Ação de petição de herança e prazo prescricional

11/06/2019 às 18:06

Resumo:


  • A ação de petição de herança é considerada uma ação real, semelhante à ação reivindicatória, na qual o herdeiro busca recuperar a posse dos bens da herança.

  • A ação de petição de herança possui dupla finalidade: o reconhecimento da qualidade de herdeiro e a restituição dos bens hereditários, sendo seu prazo prescricional de 10 anos.

  • Há divergências quanto à prescritibilidade da ação de petição de herança, com entendimentos que vão desde a imprescritibilidade até a prescritibilidade da ação.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

1. NATUREZA JURÍDICA E ASPECTOS PROCESSUAIS

A ação de petição de herança é considerada pela doutrina como uma ação real, semelhante à ação reivindicatória, por meio da qual o herdeiro, baseado na condição hereditária, promove a recuperação da posse dos bens da herança. É ação real de natureza executiva.

A Ação de Petição de Herança possui dupla finalidade: a primeira é o reconhecimento da qualidade de herdeiro; a segunda é a restituição dos bens hereditários. Logicamente, se findado o prazo utilizado pelos julgadores, ineficaz seria a referida ação, haja vista que a finalidade secundária, recém exposta, jamais poderá ser cumprida.

Luigi Ferri (Commentario del códice civile, 1970, pág. 200) dizia que, ao contrário da ação reivindicatória e ainda das ações possessórias, a ação de petição de herança é ação universal, embora seja discutível se apenas os bens materiais poderão ser objeto da ação, ou se poderia sê-lo a universalidade da herança, compreendida aí também os bens imateriais.

A ação pressupõe que o herdeiro, alegando tal qualidade, acione o possuidor dos bens da herança, para obter a respectiva posse deles. Se a causa petendi, por exemplo, um contrato firmado pelo de cujus de que lhe advenha a posse, certamente, seria incabível a petição de herança: no caso, estar-se-ia pedindo fundado no negócio jurídico, não com base do direito hereditário.

Na lição de Ovídio Baptista da Silva (Curso de processo civil, volume II, 1990, pág. 231), segundo a doutrina milenar, formada a partir do direito romano, a petição de herança tanto pode ser proposta contra aquele que possua bens da herança, dizendo-se herdeiro (pro herede) quanto poderá sê-lo igualmente contra o possuidor sem título (pro possessore).

Ainda aduziu Ovídio Baptista que é controvertida a questão da legitimidade passiva para a petição de herança. Quando o possuidor de bens hereditários, citado como réu, comparece ao processo, dizendo-se herdeiro, o problema é facilmente solucionado, no sentido do cabimento da ação. Quando, no entanto, o demandado, ao responder à demanda, não controverte a respeito da qualidade de herdeiro do autor, sem, todavia, indicar uma causa específica que legitime sua posse, os escritores divergem, entendendo uns que, em tal caso, a petição de herança transforma-se em reivindicatória em virtude da espécie de contestação eventualmente oposta pelo réu, o que poderia recomendar que o autor promovesse a petição em cumulação sucessiva eventual com a reivindicatória. Ou o demandado invoca a condição de herdeiro para justificar a sua posse (possessor pro herede), alegando, por exemplo, a existência do testamento em seu favor ou contesta a qualidade de herdeiro do autor, sem todavia atribuir à sua posse, ou a si próprio, a condição hereditária.

Max Kaser (Derecho romano privado, tradução da 5ª edição alemã, 1968, § 75, I, 3) ensinou igualmente que a ação deveria ser rejeitada, se o réu, na contestação, invocasse algum título singular legitimador da posse.

Ainda acentuou Max Kaser (Direito privado romano, Fundação Calouste Gulbenkian, 1992, pág.409) que a hereditatis petitio serve para a proteção do direito sucessório civil (D.5,3; C. 3, 31). É uma actio in rem, muito semelhante à rei vindicatio: com ela o heres exige a declaração do seu direito sucessório e a entrega da herança. Diferentemente da rei vindicatio a hereditatis petitio é uma ação universal, que compreende toda a herança. Observa-se, segundo ele, que a herança nem sempre se compõe apenas de coisas corpóreas, mas pode consistir integral ou parcialmente em direitos, em especial créditos.

