As fases de luto aplicadas à solução de dívidas

06/06/2019 às 16:38
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Um texto simples, mas que pode ajudar vocês a se libertarem não somente de processos de endividamento, mas na solução de diversos outros problemas na vida. Vale muito a pena a ler. É curto, é rápido, mas pode mudar a sua vida.

Um texto simples, mas que pode ajudar vocês a se libertarem não somente de processos de endividamento, mas na solução de diversos outros problemas na vida. Vale muito a pena a ler. É curto, é rápido, mas pode mudar a sua vida.

1. Pior do que a morte.

Há mais de 30 anos, escutei de um cliente do banco onde eu trabalhava uma frase que muito me marcou:

“dinheiro pode até não trazer felicidade, mas a falta excessiva dele, que é a dívida, é pior que a morte!”

“Pior do que a morte”? O que poderia ser pior do que a morte?

Com os passar dos anos, e após atender milhares de cidadãos brasileiros endividados (inclusive alguns de minha própria família), cheguei à conclusão que pode sim existir algo que, se não for pior do que a morte, certamente se aproxima muito.

Advogar para endividados colocou-me em contato com a chamada “morte em vida”, uma condição humana muito semelhante à depressão, em suas mais severas formas.

Do ponto de vista biológico, a pessoa está viva, seu corpo respira, ainda que lentamente, mas sua alma está quebrada, catatônica, quase morta e sem sinais vitais. Vaga, errante, por uma sociedade que aprendeu a ignorar a dor de seus semelhantes, de tal forma que tais pessoas podem caminhar entre nós, sem que sequer imaginemos a sua dor.

Quase todos nós, que estamos vivos, sabemos a dor que a morte real provoca. Quem de nós nunca “perdeu” um ente querido? Mas o que fazer quando a pessoa falecida está dentro de nós mesmos, acompanhando-nos o tempo todo, seguindo-nos a todos os lugares?

Esta é a chamada “morte em vida”. Um dos mais tristes e dolorosos estados a que um ser humano pode chegar. Comparada à morte, em alguns casos, pode até mesmo ultrapassá-la em termos de dor, pois não deve ser nada fácil lidar com o funeral, em vida, de si mesmo.

2. As fases do luto convencional

Negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Salvo pequenas diferenças doutrinárias existentes entre os estudiosos no assunto, as cinco etapas acima resumem o processo de luto. A ordem varia e pode haver supressão de etapas ou acúmulo de mais de uma, durante determinado momento.

Seja como for, tudo começa pela negação e termina com a aceitação. Pelo menos deveria terminar.

Sim, infelizmente, muitas pessoas sucumbem antes de chegarem à fase de aceitação. Mergulham em profundos estados depressivos, que podem culminar na própria loucura ou, o que ainda é pior, atentarem contra suas próprias vidas.

Não menosprezem a dor daqueles que se encontram mortos em vida, sufocados não somente pelas inúmeras dívidas que não conseguem pagar, mas, principalmente, pela crueldade de terem de passar por tal situação na mais completa solidão e abandono.

Todos se aproximam dos que têm dinheiro, mas são raros os que, de fato, auxiliam seus amigos e parentes na hora em que esse dinheiro se acaba e que as prestações começam a se amontoarem sobre os devedores, como uma verdadeira bola de neve.

Nessas décadas de contato com endividados, posso garantir que não se tratam de simples caloteiros, ou de pessoas que viveram além de suas possibilidades, visando ostentar uma vida superior à que podiam. A ponte que separa uma vida financeira organizada de um estado de endividamento doentio é muito mais curta do que imaginam.

Dívidas causam toda sorte de males à sociedade, ferindo, mortalmente, o seu principal alicerce, que é a família. Casais são desfeitos, amizades são perdidas, pessoas são estigmatizadas, enfim, o endividamento excessivo funciona como uma espécie de apocalipse na vida das pessoas e famílias.

Acontece que não precisa ser assim...

3. Apesar, de tudo, há esperanças!

Apesar do cenário gravíssimo e preocupante, duas excelentes notícias, contudo, surgem como alento aos quase 63 milhões de brasileiros endividados, de acordo com o SPC – Serviço de Proteção ao Crédito - e a CNDL – Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (dados analisados em agosto de 2018).

Não somente para eles, mas para suas famílias, que sofrem junto, seja pela privação de seus próprios bens e qualidade de vida material, seja por ter de presenciar alguém que se ama sucumbir diante dessa verdadeira chaga que é “estar endividado”.

