A concepção da pena, o significado da punição e sua expressão na prisão (Tradução)

03/07/2019 às 00:00
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Tradução do artigo ““La concepción de la pena, el significado del castigo y su expresión en la prisión” de autoria de Sofia Racco. Link do texto original: http://www.pensamientopenal.com.ar/system/files/2019/06/doctrina47778.pdf

A concepção da pena, o significado da punição e sua expressão na prisão

 O nascimento e a evolução da pena, bem como um dos seus maiores expoentes,a prisão, foi e sempre será um dos temas que mais interessam para aqueles que se sentem atraídos pelo controle social e aplicação de sanções. Assim, a aparição do instituto da prisão deu  um pontapé inicial de uma era de ensaios, consistindo em tentativa e erro sobre as prisões.  Momento em que, mesmo sem a intenção, ainda estamos imersos e cuja culminância não podemos vislumbrar até encontrarmos um sistema penitenciário livre de críticas e historicamente situado, que assegure os fins perseguidos hoje pela pena: a ressocialização do preso: ’’ o modelo prisional é especificado como pena em um momento cronologicamente sucessivo à sua manifestação como lugar da prática de exclusão”

  É necessário então entender as condições e o momento histórico que possibilitou o surgimento dessa modalidade de punição, localizar-nos e compreendermos como este processo de "globalização" da prisão, tanto a nível teórico quanto prático, tem acontecido como Massimo Pavarini acredita: " inadvertidamente ", quase " naturalmente" ainda que tenha acontecido de forma relativamente rápida.

   Seguindo a linha de pensamento de Michel Foucault, da análise de seu trabalho "Vigiar e Punir" é capaz de se entender como os homens se cansaram com a passagem do tempo de punir os corpos e se dedicarem a punir as almas, prendendo-as e isolando-as do mundo exterior para que pudessem expiar e resgatar-se espiritualmente. Então, para qualquer leitor que queira entender o que é a discussão contemporânea aqui levantada em torno da pena e seu conseqüente avanço nas formas de pensamento, também será uma tarefa necessária para mergulhar no trabalho de autores do tema como Immanuel Kant, Georg WF Hegel, Thomas Hobbes, Michel Foucault, entre outros.

 No desenvolvimento deste artigo, tentarei colocar em pauta as diferentes  noções de pena, o significado da pena e seu expoente máximo, a pena de prisão, para entender se temos evoluído ou simplesmente ainda estamos imersos no passado e a única coisa que realmente conseguimos foi mudar o modo de legitimar esses elementos. Procuraremos entender se construímos um discurso jurídico vazio, que esconde a crise real diante da qual nos encontramos.

 II. Pena e seu significado

Se analisarmos cuidadosamente o que foi  dito por diferentes autores, como

Kant e Hegel, por exemplo,observamos que cada um deles tem concepções próprias

sobre pena.

 Para Kant, a penalidade desempenha um papel retributivo contra um certo fato

criminoso, rejeitando assim a ideia de que o processo utilizado como um meio:

" A pena judicial (poena forensis), diferente da natural (poena naturalis), para a qual o vício pune a si mesmo e que o legislador não leva em conta, nunca pode servir simplesmente como um meio de promover outro bem, seja para o próprio ofensor ou para o sociedade civil, mas tem que ser imposta pois houve um crime cometido; porque o homem nunca pode ser manejado como um meio para os propósitos de outro, nem confundido entre os objetos do direito real "

 Por outro lado, Hegel, por sua vez, argumenta que a pena funciona como uma espécie de reparação ou restauração da lei. Funciona como cancelamento de crime por lesão à vontade do infrator. Para Hegel, o crime é concebido como um mal e a pena um mal necessário. Sendo assim, a legitimação hegeliana de punição é baseada na suposição de que o agente que comete um crime é um ser racional que funciona de acordo com sua condição. Como resultado disso, Hegel não encontrou a legitimidade da penalidade em nenhum raciocínio retributivo, mas apenas com base em uma lógica restaurativa. A pena  correspondente a um crime deve ser mínima,  permitindo a restituição do direito como tal, isto é, o mínimo que compense o crime. Isso significa que o fim da punição não pode ser outro senão a superação do crime em si e a restituição da plena validade do direito.

