A MEDIAÇÃO TRANSFRONTEIRIÇA DA UNIÃO EUROPEIA
1. Breve introito
Com as relações jurídicas e pessoais cada vez mais globalizadas, seja pela presencialidade de multinacionais em países que compõe a União Europeia, ou, até mesmo pelos divrsos vínculos virtuais viabilizados pela internet, a possibilidade de conflitos e disputas de naturezas transfronteiriças aumenta gradativamente.
Assim, a União Europeia desenvolveu o e-Justice (European Justice), com a criação do Portal Europeu de Justiça, compondo a denominada Rede Judiciária Europeia.
Analisaremos a sistemática adotada pela comunidade europeia e o que poderíamos adorar no Brasil, seja numa visão globalizada, Mercosul, ou ainda apenas para fins de direito comparado e boas práticas de gestão pública de conflitos e disputas.
2. Da mediação transfronteiriça
Antes de adentrarmos no assunto, é importante salientar que a Rede Judiciária Europeia é notoriamente um exemplo de sistema multiportas inserido num contexto multi normativo, multilingue e multicultural. E isso tudo, diante de fronteiras internacionais, portanto, com possibilidade de participações multi-agentes internacionais.
Nesse viés, diante de tantas complexidades superadas pela Rede Judiciária Europeia, passaremos a análise dos elementos dessa metodologia de pacificação social.
Ora, mas, de início, cumpre-nos informar o que vem a ser um litígio transfronteiriço segundo a positivação internacional delineada pela Diretiva 2008/52/CE do Parlamento Europeu:
"Artigo 2.o Litígios transfronteiriços
1. Para efeitos da presente directiva, entende-se por litígio transfronteiriço um litígio em que pelo menos uma das partes tenha domicílio ou residência habitual num Estado-Membro distinto do de qualquer das outras partes, à data em que:
a) As partes decidam, por acordo, recorrer à mediação após a ocorrência de um litígio,
b) A mediação seja ordenada por um tribunal,
c) A obrigação de recorrer à mediação se constitua ao abrigo do direito interno, ou
d) Para efeitos do artigo 5.o, seja dirigido um convite às partes.
2. Não obstante o disposto no n.o 1, para efeitos dos artigos 7.o e 8.o, entende-se igualmente por litígio transfronteiriço um litígio em que o processo judicial ou a arbitragem sejam iniciados, na sequência de uma mediação entre as partes, num Estado-Membro distinto daquele onde as partes tenham o seu domicílio ou a sua residência habitual à data referida na alínea a), b) ou c) do n.o 1. 3.
Para efeitos dos n.os 1 e 2, o domicílio é determinado nos termos dos artigos 59.o e 60.o do Regulamento (CE) n.o 44/2001. "
Vejamos, portanto algumas situações peculiares e curiosas a serem analisadas em litígios transfronteiriços:
a) Quanto ao aspecto multilingue:
Primeiramente, para que seja possível uma adequada mediação e conciliação, é importante que todos os envolvidos tenham uma comunicação eficiente, sem ruídos de interpretação, na qual todos emissores e receptores passam dialogar de forma compreensiva e inteligível. Assim, a Rede Judiciária Europeia adotou mecanismo para efetuar de forma adequada as traduções, reduzindo os riscos de traduções equivocadas em de duplo sentido. isso é representado pela sigla IATE (Terminologia Interativa para a Europa), constituída por uma base de dados multilingue, como um motor de pesquisa onde é possível identificar, inclusive expressões ou sentido semântico das frases pronunciadas ou escritas em outro idioma.
Isso compõe, o sistema de Vocábulo Jurídico Multilingue Comparado (VJM) composto pior mais de 23 idiomas da União Europeia, além de 30 ordenamentos jurídicos, para fins de termos técnicos conceituais, inclusive. Todo o trabalho foi realizado por gandes juristas europeus que compõe o Tribunal de Justiça da União Europeia.
Na página oficial da e-justice da União Europeia, informa ainda que:
"Inclui atualmente cerca de 650 fichas terminológicas multilingues (20 mil termos) dos ramos do direito da família, direito da imigração e, num futuro próximo, direito penal. Todos os registos de dados podem ser pesquisados através da base de dados terminológica IATE.
