Habeas corpus

09/06/2019 às 14:15
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No presente artigo foi abordado o conceito de habeas corpus, um dos principais institutos do Processo Penal. Dando introdução a origem do habeas corpus, sua definição, espécies, legitimidade, hipóteses de cabimento e os órgãos que possuem competência.

INTRODUÇÃO

 

O habeas corpus é um instituto jurídico que teve origem com a assinatura da Magna Carta em 1215, devido ao autoritarismo do Estado contra a liberdade de locomoção dos indivíduos.

 

No presente artigo será abordado o conceito de habeas corpus, um dos principais institutos do Processo Penal. Dando introdução a origem do habeas corpus e a sua definição. Foram analisadas as suas espécies, legitimidade e, por fim, aqueles órgãos que possuem competência para julgar.

 

Diante o exposto, este trabalho tem como objetivo apresentar o conceito de habeas corpus, sua origem e suas especificações no Processo Penal.

 

1. ORIGEM

1.1 HISTÓRICO DO HABEAS CORPUS

 

O instituto habeas corpus teve nasceu da necessidade de se opor as autoridades estatais. Muitos doutrinadores dizem que a existência do habeas corpus nos países democráticos é essencial para manutenção das liberdades do homem, pois pode ser visto como a contenção do autoritarismo.

 

Segundo muitos doutrinadores, o habeas corpus teve origem com a assinatura da Carta Magna de 1215, assinada pelo Rei João Sem Terra, devido às revoltas dos barões ingleses. Pela visão de Tourinho Filho:

 

“Os doutrinadores apontam suas origens na Magna Carta outorgada por João SemTerra, em 15-6-1215, ante as constantes pressões dos nobres e do clero, que evocavam velhos costumes saxônicos. Dizia, a propósito, o art.48 daquele diploma: ‘Ninguém poderá ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdade, senão em virtude de julgamento de seus pares, de acordo com as leis do país”.

 

José Frederico Marques seguindo a mesma visão diz:

 

“a Magna Carta, imposta pelos barões ingleses, em 15 de junho de 1215, ao rei João Sem Terra, foi ato solene para assegurar a liberdade individual, bem como para impedir a medida cautelar de prisão sem o prévio controle jurisdicional (retro n. 923). O modo prático de efetivar-se esse direito à liberdade – como lembra Costa Manso – foi estabelecido pela jurisprudência: expediam-se mandados (writs) de apresentação, para que o homem (corpus) e o caso fossem trazidos ao tribunal, deliberando este sumariamente sobre se a prisão devia ou não ser mantida. Dos diversos writs, o que mais se vulgarizou foi o writ of habeas corpus ad subjiciendum, pelo qual a Corte determinava ao detentor ou carcereiro que, declarando quando e por que fora preso o paciente, viesse apresentá-lo em juízo, para fazer, consentir com submissão e receber – ad faciendum, subjiciendum et recipiendum – tudo aquilo que a respeito fosse decidido”.

 

Apesar de possuir raízes históricas, foi apenas em 1679 que surgiu a terminologia habeas corpus. Por meio deste ato, todos os acusados de crime deveriam ser apresentados aos juízes, para ser analisado a legalidade do ato de prisão. Era um instituto válido apenas no processo penal.

 

Desse modo, a Carta Magna foi um ponto de mudança crucial na luta para estabelecer a liberdade. Por meio dela, nasceu uma nova era que limitou o poder dos monarcas da Inglaterra.

 

Em 1816 o habeas corpus passou a abranger todas as figuras de ilegalidade que tirava do homem sua liberdade de locomoção. A partir deste momento que tal modalidade desenvolveu como meio eficaz para garantir a liberdade individual. 

 

1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA NO ORDENAMENTO BRASILEIRO

 

O primeiro registro histórico de um instrumento que se assemelhava ao habeas corpus no ordenamento brasileiro, surgiu no ano de 1821 com o Decreto 114, o qual vedava prisões arbitrárias.

 

O termo surgiu expressamente no Código do Processo Criminal de 29 de novembro de 1832, aonde veio regulamentado o habeas corpus, no seu art. 340: “Todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade tem direito de pedir ordem de habeas corpus em seu favor.”

 

Assim, o instituto passou a estar presente em todas as Constituições brasileiras, atualmente estando previsto no artigo 5°, LXVIII, da Carta Magna de 1988 ("conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder") e regulado nos artigos 647 a 667 do Código de Processo Penal.

