DIREITO DOS SEGURADOS

Rescisão Unilateral e coberturas

17/06/2019 às 16:06
Leia nesta página:

O objetivo do artigo é demonstrar que se a causa da rescisão foi arbitrária, sem comunicação, o segurado mantém os benefícios da apólice, ademais informar quanto as coberturas do dano moral e corporal.

Neste artigo vamos abordar o direito que o segurado possui quando há a má prestação de serviço por parte da seguradora, e por consequência a rescisão do contrato sem seu conhecimento, acarretando no dever de indenizar pelo período contratado mesmo com o cancelamento unilateral.  Ademais, uma breve análise quanto ao ressarcimento das coberturas de danos morais e pessoais.

            APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. INDENIZAÇÃO SEGURITÁRIA. VEÍCULO. DANO MATERIAL. ACEITAÇÃO TÁCITA DA PROPOSTA DE SEGURO. NÃO COMUNICAÇÃO FORMAL DA RECUSA DA PROPOSTA. DEVER DE INDENIZAR. LIMITES DOS RISCOS PREVIAMENTE ESTABELECIDOS. CLAUSULAS ABUSIVAS. NULIDADE.  CHEQUES PRESCRITOS. DISCUSSÃO DA CAUSA DEBENDI. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO. REJEIÇÃO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. PROVA TESTEMUNHAL INDEFERIDA. DECISÃO IRRECORRIDA. COMPRA DE COISA MÓVEL. ABATIMENTO DO PREÇO POR REDIBIÇÃO. DECADÊNCIA. ACOLHIMENTO. VALOR DA CONDENAÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. VALOR DO VEÍCULO SEGURADO. TABELA FIPE NA DATA DO SINISTRO. PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO CONDICIONADA A ENTREGA DO SALVADO. NULIDADE DA CLÁUSULA. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.

            1. Aseguradora aceita tacitamente a proposta de seguro se, recebendo parcela do prêmio, não comunica formalmente a segurada de que recusou a proposta, após a vistoria do veículo, conforme cláusula prevista nas condições gerais do seguro, mormente quando estorna aquele valor recebido, um mês após a referida vistoria.

            2. Se a proposta de seguro estabelece os limites dos riscos que a seguradora assumiu, em caso de danos materiais, e esta foi aceita tacitamente pela seguradora, ela assumiu os riscos ali pré-determinados.

            3. As cláusulas contratuais de contrato de seguro de veículo, por estar sob a égide da lei consumeirista, devem ser interpretadas da forma mais favorável ao consumidor, inclusive reconhecendo-se abusividades, se for o caso, nos termos do artigo 6º, inciso V, artigo 47 e artigo 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor.

            4. No caso de pagamento de indenização securitária, em face de acidente de veículo, por se tratar de dano material, há que se considerar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, quando se deu a efetiva perda material experimentada, qual seja, a data do acidente, a fim de se estabelecer o quantum a ser recomposto.

            5. Aobrigação do segurado de entregar o salvado livre e desembaraçado de quaisquer ônus, em caso de perda total do veículo, está condicionada ao prévio pagamento da indenização securitária, e não o contrário, revelando-se abusiva a referida cláusula que reverte a situação, de forma a prejudicar o segurado.

            6.Recurso CONHECIDO e DESPROVIDO. Sentença MANTIDA.

(Acórdão n.1003570, 20160110130316APC, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO 5ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 15/03/2017, Publicado no DJE: 29/03/2017. Pág.: 311/315)

 

 No primeiro exemplo, caso acima, foi realizado a contratação via telefone, debitado a primeira parcela em conta e realizado as vistorias necessárias no tempo determinado. A seguradora por sua vez se compromete a informar caso o contrato não seja aceito, não o fazendo há aceitação tácita.

 Conforme ditado “o combinado não sai caro”, se a empresa não fez contato com o cliente e já houve o pagamento da entrada, o contrato está válido, pouco importa que tenha recusado e devolvido na conta a primeira parcela como foi o caso alhures.

  A devolução não isenta o dever da seguradora ao ressarcimento do prêmio em caso de acidente no período do contrato, isso porque, faltou a informação correta e clara no momento convencionado que o contrato não fora finalizado, e sua inércia tanto ao cancelamento quanto à devolução, induz erroneamente ao consumidor que está tudo bem, que está segurado.

 A falta de transparência no serviço é penalizada conforme art. 4º e 6º do CDC, por isso, quando o incidente ocorre dentro do prazo de cobertura, não importa se o contrato esta cancelado, a obrigação persiste pela má prestação de serviço, devendo apenas o consumidor pagar do valor devido às prestações em aberto, evitando o enriquecimento sem causa.

