A Natureza Jurídica das Prestações na Sentença Trabalhista

24/08/2019 às 07:09
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O artigo analisa as alterações realizadas pela Lei nº 13.876/2019 sobre os elementos da sentença trabalhista.

Os elementos da sentença estão listados no art. 489 do CPC e dividem-se em:

(a) relatório, consistente na parte da sentença que contém a descrição dos principais fatos processuais, ou seja, o histórico e o resumo da controvérsia, com “os nomes das partes, a identificação do caso, com a suma do pedido e da contestação, e o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo” (inciso I);

(b) fundamentação, que deve conter as razões de decidir, os fundamentos da decisão, ou seja, as razões fáticas e jurídicas que levam o magistrado a sentenciar daquela forma, (inciso II);

(c) e dispositivo, no qual o juiz efetivamente resolve as questões controversas, concluindo a sentença (inciso III).

No processo trabalhista, a CLT contém regras específicas no art. 832, com o objetivo de evitar fraudes processuais em acordos, com o fim de sonegar o pagamento de imposto de renda e de contribuições previdenciárias. O art. 832, § 3º, da CLT, prevê:

“As decisões cognitivas ou homologatórias deverão sempre indicar a natureza jurídica das parcelas constantes da condenação ou do acordo homologado, inclusive o limite de responsabilidade de cada parte pelo recolhimento da contribuição previdenciária, se for o caso”.

Assim, as sentenças trabalhistas de mérito, proferidas com fundamento no art. 487, I e III, do CPC (em especial as de procedência do pedido inicial e de homologação de acordo ou de reconhecimento da procedência do pedido pelo réu), devem levar em consideração a natureza jurídica das parcelas requeridas na petição inicial, sem alterá-la indevidamente.

Assim, por exemplo, se a parte autora requer a condenação do ex-empregador ao pagamento de verbas de natureza exclusivamente remuneratória (ex: adicional noturno, horas extras, adicional de insalubridade etc.), não é admissível a realização de acordo entre as partes para o pagamento de uma quantia de natureza indenizatória pelo réu.

Sobre o assunto, a Orientação Jurisprudencial nº 376 da SBDI-1 do Tribunal Superior do Trabalho dispõe:

“É devida a contribuição previdenciária sobre o valor do acordo celebrado e homologado após o trânsito em julgado de decisão judicial, respeitada a proporcionalidade de valores entre as parcelas de natureza salarial e indenizatória deferidas na decisão condenatória e as parcelas objeto do acordo”.

Nos termos do enunciado, quando as partes realizarem acordo após a decisão judicial no processo trabalhista transitar em julgado, não se admite a modificação da natureza jurídica das parcelas definidas na sentença.

Em complemento, a Lei nº 13.876/2019 acrescentou os §§ 3º-A e 3º-B ao art. 832 da CLT, para esclarecer que a base de cálculo das verbas de natureza remuneratória requeridas pela parte autora deve observar: (a) o piso salarial da categoria profissional do empregado); (b) e, na sua ausência, o salário mínimo:

“§ 3º-A.  Para os fins do § 3º deste artigo, salvo na hipótese de o pedido da ação limitar-se expressamente ao reconhecimento de verbas de natureza exclusivamente indenizatória, a parcela referente às verbas de natureza remuneratória não poderá ter como base de cálculo valor inferior:

I - ao salário-mínimo, para as competências que integram o vínculo empregatício reconhecido na decisão cognitiva ou homologatória; ou

II - à diferença entre a remuneração reconhecida como devida na decisão cognitiva ou homologatória e a efetivamente paga pelo empregador, cujo valor total referente a cada competência não será inferior ao salário-mínimo.

§ 3º-B Caso haja piso salarial da categoria definido por acordo ou convenção coletiva de trabalho, o seu valor deverá ser utilizado como base de cálculo para os fins do § 3º-A deste artigo”.

Portanto, as partes e o julgador não podem alterar a natureza jurídica das parcelas (remuneratórias e/ou indenizatórias) requeridas na petição inicial e, consequentemente, a sentença de procedência ou homologatória deve observar estritamente essa definição, sem modificações indevidas. Eventualmente, a decisão judicial pode corrigir o enquadramento indevido da parcela pretendida pelo empregado, mas não mudá-la apenas para facilitar a realização do acordo entre as partes (ou por outra razão diversa da correção).

Assim, está superada a Súmula nº 67 da Advocacia-Geral da União, que permite a modificação da natureza das verbas no acordo trabalhista:

“Na Reclamação Trabalhista, até o trânsito em julgado, as partes são livres para discriminar a natureza das verbas objeto do acordo judicial para efeito do cálculo da contribuição previdenciária, mesmo que tais valores não correspondam aos pedidos ou à proporção das verbas salariais constantes da petição inicial”.

Sobre o autor
Oscar Valente Cardoso

Professor, Doutor em Direito, Diretor Geral da Escola da Magistratura Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador do Comitê Gestor de Proteção de Dados do TRF da 4a Região, Palestrante, Autor de Livros e Artigos, e Juiz Federal

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