QUAL O FEMINISO EXISTENTE NA MÚSICA “TRISTE, LOUCA OU MÁ”?
RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo discutir o feminismo na música “Triste, Louca ou Má” da banda Francisco, El Hombre, cantada pela cantora e compositora Juliana Strassacapa, além de questionar a submissão da mulher em relação ao homem e os padrões sociais impostos na sociedade brasileira. Ao analisar a música se fez uma reflexão crítica sobre o papel da mulher, para isso estudou-se o processo histórico da mulher no meio social. O método utilizado para a produção do trabalho fez o uso da música assim como alguns textos teóricos, notícias, e conhecimentos gerais, com o propósito de passar as informações com efetividade. O trabalho contribui para exibir o machismo existente na sociedade e os padrões sociais impostos para as mulheres.
Palavras-chave: feminismo, mulher, padrões, liberdade.
INTRODUÇÃO
Sabe-se que desde os primórdios, a mulher é considerada inferior ao homem, pois a sociedade sempre as excluiu, tanto na política, como na vida pessoal, confirmamos isso de acordo com Beauvoir (1980, p. 97): “[...] o triunfo do patriarcado não foi nem um acaso nem o resultado de uma revolução violenta. Desde a origem da humanidade, o privilégio biológico permitiu aos homens afirmarem-se sozinhos como sujeitos soberanos”. A partir disso, percebemos que a figura feminina recebe um tratamento diferenciado na sociedade e por muito tempo a mulher foi vista apenas como objeto de desejo, que deveria servir ao seu marido e a família sem questionar ou opinar.
Atualmente, as mulheres conquistam cada vez mais o seu espaço, por mais que ainda exista uma discriminação, além dessas conquistas como a entrada no mercado de trabalho, as mulheres ainda se responsabilizam pelo cuidado do lar e dos filhos, sendo guerreiras por terem tantas responsabilidades e conseguirem dar conta de tudo! Em contrapartida, ainda existe alguns valores do patriarcalismo, e muitos direitos das mulheres não foram reconhecidos e conquistados.
Segundo Beavouir “Já que a opressão da mulher tem sua causa na vontade de perpetuar a família e manter intato o patrimônio, ela se liberta também dessa dependência absoluta na medida em que escapa da família”. A letra da música analisada se direciona para uma mulher que não quer ter filhos, deseja viver sozinha, não pretende ter uma vida que se resume basicamente em limpar a casa, cuidar dos filhos e servir seu marido, que acredita ter um empoderamento sobre ela.
METODOLOGIA
Até pouco tempo a mulher só podia ocupar duas posições, a de mãe e de esposa, no entanto esse padrão foi quebrado pelas mulheres, as quais agora possuem liberdade para assumir a posição que desejarem. O papel da mulher era limpar e reproduzir filhos, mas com a conquista dessa quebra de padrão, as mulheres possuem uma importância na sociedade, pois conseguiram mudar a ideia de que mulher só serve para ser mãe e esposa, para confirmar isso, trago uma citação de Beauvoir (1980, p. 143) “[...] Como todos os militares, Napoleão não quer ver na mulher senão uma mãe. ”
Analisando a música “Triste, Louca ou Má” da banda Francisco, El Hombre, cantada pela cantora e compositora Juliana Strassacapa, partindo de um pressuposto que as vozes feministas encontradas nesta música não são as mesmas encontradas em outras músicas que também se dirijam a figura feminina, pois cada voz social traz um efeito ideológico, que aparece para nós a partir de uma posição, como diz Kathleen Hanna, cantora norte-americana “Há tantos tipos diferentes de feminismo quanto há mulheres no mundo.”
A seguir, trago a letra da música, para que consigam observar o empoderamento e a questão do ser, a mulher ser quem ela desejar:
Triste louca ou má
Será qualificada
Ela quem recusar
Seguir receita tal
A receita cultural
Do marido, da família
Cuida, cuida da rotina
Só mesmo, rejeita
Bem conhecida receita
Quem não sem, dores
Aceita que tudo deve mudar
Que um homem não te define
Sua casa não te define
Sua carne não te define
Você é seu próprio lar
Um homem não te define
Sua casa não te define
Sua carne não te define
Você é seu próprio lar
Ela desatinou
Desatou nós
Vai viver só
Ela desatinou
Desatou nós
Vai viver só
Eu não me vejo na palavra
Fêmea: Alvo de caça
Conformada vítima
Prefiro queimar o mapa
Traçar de novo a estrada
Ver cores nas cinzas
E a vida reinventar
E um homem não me define
Minha casa não me define
Minha carne não me define
Eu sou meu próprio lar
E um homem não me define
Minha casa não me define
Minha carne não me define
Eu sou meu próprio lar
Ela desatinou
Desatou nós
Vai viver só
O feminismo que a música traz é construído através do desconforto sentido pelo emissor em relação aos padrões sociais que as mulheres “devem seguir”, caso elas não sigam essa receita, são tratadas de forma nada agradável. Esse emissor defende que o feminismo é aquele que se recusa a seguir a receita cultural, imposta por uma ideologia na sociedade.
“O destino que a sociedade propõe tradicionalmente à mulher é o casamento. Em sua maioria, ainda hoje, as mulheres são casadas, ou o foram, ou se preparam para sê-lo, ou sofrem por não o ser. É em relação ao casamento que se define a celibatária, sinta-se ela frustrada, revoltada ou mesmo indiferente ante essa instituição” (BEAUVOIR, 1967, p. 165).
