O termo corporativismo tem sua origem na Europa medieval, quando foram estruturadas associações que reuniam trabalhadores pertencentes às diversas categorias profissionais então existentes, como a dos pedreiros, carpinteiros, ferreiros, dentre outras. Chamadas de corporações de ofício, estes entes regulamentavam, em especial, as condições trabalhistas, os preços, a distribuição e as quantidades de produtos a serem ofertados. Em síntese, trabalhadores se uniam com o objetivo de defenderem seus interesses e alcançarem objetivos comuns para a categoria.
Este modelo desapareceu, na Idade Moderna, com o desenvolvimento do Estado liberal, que atribuiu ao mercado a função regulatória. No entanto, séculos depois, mais precisamente no ano de 1922, o corporativismo servirá de inspiração, na Itália, ao novo governo que ascendia ao poder, o de Benito Mussolini, para estruturar o sistema político-social fascista. Para eliminar a influência de marxistas e comunistas sobre os trabalhadores, o fascismo desenvolveu uma nova concepção que substituía a luta de classes por uma cooperação. A partir de agora, o governo e os trabalhadores estariam alinhados e unidos para alcançarem os interesses de classe. Estruturou-se o Estado Corporativista, onde o proletariado era organizado em sindicatos oficiais, os quais eram os únicos legitimados a representarem a categoria. Esta fragmentação enfraquecia e inviabilizava a realização de mobilizações proletárias de grande porte ou mesmo a realização de greves gerais.
Os sindicatos italianos passaram a estar subordinados diretamente ao Estado, integrando uma estrutura verticalizada e hierarquizada. Os representantes sindicais passaram a ter assento em órgãos e conselhos públicos, a legislação trabalhista passava a ser elaborada não por partidos de esquerda, mas sim por um governo forte e ditatorial. Em 21 de abril de 1927, foi promulgada a Carta Dil Lavoro, aprovada pelo Gran Cosiglio Fascista.
No Brasil, o modelo italiano exercerá enorme influência sobre o novo Presidente que emerge da vitoriosa Revolução de 30, Getúlio Vargas. Em janeiro de 1931, o então chefe do governo provisório defende a implantação de uma representação classista nos órgãos legislativos. Em 09 de março de 1931, sobreveio o Decreto nº. 19.770, regulando a sindicalização das classes patronais e operárias. O art. 2º fixava que a criação de sindicatos estava condicionada ao reconhecimento pelo novo Ministério do Trabalho, nos seguintes termos:
Art. 2º. Constituídos os sindicatos de acordo com o Art. 1º, exige-se ainda, para serem reconhecidos pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, e que adquirirem, assim, personalidade jurídica, tenham aprovados pelo ministério os seus estatutos, acompanha dos de cópia autêntica da ata de instalação e de uma relação do número de sócios, com os respectivos nomes, profissão, idade, esta do civil, nacionalidade, residência e lugares ou empresas onde exercerem a sua atividade profissional.
Despertou muita atenção e polêmica a redação do artigo 6º, que passava a considerar os sindicatos como órgãos de colaboração com o Estado, nos seguintes termos:
Art. 6º Ainda como órgãos de colaboração com o poder público, deverão cooperar os sindicatos, as federações e confederações, por conselhos mistos e permanentes de conciliação e de julgamento, na aplicação das leis que regulam os meios de dirimir conflitos suscitados entre patrões, operários ou empregados.
Em 5 de abril de 1933, sobreveio o Decreto nº. 22.621, convocando para comporem a Assembléia Nacional constituinte, um total de 214 deputados eleitos segundo as normas do Código Eleitoral e 40 representantes de “sindicatos legalmente reconhecidos e pelas associações de profissões liberais e as de funcionários públicos existentes nos termos da lei civil” (art 3º). Era a primeira vez em nossa história, que as categorias trabalhistas participariam diretamente da elaboração de uma Constituição. Há de se destacar que estávamos saindo de décadas da denominada República do Café com Leite, caracterizada por uma sucessão de governos oligárquicos, sem nenhuma interface com os interesses da sociedade.
Em 1937, Getúlio dissolveu todos os órgãos legislativos e os partidos políticos, passando a governar ditatorialmente, com a implantação do Estado Novo. Com o golpe, implantamos, na sua integralidade, o modelo de Estado Corporativo. Surgia um governo forte, centralizador e legislador, impondo regras sobre todos os setores da sociedade, mas, em especial, no campo trabalhista.
Em 05 de julho de 1939, Vargas baixa o Decreto-lei nº 1.402, estruturando a nova organização sindical brasileira. Os sindicatos legalmente autorizados a funcionar pelo Estado passavam a monopolizar a representação e defesa dos interesses dos trabalhadores (art. 3º). Desaparecia a possibilidade de demandas individuais ou de associações extra-sindicais. Nos termos do art. 4º, os sindicatos tinham como obrigação “colaborar com os poderes públicos no desenvolvimento da solidariedade das profissões.” Ou seja, mudou-se a tradicional função atribuída a estas organizações, que deixavam de ser mobilizadoras de empregados e promotores de reivindicações trabalhistas para se tornarem órgãos colaboradores do Estado.
Para facilitar o controle estatal, implantou-se a unicidade sindical, que perdura até os dias atuais. Nos termos do artigo 23, passou a existir uma estrutura piramidal hierarquizada, composta por sindicatos, federações e confederações. Por fim, fixou-se o polemico imposto sindical, impondo o recolhimento compulsório de todos os integrantes da categoria profissional. Em síntese, passavam a ser verdadeiros órgãos públicos, custeados com recursos tributários.
Na concepção corporativa, Estado e empregados tinham interesses comuns de avanços trabalhistas. De fato, sobreveio um acervo de melhorias, culminando com a assinatura, por Vargas, do Decreto-lei nº 5.452, em 1º de maio de 1943, a denominada Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Decorridos mais de 70 anos do fim do Estado Novo, parece paradoxal que a principal legislação trabalhista, até hoje vigente no país, e a nossa estrutura sindical foram originadas não por seguidores das idéias de Karl Marx ou integrantes de partidos de esquerda, mas sim por um governo inspirado no modelo presente na Itália, durante as décadas de 20, 30 e 40 do século XX.