As fichas terminológicas do VJM incluem informações detalhadas, como definições (adaptadas a cada ordenamento jurídico), notas de direito comparado, referências jurídicas (legislação, jurisprudência, doutrina de sistemas nacionais, da UE e internacionais), sinónimos para o mesmo conceito (na mesma língua e por vezes também em vários ordenamentos jurídicos), indicação clara da origem do termo (existência de equivalente funcional ou formulação parafrásica), outras notas (falsos amigos jurídicos, risco de confusão, termos obsoletos), árvores de conceitos que permitem ver imediatamente a relação semântica entre conceitos, etc."
(Fonte: https://e-justice.europa.eu/content_glossaries_and_terminology-119-pt.do , consultado em 14/06/2019)
Quanto aos problemas linguísticos e de comunicação, cumpre salientar que, em algumas hipóteses a mediação deverá ser presencial. Assim, é essencial que os países signatários do e-justice, facilitem ao máximo a emissão dos documentos necessários para a viagem e o trânsito para fins da mediação.
Mas, online ou presencial, a mediação poderá continuar com ruídos semânticos e de interpretação.
Vejamos algumas particularidades que envolvem a mediação transfronteiriça:
"É altamente vantajoso que o mediador fale a língua de ambas as partes ou pelo menos a língua comum do casal (se a houver).
Na comediação binacional, pode ser suficiente o mediador falar a língua de uma das partes e compreender a língua da outra parte, se não for possível encontrar outra solução. As partes devem compreender todos os termos jurídicos. A finalidade de encontrar um mediador que fale a língua das partes não é só a redução dos custos devido à dispensa de intérprete, há também o aspeto psicológico e a necessidade de as partes compreenderem o acordo que estão a negociar.
O mediador deve igualmente ser sensível ao contexto cultural em que as partes vivem ou de que provêm e estar ciente das diferenças culturais entre os países.
A introdução de meios de comunicação modernos (telefone, videoconferência, webcams, etc.) ajuda a reduzir os custos e a organizar a mediação mesmo à distância, se as partes não puderem estar fisicamente presentes. Todos os Estados-Membros deveriam dispor destes instrumentos técnicos e a mediação «à distância» deveria ser testada.
Deve ser desenvolvido software interativo seguro para apoiar a mediação.
Além disso, independentemente da língua usada na mediação, é importante que todos compreendam a língua e a terminologia utilizada pelos mediadores."
Isso tudo é muito importante, pois além de garantir a eficiência do diálogo, possibilita a adequada tomada de decisão. E, ao mediador, cabe sempre garantir a informação quanto a decisão tomada e seus efeitos.
Pois bem. Passados resumidamente sobre a metodologia e aos aspectos que envolvam a comunicação, viabilizando o adequado diálogo, passaremos a análise quanto a mediação na União Europeia.
A mediação é uma forma de Resolução Alternativa de Litígios (RAL) e é aplicável, na Rede Judiciária a diversos temas.
b) Do apoio judiciário
Para garantir o máximo acesso ao sistema multiportas, a UE desenvolveu a Directiva 2002/8 / CE do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços, através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios.
Assim, já no preâmbulo da Diretiva normativa internacional, consta que:
"5) A presente directiva visa promover a aplicação do apoio judiciário nos litígios transfronteiriços às pessoas que não disponham de recursos suficientes quando o auxílio é necessário para garantir o acesso efectivo à justiça. O direito geralmente reconhecido ao acesso à justiça é também reafirmado no artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
(6) Nem a falta de recursos de um litigante, seja agindo como requerente ou demandado, nem as dificuldades decorrentes da dimensão transfronteiriça de um litígio devem poder impedir o acesso efectivo à justiça.
(...)
(21) O apoio judiciário deve ser concedido nos mesmos termos tanto para processos judiciais convencionais como para procedimentos extrajudiciais, como a mediação, quando o recurso aos mesmos é exigido por lei ou ordenado pelo tribunal."
