Medidas alternativas à reclusão: freio à delinqüência (tradução)

05/07/2019 às 18:29
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Tradução do artigo “Medidas alternativas a la reclusion: freno a la delincuencia” de autoria da advogada e ex-ministra chilena Javiera Blanco Suarez. Link do texto original: http://www.pensamientopenal.com.ar/system/files/2019/06/doctrina47759.pdf

Medidas alternativas à reclusão: freio à deliquencia

*tradução por Matheus Maciel 

A tragédia da prisão de San Miguel tornou evidente a urgência de avançar na segunda geração de reformas na agenda da segurança pública. Desta vez, é apropriado intervir no sistema de cumprimento das penalidades, incentivando medidas de reintegração e reabilitação daqueles que são privados de sua liberdade ou que cumprem penas no libertos.

 Uma década após a implementação da Reforma do Processo Penal em nosso país [Chile – Nota do Tradutor], que envolveu investimento de grandes recursos econômicos do Estado, este novo sistema de justiça criminal tem mostrado eficiência, velocidade e controle da  investigação, princípios que inspiraram sua implementação.

 Deve ser lembrado que os processos reduziram o tempo médio de duração, para 126 dias no caso de afastamentos judiciais e para 72 dias para saídas não-judiciais, apesar de ter aumentado a carga de trabalho. Sob o antigo sistema, a duração média dos casos ultrapassava dois anos. Mesmo assim, existe maior produtividade em relação à quantidade de términos. As causas terminadas chegam a 91% quando se fala das recebidas nos primeiros anos da Reforma, enquanto em relação ao ano de 2009, a porcentagem dos términos foi elevada a 107%.

 No entanto, no que diz respeito à tragédia ocorrida no início de dezembro passado, na qual 81 prisioneiros morreram da prisão de San Miguel, tornou-se evidente a necessidade urgente de avançar nas chamadas reformas de segunda geração na agenda de segurança pública. Desta vez significa reformar o sistema de cumprimento de penalidades, o que implica não apenas ter mais infra-estrutura, mas, principalmente, incentivar medidas de reintegração e reabilitação daqueles que são privados de sua liberdade ou que cumprem penas libertos. Em sua criação, há 18 anos, a Paz Ciudadana, propiciou a modernização do sistema penitenciário chileno através de estudos, publicações e atividades referentes à conscientização do problema. Alem disso, propôs orientação e métodos para melhoria de políticas públicas nesta matéria.

 Quanto ao aprimoramento de medidas alternativas à privação de liberdade, a Fundação as promove desde 1997. As razões agora estão à vista: o Chile conta hoje com cerca de 50 mil pessoas privadas de liberdade e aproximadamente 23 mil de volta à sociedade ou porque cumpriram uma parte de sua sentença e obtiveram sua liberdade, ou porque cumpriram toda a penalidade. Para isso, devem ser adicionados os 250.000 casos em que alguma medida de controle é dispensada no processo. A população condenada privada de liberdade cresceu 120% entre 2000 e 2008 e os condenados em ambiente livre (Lei Nº18.216) aumentaram 53% no mesmo período.

NENHUMA DEFINIÇÃO CLARA

 Quanto ao sistema de medidas alternativas à detenção, aparecem dificuldades na ausência de um catálogo amplo e diversificado de sanções em sua abrangência, ou de uma organização com apoio orçamentário que permita adequado controle social e reintegração dessa população. Por exemplo, o baixo número de delegados probatórios não permite a adequada gestão de casos e acompanhamento para reintegração, uma vez que há 57 condenados por delegado e o limite técnico sugerido é 30. Em relação às outras medidas da Lei nº 18.216, pode-se afirmar que também não existe uma definição clara que favoreça a reintegração, já que 37% da população é condenada a passar a noite na prisão, quando deveria fazê-lo em instituição especializada, o que leva a um contágio criminogênico difícil de evitar. Cerca de 52% do número total de condenados - que correspondem àqueles que cumprem sua pena no ambiente livre (liberdade condicional, regime aberto e liberdade assistida) - é atendido e controlado por um departamento de hierarquia intermediária dentro do organograma da Gendarmaria, com um orçamento muito limitado e pessoal reduzido. Sob essas condições, é difícil alcançar os objetivos de reabilitação que este tipo de pena originalmente deveria satisfazer. Embora ainda não existam dados e estatísticas atualizados sobre a reincidência dessa população, é possível constatar que os sistemas de controle são bastante precários e a oferta prógramática de reinserção social é escassa e de cobertura muito pouco significativa, por isso é altamente provável que uma porcentagem importante daqueles que passam por esse sistema voltará a ser interno do mesmo organismo. Claramente, esse percentual é ainda maior se considerarmos a população privada de liberdade. Todas essas pessoas devem ser objeto de controle e apoio reais, um fator fundamental para evitar que cometam crimes novamente. Isso não funciona atualmente.

PENALIDADES SUBSTITUTAS: PENALIDADE, NÃO BENEFÍCIOS

É urgente e prioritário avançar na criação de uma nova institucionalidade - separada da Gendarmaria do Chile - que se encarregue do cumprimento efetivo e da correta supervisão técnica dessas medidas e penalidades que se cumprem em liberdade. Um avanço nesse sentido é a alteração da Lei nº 18.216, que muda seu nome de “medidas alternativas” para “penas substitutas”, demonstrando que não se trata de um "benefício" concedido aos condenados, mas uma sanção. Além disso, essa iniciativa diversifica o catálogo de penalidades substitutivas, incorporando reclusão parcial e liberação supervisionada intensiva.

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 O projeto também determina dentro do catálogo de condições para sentenças de liberdade vigiada e supervisionada intensiva, a obrigação de participar de programas de reabilitação em drogas e álcool, nos casos de dependência.

 Esta última medida parece justa depois dos resultados do estudo I-ADAM 2010 sobre o uso de drogas por presos realizado pela Paz Ciudadana, que mostrou que sete em cada dez detentos nas delegacias de polícia no setor sul de Santiago tiveram exames considerados positivos para consumo de drogas.

 Da mesma forma, o projeto - como forma de garantir que aqueles condenados sob um regime de liberdade supervisionada cumpram com um plano conducente à sua reabilitação e reintegração – se aumente o número de delegados probatórios, alcançando um padrão internacional de um delegado por cada 30 condenados supervisionados.

 O sistema de medidas alternativas ao encarceramento foi largamente adiado, deixando de aproveitar as oportunidades que oferece para acabar com trajetórias criminosas precoces. Isso produziu uma grande deslegitimação pública quando associada à impunidade, o que acaba alimentando as demandas orientadas exclusivamente à promoção carcerária e não ao investimento na reinserção social.

 Nem todos os infratores devem cumprir pena de prisão. Isso acontece tanto pela gravidade do crime, quanto por ser economicamente inviável para qualquer país do mundo.

A ênfase deve estar no investimento em um sistema real e efetivo de reabilitação e reintegração.

*Matheus Maciel é Advogado, Especialista em Direito Processual Civil e Assessor Especial da Prefeitura Municipal de Lauro de Freitas.

Sobre o autor
Matheus Queiroz Maciel

Advogado, Assessor da Prefeitura Muncipal de Lauro de Freitas, Especialista em Direito Processual Civil e Mestrando em Saúde, Ambiente e Trabalho pela UFBA

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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