A hereditatis petitio (como actio in rem) no direito antigo dirigia-se apenas contra o que "possui" todos ou alguns bens singulares da herança. Desde que a herança não consista exclusivamente em bens corporais, este requisito atenua-se frequentes vezes.

É certo que Justiniano afastou as dúvidas quando a legitimação passiva do possuidor fictício, isto é do não-possuidor que simula posse ou a abandona dolosamente.

No direito romano, como em todas as ações in rem, também na hereditatis petitio o demandado só de modo indireto é forçado pelo pretor a ser parte da ação. Se se recusar a ser parte, em especial a colaborar na litis contestatio, a hereditatis petitio não se realiza, mas o pretor dá ao autor o interdictum quam hereditatem (restitutório).

Observe-se que o objeto do que se inclui na hereditatis petitio abrange tudo o que o demandado obteve da herança.

No sistema processual romano, ensinou Max Kaser (obra citada, pág. 412) que "depois da litis contestatio, como na rei vindicatio, o demandado responde por dolo e culpa; mas, excepcionalmente tem de colocar o autor na situação em que estaria se a herança (que ao tempo da litis contestatio está em poder do demandado) já nesse momento lhe tivesse sido entregue".

Pontes de Miranda (Tratado das ações, tomo VII, § 48, 2) reputou irrelevante o fato de ter sido anterior à morte do “de cujus” o início da posse ou não.

Segundo uns, a posse do réu, para legitimar a petição de herança, deverá ser posterior à morte do autor da herança, pois se o réu já possuía o bem antes da morte do “de cujus”, não se pode dizer que a respectiva adprehensio tenha sido de um bem hereditário, condição para o cabimento desta ação como disse Schlensinger. Mas, outros, ao contrário, reputam irrelevante o fato de ter sido anterior à morte do “de cujus” o início da posse, ou não, como se lê de Pontes de Miranda (Tratado das ações, tomo VII, pág. 48,2).

Não cabe ao autor da ação de petição de herança qualquer ônus probatório quanto à propriedade do bem reclamado, de modo que a ação somente pudesse abranger os bens de propriedade do “de cujus”. O que lhe cabe provar é sua condição de herdeiro e a circunstância de haver o “de cujus” exercido posse sobre o bem reclamado na ação. Pode o herdeiro, através da ação de petição de herança, reclamar a posse do prédio de que o “de cujus” fora simples inquilino, se o demandado dele se apossara depois de aberta a concessão. Sendo assim a ação de restituição funda-se, portanto, na hereditariedade da coisa reclamada, como ensinou Schlensinger, citado por Ovídio Baptista (obra citada, pág. 233).

Mas Schlensinger, no entanto, entendia que o fato de o réu possuir a coisa pro herede ou pro possessore, é elemento constitutivo da ação, de modo que a prova desse pressuposto opera o autor, pois do contrário – a transferência para o demandado do ônus da prova da legitimidade de seu título, resolver-se-ia na abolição do princípio tradicional de que melhor condicio possidentis, segundo o qual (nas demais ações) é assegurada ao possuidor a vantagem de impor a quem pretenda a restituição da posse, a prova do próprio direito de restituição, assim como a prova da ilegitimidade da posse do demandado. Assim, como informou ainda Ovídio Baptista da Silva, na petição da herança, a adotar-se a solução inversa, como afirmou Schlensinger, “a posse dos bens hereditários assentar-se-ia no pressuposto exatamente o contráro, ou seja, ter-se-ia em princípio, como ilegítima a posse, até que o demandado provasse a legitimidade do seu título”.

Para Ovídio Baptista, Schlensinger não teria razão ao insurgir-se contra a inversão do ônus da prova, pois esse expediente técnico é comum.

A ação de petição da herança pode vir cumulada a outra ação, como por exemplo, a ação de nulidade do testamento ou do inventário.

Questão controvertida, como se observa da doutrina, é saber até que ponto poderá ir direito do herdeiro que exerce a petição da herança contra o herdeiro aparente, se este de boa fé, ou perante terceiro de boa fé, alienou o bem hereditário. Se a alienação fora a título gratuito entende-se que a restituição alcança o terceiro, se a alienação tivera como causa negócio jurídico oneroso, caberá ao herdeiro, vencedor na petição de herança, exigir do herdeiro aparente a transferência do que ele houver percebido com a alienação.

