DIREITO AGRÁRIO – POSSE PROTEGIDA CONTRA "GRILEIROS"

17/07/2019 às 09:11
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O Presente artigo, visa demonstrar no âmbito do Direito Agrário a proteção que o possuidor (posseiro) de boa-fé possui contra o Titular Escritural de imóvel rural.

Tendo em vista a recente pesquisa acadêmica sobre Direito Agrário, o presente autor se deparou com diversos Princípios Próprios desse ramo autônomo de direito, sendo que um dos princípios, que mais lhe chamou a atenção, foi o Princípio da utilização da terra que se sobrepõe à titulação dominial, o qual conseguiu fazer um link com diversos casos práticos, haja vista que o contexto fático e histórico tem uma ligação com a história e a finalidade do referido Princípio de Direito Agrário em proteger o possuidor.

O Princípio da utilização da terra que se sobrepõe à titulação dominial, foi trazido inicialmente pelo Agrarista Benedito Ferreira Marques em sua obra Direito Agrário Brasileiro. 11ª. Ed Editora Atlas: São Paulo, 2015. (P.  22).

Tal princípio tem por finalidade de proteger o Possuidor do imóvel, que mesmo não sendo titular tabular do imóvel, faz cumprir a função social do mesmo, em detrimento do Proprietário tabular/escritural, que só tem o título em seu nome, mas nunca exerceu a posse do imóvel.

Assim, em decorrência desse princípio do Direito Brasileiro, temos a proteção do direito ao possuidor em detrimento do titular tabular, como os casos previstos de Perda da Propriedade pela Prescrição Aquisitiva, seja pela Usucapião Especial Rural (Art. 183 da CF), Usucapião Ordinária Rural ( art. 191 da CF, e no art. 1239 do CC), Usucapião Ordinária Comum (Art. 1242 do CC) ou Extraordinária Comum (Art. 1238 do CC), bem como pelo direito de retenção (art. 1219 do CC), ou mesmo da acessão inversa (art. 1255, parágrafo único, do CC).

Outrossim, comporta ressaltar que esse princípio visa proteger o Possuidor que investiu no imóvel contra possíveis “grileiros” e especuladores.

Ademais, comporta conceituar o termo Grilagem de Terras, comporta trazer a conceituação usada pelo Instituto Pensamento Verde[1]:

“O termo grilagem está realmente associado ao inseto, uma vez que havia uma prática de colocar documentos fraudados dentro de uma gaveta com grilos: a permanência dos pequenos animais no ambiente fechado causava um efeito gradual de envelhecimento, perfeito para quem precisava mostrar que determinado documento era antigo.

Na época, os registros de cartório podiam ser facilmente questionados pela sua organização precária. Hoje, porém, há uma alta tecnologia de fraudes documentais sobre terras públicas, possibilitando que documentos falsos sejam vistos como legítimos. Este tipo de falsificação é feito com base no cruzamento de registros da Receita Federal, em falhas no processo e a falta de fiscalização permitem que haja brechas para driblar a lei.

Como não há um sistema único nacional que controle as terras, nem cruzamento de informações entre os órgãos fundiários da esfera federal, estadual e municipal, os cartórios estão abarrotados de inúmeros títulos de propriedade para a mesma área. Além disso, o grileiro geralmente tem boas condições financeiras e sociais, suficientes para influenciar funcionários e autoridades.

Mesmo que as terras sejam públicas e que muitas delas não estejam produzindo, há outros métodos mais apropriados para sua distribuição, como realizada pela reforma agrária. O sistema de grilagem, portanto, pode se configurar como furto e estelionato.”

Ademais, tal princípio foi recebido e vem sendo aplicado pelo TJPR em casos práticos, no Agravo de Instrumento Protocolo: 2016/32551. Comarca: Ribeirão do Pinhal. Vara: Juízo Único. Ação Originária: 0002905-85.2015.8.16.0145, no qual o Relator: Des. Ruy Muggiati, o mesmo evidenciou a autonomia do Direito Agrário e assentou a base principiológica do mesmo:

Em novembro de 1964, foi então promulgada a Lei nº 4.504(Estatuto da Terra), posteriormente regulamentada por decretos, tendo percorrido um longo caminho até sua consolidação no nosso sistema jurídico. Incontestável que a autonomia científica do Direito Agrário lhe confere princípios específicos que o regram, dos quais se torna mister destacar: - Monopólio Legislativo da União; a utilização da terra sobrepõe a titulação dominial; a propriedade da terra com cunho voltada na função social.

Em outro julgado do TJPR, APELAÇÃO CÍVEL Nº 414523-5, DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE PONTA GROSSA, o RELATOR: DES. JOSÉ CICHOCKI NETO faz uma análise sistêmica do Direito Agrário, evidenciando novamente o referido princípio:

Incontestável que a autonomia científica do Direito Agrário lhe confere princípios específicos que o regram, dos quais se torna mister destacar: 

- Monopólio Legislativo da União; a utilização da terra sobrepõe a titulação dominial; a propriedade da terra com cunho voltada na função social; o aspecto dicotômico compreendido entre as políticas de (Reforma Agrária) e a de desenvolvimento (Política Agrícola); normas jurídicas de interesse público prevalece ao individual; reformulação fundiária; fortalecimento do espírito comunitário (cooperativas e associações); combate ao êxodo rural, exploração predatória e os mercenários da terra; proteção à propriedade familiar, à pequena e média propriedade; conservação e preservação dos recursos naturais e a proteção do meio-ambiente; dentre outros. (cfr. Marques, Goiânia, AB editora, 2005).

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Diante disso, fica evidente a proteção do Possuidor de Imóvel rural, que cumpra com a função social, em detrimento do Proprietário Tabular que nunca exerceu posse sobre o mesmo.


[1] https://www.pensamentoverde.com.br/meio-ambiente/entenda-o-que-e-grilagem-de-terra-e-como-contribui-para-o-desmatamento/

Sobre o autor
Alexandre Dangui

Bacharel em Direito, Pós Graduado em Direito Imobiliário e Cursando LL.M em Direito Empresarial na FVG. Contabilista Inscrito no CRC/PR e Técnico em Transações Imobiliárias com inscrição no CRECI/PR Ex-Professor Universitário de Direito Empresarial e Tributário Atualmente Advogado Militante no Escritório Carminatti & Dangui Advogados Associados.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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