 Por sua parte, Thomas Hobbes, em seu trabalho "O Leviatã" define punição como

"Um mal infligido pela autoridade pública a quem ele fez ou omitiu o que essa mesma autoridade considera uma transgressão da lei. Para que a vontade dos homens esteja por si mesma melhor disposta à obediência”

 Todas essas definições diferentes fornecidas sobre a pena por esses autores não fazem mais do que destacar que, embora a punição seja necessária para proteger a sociedade e as pessoas que a compõem individualmente não deve exceder os limites que o convertem em simples vingança.

 É necessário a existência da punição e seu fundamento para que os homens, como tais, possam entender o que ela implica em si, sua verdadeira concepção, e assim estar ciente do que a pena pode gerar em sua vida.

 Mas a punição nem sempre foi aplicada da mesma maneira aos homens. A concepção de punição evoluiu ao longo do tempo, assim como sua aplicação e justificativa.

III Período iluminista e castigo

A princípio, observou-se como o sistema absolutista criou penalidades

totalmente desproporcionais, baseado apenas a sua aplicação em desobediência daquele que cometeu o crime, residindo no monarca a escolha arbitrária de como aplicá-la. As execuções eram públicas e as pessoas pareciam gostar disso. Depois, uma espécie de "solidariedade" é iniciada, se assim se quiser interpretar, entre o executado e o público. Assim, surge a necessidade de punir de maneira diferente e, como resultado, o aparece o instituto penitenciário. Desta forma, a punição foi escondida dos olhos do público.

    Nos séculos XV e XVI, com o surgimento da classe média, as primeiras prisões foram erguidas nos principais centros europeus da indústria de tecidos.

Até os séculos XVII e XVIII, as idéias de tortura, mutilação, cessam quase completamente, por uma razão simples: a exploração lucrativa da força de trabalho dos prisioneiros.  Isto marca o fim da "pena capital" e do castigo corporal, e surge a prisão com o nome de "Casas de trabalho" ou "Casas de Correção" na Inglaterra e na Holanda.

 No entanto, foi  tarefa do Iluminismo a elaboração teórica do sistema prisional ao longo do século XVIII. Nesse período, o Direito Penal Liberal foi formado, ligado ao desenvolvimento de uma nova classe social interessada em estabelecer limites ao poder punitivo exercido pela nobreza, sob a influência dos ideais da Revolução Francesa.

 Paralelamente à agitação contra a ineficácia e crueldade das sentenças que levaram à adoção da prisão como forma normal de punição para todos os tipos de crimes, surgiu outro movimento contra a indeterminação das penas e a arbitrariedade dos tribunais penais.

 Como resultado disso, o Iluminismo procurou forjar um novo conceito de justiça criminal em que se reivindicou, de forma generalizada: igualdade no tratamento, a personalidade da punição, a erradicação da arbitrariedade dos juízes na determinação dos crimes e de penalidades, a abolição de crimes contra religião e moralidade, publicidade dos processos, o direito de defesa por meio de assistência judiciária, a obrigação de motivar julgamentos e torná-los públicos.

A chegada do Iluminismo também permitiu a separação dos dogmas religiosos e a explicação dos fenômenos naturais através da razão e sob as leis de

causalidade. Unido a isto, nesta época também surgem as garantias processuais e criminais, dos quais um de seus máximos expoentes foi César Beccaria.

 Da mesma forma, a teoria do contrato social desempenhou um papel importante na forma de conceber de maneira geral a punição e nas reformas penais introduzidas. Rousseau estabelece em seu contrato social que "Todos colocam em comum sua pessoa e seu poder sob a direção suprema da vontade geral, e cada membro é considerado uma parte indivisível do todo ", entendeu esta vontade geral como aquela que consiste na realização do desejo coletivo e de tudo que é dirigido no interesse da comunidade.