Para Pontes de Miranda (Tratado das ações, VII, § 47, 2), estabelece-se a ampla sub-rogação dos bens adquiridos pelo possuidor com o valor dos bens da herança.

Mas, todavia, é mister que se configure a condição de herdeiro aparente que evidentemente não se confunde com a situação de qualquer detentor de bens hereditários que se atribua a qualidade de herdeiro. Para que o terceiro possa defender-se vantajosamente e evitar a restituição do bem hereditário que houver adquirido do falso herdeiro, é necessário que se verifiquem três condições: a) que o alienante se apresente como herdeiro; b) que a aquisição se tenha dado a título oneroso; c) que o terceiro esteja de boa fé, cabendo a ele a prova desta condição.


2. AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA E PRESCRIÇÃO

Outra discussão se dá com relação a prescrição nessas ações de petição da herança.

A ação de petição de herança é aquela proposta pelo herdeiro que não participou de um inventário e de uma partilha em busca de receber o seu quinhão hereditário das mãos dos demais herdeiros (artigo 1.824 e ss, Código Civil). Seu prazo prescricional é de 10 anos, por força da regra geral do artigo 205 do CC.

Bem disse Carlos Eduardo Elias de Oliveira (Decênio prescricional da ação de petição de herança começa com o fim da partilha):

“O problema é definir o termo inicial desse decênio prescricional na hipótese de a condição de herdeiro depender de um reconhecimento oficial por meio de uma prévia ação, como no caso de um filho não reconhecido ou de uma companheira cuja união estável ainda não foi reconhecida.

De um lado, se a condição de herdeiro não depender de uma ação prévia por já estar reconhecida oficialmente (por exemplo, o filho já foi reconhecido), há controvérsia se o termo inicial deve ser a data da abertura da sucessão ou a data da partilha dos bens. Entendemos que deve ser a data da partilha, pois somente a partir desse momento o herdeiro efetivamente pode ser considerado preterido e, assim, só a partir daí ele pode se valer da ação da petição de herança para cobrar o seu quinhão hereditário. Antes da partilha, o herdeiro não poderia propor ação de petição de herança, pois a via adequada para ele pleitear seu quinhão é habilitar-se no inventário na forma do artigo 628 do CPC.

De outro lado, se a condição de herdeiro depender de uma prévia ação por ainda não estar definida (por exemplo, ação de investigação de paternidade post mortem), a 3ª Turma do STJ decidiu que o termo inicial da prescrição da ação de petição de herança será apenas o trânsito em julgado daquela anterior ação.

É que somente após a definição da condição de herdeiro com o trânsito em julgado da ação pertinente nasceria a pretensão de o herdeiro preterido pleitear o seu quinhão hereditário por meio da ação de petição de herança. Antes disso, a parte desconheceria a sua condição de herdeiro e, por isso, não poderia ser punida com a prescrição em relação à possível ação de petição de herança. A teoria da actio nata — que vincula o termo inicial da prescrição ao momento do nascimento da pretensão — justificaria esse entendimento. Trata-se da velha máxima romana: actioni nondum natae non praescribitur.

Portanto, à luz da 3ª Turma do STJ, no caso de filho ainda não formalmente reconhecido, o prazo prescricional de 10 anos da ação de petição de herança só começa a correr a partir do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade. Esse é o entendimento mais recente do colegiado, que superou anterior entendimento que se inclinava a fincar o termo inicial do decênio prescricional da ação de petição de herança na data da abertura da sucessão (STJ, REsp 1.368.677/MG, 3ª Turma, rel. ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 15/2/2018; REsp 1.475.759/DF, 3ª Turma, rel. min. João Otávio de Noronha, DJe de 20/5/2016; REsp 1.392.314/SC, 3ª Turma, rel. ministro Marco Aurélio Belizze, DJe 20/10/2016).”

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Temos que o recente entendimento da 3ª Turma do STJ à luz da 3ª Turma do STJ, o termo inicial da ação de petição de herança seria o trânsito em julgado da ação de investigação da paternidade, há o risco potencial de eternização de discussões patrimoniais. Imagine, por exemplo, que um indivíduo proponha uma ação de investigação de paternidade post mortem depois de 50 anos da partilha de bens do suposto pai. Em vencendo a ação, ele ainda terá 10 anos para ajuizar a ação de petição de herança, o que, na prática, exporia os herdeiros que fizeram a partilha a terem de pagar o quinhão do filho preterido após 60 anos. Não nos parece adequada essa imortalidade de discussões patrimoniais.

