Opinião: Incentivos ao crime: o dilema da delinqüência na juventude
¹ Ignacio Munyo
² tradução por Matheus Maciel
Infelizmente, a delinqüência juvenil está crescendo em quase todos os países da América Latina, uma região onde a insegurança dos cidadãos é a principal preocupação. Acadêmicos, ativistas e legisladores discutem causas e possíveis soluções para o complexo problema da violência juvenil.
Em " The Juvenile Crime Dilemma " - publicado recentemente pela Review of Economic Dynamics, revista oficial da Society for Economic Dynamics - desenvolvi um modelo para analisar as causas do crescente número de jovens participando de atividades criminosas. Eu argumento que esse fenômeno é impulsionado por uma mudança nos incentivos, ao invés da inevitável consequência de uma geração de jovens que difere intrinsecamente de seus predecessores.
Há consenso na literatura psicológica de que o amadurecimento psicossocial é subsequente ao desenvolvimento cognitivo, e que isso se reflete em diferenças marcantes no comportamento social e emocional entre adolescentes e adultos. Entretanto, um modelo de comportamento racional que considere decisões consistentes de adolescentes, que desconsideram as consequências futuras de suas ações, e que reconhecem as mudanças significativas nos incentivos à atividade criminal em detrimento de atividades legais, é capaz de explicar em sua totalidade o aumento recente observado na delinquência juvenil no Uruguai.
No modelo da análise desenvolvida, os adolescentes racionais enfrentam o dilema recorrente de decidir entre atividades legais e atividades criminosas com base em suas “habilidades” para o trabalho e para o crime.
O modelo incorpora o fato de que as decisões tomadas pelos adolescentes deixam seqüelas que afetam decisões futuras e que são difíceis de reverter em fases posteriores da vida. Essas inércias são o que explica, em parte, por que existem carreiras criminosas e por que o adolescente que é dedicado ao estudo ou ao trabalho é muito menos propenso a cometer um crime do que outro que não estuda nem trabalha que enfrente punição do mesmo rigor.
Para avaliar seu poder explicativo, calibrei o modelo com dados para o Uruguai. O modelo conseguiu reproduzir mais de 90% do recente aumento da delinqüência juvenil no Uruguai - que triplicou na última década, ao afetar os parâmetros-chave de acordo com as mudanças observadas nos incentivos à atividade criminosa.
De fato, na última década no Uruguai, houve uma redução significativa na lucratividade das atividades jurídicas relacionadas ao crime, acompanhadas pela introdução de uma legislação benevolente no tratamento de adolescentes em conflito com a lei.
Este modelo também se revela uma ferramenta útil - complementar à avaliação de impacto - para quantificar os efeitos potenciais de medidas alternativas para enfrentar a delinqüência juvenil. O modelo tem a vantagem de considerar a interação de vários fatores dinâmicos - que muitas vezes operam em direções opostas - para computar o efeito final sobre os incentivos que afetam o comportamento dos adolescentes.
Por exemplo, se a coexistência em centros de detenção facilita a aquisição de habilidades para cometer um crime, ou se a passagem por esses centros reduz significativamente potenciais retornos futuros em atividades legais como consequência do estigma que os impõe a sociedade, então punir os adolescentes de forma mais severa - através de períodos mais longos de privação de liberdade - ao invés de dissuadi-los a não cometer crimes, poderia aumentar os incentivos para que eles retornassem ao crime.
De fato, o modelo prevê que uma queda na idade de responsabilidade penal de 18 para 16 anos - uma alternativa considerada em vários países - seria uma medida eficaz para reduzir a delinquência juvenil.
No entanto, se a transmissão de habilidades criminosas nos centros de detenção for suficientemente forte, penas mais severas para adolescentes acabariam aumentando a probabilidade de reincidência ao atingirem a maioridade. Nestes casos, a cura pode ser pior que a doença.
Portanto, é fundamental minimizar a "escola do crime" nos centros de detenção.
Apesar de ainda estarmos longe de compreender em profundidade como funciona o processo de reabilitação, sentenças mais longas são consistentes com uma redução na probabilidade de reincidência se durante o confinamento é possível melhorar as habilidades para trabalhar e restringir o desenvolvimento de habilidades para delinquir. Esse é o grande desafio pendente em termos de políticas públicas.
¹ Ignacio Munyo: Professor da Escola de Negócios IEEM da Universidade de Montevidéu, Uruguai, e diretor do Centro de Economia, Sociedade e Negócios.
² Matheus Maciel é Advogado, Especialista em Direito Processual Civil e Assessor Especial da Prefeitura Municipal de Lauro de Freitas.
Fonte: BID