Note-se o quanto é interessante e abrangente a Diretiva:
"Artigo 7
Custos relacionados com a natureza transfronteiriça do litígio
O apoio judiciário concedido no Estado-Membro em que o juiz tem a sua sede deve cobrir os seguintes custos directamente relacionados com o carácter transfronteiriço do litígio:
(a) interpretação;
b) tradução dos documentos exigidos pelo tribunal ou pela autoridade competente e apresentados pelo destinatário, necessários para a resolução do caso; e
c) As despesas de viagem a cargo do requerente quando a presença física das pessoas em causa na apresentação do caso do requerente for exigida em tribunal pela lei ou pelo tribunal desse Estado-Membro e o tribunal decida que as pessoas em causa não podem ser ouvido para a satisfação do tribunal por qualquer outro meio."
Já o sistema e-justice, informa claramente a abrangência do Apoio Judiciário:
"Este apoio abrange o aconselhamento prévio, destinado a alcançar um acordo que permita evitar a instauração de um processo judicial, a assistência jurídica para a instauração de um processo e o patrocínio em tribunal e um contributo para o pagamento das custas ou mesmo a isenção destas custas."
Em observância à DIRECTIVA 2008/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de Maio de 2008, podemos acrescentar que;
"6 - A mediação pode proporcionar uma solução extrajudicial rápida e pouco onerosa para litígios em matéria civil e comercial através de procedimentos adaptados às necessidades das partes. É mais provável que os acordos obtidos por via de mediação sejam cumpridos voluntariamente e preservem uma relação amigável e estável entre as partes. Estas vantagens tornam-se ainda mais evidentes em situações que apresentam aspectos transfronteiriços"
Para fins de direito consumerista, é possível realizar a reclamação acessando o sistema Consumer Complaint Boards, pelo site: https://www.complaintsboard.com/
c) Dos princípios da conciliação aplicáveis:
De início, apresentaremos os termos da Recomendação internacional sobre os princípios aplicáveis em resoluções de litígios por organismos extrajudiciais.
Constaremos os quatro princípios expressos. Vejamos:
"1. A presente recomendação aplica-se aos organismos terceiros responsáveis pelos procedimentos de resolução de litígios em matéria de consumo que, independentemente da sua designação, pretendam solucionar um litígio através da aproximação das partes para as convencer a encontrar uma solução de comum acordo.
2. Não se aplica a mecanismos relativos a queixas dos consumidores que sejam postos em prática por uma empresa e onde exista uma relação directa com o consumidor ou a mecanismos que prestem estes serviços para ou em nome de uma empresa.
II. PRINCÍPIOS
A. Imparcialidade
Para garantir a imparcialidade do procedimento, os seus responsáveis devem reunir as seguintes condições:
a) Serem mandatados por um período determinado e não poderem ser destituídos das suas funções sem motivo válido;
b) Não possuírem qualquer conflito de interesses, potencial ou efectivo, com qualquer uma das partes;
c) Fornecerem a ambas as partes informação relativa à sua imparcialidade e competência antes de se dar início ao procedimento.
B. Transparência
1. Deve ser garantida a transparência do procedimento.
2. Os pormenores relativos a contactos, tramitação e disponibilidade do procedimento devem estar à disposição das partes em termos simples, de forma a que estas possam facilmente aceder e tomar conhecimento das referidas informações antes do início do procedimento.
3. Devem, nomeadamente, ser disponibilizadas informações sobre:
a) A tramitação do procedimento, os tipos de litígios que podem ser submetidos à sua apreciação, bem como quaisquer restrições relativas ao seu exercício;
b) As disposições que disciplinam qualquer tipo de diligência preliminar que as partes tenham de efectuar e outras disposições processuais, designadamente as relativas à tramitação do procedimento e às línguas do procedimento;
c) Se existirem, os custos do procedimento para as partes;
d) A duração do procedimento, designadamente, tendo em atenção o litígio em causa;
e) Quaisquer normas substantivas aplicáveis (disposições legais, boas práticas comerciais, considerações relativas à equidade, códigos de conduta);
f) A função do procedimento para se chegar à resolução de um litígio;
g) O valor jurídico da solução acordada para a resolução do litígio.
4. Qualquer solução acordada pelas partes para a resolução do litígio deve ser objecto de registo num suporte duradouro, onde serão claramente enunciados os termos e as razões em que se baseia. Este registo deverá ser colocado à disposição das partes.
5. Deverá ser publicada a informação relativa ao funcionamento do procedimento nomeadamente:
a) O número e o tipo de queixas recebidas e os respectivos resultados;
b) O tempo necessário para a resolução das queixas;
c) Todo e qualquer problema sistemático decorrente das queixas;
d) O registo de conformidade, se for conhecido, em relação às soluções acordadas.
