Desmistificando a Reforma da Previdência

21/07/2019 às 23:13
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Antes de impor tamanho sacrifício à população, o governo deve cobrar devedores, por fim ao contencioso, combater a sonegação, a corrupção e as fraudes, melhorar a fiscalização, aplicar sanções mais eficazes aos sonegadores, etc.

Em 2018, o déficit da Previdência (INSS) foi de R$ 194 bilhões. Argumentam os defensores da reforma da Previdência que o país está envelhecendo rapidamente e é um dos poucos do mundo a não exigir idade mínima, que deveria ser de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.

Pois bem. Na Europa, a Hungria tem piso menor do que 60 anos e a expectativa de vida é de 78 anos. Na Alemanha, a idade mínima para se aposentar é de 65, mas a expectativa de vida é de 83 anos. No Japão, a idade mínima para se aposentar é de 65 anos, todavia a expectativa de vida é de 90 anos. Então, nesses países, em média, o aposentado recebe o benefício previdenciário por 20 anos.

No Brasil, por outro lado, a expectativa de vida no norte e nordeste ainda é de 65 anos, só no Sul e Sudeste ela chega aos 70 anos. No agregado, a expectativa média de vida no Brasil é de 68 anos. Portanto, no Brasil, os aposentados, em média, receberiam o benefício da aposentadoria por 3 anos. Então, contribuir por 35 anos (homens) e 30 anos (mulheres) para a Previdência para gozar do benefício por 3 anos é um disparate.

Ademais, o governo não cobra adequadamente os devedores da Previdência. Empresas privadas e públicas devem R$ 450 bilhões à Previdência. Entre os 50 maiores devedores, 12 são públicos. O problema é que 35% desse crédito é irrecuperável. São de empresas que tiveram falência decretada.

No entanto, do crédito recuperável, há 5 milhões de ações de cobrança em andamento no Poder Judiciário. Então, é a morosidade do judiciário e a infinidade de recursos que atrasa o recebimento.

Com efeito, é um crédito já histórico e que não tende a crescer, porque oriundo de bancos e empresas que empregam cada vez menos devido à robotização e à inteligência artificial.

Os bancos e grandes empresas disputam no Judiciário com o Fisco verbas como auxílio-creche, aviso prévio, indenização de transporte, participação em lucros, terço de férias, vale-transporte e vale-alimentação. Bancos e empresas entendem que são verbas indenizatórias, enquanto o Fisco entende serem remuneratórias (devendo haver incidência de contribuições previdenciárias).

Portanto, os Tribunais devem logo se pronunciar. E que seja por considerar essas verbas remuneratórias. São verbas oriundas do trabalho, não há que se falar em indenização. Empresas e bancos devem ser chamados a cumprir seu dever com o país.

Ademais, é sabido que os bancos são os maiores interessados na Reforma da Previdência porque seus planos de previdência privada seriam mais atraentes com a ruína da previdência pública.

Outro problema são os programas de refinanciamento (Refis). Na verdade, eles são incentivos a maus pagadores. São quase 30 tipos de refinanciamento em funcionamento. Por um fim aos Refis é medida de urgência.

Na bastasse, há as isenções, que custam à Previdência cerca de R$ 60 bilhões por ano. Também as isenções têm que ser revistas. Isso porque nem todos os isentos são merecedores, a exemplo de grandes conglomerados exportadores de commodities.

Se o governo insistir em conceder desonerações, que nem sempre se justificam, que o faça mediante o Tesouro Nacional e não pela Previdência.

E, ainda, o que é de extrema gravidade, a má gestão e a desvinculação de receitas provocam uma perda de R$ 428 bilhões por ano à Previdência. Por exemplo, a apropriação indébita dos patrões. Por ano, os patrões descontam dos salários dos trabalhadores, mas não repassam ao caixa da Previdência, cerca de R$ 31,25 bilhões. Somado com a sonegação das contribuições das empresas, esse número chega a R$ 100 bilhões por ano.

A Receita Federal é o órgão responsável pela fiscalização da Previdência, no entanto urge melhorar a fiscalização e colocar a máquina pública para cobrar as contribuições em atraso.

As fraudes devem ser combatidas com rigor. São a falsificação de RG, de registro civil [certidão de nascimento ou casamento], falsificação de laudos médicos, para auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, e falsificação de certificações rurais, que comprovam o tempo de trabalho em área rural, etc. O INSS não tem um método seguro de identificação do cidadão, como a biometria.

Em 2018, 135 pessoas envolvidas em fraudes previdenciárias foram presas, resultando em uma economia de R$ 464 milhões. Estima-se que com melhores práticas de combate a fraudes, a Previdência economizaria R$ 10 bilhões por ano.

Assim, urge cobrar devedores, por fim ao contencioso, inibir o litígio protelatório, combater a sonegação, melhorar a fiscalização, aplicar sanções mais eficazes aos sonegadores, exigir honestidade na gestão dos recursos públicos, combater rigorosamente as fraudes, corrupção, etc. Tudo isso antes de impor mais sacrifícios a uma população já tão sofrida.

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