A mulher citada na música não quer ter filhos, deseja viver sozinha, não pretende ter uma vida que se resume basicamente em limpar a casa, cuidar dos filhos e servir seu marido, que acredita ter um empoderamento sobre ela, a mulher da música ao rejeitar a figura masculina é vista como triste, louca e má.
“[...] pelo fato de ter tomado consciência de si e de poder libertar-se também do casamento pelo trabalho, a mulher não mais aceita a sujeição com docilidade. O que ela desejaria é que a conciliação da vida familiar com um ofício não exigisse dela desesperantes acrobacias”.
Mas o que realmente significa uma mulher “Triste, Louca ou Má”? Uma mulher triste seria quando a figura feminina entra em uma situação de solidão, desanimo, situações de brigas, frustações, emoções descontroladas que afetam a alegria da mulher, a solução para esse problema numa visão machista seria o homem, que entra na situação e defende o “sexo frágil”, orientando o caminho a ser seguido.
Uma mulher louca é quando está com TPM, ciúmes ou menopausa, a solução seria negar o problema e aceitar que isso é um problema das mulheres, aqui, novamente a visão machista.
Uma mulher má seria aquela que faz ou diz coisas “desagradáveis” aos homens, como por exemplo ter relacionamento com mais de um homem, recebendo assim inúmeras críticas, a solução seria os homens as desprezarem para que assim voltassem ao “juízo”. A seguir, uma frase que se uma mulher falasse na visão machista seria considerada má: “Eu mesma nunca fui capaz de descobrir precisamente o que é o feminismo. Eu só sei que as pessoas me chamam de feminista toda vez que eu expresso sentimentos que me diferem de um capacho” – Rebecca West, autora inglesa
A filiação histórica está nítida na música, percebe-se que a única opção que a mulher tinha de posição para interpelar era aquela que a condenava como um ser submisso ao homem, ela poderia ocupar apenas as posições de mãe e esposa. Felizmente as mulheres lutaram contra esse padrão, dando a si mesmas o valor que merecem.
O emissor da música teve que se posicionar dentro dessa formação discursiva que é o feminismo para poder falar sobre este assunto, se concorda ou discorda, essa posição que esse sujeito ocupa é o feminismo, mas não o feminismo dos tempos antigos, e sim o feminismo atual, pois essa posição muda de acordo com a historicidade.
A posição mulher está dando um “grito” para que as mulheres não aceitem serem consideradas “ fêmeas para caça”. Essa posição que o emissor ocupa (mulher) durante a música não se identifica com a posição mulher que foi criada como padrão na sociedade, ela se identifica com outra forma-sujeito, de que a mulher não precisa de ninguém para viver, que o próprio corpo dela é seu lar, lembrando que essas posições já existem na história.
Para que o emissor da música se constituísse como sujeito ele esqueceu duas coisas, pois quando usou a linguagem esqueceu que ele não é dono daquele dizer, pois os discursos já existem, nós apenas os atualizamos para o nosso contexto, além disso, o emissor acredita que o sentido da música vai ser o mesmo para todos, mas não vai, pois, as pessoas ocupam posições diferentes, o sentido se dá a partir de cada posição, não dependendo da vontade do emissor, mas sim das memorias discursivas que nos (receptores) iremos ter ao sermos expostos diante de um assunto.
Antes desse sujeito da música se interpelar com esta posição feminina, ele se identificou com a posição sujeito-livre, a qual todos se identificam, isso gera um efeito de completude, o sujeito acredita ser dono de si mesmo, esse feminino da música acredita nisso, e uma espécie de “liberdade” condicional, na música o emissor deixa explícito que saiu dos padrões da sociedade para ser livre, para ser dono do seu próprio corpo.
A significação que a música traz atualmente não é a mesma dos tempos antigos, ou seja, o valor (sentido) irá depender das condições de produção tais como tempo e lugar, que variam na sociedade.
CONCLUSÃO
Com a finalização da análise e da reflexão sobre a condição da figura feminina, percebeu-se que as mulheres são muito discriminadas, a música “Triste, Louca ou Má” tem como objetivo mostrar para as mulheres que elas não precisam seguir e se enquadrar nesse padrão social que mulher só pode ser mãe e esposa, ela pode ser o que quiser, por mais que as mulheres já tenham conquistado muitas coisas ainda há muito o que conquistar, precisamos nos libertar dessa prisão que são os padrões sociais impostos na sociedade brasileira, a música deve ser considerada como o hino do feminismo! Espero que o trabalho tenha contribuído para a reflexão dos direitos das mulheres e que consigamos romper esse pensamento machista. E para fechar com chave de ouro, uma citação de Karol Conka, cantora brasileira “Quero mostrar que as mulheres podem falar. Não podemos nos calar diante de nada. ”
REFERÊNCIAS
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: A experiência vivida. 2.ed. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1967.
HOMBRE, Francisco El. Triste, Louca ou Má. 2016. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=lKmYTHgBNoE> Acesso em 14 de março de 2019.
ORLANDI, Eni Puccinelli. Condições de Produção. In: _. Análise De Discurso: princípios & procedimentos. 8.ed. Campinas: Pontes, 2009. Cap.2, p. 30-34.
TEIXEIRA, Amanda. Triste, Louca Ou Má: Os três compartimentos da bagagem emocional de um macho-qualquer. Disponível em: https://blogueirasfeministas.com Acesso em: 14 de março de 2019