Resenhas críticas da unidade "Leviatã em perspectiva no Paradigma do Estado Social - As visões de alguns intérpretes do Brasil"

30/08/2019 às 11:59
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Resenhas críticas a partir das obras "A Organização Nacional: Primeira Parte, a Constituição", de Alberto Torres, "Raízes do Brasil", de Sérgio B. de Holanda, e "Coronelismo, enxada e voto", de Victor N. Leal

1. Resenha crítica a partir da seguinte bibliografia: 

TORRES, Alberto. A Organização Nacional: Primeira parte, A Constituição. 3 ed. São Paulo: Ed. Nacional, 1978, p. 71-78; p. 87-92; p. 114-135; p. 151-173. 

 

Primeiramente, Alberto Torres pontua que as ideias típicas das revoluções liberais, como a separação de poderes, a representação popular, a democracia representativa e o sistema de freios e contrapesos, formalmente incorporados à Constituição de 1981, foram como uma cópia transplantada da Constituição Americana para o Brasil. Entretanto, essa incorporação foi somente formal, no texto constitucional, sem coincidir com a realidade brasileira.  

A partir dessa dicotomia, Torres critica a falta de correspondência entre o Brasil “no papel” e o Brasil real. Um dos pontos de sua crítica se vale do fato de ter sido o Brasil uma colônia de exploração da Coroa Portuguesa. Assim, Torres afirma que esse processo de colonização contribuiu definitivamente para a formação de uma cultura de administração patrimonialista – até mesmo com a formação de uma estrutura burocrática na Administração Pública brasileira, não se veem nela os ideias weberianos, mas práticas notadamente patrimonialistas, como o nepotismo e a corrupção. 

Além disso, a exploração também contribuiu para uma economia centrada em monopólios, os quais se baseiam em troca de favores. Esse tipo de monopolização culminava numa economia não geradora de capital. 

Em seus pressupostos, Torres revela uma visão organicista da sociedade, a partir da qual a sociedade é vista como um corpo, cuja cabeça é o Estado. Para os problemas da sociedade brasileira, Torres propõe um Estado-cabeça forte, para administrar o Brasil e enfim levá-lo ao progresso.  

Especificamente quanto à apreciação de Torres a respeito de Silvo Romero, compartilha com este a recuperação do elemento geográfico (a ideia do meio como influenciador da formação sociopolítica da nação), a preocupação para com a formação da sociedade brasileira e, por fim, conforme citado anteriormente, a divergência entre o Brasil na Constituição e o Brasil real, entre o Brasil garantista de direitos e o como isso se dá na prática cotidiana. 

Ainda sobre Silvo Romero, Torres diverge deste no aspecto racial da formação do país, pois Torres é contra a entrada de imigrantes no Brasil, pois vê essa entrada, numa perspectiva institucional, como algo que atrapalharia a formação de uma nação brasileira. Romero, por sua vez, via a mestiçagem racial como intrínseco à identidade nacional, porém defendia um branqueamento da nação em busca do progresso, isto é, acredita que, para atingir o progresso, a etnia branca deve estar à frente das demais. 

 

2. Resenha crítica a partir da seguinte bibliografia: 

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. Capítulos 5 e 6.  P. 139-167. 

Inicialmente, cabe pontuar que Sérgio Buarque possui uma intersecção com muitas categorias weberianas, especialmente quanto aos “tipos ideais”, desenvolvendo-os, por sua vez, a partir de pares conceituais, com análises comparativas, que apresentam uma dialética ao longo de sua obra.  

O conceito mais célebre produzido por Sérgio Buarque é o de “homem cordial”, traduzido na linguagem comum como “o jeitinho brasileiro”. O homem cordial é aquele cujo paradigma das relações sociais e políticas, do Estado e da Administração Pública é como uma extensão do seu patrimônio e do de sua família. O âmbito público é visto, então, como extensão no âmbito privado, o que causa uma confusão na delimitação desses âmbitos. 