DIREITO CIVIL. CONTRATO DE SEGURO. ACIDENTE DE TRÂNSITO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. VALOR DAS INDENIZAÇÕES. 1 - Na forma do art. 46 da Lei 9.099/1995, a ementa serve de acórdão. Recurso próprio, regular e tempestivo. Pretensão de indenização por danos materiais e morais em razão de cancelamento indevido de seguro veicular. Recurso do autor visando à majoração das indenizações. 2 - Causa madura. A sentença mostra-se contraditória na medida em que afirma serem dispensáveis outras provas e mais adiante concluir que não há prova da dinâmica do acidente, que só poderia ser demonstrada em audiência, com oitiva das partes e testemunhas, a qual deveria ser designada pelo próprio Juiz. Todavia, é possível convalidar tal defeito com julgamento na instância recursal como causa madura. 3 - Dinâmica do fato. O réu, principal interessado em afastar a presunção de veracidade das alegações do autor, deixou de impugnar as afirmações constantes da inicial, nada diz sobre a dinâmica do fato. Impugna, tão somente, a ocorrência de acordo sem anuência da seguradora, matéria que, todavia, não é impedimento absoluto ao recebimento da indenização. Assim, presume-se verdadeira a alegação de culpa do próprio autor, pelo que se impõe o reconhecimento do dever de indenizar da seguradora, por força do contrato. 4 - Acordo com terceiro. Embora a transação entre o segurado e o terceiro prejudicado não tenha eficácia em face da seguradora, sem anuência expressa desta (art. 787, § 2º. do CC), a responsabilidade da seguradora pelos danos deve ser apurada em conformidade com os elementos normativos e fáticos do contrato de seguro que obriga esta a indenizar em razão de culpa do segurado Precedente: (ACJ20120111989543ACJ, 2ª Turma). A responsabilidade da seguradora não decorre do acordo, mas do sinistro. Logo, não há justificativa para afastar a responsabilidade da ré. 5 - Danos materiais. Com relação aos danos, os documentos são suficientes para demonstrar a extensão do dano e estão em consonância com as demais provas dos autos. O rol de peças apresenta-se com preços compatível com o tipo de veículo do terceiro, e é respaldado pela cópias das guias de depósito em favor do mesmo CNPJ da empresa que forneceu o orçamento dos reparos, indicando pagamentos de R$5.000,00 e R$ 14.276,00. Tais elementos de prova aliado à equidade são suficientes para concluir pela ocorrência do dano na extensão indicada. 6 - Danos morais. Valor da indenização. Sem demonstração de maiores desdobramentos decorrentes do cancelamento de seguro ou repercussões exacerbadas na esfera íntima do autor, não há justificativa para a majoração da indenização por danos morais (R$ 2.000,00), que se mantém por força do princípio tantum devolutum quantum apelatum. Sentença que se reforma para condenar a ré ao pagamento de 25.552,66.   7 - Recurso conhecido e provido. (Acórdão n.1171791, 07034549720188070016, Relator: AISTON HENRIQUE DE SOUSA 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento: 16/05/2019, Publicado no DJE: 06/06/2019. Pág.:  Sem Página Cadastrada.)

 

No segundo exemplo temos o cancelamento unilateral pela ausência de pagamento. Ocorre que assim como o primeiro caso o pagamento era débito em conta, no entanto, por uma mudança na conta esse pagamento não foi efetuado e não tinha o segurado ciência do inadimplemento.

No momento em que não há pagamento de uma parcela, é lítico e obrigatório à empresa realizar cobranças pelos ramais cadastrados, e-mail, carta, telefone, oportunizando o adimplemento da parcela em atraso antes do cancelamento do contrato, que pode variar de acordo com cada apólice.

Não fazendo essa comunicação, inexiste ciência e consequente possibilidade de regularização em tempo hábil, portanto, não é lícito seu cancelamento unilateral, sem incorrer em abuso. Embora seja um exame caso a caso, é certo que sendo um cancelamento sem comunicação prévia, e quase que certo ser nulo.

E conforme primeiro exemplo, com o gravame ocorrido durante a vigência do contrato, a empresa foi condenada a ressarcir os danos materiais da apólice e danos morais que neste caso foi minorado pela ausência de restrição nos órgãos de proteção ao crédito, mantendo a compensação dos valores devidos referente á apólice.

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONTRATO DE SEGURO CONTRA ACIDENTES PESSOAIS. AGRAVO RETIDO: FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL NÃO CONFIGURADA. APELAÇÃO CÍVEL: PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. REJEIÇÃO. MÉRITO. INVALIDEZ PERMANENTE PARCIAL POR ACIDENTE. COMPROVAÇÃO. CÁLCULO DA INDENIZAÇÃO. PAGAMENTO A MENOR. COMPLEMENTAÇÃO. CABIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. DATA DA ASSINATURA DO CONTRATO.

1. O pagamento parcial da indenização securitária não acarreta a perda do interesse processual do segurado, quanto à pretensão de recebimento da diferença entre o valor recebido e o efetivamente devido, ainda que tenha sido emitido recibo de quitação do valor pago na via administrativa. (...) 6.Agravo Retido conhecido e não provido. Apelações Cíveis conhecidas. Preliminar rejeitada. No mérito recursos não providos. Termo inicial da correção monetária modificado de ofício.”(Acórdão n.902294, 20130111904310APC, Relator: NÍDIA CORRÊA LIMA, Revisor: ALFEU MACHADO, 1ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 21/10/2015, Publicado no DJE: 09/11/2015. Pág.: 193)

                        (...)

