Recorribilidade Imediata das Decisões Interlocutórias Posteriores à Sentença

08/07/2019 às 21:36
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O artigo analisa o julgamento do REsp 1736285 pelo Superior Tribunal de Justila, sobre a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias posteriores à sentença.

A principal inovação realizada pelo CPC/2015 sobre o recurso de agravo de instrumento está no seu objeto, ou seja, nas decisões recorríveis por esta espécie recursal.

Com fundamento no princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias, nem todas as decisões interlocutórias são impugnáveis por meio de agravo de instrumento. Por isso, na fase de conhecimento são agraváveis apenas aquelas decisões expressamente listadas no art. 1.015 e em outros dispositivos de lei (como, por exemplo, o julgamento antecipado parcial de mérito, nos termos do art. 356, § 5º, do CPC).

Portanto, o agravo de instrumento rege-se pela tipicidade das decisões interlocutórias. Durante a fase de conhecimento, somente as decisões típicas (ou seja, previstas expressamente em lei) podem ser objeto de agravo de instrumento.

Por outro lado, as decisões interlocutórias não referidas no art. 1.015, ou em outro dispositivo legal, devem ser impugnadas na apelação contra a sentença, ou nas suas contrarrazões (art. 1.009, § 1º, do CPC).

Além das decisões descritas nos incisos do art. 1.015, também são recorríveis por agravo de instrumento todas as decisões interlocutórias proferidas nas quatro situações previstas em seu parágrafo único: (a) a liquidação de sentença; (b) o cumprimento de sentença; (c) o processo de execução; (d) e o processo de inventário.

Portanto, é equivocado afirmar que existem decisões interlocutórias irrecorríveis no CPC. Todas elas são recorríveis: algumas de imediato (pelo agravo de instrumento) e as demais, apesar de não ser impugnáveis imediatamente, podem ser objeto de recurso (apelação ou contrarrazões). Busca-se, com isso, afastar a preclusão da recorribilidade das decisões interlocutórias e concentrar o julgamento dos recursos na apelação.

Além disso, ao uniformizar a interpretação e aplicação do art. 1.015 do CPC, ao julgar o Tema nº 988 dos Recursos Repetitivos, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese: “O rol do artigo 1.015 do CPC/15 é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”.

Assim, o STJ declarou existir uma taxatividade mitigada, ou seja, é possível a ampliação para incluir hipóteses não previstas expressamente em lei. O direito de recorrer, de acordo com o voto da maioria, não se restringe ao previsto nas regras que definem quais são as decisões recorríveis, mas deve ser interpretado e aplicado a partir das normas fundamentais do processo. Contudo, não há um amplo poder do julgador para criar situações de cabimento do agravo de instrumento, o que esvaziaria o princípio da tipicidade e a irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias. Logo, a solução mais adequada (na visão da Corte) foi a manutenção da taxatividade legal, com o acréscimo de um critério de mitigação (ou, na expressão utilizada no voto da relatora, Min. Nancy Andrighi, uma “cláusula adicional de cabimento”).

Além disso, em julgamento posterior, a 3ª Turma do STJ esclarecer que, após a fase de conhecimento, o processo rege-se pela recorribilidade tmediata das decisões interlocutórias, ou seja, as decisões proferidas nas fases de liquidação e cumprimento de sentença são recorríveis por agravo de instrumento, com fundamento no parágrafo único do art. 1.015 do CPC.

A maior dificuldade está na definição do recurso cabível para as decisões proferidas no juízo de primeira instância após a sentença e antes do início das fases de liquidação e de cumprimento. De um lado, não há previsão expressa do cabimento do agravo de instrumento, mas, por outro lado, em princípio não existe outro recurso cabível.

Logo, no entendimento do STJ, o art. 1.015, parágrafo único, do CPC, deve ser interpretado no sentido de que se aplica a todas as decisões proferidas pelo juízo de primeira instância após a sentença (logo, excluídas as decisões prolatadas em grau recursal nas instâncias e tribunais superiores), que é o ato processual que põe fim à fase de conhecimento (art. 203, § 1º, do CPC). Em suma, encerrada a fase de conhecimento pela sentença, todas as decisões interlocutórias posteriores são agraváveis. Desse modo, ainda que anteriores a eventual recurso e às fases de liquidação e cumprimento de sentença, as decisões interlocutórias posteriores à sentença são recorríveis por meio do agravo de instrumento. Por exemplo, se o juiz não conhece a apelação interposta pela parte com fundamento na intempestividade, o recurso cabível contra essa decisão interlocutória é o agravo de instrumento.

Por isso, o STJ concluiu que “(...) tendo sido proferida decisão interlocutória – que indeferiu o pedido de nulidade das intimações após a prolatação da sentença - após o trânsito em julgado e antes do efetivo cumprimento do comando sentencial, cabível, de imediato, o recurso de agravo de instrumento, na forma do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015” (REsp 1736285/MT, 3ª Turma, rel. Min. Nancy Andrighy, j. 21/05/2019, DJe 24/05/2019).

Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

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