DIREITOS HUMANOS

Fundamentos da Humanização

24/08/2019 às 15:24
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A solidariedade é o acolhimento da solicitação de sociabilidade.

Como se sabe, por observação empírica sem muitos derivados teóricos e técnicos, os Direitos Humanos recobrem praticamente todos os espaços da vida social – não se limitam, certamente, como querem os advogados da ignorância, a “cuidar de presos”. Observando-se historicamente, desde as primeiras nomenclaturas de organização social e contratual, ainda que imiscuídas de Moral, sempre estiveram presentes e declarados os direitos fundamentais (bem como os deveres) dos indivíduos e da convivialidade na ordem da cultura.
Os povos tradicionais, de certa forma, também constituem regras fixas que promovem e protegem seus indivíduos, como cuidar dos idosos e das crianças, ou ao excluir a violência física do recinto social. Os povos indígenas da Amazônia ainda são conhecidos por sua capacidade de preservação ambiental. Outras regras de convivência são ainda mais longevas, perdendo-se nas contas da própria Humanidade – este seria o caso do Princípio da Reciprocidade: receber bem, para ser bem acolhido(a). É, pois, um princípio em que o direito só se realiza quando reúne condições de se externalizar. Externo, o direito se desprende do indivíduo delimitado para se tornar utopia realizável em todos os demais.
Este Princípio da Hospitalidade (equivalência) – conduzindo quem necessite, ao se prestar asilo e alimentação – é uma das marcas mais sólidas, por exemplo, da cultura Pashtun no Afeganistão. Disto decorrem “obrigações de fazer” – normas de aculturamento jurídico-moral –, de “não-recusar” asilo, garantindo-se a franqueza de recepção e de tratamento solidificável pela necessidade do requerente, de qualquer um que requeira. Bem como se impõem “obrigações de não-fazer”, isto é, não excluir uns em razão de outros que solicitem cobertura em sua fuga do perecimento: num exemplo marcante, o Pashtun não discrimina nem mesmo o inimigo combatido, abrigando-o, se assim for requerido.
Desses posicionamentos podemos pensar em duas consequências político-jurídicas do Ocidente moderno: a garantia ao bom tratamento do prisioneiro de guerra (Convenção de Genebra) e da cultura, da tolerância, do diferente (Convenção de Viena) e o Princípio da Solidariedade, previsto inclusive na edificação do Poder Político, como poder solidus, eficiente, organizado (Tratado de Montevidéu, Pacto de San Jose). É este sentido de Conjunto Complexo dos Direitos Humanos que solidifica valores e ações inerentes à sociabilidade.
Como se vê, tudo que é complexo é sólido.
Outras regras de civilidade são destacadas desde a Grécia clássica, com a imposição de uma regra superior e da qual decorrem as demais: todas as decisões relevantes ao grupo social só são legitimadas se e quando seguirem procedimentos solenes e demarcadores de sua cultura. Este foi o momento fundante e institucional da Política, da Polis. O Princípio de Organicidade e de Urbanidade (civilidade) indicava desde o início a certeza de que os homens são seres sociais que assim se fazem por meio do “fazer-se política”. Logo, nesta tradição, que se tornaria ocidental, não há reconhecimento da sociabilidade, da interatividade social, que não seja mediante a fabricação do “animal político” (desde Aristóteles).
Desse modo, em outro exemplo de fundamentação, esta certeza de que a Política patrocina a ação de cidadania, com Igualdade e Liberdade (isonomia e isegoria), tornar-se-ia o principal baluarte do pressuposto basilar dos próprios Direitos Humanos. Fora da sociabilidade política que articula Igualdade e Liberdade não há direitos fundamentais (individuais e sociais), posto que as formas de dominação não propugnam pela Emancipação. E há um mínimo e essencial contributo desta aplicabilidade da Política à Ideia do Direito, que é o Princípio da Dignidade Humana. Afinal, sem Política não há Dignidade, mas somente sujeição, subordinação, negação existencial do(a) Outro(a). Portanto, observando-se como Conjunto Complexo dos Direitos Humanos, pode-se/deve-se afirmar que a solidariedade é o acolhimento da solicitação de sociabilidade. É a solidificação da convivialidade em direitos – que se opõe a toda forma de violência não-legitimada pela própria conservação da convivência pacífica.
 Enfim, e por tudo isso, há que se afirmar que os Direitos Humanos correspondem à equivalência humana.
 

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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