O homem cordial é o principal agente, ativo e passivo, do patrimonialismo, perpetuando-o nas mais diversas relações sociais brasileiras. No patrimonialismo, não há uma distinção clara entre o que é público e o que é privado, entre individual e coletivo.  

O patrimonialismo é característica geral intrínseca de sociedades pré-capitalistas e pré-democráticas, e pode muito bem ser um dos motivos para a dificuldade do estabelecimento de uma economia e de uma democracia liberais durante todo o século XX no Brasil.  

Suas principais características é a de um soberano que toma os bens públicos como extensão de seu patrimônio, dando lugar à corrupção e ao nepotismo. É também sinal de uma democracia fraca. Além disso, notoriamente em Estados patrimonialistas não se encontra uma preocupação com o controle da Administração Pública. 

Na especificidade brasileira, não é patrimonialista somente o soberano e seus familiares. Sérgio Buarque de Holanda expõe o homem cordial como uma figura comum das mais diversas classes brasileiras: aquele que atinge o poder, independentemente de onde veio, se estiver figurado como homem cordial, estenderá os bens públicos como se seus fossem.  

 

3. Resenha crítica a partir da seguinte bibliografia: 

LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. 7ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. Capítulo 1. P. 43-74. 

Victor Nunes Leal, em sua obra, possui cinco importantes inovações, a partir do que expõe José Murilo de Carvalho. As inovações são a) ver o coronelismo como um sistema; b) superação das dualidades; c) ter um objeto definido; e, por fim, d) análise empírica. 

Essas inovações fazem da obra de Nunes Leal uma obra atípica para sua época, quiçá à frente de seu tempo. A primeira inovação trata de compreender o coronelismo especificamente como um sistema, e não como uma manifestação isolada. O autor demonstra perceber a infiltração do coronelismo nas mais diferentes esferas da sociedade, indo desde fenômenos locais até a Administração Pública Federal. Dessa forma, começa-se a perder no Brasil uma ingenuidade para com esse sistema.  

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Quanto à superação de dualidades, diferentemente de Sérgio Buarque de Holanda, Euclides da Cunha e outros autores, Nunes Leal faz uma análise mais centra na multidisciplinariedade, sem necessariamente recorrer a dualismos para explicar fenômenos. Assim, apesar de possuir um objeto definido, sua obra procura estar de acordo com diversas manifestações políticas, econômicas e jurídicas, e não na produção de um conhecimento setorizado, que se encaixasse especificamente no paradigma de uma área científica em especial. 

O objetivo definido é uma das mais importantes inovações. Diferentemente de obras generalistas, globais, de objetivo continental, Nunes Leal põe em relevo o centro ao redor do qual orbita a sua produção intelectual: o coronelismo conforme se deu durante a República Velha.  

Por fim, a análise empírica, sua última inovação a ser apontada por Murilo de Carvalho no prefácio à 7ª edição de sua obra, consiste no fato de Nunes Leal estribar-se num senso de 1940 para analisar a conformação da concentração de propriedade no Brasil, a porcentagem da população brasileira pertencente a uma determinada classe, número de votantes, utiliza estatísticas para discorrer sobre a reforma agrária, etc, o que enriquece bastante sua obra, pois adere a ela um rigor científico, estando notadamente baseada em dados empíricos, e não somente em reflexões e observações unilaterais do meio social. 

Sobre o autor
Gabriel Teles Pontes

Bacharel em Direito e Técnico-Administrativo em Educação na Universidade de Brasília (UnB).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Resenhas críticas desenvolvidas como requisito parcial para a aprovação na disciplina Sociologia Jurídica, da Universidade de Brasília (UnB), no segundo semestre de 2018, ministrada pelo prof. me. Mateus Rocha Tomaz, referentes à unidade "Leviatã em perspectiva no Paradigma do Estado Social - As visões de alguns intérpretes do Brasil".

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