Porque o eSocial deve acabar

14/06/2019 às 15:33
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O eSocial veio como uma inovação revolucionária, moderna e eficiente que representava uma evolução nas relações entre empregados e empregadores. Seis anos depois, o que se vê, no entanto, é um sistema falho, complexo e altamente burocrático.

Quando foi anunciado, ainda em 2013, o projeto do eSocial veio como uma inovação revolucionária, moderna e eficiente que representava uma evolução nas relações entre empregados e empregadores. Seria a simplificação da forma de prestar informações referentes às obrigações fiscais, previdenciárias e trabalhistas e tornaria a vida dos trabalhadores do Departamento Pessoal muito mais fácil. Seis anos depois, o que se vê, no entanto, é um sistema falho, incompleto e que conseguiu tornar as rotinas trabalhistas ainda mais burocráticas.

Parece que o economista Milton Friedman tinha razão ao dizer que “A solução do governo para um problema é usualmente tão ruim quanto o próprio problema”. Ao invés de simplificar o Departamento Pessoal das empresas conforme alardeado aos sete ventos, na verdade criou-se um monstro digital que não acabou com a burocracia, mas apenas a informatizou.

Na prática, a maioria das obrigações acessórias que existiam não foi extinta e ainda criaram-se novas rotinas, que exigiram toda uma reestruturação por parte dos empregadores. Basicamente, no meio de uma das maiores crises econômicas já vividas no mundo moderno, o Governo obriga os empregadores a investirem uma quantidade absurda de tempo e dinheiro em atualizações de sistemas e treinamentos que não aumentam em nada a sua produtividade, mas apenas alimentam o fetiche quase pornográfico desse país por burocracia.

Os escritórios de contabilidade, que, na prática, são os responsáveis pela elaboração das rotinas trabalhistas na grande maioria das pequenas e médias empresas no Brasil, já estão acostumados com os impactos da tecnologia em seu dia-a-dia. A Contabilidade no mundo todo passa por um processo de evolução tecnológica sem precedentes e isso é maravilhoso para a profissão. No entanto, é vergonhoso que nossos contabilistas estejam ocupados demais para se dedicar a avanços tecnológicos realmente importantes (como a linguagem XBRL, Big Data, IOT, dentre outros) por estarem ocupados demais consertando, por exemplo, um erro de cadastro no número do DDD do telefone da empresa no Registro S1000.

A verdade é que o próprio governo, mesmo com tantos adiamentos, postergações e adaptações não conseguiu se adequar ao eSocial. As empresas do “Grupo 01” e do “Grupo 02 – Parte 01” (sim, o governo precisou dividir o Grupo 02 em duas partes, uma para as empresas que faturaram acima de R$ 4.800.000,00 no ano-calendário de 2017 e outra para as demais),  que estão mais avançadas no processo, têm até hoje dificuldades para acessar o sistema, o qual apresenta uma série de problemas de estabilidade nos períodos de fechamento da folha e envios dos eventos periódicos. Parece que o T-REX, supercomputador orgulhosamente ostentado pela Receita Federal, não está dando conta do recado. Sinceramente, se o sistema continuar do jeito que está, nem o Jurassic Park inteiro seria capaz de atender a demanda.

Recentemente, entretanto, tivemos uma boa notícia. Aparentemente, o Ministério da Economia e, em particular, a Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade, têm ouvido as demandas dos profissionais de Departamento Pessoal, da classe contábil e das empresas de Tecnologia da Informação, planejando uma simplificação ou talvez até, quiçá, uma extinção do eSocial.

Independente da via escolhida, o que se faz claro é que não se pode manter o sistema atual, que apenas prejudica a vida dos corajosos empregadores brasileiros, que lutam diariamente para manter seus negócios funcionando corretamente, fugindo das pesadíssimas multas impostas pelo Estado.

Com uma atenção especial, é possível sim fazer adaptações para que o eSocial se transforme em uma ferramenta que, de fato, cumpra com o seu objetivo original. É preciso ouvir as demandas dos envolvidos, em especial dos pequenos empreendedores, que são os que mais sofrem com os impactos dessas inovações. Em recente audiência pública realizada por membros do legislativo com contadores, profissionais de DP e de empresas de software, várias sugestões de adaptações e flexibilizações foram realizadas, todas muito pertinentes.

No entanto, se o Fisco for intransigente e se não conseguirem chegar a um processo mais suave, que realmente simplifique as rotinas trabalhistas e traga uma segurança maior para os empregadores e os profissionais de DP, a única solução será realmente acabar de vez com o eSocial e deixar tudo do jeito que está. Assim, esse será apenas mais um investimento inútil no qual se gastou bilhões de Reais à toa. Algo que, infelizmente, não é novidade para o Governo Brasileiro.

Sobre o autor
André Charone Tavares Lopes

Contador, professor universitário, palestrante e pesquisador da área contábil. Autor de dezenas de artigos e cinco livros publicados no Brasil, Portugal e Espanha. É ex-conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade do Estado do Pará, membro da Associação Científica Internacional Neopatrimonialista, sócio do escritório Belconta - Belém Contabilidade S/S Ltda (www.belconta.com.br) e diretor acadêmico do Portal Neo Ensino (www.neoensino.com).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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