 Rousseau associa essa vontade geral com outras propriedades concorrentes no contrato social como o conceito de soberania, e afirma que estão ligados uns aos outros.

Estes conceitos são decisivos para substituir a chamada "vontade do príncipe", sistema vigente na época, para apoiar a projeção da democracia.

  Nesse contexto, a teoria da defesa social foi consolidada. A vingança foi deixada no passado em benefício de uma penalidade que deveria ser o mínimo necessário para prevenção de crimes.

 Essas mudanças, necessariamente impactaram em vários aspectos relacionados ao crime, resultando na consolidação da prisão como uma penalidade generalizada e dominante em  relação à punição. A privação da liberdade deixa para trás o ritual da punição pública transformando a prisão na penalidade característica da modernidade ocidental, sendo a prisão a " [p] ena das sociedades civilizadas"

IV. Evolução do castigo e fundação da prisão

As penalidades de privação da liberdade originaram-se no século XVI e foram aplicadas de maneira generalizada quando os diferentes Estados começaram a observar que a penalidade poderia ter um sentido utilitário.

 Além das teorias, na realidade "a prisão é uma instituição muito antiga. A prisão de Tuliana, mais tarde chamada Mamertina, e descrita por Sallust e Livy, de acordo com sua lenda, foi construído em Roma pelo rei Anco Marcio para provocar medo na plebe, e depois ampliada por Servio Tulio ".  Ferrajoli argumentou que o principal objetivo da prisão era reter os prisioneiros para que eles não escapassem enquanto o processo criminal fosse realizado.

 Posteriormente, com o aumento da riqueza e uma valorização moral e jurídica mais intensa das relações de propriedade, configuraram-se algumas das razões político-econômicas que influenciaram consideravelmente e favoreceram as mudanças em sua forma de concepção.

 No final do século XVIII e início do século XIX, a punição tende a se tornar a "[p]arte mais oculta do processo criminal, uma vez que sua eficácia é exigida e sua fatalidade não. Torna-se agora a certeza de ser punido e não mais aquele abominável teatro ". Além disso, é a sentença em si que deve marcar o agressor com o sinal negativo e inequívoco.

  Foucault sustentou que as idéias reformistas traduzidas na nas reivindicações da humanidade nos castigos, deviam ser entendidas, como tentativas de estabelecer uma nova economia de poder punitivo visando responder às mudanças ocorridas no crime com o advento do industrialismo.

Ele considerou que a partir de certas práticas sociais de confinamento que eram

desenvolvido ao longo dos séculos XVI e XVII, o mesmo resultou em uma série de conhecimentos que levaram à constituição de novos objetos, dentre os quais emergiram o homem.

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 Em seu trabalho "Vigilar y Castigar" Foucault, enfocando o direito penal e regime penitenciário do século XVIII ao século XIX, estudou a presença de relações de poder, tecnologias de controle e apresentou sua análise sobre a evolução dos métodos de punição e Vigilância. Ele concebeu a punição como uma expressão de poder e explicou como a Pena sofreu mutação em resposta ás mudanças político-econômicas nas sociedades ocidentais.

 Seu estudo enfoca principalmente o aspecto repressivo da punição e seus efeitos positivos, os métodos punitivos da perspectiva da tática política, a história do direito penal e das ciências humanas, e o deslocamento da punição do corpo para a alma e a inserção de um conhecimento científico no campo do crime. Todas essas idéias que implicaram uma mudança na maneira pela qual o corpo dos homens é atravessado por relações de poder.

  A princípio, no início de sua análise da pena, encontra-se a punição corporal como vingança do soberano que restaura a soberania ferida. Posteriormente, a punição começa a fazer parte da consciência abstrata do homem e começa a afirmar que a justiça não visa punir, mas reformar, corrigir, transformar.