Mas Carlos Eduardo Elias de Oliveira (obra citada) observou que o termo inicial do prazo prescricional de 10 anos da ação de petição de herança é a data da conclusão da partilha, pois, a partir daí, passa a ser cabível a ação de petição de herança. Todavia, ao ser proposta a ação destinada ao reconhecimento da condição de herdeiro (por exemplo, ação de reconhecimento de paternidade post mortem ou ação de reconhecimento de união estável post mortem), o prazo prescricional deverá ficar suspenso e só voltará a fluir com o trânsito em julgado dessa ação. O fundamento dessa suspensão é o princípio do contra non valentem agere non currit praescriptio (em vernáculo, contra quem não pode agir, não corre a prescrição): enquanto a condição de herdeiro não está reconhecida definitivamente, não é razoável exigir a propositura da ação de petição de herança.

Sílvio de Salvo Venosa assim orienta (Direito das Sucessões. – 8.ed. – São Paulo: Atlas, 2008, pág.108 ): “O prazo extintivo para essa ação inicia-se com a abertura da sucessão e, no atual sistema, é de 10 anos, prazo máximo permitido no ordenamento. No sistema de 1916, o prazo era de 20 anos”

Ainda, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Recurso especial n° 260079. Quarta Turma. Relator. Min. Fernando Gonçalves. Julgado em 17/05/2005), segue os ensinamentos de Sílvio de Salvo Venosa, que nos apresenta como termo inicial a abertura da sucessão e, como termo final, transcorridos 20 anos da abertura da mesma considerando a vigência do Código Civil de 1916. Veja-se:

“PROCESSUAL CIVIL. INCLUSÃO. PÓLO PASSIVO. POSTERIOR. CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. REEXAME DE PROVAS.SÚMULA 7-STJ. CIVIL. PARTILHA. NULIDADE. HERDEIRO PRETERIDO.PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. ADOÇÃO. CÓDIGO CIVIL. ÉPOCA ANTERIOR. ATUAL CONSTITUIÇÃO. MORTE. DE CUJUS. SUCESSÃO. ABERTURA. ÉPOCA POSTERIOR (1989). ADOTADO. FILHOS DO CASAMENTO. DISCRIMINAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. - Não viola os arts. 264. e 294, ambos do CPC a inclusão no pólo passivo da demanda de maridos e esposas dos primitivos réus, posteriormente à citação destes, porquanto não efetivada nenhuma alteração na causa de pedir ou no pedido, restando incólume a estabilidade da causa. 2. - Segundo iterativos precedentes das Turmas especializadas em direito privado desta Corte a prescrição para anular partilha, onde preterido herdeiro necessário, é a vintenária. 3. - Aferir se há ilegitimidade passiva ad causam demanda revolvimento de aspectos fático-probatórios, vedados pela súmula 7-STJ. Precedentes do STJ. 4. - Ocorrida a morte da autora da herança em 1989, quando já em vigor o art. 227, § 6º, da Constituição Federal, vedando qualquer tipo de discriminação entre os filhos havidos ou não do casamento, ou os adotivos, a recorrida, ainda que adotada em 1980, tem direito de concorrer aos bens deixados pela falecida, em igualdade de condições com os outros filhos, prevalecendo, nesse caso, os arts. 1572. e 1577, ambos do Código Civil de 1916. 5. - Recurso especial não conhecido.”

(Recurso especial Nº260079. Quarta Turma. Relator. Min. Fernando Gonçalves. Superior Tribunal de Justiça, Julgado em 17/05/2005).