C. Eficácia
1. Deve garantir-se a eficácia do procedimento.
2. O procedimento deverá ser facilmente acessível e estar à disposição de ambas as partes, por exemplo, através de meios electrónicos, independentemente do local onde aquelas estejam localizadas.
3. O procedimento deverá ser gratuito para os consumidores ou, quando existam custos, estes deverão ser proporcionais ao valor do litígio e moderados.
4. As partes deverão ter acesso ao procedimento sem serem obrigadas a nomear representante legal. Todavia, nada as impede de serem representadas ou assistidas por um terceiro em qualquer fase do procedimento.
5. A partir do momento em que o litígio for apresentado, deverá ser tratado no mais breve prazo possível de acordo com a natureza do mesmo. O organismo responsável pelo procedimento deve examinar periodicamente a situação de modo a assegurar que o litígio entre as partes está a ser apreciado de forma célere e adequada.
6. A conduta das partes deve ser examinada pelos organismos responsável pelo procedimento no sentido de garantir que as partes se comprometem a procurar uma solução adequada, equitativa e oportuna em relação ao litígio. Se a conduta de uma das partes for considerada pouco satisfatória, ambas as partes deverão ser de facto informadas, de modo a poderem decidir se prosseguem o procedimento de resolução do litígio.
D. Equidade
1. Deve ser garantida a equidade do procedimento, nomeadamente que:
a) As partes são informadas dos seus direitos de recusar participar ou de desistir do procedimento em qualquer momento e de recorrer ao sistema judicial e a outros mecanismos de reparação extrajudiciais em qualquer fase do procedimento se não se considerarem satisfeitas com a tramitação ou o funcionamento do procedimento;
b) Ambas as partes devem poder, livre e facilmente, apresentar ao procedimento qualquer tipo de argumentos, informações ou provas relevantes em relação ao seu caso numa base confidencial, salvo se as partes consentirem expressamente na transmissão dessa informação à outra parte. Se em qualquer fase a terceira parte sugerir soluções possíveis para a resolução do litígio cada parte deverá desfrutar da possibilidade de expressar a sua posição e tecer comentários relativamente a qualquer argumento, informação ou prova apresentado pela outra parte;
c) Ambas as partes devem ser incentivadas a cooperar totalmente com o procedimento, nomeadamente através da apresentação de qualquer informação necessária a uma resolução equitativa do litígio;
d) Antes de as partes aceitarem a solução sugerida para a resolução do litígio, ser-lhes-á concedido um período de tempo razoável para poderem avaliar a referida solução.
2. Antes de aceitar a solução sugerida, o consumidor deve ser informado em linguagem clara e compreensível sobre o seguinte:
a) Pode optar por aceitar ou recusar a solução sugerida;
b) A solução sugerida poderá ser menos favorável do que uma resolução por via judicial e mediante a aplicação das normas legais vigentes;
c) Antes de aceitar ou recusar a solução sugerida, tem o direito de procurar aconselhamento independente;
d) O recurso ao procedimento não exclui a possibilidade de apresentar o seu litígio em matéria de consumo a outro mecanismo de resolução extrajudicial de conflitos, nomeadamente no âmbito de aplicação da Recomendação 98/257/CE ou de procurar reparação legal através do seu próprio sistema judicial;
e) O valor jurídico da solução acordada."
A União Europeia, no ano de 2008, na Diretiva 2008/52/CE, já dispunha quanto a necessidade de instituição de princípios fundamentais para meios alternativos de resolução de litígios.
"3 - Em Maio de 2000, o Conselho aprovou conclusões sobre modos alternativos de resolução de litígios, declarando que o estabelecimento de princípios fundamentais neste domínio constitui uma etapa essencial para o desenvolvimento e funcionamento adequado dos procedimentos extrajudiciais para a resolução dos litígios em matéria civil e comercial, de forma a simplificar e melhorar o acesso à justiça."
No sistema e-justice, considera como princípios fundamentais da mediação: a imparcialidade; a confidencialidade; a voluntariedade.