 A premissa legal e a premissa econômico-política, juntamente com os vestígios da tortura, serão duas maneiras diferentes de organizar o poder de punir. Na primeira, o infrator é concebido como aquele que rompeu o pacto social e representa uma ofensa à sociedade, que exerce seu direito de defesa. Na segunda forma de punição, a punição propriamente dita é concebida como uma técnica de coerção de indivíduos, que sujeita o corpo e deixa nela um rastro. Essa forma de punição é o projeto da instituição prisional que exercerá o aparato administrativo.

Foucault argumentou que as idéias de reforma traduzidos em reivindicações de punições humanitárias, devem ser entendidas principalmente como tentativas de estabelecer uma nova “economia” do poder punitivo dirigido para responder às mudanças que ocorreram no crime com o advento da industrialismo Considerou determinar práticas sociais de confinamento que foram desenvolvidos ao longo dos séculos XVI e XVII,estas resultaram em uma série de conhecimentos que levaram à criação de novos objetos, entre os quais o surgimento do homem.

Em sua obra "Vigiar e Punir" Foucault, com foco em Direito Penal e do sistema penal do século XVIII até o século XIX, estudou a presença de relações de poder, tecnologias de controle e apresentou sua análise da evolução dos métodos de punição e Vigilância Foucault argumentou que as idéias de reforma traduzidos em reivindicações de punições humanidade, deve ser entendida principalmente como tentativas de estabelecer uma nova economia do poder punitivo dirigido para responder às mudanças que ocorreram no crime com o advento da industrialismo Ele considerou isso de você determinar práticas sociais de confinamento que foram desenvolvidos ao longo dos séculos XVI e XVII, jogaram resultou em 6 Foucault, de conhecimento que levou à criação de novos objetos, entre os quais surgiu a homem Em sua obra "Vigiar e Punir" Foucault, com foco em direito penal e do sistema penal do século XVIII para o século XIX, estudou a presença de relações de poder, tecnologias de controle e apresentou sua análise da evolução dos métodos de punição e Vigilância

Concebeu a punição como uma expressão de poder e explicou como foi sofrendo mutação em resposta à mudanças político-econômicas nas sociedades ocidentais. O estudo se concentra principalmente no lado repressivo da pena e os seus efeitos positivos, métodos punitivos a partir da perspectiva de táticas políticas, a história do direito penal e ciências humanas e deslocamento da pena do corpo para a alma e inserção do conhecimento científico no campo do crime. Todas essas idéias que implicaram uma mudança na maneira pela qual o corpo dos homens é atravessado por relações de poder. A princípio, ao iniciar sua análise sobre a pena, encontra-se o castigo corporal, como vingança do soberano que restaura a soberania ferida. Posteriormente, a punição começa a fazer parte da consciência abstrata do homem e passa a afirmar que a justiça não visa punir, mas reformar, corrigir, transformar. A premissa legal e a premissa econômico-política, juntamente com os vestígios da tortura, são duas maneiras diferentes de organizar o poder de punir. Na primeira, o infrator é concebido como aquele que rompeu o pacto social e representa uma ofensa à sociedade, que exerce seu direito de defesa. Na segunda forma de punição, a punição propriamente dita é concebida como uma técnica de coerção de indivíduos, que sujeita o corpo e deixa nela um traço. Essa forma de punição é o projeto da instituição prisional que exercerá o aparato administrativo.

 Nesse sentido, Foucault afirmou que esse tipo de fundamento "jurídico-econômico" nada mais fazia do que demonstrar as necessidades da burguesia e do modelo de contrato social proposto no século XVIII, para o qual a prisão se concentrava na liberdade como um valor que poderia pertencer a todos e, portanto, entendeu-se que afetaria a todos igualmente. Como um correlato, a penalidade, baseada na extração do tempo, permitiu uma quantificação exata da punição correspondente a cada crime. Tudo isso tornou compreensível que a prisão se tornasse a "forma natural de castigo".

