LAVA JATO – Incêndio fora de controle

28/08/2019 às 22:04
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Analisa os efeitos da decisão proferida pelo STF, no que se refere a eventual necessidade de concessão de prazos diferenciados para a apresentação de Alegações Finais, a depender de o acusado ter ou não celebrado acordo de colaboração premiada.

Nestes últimos meses temos assistindo como o “Deep State” vem articulando suas manobras de desestabilização do Governo Nacional, pelos mais variados meios. Sobre isso, inclusive, tratamos no texto que intitulamos de “Todo dia será como STALINGRADO.”

As manobras desestabilizadoras mais recentes, vem da divulgação de supostas conversações mantidas por Autoridades Públicas que atuam no caso de corrupção de envergadura estarrecedora denominado de LAVA JATO, e nos últimos dias, por meio de retóricas em torno das queimadas na região amazônica.

Mas no dia 27/08/2019, foi desferido novo ato, cujas consequências devastadoras ainda não é possível mensurar, mas certamente serão de proporções bíblicas. Trata-se da decisão proferida pela maioria dos Ministros que integram a 2ª Turma do Supremo Tribunal federal, cuja notícia (ainda não foi disponibilizado o acórdão oficial) é abaixo reproduzida, extraída da página do próprio STF (Disponível em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=421829, acesso em 28 ago 2019):

“...2ª Turma reconhece cerceamento de defesa e anula condenação de ex-presidente da Petrobras: Para a maioria dos ministros da Turma, o juízo de primeiro grau, ao negar pedido da defesa para apresentar alegações finais somente após a manifestação dos corréus colaboradores, causou prejuízo a Aldemir Bendine.

Com o entendimento de que a apresentação das alegações finais de corréus não colaboradores deve se dar após a apresentação do documento por parte dos colaboradores, a maioria dos ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou a condenação do ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no âmbito da Operação Lava-Jato. A decisão foi tomada na sessão desta terça-feira (27) no julgamento de recurso (agravo regimental) no Habeas Corpus (HC) 157627.

O juízo da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba (PR), ao concluir a instrução processual, abriu prazo comum para que os corréus apresentassem suas alegações finais. A defesa do executivo pediu que seu cliente pudesse apresentar sua manifestação após os colaboradores, com o argumento de que a abertura de prazo comum, e não sucessivo, para colaboradores e não colaboradores traria prejuízos a seu cliente. O pedido, no entanto, foi negado.

...

A ministra Cármen Lúcia, que também integrou a corrente vencedora, salientou que o tema é uma novidade no Direito. Para ela, delatores e delatados não estão na mesma condição processual e, portanto, não podem ser tratados de forma igual. Por fim, observou que, da mesma forma que não existe norma específica sobre o tema, também não há nada que impeça o juiz de conceder prazos sucessivos, principalmente porque houve pedido da defesa nesse sentido...”

À toda evidência, por mais que esta decisão tenha sido dada em um processo específico, e por mais que não tenha eficácia vinculante, poderá servir de parâmetro para a anulação de todos os outros processos que envolvem “delações premiadas”. E nos quais não se tenha concedido prazos diferenciados para apresentação de Alegações Finais, aos acusados que tenham celebrado acordo de “delação premiada”, e aqueles que não fizeram nenhum acordo desta espécie.

Se este procedimento (de concessão de prazos diferenciados para acusados delatores e não delatores) é o mais correto ou não, é questão a ser analisada em instância apropriada, e com competência constitucional para legislar em matéria de Direito Processual Penal. No caso, por força de aplicação da Constituição Federal, o Congresso Nacional (CF, art. Art. 22, I), como decorrência da repartição de competências, para que haja o sistema de controle e independência entres os Poderes Republicanos (CF, art. 2°). Posto que o Brasil não se filiou ao sistema do Direito Anglo-Saxônico (“common law”), no qual o Judiciário está habilitado a criar leis, e inovar na ordem jurídica.