 

2. HABEAS CORPUS

2.1 Conceito

 

A expressão habeas corpus tem sua origem no latim, que, em sentido literal, significa “tome o corpo”. Isto é, tome a pessoa presa e a apresente ao juiz, para julgamento do caso. Popularmente o HC passou a ser conhecido como ordem de libertação.

 

O habeas corpus tornou-se uma garantia individual. Podendo ser conceituado como o remédio judicial que tem por finalidade evitar ou fazer cessar a violência ou a coação à liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou abuso de poder.

 

Nas palavras de Edílson Mougenot Bonfim:

 

“Habeas corpus é o remédio jurídico-constitucional destinado a proteger a liberdade de locomoção do indivíduo (ju manendi, eundi, ambulandi, veniendi, ultro citroque), ameaçada por qualquer ilegalidade ou abuso de poder. A expressão habeas corpus significa ‘tome o corpo’, pois em suas origens, com a impetração da ordem o prisioneiro era levado à presença do rei para que este verificasse a legalidade ou ilegalidade da prisão.”

 

Nos termos do art. 647 do CPP, o HC está inserido dentre as espécies de recursos. Uma vez que a Doutrina Majoritária acata que o instituto habeas corpus tem caráter jurídico de ação independente, não podendo ser considerado recurso.

 

Ademais, o HC esta contido na Constituição de 88 como remédio constitucional, sendo considerado como ação penal constitucional, uma vez que possui características que o difere de todos os outros recursos penais.

 

Uadi Lammêgo Bulos assinala algumas características deste remédio constitucional:

“Trata-se de uma ação penal popular, de berço constitucional e procedimento sumário. Ora assume o posto de ação cautelar, declaratória ou constitutiva (CPP, art. 648, I a V), ora de ação rescisória constitutiva negativa (CPP, art. 648, VI e VII).”

“Não é em todo e qualquer caso que o remédio heróico pode ser usado, visto que somente serve para tutelar a liberdade ambulatória ou de locomoção.”

 

2.2 Espécies

 

Podemos analisar duas espécies de habeas corpus:

 

A espécie liberatória ou repressiva tem por função afastar a ilegalidade e a liberdade de locomoção já existente, visando eliminar o constrangimento àquela pessoa que se encontra presa por ilegalidade ou por abuso de poder. Essa espécie pode ser concedida a pedido ou de ofício pelo Juiz ou Tribunal. Quando concedido, expede-se um alvará de soltura e o preso é posto em liberdade.

 

Já a espécie preventiva ou suspensiva há uma situação de ameaça em sofrer uma violência ou coação na sua liberdade por ilegalidade ou abuso de poder. Quando concedido o instituto, expede-se o chamado salvo-conduto e, por meio deste, o paciente recebedor do remédio fica impedido de ser privado de sua liberdade pelo fato que culminou a apreciação pela autoridade prevista.

 

Edílson Mougenot Bonfim diz o seguinte acerca do habeas corpus preventivo:

 

“Será preventivo quando sua finalidade for afastar o constrangimento à liberdade antes mesmo de se consumar. Baseia-se, portanto, na iminência da violência ou coação ilegal e na possibilidade próxima da restrição da liberdade individual. Caso seja admitido, será expedido um salvo-conduto a favor daquele que tem ameaçado sua liberdade de ir e vir. No entanto, se houver mandado de prisão expedido e não cumprido, o impetrante deve requerer no pedido do habeas corpus a expedição do contramandado de prisão, e não o salvo-conduto. Tal hipótese gera certa dúvida na doutrina, existindo posicionamento no sentido de ser o habeas corpus repressivo, uma vez que o ato coator já estaria devidamente formalizado”.

 

O habeas corpus é um instrumento que resguarda o direito de liberdade previsto na Constituição Federal no art. 5°. Tal instituto resguarda inclusive a ameaça de tal direito. Sendo assim, uma garantia do próprio Estado de direito.  

 

2.3 Legitimidade

 

A legitimidade instaurada pelo habeas corpus esta prevista no art. 654 do CPP que diz “o habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.”

 

Na modalidade de Legitimidade ativa qualquer pessoa pode impetrar, não importando idade, sexo, estado mental, profissão, nacionalidade. Podendo também ser imposto por uma terceira pessoa, e pessoa jurídica.