Vejamos a explicação oficial:
"Princípios fundamentais
Imparcialidade
Os mediadores mantêm uma posição neutra e não tomam partido no litígio. Os mediadores não são conselheiros, pelo que não dão conselhos acerca de posições específicas, recomendando em geral que se procure aconselhamento jurídico durante o processo de mediação.
Confidencialidade
Em geral, nem o que for dito na mediação nem os documentos apresentados nesse contexto poderão ser usados como provas num processo judicial sobre o mesmo litígio. Os mediadores também não podem ser testemunhas.
Natureza voluntária
As partes em litígio devem ser informadas da mediação como opção adicional para resolver o conflito. A recusa de tentar a mediação não tem qualquer influência no resultado final do processo judicial.
Este princípio não colide com as sessões de informação obrigatórias sobre mediação, desde que as partes não sejam obrigadas a resolver o conflito por esse meio."
Mas, logicamente, o princípio da transparência, eficiência e da equidade não devem ser esquecidos.
Também, o princípio do profissionalismo, que exige aptidão técnica dos mediadores extrajudiciais.
E essa busca incansável de qualidade, o que retrata a existência de limitações técnicas e éticas, foi também objeto de normatização positivada na Diretiva 2008/52/CE:
"16 - Para assegurar a necessária confiança mútua no que diz respeito à confidencialidade, aos efeitos nos prazos de prescrição e caducidade e ao reconhecimento e execução dos acordos obtidos por via de mediação, os Estados- -Membros deverão incentivar, por todos os meios que considerem adequados, a formação de mediadores e a criação de mecanismos eficazes de controlo da qualidade relativamente à prestação de serviços de mediação."
E, em continuidade, referida norma internacional carreia alguns outros princípios. Vejamos:
"17 - Os Estados-Membros deverão definir esses mecanismos, que podem incluir o recurso a soluções com base no mercado, e não lhes deverá ser exigido qualquer financiamento para este efeito. Tais mecanismos deverão ter por finalidade preservar a flexibilidade do processo de mediação e a autonomia das partes e garantir que a mediação seja conduzida de modo eficaz, imparcial e competente. Dever-se-á chamar a atenção dos mediadores para a existência do Código de Conduta Europeu para Mediadores, que deverá estar também acessível ao público em geral na internet."
O Código Deontológico Europeu dos Mediadores (Código de ética), prevê, ainda quanto aos princípios que:
"Independência e neutralidade
O mediador não deve iniciar a mediação ou, se já a iniciou, não deve prossegui-la sem antes divulgar quaisquer circunstâncias que possam afectar, ou pareçam afectar, a sua independência ou prefigurem um conflito de interesses. As referidas circunstâncias incluem: – qualquer relação pessoal ou profissional com uma ou mais partes, – qualquer interesse financeiro ou outro, directo ou indirecto, no resultado da mediação, – o facto de o mediador, ou um membro da sua empresa, ter agido, relativamente a uma ou mais partes, noutra qualidade que não a de mediador. Nestes casos, o mediador só pode aceitar ou continuar a mediação se estiver certo de poder conduzi-la com independência e neutralidade totais, a fim de garantir a imparcialidade plena, e se as partes derem o seu consentimento expresso.
O dever de divulgar as circunstâncias mantém-se durante todo o processo.
2.2. Imparcialidade O mediador deve tratar as partes sempre com imparcialidade, procurando que a sua actuação seja considerada como tal, e empenhar-se em servir todas as partes de forma igual no que se refere ao processo de mediação.
(...)
3.2. Equidade do processo
O mediador deve assegurar que todas as partes têm oportunidade de participar no processo.
O mediador deve informar as partes e pode encerrar a mediação se: – a solução em vias de aprovação constituir, para o mediador, uma solução inaplicável ou ilegal, atendendo às circunstâncias do caso e à competência do mediador para proceder a um juízo deste tipo, ou – o mediador considerar que é pouco provável que a continuação da mediação conduza a uma solução.
3.3. O final do processo
O mediador deve tomar as medidas adequadas para garantir que todas as partes cheguem a acordo mediante consentimento consciente e informado e que todas as partes compreendem as condições do acordo.
As partes podem abandonar a mediação a todo o tempo sem dar qualquer justificação.