Recentemente a matéria voltou a ser enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça:

“Na hipótese em que ação de investigação de paternidade post mortem tenha sido ajuizada após o trânsito em julgado da decisão de partilha de bens deixados pelo de cujus, o termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da decisão que reconheceu a paternidade, e não o trânsito em julgado da sentença que julgou a ação de inventário. A petição de herança, objeto dos arts. 1.824. a 1.828 do CC, é ação a ser proposta por herdeiro para o reconhecimento de direito sucessório ou a restituição da universalidade de bens ou de quota ideal da herança da qual não participou. Trata-se de ação fundamental para que um herdeiro preterido possa reivindicar a totalidade ou parte do acervo hereditário, sendo movida em desfavor do detentor da herança, de modo que seja promovida nova partilha dos bens. A teor do que dispõe o art. 189. do CC, a fluência do prazo prescricional, mais propriamente no tocante ao direito de ação, somente surge quando há violação do direito subjetivo alegado. Assim, conforme entendimento doutrinário, não há falar em petição de herança enquanto não se der a confirmação da paternidade. Dessa forma, conclui-se que o termo inicial para o ajuizamento da ação de petição de herança é a data do trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, quando, em síntese, confirma-se a condição de herdeiro.

REsp 1.475.759-DF , Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 17/5/2016, DJe 20/5/2016.’

O deferimento da respectiva ação acarreta nova partilha de bens, sendo que o prazo prescricional para sua interposição começará com o trânsito em julgado da sentença que julgou o inventário, em 10 anos, uma vez que não existe prazo específico estipulado no ordenamento jurídico para a petição de herança. No caso, adota-se o prazo prescricional geral previsto no artigo 205 do Código Civil, ainda que alguns doutrinadores entendam que se trata de direito imprescritível, visto que a condição de herdeiro não se perde no tempo.

Há divergências quanto à prescritibilidade da Ação de Petição de Herança. As divergências ocorrem sobre questão relativa à natureza da ação discutida anteriormente. Orlando Gomes (Sucessões – 12. ed. ver., atual. e aumentada de acordo com o Código Civil de 2002 / por Mario Roberto Carvalho de Faria. – Rio de Janeiro : Forense, 2004, pág. 265) assim entende: :

“No rigor dos princípios, a ação é imprescritível. Ainda que tivesse natureza real, não prescreveria como não prescreve a ação de reivindicação, a que se equipararia. Fosse ação pessoal, também seria imprescritível porque, destinada ao reconhecimento da qualidade hereditária de alguém, não se perde esta pelo não-uso. Busca-se um título de aquisição. Seu reconhecimento não pode ser trancado pelo decurso de tempo. Há de ser declarado passem ou não os anos.”

No pensamento de Orlando Gomes, independente do entendimento acerca da natureza da ação, em ambos os casos imprescritível seria o reconhecimento da qualidade de herdar. Ou seja, tanto sendo a Ação de Petição de Herança de natureza real quanto pessoal, seria ela imprescritível, pois, se perpetuaria ao longo da vida do sucessor.

De mesma forma, relata o professor Sílvio Rodrigues (Direito civil: direito das sucessões. v. 7. – 26. ed. ver. e atual. por Zeno Veloso; de acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-1-2002). São Paulo : Saraiva, 2003, pág. 90):

“O Código Civil português afirma que a ação de petição de herança é imprescritível, embora reconheçam os efeitos da usucapião relativamente a cada uma das coisas possuídas. Nesses países, portanto, esta ação pode ser intentada a todo tempo, a não ser que, pelo decurso do prazo, o possuidor – pela usucapião – já tenha adquirido a propriedade da coisa possuída”.

Há o entendimento de que o direito de sucessor deve ser imprescritível, ou seja, considerado, pois, vitalício. A título disto, Arnaldo Rizzardo (Direito das sucessões. Rio de Janeiro : AIDE Editora, 1996, pág.750) conclui que: “não corre contra filho natural não reconhecido a prescrição de petição de herança”.

Na matéria aponta-se a Súmula 149 do Supremo Tribunal Federal como norte na matéria:

É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança.

A esse respeito tem-se:

Agravo regimental em recurso extraordinário. Agravo de instrumento convertido em recurso extraordinário. Fato que não impede sua apreciação, como de direito, pelo Ministro relator do feito, de forma monocrática. Irresignação, ademais, que foi apreciada pelo mérito. Ação de investigação de paternidade. Demanda que, por dizer respeito ao estado de filiação da pessoa, é imprescritível. 1. A decisão ora atacada reflete a pacífica jurisprudência desta Corte a respeito do tema, tendo sido, ademais, efetivamente apreciado o mérito da irresignação deduzida pela recorrente. 2. Não há que se falar em eventual cerceamento do direito de produzir provas quando o acórdão agravado se limita a confirmar decisão regional que afastou decreto de extinção do feito, determinando, tão somente, o prosseguimento da demanda. 3. Agravo regimental não provido.