 

De acordo com o § 2.° do art. 654 do Código de Processo Penal, pode ainda, ser concedido de ofício pelos juízes e pelos tribunais, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.

 

A Legitimidade passiva do habeas corpus é de titularidade daqueles que pratiquem a ilegalidade ou abuso de poder, seja autoridade pública ou particular. Podendo ser os delegados de policia, promotores, juízes de direito, tribunais, particulares etc.

 

2.4 Cabimento

 

As hipóteses de cabimento do HC estão previstas no art. 648 do CPP: a coação considerar-se-á ilegal

I - quando não houver justa causa;

A hipótese trata da falta de justa causa para a prisão, para o inquérito e para o processo. Só há justa causa para a prisão no caso de flagrante delito ou de ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.

II - quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

A hipótese cuida do excesso nas prisões provisórias, e/ou referentes ao prazo para o encerramento da instrução criminal que, em regra, é de 105 dias no procedimento comum ordinário.

III - quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;

Só pode determinar a prisão, a autoridade judiciária dotada de competência material e territorial, salvo caso de prisão em flagrante. Ex. prisão alimentícia decretada por Juiz criminal, ou vice-versa.

IV - quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;

V - quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei a autoriza;

VI - quando o processo for manifestamente nulo;

A nulidade pode decorrer de qualquer causa, como falta de condição de procedibilidade (representação nos crimes de ação penal pública condicionada), ilegitimidade ad causam (ofendido propõe a ação penal pública ou vice-versa) ou processual (menor de 18 anos propõe ação penal privada), incompetência do juízo, ausência de citação ou de concessão de prazo para a defesa prévia, alegações finais etc..

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VII - quando extinta a punibilidade;

As causas extintivas da punibilidade estão enumeradas no art. 107, do CP.

            

2.5 Competência

 

Pelo artigo 650 do CPP é determinado quem tem competência para julgar o habeas corpus. Destacando os casos em que o STF e STJ são os responsáveis por analisar o recurso.

 

A competência segue dentro dos limites de sua jurisdição, ou seja, o habeas corpus deverá ser postulado dentro da comarca em que esta ocorrendo à perda de liberdade do paciente. E, da mesma forma, deve ocorrer frente à autoridade superior.

 

Nesse mesmo sentido, cabe aos diferentes órgãos do judiciário sua apreciação, dependendo do autor ou coator do fato. Essa competência se processa pela função dos órgãos do judiciário, cabendo a eles diferentes apreciações.

 

Pela competência do STF o art. 102, I, da CF              determina quando o órgão Superior esta autorizado para julgar o HC. Na alínea “d” está disposto que é de responsabilidade da Corte Maior o habeas corpus em que o paciente for o Presidente da Republica, Vice-presidente,   membros do Congresso Nacional, Ministros, Procurador Geral da República, entre outros.

 

Pela competência do STJ esta igualmente elencada no artigo 105, I, c, CF, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea "a": Governadores dos Estados e do Distrito Federal, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais.

 

A competência do Juiz de Primeiro Grau, os juízes são competentes quando os coatores estão em igual grau de hierarquia ou inferior. No art. 109, VII, CF diz que “competirá ao juiz federal processar e julgar o habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição”.

 

3. Conclusão

 

O presente trabalho favoreceu a compreensão de que o habeas corpus trata-se do instrumento jurídico de caráter constitucional penal, que tem por fim assegurar a liberdade de locomoção, tutelando o direito fundamental de ir e vir e evitando a perpetuação da ilegalidade e do abuso de poder daqueles que tem o poder de punir.

 

Considerando o objetivo do estudo, foi possível concluir a crescente necessidade de estudos relacionados ao tema, devido aos conceitos serem amplos e abrangentes com implicações jurídicas diversificada, bem como a evolução atual nos conceitos de habeas corpus.

 

Vale ressaltar que a discussão sobre o tema não se esgota, devendo ser continua e atualizada devido a importância do mesmo no contexto sócio político.

 

Bibliografia

 

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Bulos, Uadi Lammêgo. Direito Constitucional ao alcance de todos – 2 ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2010.

GALDINO, Vandson dos Santos. Habeas Corpus: natureza jurídica de ação penal constitucional e crítica à atual jurisprudência na restrição de seu uso. Conteudo Juridico. Disponivel em: http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.47447&seo=1

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