 O autor observou o paradigma de todos esses dispositivos que são feitos presente na prisão e em seu princípio arquitetônico formado pelo filósofo utilitarista Jeremy Bentham.

 A idéia do Panóptico como uma figura arquitetônica em particular, representa uma tentativa de ver como diferentes tecnologias de poder são inscritas e atravessam corpos, como eles regulam o comportamento dos sujeitos ali imersos. Foucault descreve três diferentes lógicas de exercício de poder: soberania, disciplina, segurança, e a referência ao Panóptico de Bentham serve para explicar o modelo da disciplina, enquanto se usa a tortura para analisar a soberania.

 Para Foucault, "a prisão, peça essencial no arsenal punitivo, certamente marca um momento importante na história da justiça criminal: seu acesso à humanidade.”

 Por sua parte, Massimo Pavarinni, explica o surgimento da prisão no início para a satisfação de uma instância disciplinar. Isto é, como um lugar que busca o "treinamento" dos homens, através de práticas pedagógicas, tendendo a torná-los mais úteis.

 Nas palavras deste autor "a sentença de prisão ou encarceramento, aparece com domínio absoluto apenas nas codificações do século XIX. Embora seja verdade que a prisão era uma realidade bem conhecida, sua presença era justificada pela funcionalidade que oferecia aos diferentes requisitos que eram estranhos aos de uma sanção criminal. Foi no século XIX, quando a pena de prisão se tornou "a" pena por excelência ".

 Massimo Pavarini explica o surgimento da prisão em um primeiro momento para a satisfação de uma instância disciplinar. Isto é, como um lugar que procura a "formação" dos homens, através de práticas pedagógicas, tendendo a ser mais útil.

Nas palavras deste autor "a sentença de prisão ou prisão, aparece com prescrição absoluta apenas nas codificações do século XIX. Embora seja verdade que a prisão era uma realidade já conhecida, sua presença era justificada pela funcionalidade que ofereciam os diferentes requisitos alheios aos de uma sanção penal. Foi no século 19 que a privação da liberdade se tornou "a" pena por excelência ".

No entanto, não é possível entender por que essa predileção pela penalidade privativa do mais sagrado que possui o homem: a liberdade, e não a inclinação para outra possível sanção certamente mais "humana".

 Massimo Pavarini explica isso e sustenta que "os parâmetros contratuais sinalagmáticos na determinação legal e judicial da punição e se transformam na condição ‘Sine qua non’ para poder estabelecer uma diferenciação rigorosa e certa no plano sancionatório a especificidade não homogênea dos interesses criminalmente protegidos. Isso acaba sendo uma condição necessária para o processo de codificação criminosa. Se este for o caso, então a preferência que é estabelecida com relação à sentença custodial é mais do que compreensível. É a mesma noção de liberdade que muda: tem um valor econômico porque está ligada ao valor econômico daquele tempo, uma vez que pela primeira vez pode ser "economicamente mensurado, quantificado. Isso explica por que a necessidade retributiva encontra sua exaltação na privação da liberdade”.

  Por sua vez, Michel Foucault argumenta que, juntamente com o surgimento da   prisão,surge a "humanidade", e que a prisão tem o mesmo valor para todos, uma vez que perde-se a liberdade que é um bem que pertence a todos da mesma maneira.

  Desta forma, a prisão encontra seu fundamento teórico-prático no "deve ser" um aparato disciplinar exaustivo, que dá um poder quase total sobre os detentos. No entanto, a prisão não conseguiu atingir seus objetivos, uma vez que não foi capaz de reduzir a quantidade de ilícitos, mas favoreceu a organização dos criminosos e os fabricou. A prisão não fez nada além de demonstrar incansavelmente o fracasso que sua aplicação causa e a perda de identidade-humana que sua execução acarreta.

 V. Conclusões

 Embora no início deste artigo tenha sido mencionado que a punição é necessária para proteger a sociedade e as pessoas que a compõem individualmente, é necessário que como tal não exceda os limites que a transformem em simples vingança.