Ora, o Código de Processo Penal, ao se referir as “partes” no processo (que litigam entre si), e ao prazo para apresentação de Alegações Finais (fase final da instrução processual que antecede a prolação da sentença), somente faz referência a ACUSAÇÃO e a DEFESA, estabelecendo prazos SUCESSIVOS para a acusação, e depois para a defesa, para que formulem estas razões finais (CPP, art. 403). Não estabelecendo distinção entre os acusados/réus posto que, obviamente, mesmo que atuando em alguma das modalidades de concurso de pessoas (associação criminosa, milícias ou organizações criminosas) podem apresentar defesas contraditórias entre si.

Tanto que, quando estes interesses entre os acusados/réus forem conflitantes, pode caracterizar inclusive crime que um mesmo advogado defenda estes interesses conflitantes simultaneamente (Código Penal, art. 355, parágrafo único: Patrocínio simultâneo ou tergiversação).

Nesta mesma linha de raciocínio, a Lei 12.850 (que dispõe sobre a investigação criminal referente a organizações criminosas), em vigor desde 2013, ao tratar da “colaboração premiada” (arts. 3°, I, e 4° a 7°) em nenhum instante faz qualquer distinção entre investigados/acusados “colaboradores/delatores” e “não colaboradores/delatores.”

Qualquer orientação em sentido contrário, representa inovação legislativa, que precisa passar pelas Casas Legislativas, para que só então possa ser aplicado. Como, ademais, reconhecido pela Min. Carmen Lúcia neste julgamento, conforme trecho da notícia extraída do informativo do STF, acima reproduzido. O que é terminantemente vedado pela Constituição Federal.

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E mesmo que, eventualmente, fosse alterada a legislação para se inserir nas regras legais em vigor esta nova orientação criada pelo STF, na hipótese, não poderia surtir efeitos em situações pretéritas. Posto que o próprio Código de Processo Penal determina que a lei processual, uma vez em vigor, passa a ter aplicação imediata (inclusive sobre os processos em curso). Mas faz a ressalva de que, os atos anteriores praticados devem ser mantidos posto que válidos: Art. 2o A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior.”

Vale dizer, mesmo que supondo que esteja correta esta nova orientação trazida pelo STF acerca de prazos diferenciados para apresentação de alegações finais, a depender de se tratar de acusado colaborador ou não, somente poderia ter validade para os novos atos processuais (alegações finais) a partir desta data. E não de forma retroativa, como se pretende agora.

Até porque, cumpre enfatizar pela relevância que encerra, a lei que regulamentou a “colaboração premiada” está em aplicação desde o ano de 2013, não havendo urgência ou relevância que justifique a aplicação retroativa de entendimentos jurisprudenciais inovadores, firmados agora em 2019.

A respeito disso, também existe expressa previsão legal, admitindo que o STF, se porventura reconhecer a inconstitucionalidade em alguma disposição legal, por questão de segurança jurídica, possa “modular” os efeitos de sua decisão, de maneira a que se produza efeitos a partir de então (Lei n° 9.868/99, art. 27):

Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.

Portanto, o que se espera da Suprema Corte da Nação, é que cumpra sua missão republicana, dentro de suas funções institucionais jurisdicionais (e não legislativas), e aplique os comandos legais em vigor. E, se porventura identificar alguma inconstitucionalidade, por questões de segurança jurídica (e tendo em consideração o já longo período de vigência da normatização questionada), estipule que o novo preceito judicial somente se aplique aos casos futuros.

Vedando sua aplicação retroativa, o que traria verdadeiro caos processual, e descrença nas instituições julgadoras, e preocupantes reflexos em um contexto social já demasiadamente conturbado. Especialmente no que se refere ao combate a corrupção no setor público, como é o caso da Operação Lava Jato.

Sobre o autor
Sérgio de Oliveira Netto

Procurador Federal. Mestre em Direito Internacional (Master of Law), com concentração na área de Direitos Humanos, pela American University – Washington College of Law. Especialista em Direito Civil e Processo Civil. Professor do Curso de Direito da Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE (SC).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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