O mediador deve, a pedido das partes e dentro das respectivas competências, comunicar às partes a forma pela qual podem formalizar o acordo e as possibilidades de o tornar exequível.
4. Confidencialidade
O mediador deve preservar a confidencialidade de todas as informações tratadas na mediação ou com ela ligadas, incluindo o facto de que a mediação vai ser feita ou já foi feita, a menos que seja obrigado a revelá-las por motivos legais ou de ordem pública.
Qualquer informação facultada confidencialmente ao mediador por uma das partes não deve ser transmitida às outras partes sem autorização, a menos que a lei o imponha."
d) Mediação e seu conceito e-justice
Mas, o que é mediação para fins do e-justice?
A conceituação do termo mediação, para fins da e-justice da União Europeia, é:
"A mediação pode ser definida como um processo estruturado através do qual duas ou mais partes em litígio procuram voluntariamente alcançar um acordo sobre a resolução do seu litígio com a assistência de uma parte terceira neutra e qualificada ("mediador"). Este processo pode ser iniciado pelas partes, sugerido ou ordenado por um tribunal, ou imposto pelo direito de um Estado-Membro.
O mediador ajuda as partes a chegarem a acordo sem expressar efectivamente nem formalmente uma opinião sobre as soluções possíveis para o litígio.
Durante a mediação, as partes são convidadas a encetar ou reatar o diálogo e a evitar confrontos. As partes escolhem elas próprias a técnica de resolução do litígio e desempenham um papel particularmente activo nos esforços para encontrar a solução que mais lhes convém. Noutros casos, em especial nos conflitos de consumo, é o mediador que encontra a solução e a apresenta às partes. A resolução do litígio depende da obtenção de um acordo entre as partes; se as partes não chegarem a acordo, o mediador não impõe uma solução.
A mediação é considerada mais rápida e, na maior parte das vezes, mais barata do que um procedimento judicial ordinário. Evita o confronto entre as partes inerente ao procedimento judicial e permite às partes manterem as suas relações profissionais ou pessoais para além do litígio. A mediação permite igualmente às partes encontrar soluções criativas para o seu litígio que não poderiam obter em tribunal."
((Fonte: https://e-justice.europa.eu/content_glossaries_and_terminology-119-pt.do , consultado em 14/06/2019 - grifamos)
Já a Diretiva 2008/52/CE traz algumas importantes definições positivadas internacionalmente sobre o conceito de mediação e da pessoa do mediador. Vejamos:
"Artigo 3.o
Definições Para efeitos da presente directiva,
Entende-se por:
a) Mediação, um processo estruturado, independentemente da sua designação ou do modo como lhe é feita referência, através do qual duas ou mais partes em litígio procuram voluntariamente alcançar um acordo sobre a resolução do seu litígio com a assistência de um mediador. Este processo pode ser iniciado pelas partes, sugerido ou ordenado por um tribunal, ou imposto pelo direito de um Estado-Membro.
Abrange a mediação conduzida por um juiz que não seja responsável por qualquer processo judicial relativo ao litígio em questão. Não abrange as tentativas do tribunal ou do juiz no processo para solucionar um litígio durante a tramitação do processo judicial relativo ao litígio em questão;
b) Mediador, uma terceira pessoa a quem tenha sido solicitado que conduza uma mediação de modo eficaz, imparcial e competente, independentemente da denominação ou da profissão dessa pessoa no Estado-Membro em causa e da forma como ela tenha sido designada ou de como tenha sido solicitada a conduzir a mediação."
e) Fases da mediação
A União Europeia, em sua rede e-justice, preconiza as fases adequadas de uma mediação.
Assim, é composta pelas fases de abertura, discrição dos problemas pelas partes, identificação das questões a serem debatidas, bem como fixação do conteúdo das negociações, ponderar sobre as opções com possibilidade de escolha da solução mais viável, conclusão da mediação.
Repassaremos as fases consoante informado pela Rede Europeia:
"Fases da mediação
Abertura: o mediador explica o processo
O mediador começa por explicar a finalidade da mediação, o processo seguido e o papel do mediador. O mediador fixa as regras a seguir e pede às partes que aceitem este processo específico.
2. Descrição do problema pelas partes
O mediador ouve a exposição de cada uma das partes.
O mediador acolhe as emoções expressas e sossega as partes, se necessário, identificando cabalmente os receios de cada uma delas.