 Tanto é que as teorias de punição ressocializantes indicam que a punição, traduzida na penalidade a ser aplicada, deve tender a incutir no condenado certas regras para seu comportamento no futuro.

 Assim, tendo em vista a divergência de opiniões existentes na sociedade atual sobre a pena e seu grau de efetividade, não se deve esquecer que, o objetivo perseguido pela sua aplicação é a repressão desses comportamentos contrários ao que a sociedade considera "bom" para sua própria sobrevivência. É por isso que, embora às vezes seu grau de eficácia diminua em relação àqueles a quem pretende ser aplicado, a pena é necessária.

 No entanto, não posso deixar de ignorar o fato de que, ao longo dos anos, as expectativas sobre a eficácia da ressocialização foram desacreditadas, arrasando com a legitimidade do sistema de sentenças indeterminadas e é isto que leva os membros da sociedade a agirem por si mesmos em busca de sua autopreservação.

 Há uma propensão para políticas criminais que lutam pela acentuação da sentença de prisão sem nem mesmo se insinuar antes de sua substituição. Assim, é possível optar por outras medidas de "punição" se quisermos realmente cuidar da ressocialização do indivíduo sem, desse modo, deixar de manter a ordem moral dominante e impedir seu desgaste e colapso.

  Nas palavras de Massimo Pavarini,’’A forma como se manifesta historicamente a realidade carcerária, exprime sempre uma elevada autonomia da forma jurídica que, desde o início do século XIX, tenta, sem sucesso, regulá-la para “formalizá-la’’. O esforço para refundar utilitariamente o sistema jurídico-penal, orientando-o para uma finalidade preventiva especial, não deve ser julgado em termos de sua eficácia, mas no plano simbólico, isto é, em relação à capacidade de criar a imagem de um sistema penitenciário novamente orientado para uma função unitária. Isso supõe que esse esforço deve ser analisado como uma tentativa de redefinir um sistema penal-legal "fraturado" e "parcelado" com o cenário em crise do paradigma retributivo. Ao absolutizar uni-funcionalmente sua atividade com uma óptica preventiva especial, o sistema penal "procura substituir" o que foi privado com a quebra do limite contratual, isto é, de um sistema "único", liderado por uma lógica "só" e" interna ""

 Isso significa que, com a quebra do "paradigma retributivo" da pena, a sentença de prisão tem propósitos "úteis" em relação a qualquer sistema uni-funcional. Nossa Constituição Nacional expressa de maneira absolutamente clara e precisa que as prisões são destinadas à custódia e reabilitação do detento. No entanto, para alcançar este suposto fim, é exercida uma grande quantidade de violência, que torna impossível separar o confinamento imposto como privação de liberdade de degradação e perda de identidade dos encarcerados que são executados como parte da punição. E isso não acontece apenas aqui na Argentina, mas em todo o mundo.

Basta observar o caso do Brasil, em que no espaço de uma semana ocorreram três distúrbios em três institutos penitenciários diferentes, deixando um saldo total de cem mortos. O primeiro aconteceu no domingo, 1º de janeiro de 2017, no complexo prisional Anísio Jobim (Compaj), na capital do Amazonas, Manaus, com um saldo de 60 mortos por conta do confronto entre as gangues do tráfico de drogas "Primeiro Comando da Capital" (PCC) e o "Comando Vermelho" (CV) apoiado pelos seus aliados "Familia do Norte" (FDN), pelo controle nacional do narcotráfico. O segundo deles ocorreu na sexta-feira da mesma semana, no estado de Roraima, deixando um saldo de 33 presos mortos, agravando a crise do sistema prisional dominado pela superpopulação e controlado por gangues de traficantes. O último aconteceu em 8 de janeiro de 2017, no presídio Desembargador Raimundo Vidal Pessoa, no norte do Estado do Amazonas, cuja capital é Manaus, resultando em 4 mortes. Finalmente, no domingo, 9 de janeiro, no mesmo ano as autoridades do estado do Amazonas anunciaram a descoberta de 3 corpos "em avançado estado de decomposição" no Compaj, que atingiu a soma de 100 assassinatos em uma semana.