A primeira grande notícia é que, entendendo esse complexo mecanismo, é possível não somente amenizar a dor, entender suas origens, mas, principalmente, superar a “morte”, voltando a viver novamente, em um mágico processo de renascimento espiritual, moral e social.

A segunda e mais inspiradora notícia, que reflete a essência de tudo que eu aprendi, lidando não somente com endividados, mas com pessoas em diversos estágios do luto, é que, apesar da “morte em vida” ser grave e poder conduzir à morte propriamente dita, o ruído de um coração batendo, ainda que fraca e lentamente, e o suspiro de um ser humano respirando, representam a certeza de que, aquela pessoa, apesar de toda dor e sofrimento, ainda está viva, logo, ainda pode voltar a viver.

Nenhum médico ou cientista irá discordar de mim quando afirmo que é mais fácil reviver alguém que se encontra em coma moral, do que alguém cujo peito parou de bater, alguém que já soltou o seu último suspiro de vida, no mundo como o conhecemos.

Mesmo que pareçamos mortos, estar vivo faz toda a diferença. Pois, superadas as fases críticas do luto, o que vem, em seguida, é a vida, linda e resplendorosa como ela é.

Ultrapassada a depressão, surge a aceitação de que é o momento em que a pessoa, e aqueles que a amam, começam a ver a situação com mais realismo, com mais ponderação. Nesse momento, o monstro do impossível cede lugar à certeza de que tudo não passa de um obstáculo, poderoso, sim, mas que pode ser vencido, bastando, para isso, simplesmente … Estar vivo!

Mãos, mentes e corações a postos, é hora de iniciar o próximo passo dessa dura viagem. Encerrado o luto, é hora da AÇÃO!

4. Após a aceitação, hora de AÇÃO!

O processo de endividamento excessivo assemelha-se às mais dolorosas e cruéis doenças que podem acometer um ser humano ou uma família.

A exemplo do que ocorre na grande maioria das enfermidades, quanto mais cedo se chegar ao diagnóstico, melhor. Seja um câncer agressivo, seja uma doença auto-imune, seja uma grave infecção, descobrir a tempo é essencial ao processo de cura.

O oposto, contudo, pode tornar irreversível todo o processo, conduzindo as pessoas à morte, seja a “morte em vida”, seja a morte real.

Milhares de pessoas praticam atos de suicídio em todo o mundo. Nem todos eles são motivados por dívidas, mas por processos muito semelhantes, como por exemplo, o uso de drogas, que percorre um caminho muito semelhante ao das dívidas, sem contar que existem diversas outras dificuldades graves na vida.

Infelizmente, já conheci suicidas e “ex-suicidas”. Seja qual for o caso, que faz com que seres humanos pratiquem o mais grave e extremo ato contra si mesmo, sempre detectei a presença de um elemento comum a quase todos os casos: a solidão!

Pior do que passar pelo pior, é fazê-lo sozinho, sem apoio, no escuro de um quarto vazio, muitas vezes dentro de uma casa cheia de pessoas ruidosas, que, muitas vezes, sequer imaginam o tamanho da dor. E o tamanho de nossa solidão.

Atenção aos sinais. Se perceberem mudanças importantes no comportamento de seus familiares ou amigos, fiquem atentos. A depressão nem sempre é causa, sendo, na maioria dos casos, consequência, uma resposta do corpo aos transtornos da mente, que sofre e agoniza em silêncio.

Se acontecer com vocês, peçam ajuda. Não se afoguem em meio metro de água. Sabendo ou não nadar, basta ficarem de pé: verão que nada é tão grave quanto parece.

Igualmente, não permitam que outras pessoas apontem os dedos para vocês e os julguem. Boa parte dos “juízes da vida alheia”, ou não sabem o que assola uma mente mergulhada em dor, ou tentam julgar seus semelhantes para esconderem suas próprias tristezas e angústias.

Compartilhem suas dores com seus amigos. Um dos grandes ganhos colaterais desses momentos terríveis vida é podermos reconhecer quem são, de fato, nossos verdadeiros amigos.

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Quando estamos bem, endinheirados, esbanjando alegria (ainda que falsa), é assustadora a quantidade de pessoas que se aproximam. Quando o inferno, todavia, aproxima-se, assistimos, perplexos, à debandada de grande parte daqueles que julgávamos nos quererem bem.