3. Identificação das questões a debater
e fixação do conteúdo das negociações
Durante esta fase, o mediador fixa a matéria a negociar, resumindo os domínios em que há acordo (ou receios semelhantes) e aqueles em que não há. O mediador determina, depois de consultar as partes, as questões a debater.
4. Procurar opções/soluções
O mediador ajuda as partes, pensando com elas, a ponderar as várias opções/soluções para a sua situação.
5. Ponderar as opções e selecionar a solução mais viável/aceitável
Durante esta fase, o mediador ajuda as partes a chegar a acordo, ponderando as opções propostas e selecionando as mais viáveis e aceitáveis para as partes.
6. Fim da mediação
Chegar a acordo
O mediador ajuda as partes a redigir um acordo claro e circunstanciado.
Os representantes legais podem analisar o acordo para garantir que ele produz efeitos jurídicos em todos os países em questão.
Inexistência de acordo
Se as partes não chegarem a acordo, o mediador resume as questões debatidas e os progressos registados. O mediador agradece às partes e encerra o processo de mediação. As partes podem instaurar então uma ação judicial ou prosseguir a ação já instaurada."
(Fonte: https://e-justice.europa.eu/content_key_principles_and_stages_of_mediation-383-pt.do , acessado em 14/06/2019)
f) A execução do acordo transfronteiriço
Objetivando a completa validade dos meios alternativos de resolução de conflitos, e consagrando, portanto, o sistema multiportas, a Diretiva 2008/52/CE, preconizou em sua fase preambular que:
"19 - A mediação não deverá ser considerada uma alternativa inferior ao processo judicial pelo facto de o cumprimento dos acordos resultantes da mediação depender da boa vontade das partes. Por conseguinte, os Estados-Membros deverão assegurar que as partes de um acordo escrito, obtido por via de mediação, possam solicitar que o conteúdo do seu acordo seja declarado executório. Os Estados-Membros só deverão poder recusar declarar esse acordo executório se o seu conteúdo for contrário ao direito interno, incluindo o direito internacional privado, ou se o seu direito não previr o carácter executório do conteúdo do acordo específico. Tal poderá acontecer se a obrigação especificada no acordo não tiver, pela sua natureza, carácter executório."
"20 - O conteúdo de um acordo obtido por via de mediação e declarado executório num Estado-Membro deverá ser reconhecido e declarado executório nos outros Estados- -Membros, nos termos do direito comunitário ou interno aplicável. Tal seria possível, por exemplo, com base no Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (1), ou no Regulamento (CE) n.o 2201/2003 do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental.
21 - O Regulamento (CE) n.o 2201/2003 prevê especificamente que os acordos entre as partes têm imperativamente que gozar de força executória no Estado-Membro em que foram celebrados para poderem ter força executória noutro Estado-Membro. Por conseguinte, se o conteúdo de um acordo em matéria de direito da família, obtido por via de mediação, não tiver força executória no Estado-Membro onde foi celebrado e se for solicitada a sua executoriedade, a presente directiva não deverá incentivar as partes a contornar o direito desse Estado- -Membro, conseguindo que esse acordo seja dotado de força executória noutro Estado-Membro.
22 - ) A presente directiva não deverá afectar as regras em vigor nos Estados-Membros relativas à execução de acordos resultantes da mediação."
Conclusão
Diante da breve análise quanto aos avanços da União Europeia quanto aos meios alternativos de resolução de litígios (conflitos), entendemos que o Brasil e o sistema internacional regionalizado ao qual esta inserido, Mercosul, deveria ater-se a adoção de métodos de resolução de conflitos transfronteiriços, o que geraria maior eficiência, economia e celeridade aos meios de pacificação social em relações transfronteiriças.
Isso é essencial, notadamente pela abertura de fronteiras da América Latina e o dever constitucional de integrações das nações latino-americanas.
Essa globalização, orientada pela própria Constituição Federal, é nada mais que princípio regente de relações internacionais.
O parágrafo único do artigo 4º da Constituição Federal, prevê que:
"Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações."
Se há relações econômica, política, social e cultural há, inexoravelmente conflitos e litígios, com o que será necessária a adoção de mecanismos para a resolução de conflitos e litígios transfronteiriços.