[RE 422.099 AgR , rel. min. Dias Toffoli, 1ª T, j. 23-3-2011, DJE 109 de 8-6-2011.]

Possibilidade de repropor ação de investigação de paternidade. 1. É dotada de repercussão geral a matéria atinente à possibilidade da repropositura de ação de investigação de paternidade, quando anterior demanda idêntica, entre as mesmas partes, foi julgada improcedente, por falta de provas, em razão da parte interessada não dispor de condições econômicas para realizar o exame de DNA e o Estado não ter custeado a produção dessa prova. 2. Deve ser relativizada a coisa julgada estabelecida em ações de investigação de paternidade em que não foi possível determinar-se a efetiva existência de vínculo genético a unir as partes, em decorrência da não realização do exame de DNA, meio de prova que pode fornecer segurança quase absoluta quanto à existência de tal vínculo. 3. Não devem ser impostos óbices de natureza processual ao exercício do direito fundamental à busca da identidade genética, como natural emanação do direito de personalidade de um ser, de forma a tornar-se igualmente efetivo o direito à igualdade entre os filhos, inclusive de qualificações, bem assim o princípio da paternidade responsável.

[RE 363.889 , rel. min. Dias Toffoli, P, j. 2-6-2011, DJE 238 de 16-12-2011.]

Observou Washington Barros Monteiro (Curso de direito civil, volume 2º, 265) que “enquanto vivo, assiste ao filho o direito de reclamar a investigação. A imprescritibilidade descansa na conexão existente entre o interesse do indivíduo e o interesse do Estado. Além disso, o status familiae implica uma coincidência de direitos e deveres, que impede possa alguém liberar-se dos deveres, despojando-se dos direitos.

Tem-se que a razão da Súmula 149, como informou Roberto Rosas (Direito sumular – Comentários às Sumulas do STF, 6ª edição, pág. 67) deve-se ao largo dissenso doutrinário e jurisprudencial, em razão de entender-se a ação de investigação de paternidade como ação de estado e os efeitos da sentença nessa ação. Na linha da prescrição ficaram: Clóvis Beviláqua, Carlos Maximiliano, Arnaldo Medeiros da Fonseca. Na linha da Súmula, pela imprescritibilidade: Pontes de Miranda, Câmara Leal, Carpenter, Orlando Gomes, Nelson Carneiro (Do reconhecimento de filhos adulterinos, n. 291) e Caio Mário da Silva Pereira (Reconhecimento de paternidade e seus efeitos, 1977, pág. 98)), e ainda: RE 80.426, Relator ministro Aliomar Baleeiro, RTJ 74/581; RE 78.969 – Relator ministro Bilac Pinto, Silvio Rodrigues (Direito civil aplicado, volume I, pág. 161), dentre outros.

Os acórdãos em que se fundam a Súmula referenciada se esteiam na ideia de que as ações de estado são imprescritíveis, pois não prescreve o estado de uma pessoa (voto do ministro H. Guimarães nos Bem. 47.745). Nesse sentido, repetindo o voto de muitos colegas, a opinião do ministro Cândido Mota Filho, nos Emb. 49.526, de Minas Gerais:

“Sempre sustentei que são imprescritíveis as ações que visam a declaração ou o reconhecimento do status de uma pessoa. A ação de estado tem condição especial e, é tão-só declaratória, não tendo, assim, outra consequência”.

A ideia que impele a Súmula, como disse Sílvio Rodrigues (Direito civil aplicado, volume I, pág. 169) é de que a ação de status, por ser meramente declaratória e sem repercussão patrimonial, poderia, justamente por isso, ser havia como imprescritível, pois, não interferindo na esfera do patrimônio dos litigantes, não atinge nem fere o equilíbrio e a harmonia das relações jurídicas que o instituto da prescrição visa preservar.

Disse ainda Silvio Rodrigues naquela obra citada (pág. 169) que “a súmula proclama a imprescritibilidade da ação de investigação de paternidade e a prescritibilidade da de prescrição da herança, cuidando, assim, evitar o debate de questão patrimonial trinta anos após os fatos que geraram a demanda”.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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