Não fiquem magoados, revoltados ou tristes com isso. Ao contrário, devemos agradecer a Deus por nos mostrar aqueles que, de fato, são nossos verdadeiros amigos. Trata-se do sagrado processo de seleção natural da vida.

Um aviso: muito cuidado! Amigos nem sempre são aqueles que se oferecem para emprestar dinheiro. Na verdade, muitos oportunistas surgem nesses momentos.

Amigos são seres abençoados, que não nos deixarão morrer na solidão. E, quando conhecemos essas pessoas, ou quando elas se mostram, é que podemos ver o quanto somos ricos e abençoados por Deus.

Quando superamos a “morte”, a vida recomeça, a alma renasce, e podemos voltar a respirar o doce ar puro dos que são agraciados pelas mãos de Deus, que tiveram a bênção de, depois de estarem quase mortos, voltarem a viver!

Espero ter podido ajudar. Assim como vocês, já passei por diversos momentos de “morte em vida”. E, toda vez que morri, encontrei forças e pessoas, principalmente de minha família, que me ajudaram a ficar de pé.

De tanto quase morrer, aprendi a renascer. E, se Deus me deu essa glória, de voltar à vida, tantas vezes, é porque devemos aproveitá-la, correto?

Fiquem com Deus.

Belo Horizonte (MG), 03 de junho de 2019.

André Mansur Brandão
Advogado, Especialista em Dívidas e Escritor.

NOTA DO AUTOR

Quando ultrapassamos a marca de 2 milhões e quatrocentas mil pessoas no Facebook, vivi um momento de incredulidade. Nunca imaginava que pudéssemos atingir tantas pessoas. Pessoas começaram a me reconhecer em lugares públicos, festas e em diversas situações até mesmo inusitadas.

Os poucos que me conhecem de perto sabem que isso nunca seria algo que eu buscaria, pois eu adoro ser invisível. Mas não consigo. De qualquer forma, ser lido por milhares de pessoas, e ter seu trabalho reconhecido é muito, muito bom.

Com a visibilidade, contudo, vem a responsabilidade. Tudo tem um preço. Eu bem que sei disso. Diariamente, centenas de pessoas, do Brasil inteiro e do mundo, enviam-me mensagens sobre os mais variados temas e assuntos. Contam suas histórias, seus medos e seus sonhos.

E isso me faz alternar momentos de alegria extrema à tristeza profunda, várias vezes, no mesmo dia. Da mensagem do leitor que me comunica, radiante, que vai ser pai, até a mensagem de outro, que acabou de perder um filho. Do céu ao purgatório, em segundos.

Isso sem contar a minha própria profissão, que é quase uma versão em menor escala desse mundo chamado redes sociais. Em ambos os casos, sinto que posso fazer algo. Mas, quando não é possível, “quase morro”, mas renasço, de novo, como na crônica acima.

Converso muito com uma amiga psicóloga, que me ajudou a lidar com essa montanha russa de emoções. Mas eu sou muito humano. Sendo assim, sou muito falho. Não sei se isso me faz bem ou mal, mas sei que, de uma forma ou de outra, eu posso ajudar alguém, ainda que seja uma pessoa, dentre milhões.

A crônica acima nasceu como resposta à três mensagens que recebi. Três pessoas endividadas com cartão de crédito, cheque especial e, a mais preocupante delas, com muitas dívidas de impostos, e ameaças de prisão (sim, dever impostos é crime).

Escrevi a cada uma delas sobre os pontos específicos de seus casos. Mas pensei: “por que não escrever algo, que alcance milhares de pessoas, que possa ajudar não somente com seus casos pessoais, mas na forma de lidar com eles?”

E assim nasceu a presente crônica.

Se puder ajudar apenas uma pessoa, a missão já estará cumprida, mas sinto que seu conteúdo tocará muitos corações. Se acharem que pode ajudar alguém, compartilhem, mas, em hipótese alguma, julguem aqueles que, por uma infelicidade mergulharam no pântano escuro das dívidas.

Após quase 30 anos de experiência, posso afirmar: o mau caráter é a exceção!

André Mansur Brandão
Diretor-Presidente

ANDRÉ MANSUR ADVOGADOS ASSOCIADOS

Sobre o autor
André Mansur Brandão

Advogado da André Mansur Advogados Associados (Minas Gerais). Administrador de Empresas. Escritor.Saiba mais sobre nossa empresa em: http://andremansur.com/portfolio/

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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