No termos da Súmula 402 do STJ, “O contrato de seguro por danos pessoais compreende os danos morais, salvo cláusula expressa de exclusão.”

Nesse raciocínio, entende-se que "Se o contrato de seguro prevê, em cláusula distinta, a cobertura para danos morais, deve a indenização correspondente ficar limitada ao valor contratado a esse título.  Somente  nos casos em que a cláusula   é   inespecífica,   referindo-se  genericamente  a  danos corporais  ou  a  danos  pessoais,  é  que  se pode compreender nela inclusos os danos morais."(AgInt  no AgInt nos EDcl no AREsp 708.653/SC, Relator Ministro João Otávio  de  Noronha,  Terceira  Turma,  julgado  em  18/8/2016,  DJe 25/8/2016).

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Não é outro o entendimento jurisprudencial do eg. TJDFT:

“DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA. SEGURO. ACIDENTE DE VEÍCULOS. DANOS MORAIS. INTEGRIDADE FÍSICA. APÓLICE. DEVER CONTRATUAL. SENTENÇA MANTIDA. (...) 2. Conforme jurisprudência do STJ, considera-se dano à pessoa toda ofensa dirigida contra sua integridade física. Assim, havendo previsão expressa quanto à cobertura de danos corporais, subespécie de dano moral, é dever da seguradora indenizar o segurado por esta rubrica. (...) 4. Negado provimento ao apelo.”(TJDFT, Acórdão n.1054553, 00183828620168070009, Relator: LEILA  ARLANCH 7ª Turma Cível, Data de Julgamento: 18/10/2017, Publicado no DJE: 26/10/2017. Pág.:  Sem Página Cadastrada.)

(...)

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO.  COLISÃO DE CAMINHÃO COM MICRO-ÔNIBUS. DANOS MORAIS. COMPROVAÇÃO. VALORAÇÃO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. ASSOCIAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS. SERVIÇO DE PROTEÇÃO VEICULAR. NATUREZA DE SEGURO. APLICAÇÃO DO CDC. EXTENSÃO DA COBERTURA. LEGITIMIDADE PASSIVA E RESPONSABILIDADE DA LITISDENUNCIADA.

(...) 6. Deve a litisdenunciada responder pelas indenizações devidas pelo litisdenunciante à vítima, nos limites da apólice, uma vez que foi prevista expressamente a cobertura para terceiros e não existe cláusula específica no contrato excluindo os danos corporais ou morais, conforme exige o artigo 54, § 4º, do CDC. Ademais, a teor do artigo 46 do mesmo Código, sem uma informação adequada, disposições contratuais que excluem direitos ou limitem obrigações do consumidor não o vinculam.

7. Apelação da litisdenunciada conhecida e parcialmente provida.”

(Acórdão n.1052384, 20151010061322APC, Relator: CESAR LOYOLA 2ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 04/10/2017, Publicado no DJE: 10/10/2017. Pág.: 253-286). TJDFT. PJE: 0721329-62.2017.8.07.0001. 

Um terceiro exemplo foge um pouco o tema central de rescisão unilateral, mais é tão importante quanto, já que por vezes ignorado pelo segurado. Refere-se ás coberturas de danos morais e pessoais.

Quando a apólice não vem específica quanto à exclusão do ressarcimento dos danos morais e apenas contempla danos corporais a terceiros, estes não são diferenciados, portanto, devem ser ressarcidos no limite do prêmio, conforme entendimento do STJ.

As seguradoras de forma extrajudicial tendem a não reconhecer seu pagamento, ressarcindo apenas o dano material, dessa forma mesmo que a parte receba e dê quitação nada obsta sua busca pelo complemento junto à justiça, desde que o recibo de quitação venha contemplando apenas as coberturas que recebeu exemplo danos materiais.

 Nesse sentido, as situações elencadas acima ocorrem porque cabe à seguradora prestar seu serviço de forma clara, dar informações precisas ao consumidor, comunicá-lo sobre qualquer inadimplemento, refazer a proposta como no primeiro exemplo, dar ciência de qualquer alteração do contrato, enviar o contrato com suas especificações, determinar de forma clara as coberturas, entre outras, evitando assim rescisões indevidas e descumprimento de obrigações pactuadas.

 

Bibliografia:

 

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Acórdão 1003570. Relator:
ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO. Disponível em https://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj. acesso dia 17/06/2019.    

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Acórdão 1171791. Relator: AISTON HENRIQUE DE SOUSA disponível em https://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj. acesso dia 17/06/2019.

BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Sentença processo nº 0721329-62.2017.8.07.0001. JUIZ: WAGNER PESSOA VIEIRA. Disponível em: https://pje.tjdft.jus.br/consultapublica/ConsultaPublica/DetalheProcessoConsultaPublica/listView.seam?ca=0f35387ffe162561257a87340d8b912a5186db4704ee0b40. Acesso em 17/06/2019.

 

Sobre a autora
Chryssie Cavalcante

Advogada, Pós Graduada em direito de Família e Sucessões, Pós Graduada em Direito Penal, Especialista em Processo Cível. OAB-DF 36514. E-mail: [email protected]. Tel: 61.982886205

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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