 O Brasil tem a quarta maior população carcerária do mundo. As prisões brasileiras têm capacidade para abrigar 300 mil presos e atualmente 650 mil convivem juntos. Ou seja, em 12 metros quadrados, 12 homens vivem abarrotados, misturando prisioneiros de dois grupos rivais de drogas do Primeiro Comando da Capital (PCC) e com membros do Comando Vermelho (CV). A justiça desse país faz isso com o propósito de que aqueles que são privados de sua liberdade matem uns aos outros? A julgar pela frequência com que essas atrocidades acontecem, parece que sim. Soma-se a isso a bestialidade com que esses assassinatos foram realizados, por decapitações e desmembramentos de seus corpos.

 Foucault disse: "Na minha opinião, a prisão foi imposta simplesmente porque era a forma simbólica e concentrada de todas essas instituições de seqüestro criadas no século XIX. De fato, a prisão é isomórfica para todas essas instituições. No grande panoptismo social cuja função é precisamente a transformação da vida dos homens em uma força produtiva, a prisão cumpre um papel muito mais simbólico e exemplar do que econômico, criminal ou corretivo. A prisão é a imagem da sociedade, sua imagem invertida, uma imagem transformada em ameaça ... "

 Hoje pode-se argumentar que, pelo menos na América Latina, a prisão falhou. Um fator importante do nosso Direito Penal é a chamada "prevenção do crime", que é o objetivo perseguido pela política criminal. Tanto a prevenção como a política criminal, ambas são estudadas pela Criminologia, que não deve perder de vista os limites que o próprio Estado de Direito possui, e que são concedidos pelos princípios que garantem os Direitos Humanos.

Entretanto, em muitas ocasiões acontece que ações preventivas trazem como conseqüência um estigma [a certos grupos - Nota do Tradutor]de perigo ou população arruscada que afetará somente os sujeitos visados para essa ação.

 É por isso que você deve procurar ferramentas corretas para alcançar a prevenção sem precisar rotular ou vitimizar o "possível" sujeito de uma ação penal, criar um programa de prevenção ao crime que permita diminuir os atos criminosos, trabalhando com vítimas e vitimas específicas, como as possíveis populações em risco isoladas a que me referi anteriormente.

                   BIBLIOGRAFIA:

  • Foucault, Michel, “Vigilar y Castigar. Nascimento da prisão, Século XXI,”Madrid, 1986
  • Foucault Michel, “La Verdad y Las Formas Jurídicas”,Gedisea Editorial, 4ta reimpressão, 1996.
  • Kant, Immanuel, “Metafísica de las Costumbres, 2° parte da doutrina de Direito.”, Observação Geral, par. E, trad. E notas Adela Cortina Orts e Jesús Conilli Sancho, Editorial Tecnos S.A., 1989.
  • Hobbes, Thomas, “Leviatán”, edição preparada por C. Moya e A. Escohotado, Editorial Nacional, Madrid, 1983.
  • Ferrajoli, Luigi.: “Derecho y Razón. Teoría del garantismo penal”,Ed. Trotta, Madrid, 1995.
  • Hegel, George W.F., “Líneas fundamentales de la filosofía del derecho”, Biblioteca de Grandes Pensadores, t. II, trad. Joaquín Chamorro Mielke, Editorial Gredos, Madrid
  • Pavarini, Massimo “Los confines de la cárcel”, prólogo de Ofelia Grezzi, Edición Carlos Álvarez, Montevideo 1995.
  • Rousseau, Jean-Jacques, “El contrato social”, Editorial Edaf S.L.U., junho de  2012, Madrid.
Sobre o autor
Matheus Queiroz Maciel

Advogado, Assessor da Prefeitura Muncipal de Lauro de Freitas, Especialista em Direito Processual Civil e Mestrando em Saúde, Ambiente e Trabalho pela UFBA

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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