A jurisprudência, em sua essência, não constitui fonte direta e imediata do direito obrigacional

30/08/2019 às 12:28
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Ensaio acadêmico, a respeito da jurisprudência em relação às fontes do direito obrigacional, elaborado na disciplina Direito das Obrigações, da Universidade de Brasília (UnB), no primeiro semestre de 2019, ministrada pelo prof. Fellipe Borges Dias.

RESUMO

Diversas são as fontes diretas do Direito das Obrigações, compreendidas como as capazes de gerar direta e imediatamente obrigações. Indaga-se sobre a ser ou não a jurisprudência uma dessas fontes. Entende-se aqui que esta não essencialmente não o é, por se tratar de uma orientação para decisões judiciais, influenciando apenas indiretamente a criação de obrigações.

 

INTRODUÇÃO

É doutrinariamente pacificado que as fontes do Direito são a lei, a jurisprudência, a doutrina e os costumes. No entanto, indaga-se se a jurisprudência, em especial, constituiria ou não fonte direta e imediata do ramo do direito privado denominado Direito das Obrigações. Entende-se aqui que esta, em sua essência, não é fonte desse ramo jurídico, por se tratar de uma orientação para a decisão judicial, especialmente a do tipo constitutivo.

 

1. FONTES DAS OBRIGAÇÕES:

Segundo o vigente Código de Civil, três são as fontes diretas do Direito das Obrigações:

a) Contratos, sendo a principal fonte; b) Atos unilaterais; e c) Atos ilícitos. Na doutrina, encontram-se critérios mais abrangentes, como o de Silvio Rodrigues¹: a) Obrigações por força da vontade humana: provenientes dos contratos e das manifestações unilaterais de vontade; b) Obrigações que têm por fonte imediata o ato ilícito: derivam de um comportamento humano gerador de dano a outrem; e c) Obrigações que têm por fonte direta e imediata a lei.

Entretanto, as fontes acima elencadas não esgotam as fontes diretas geradoras de obrigações. Estas, por exemplo, podem ser imediatamente criadas através da atividade judicial, por meio das decisões judiciais constitutivas, como se observa no seguinte fragmento de texto:

Regra geral, as decisões judiciais declaram a preexistência de relações jurídicas anteriores à sua prolação, não sendo fonte imediata de obrigações, mas a declaração de sua certeza [...]. Ao contrário, a decisão  constitutiva   criará   uma   situação  nova,   ou   seja, novas obrigações que não são resultantes diretamente da lei, da vontade das partes e, muitas vezes, independente de ato ilícito.²

 

2. ORIENTAÇÕES:

Não obstante, há uma corrente proeminente no direito contemporâneo de integralização do ordenamento jurídico, cuja “tendência está na dinamização do ordenamento jurídico como complexo uno de correlações, não sendo minimizado por princípios específicos, devendo ocorrer a necessária integração de normas e princípios”³.

Por sua vez, tal tendência entrega a fontes não primárias do Direito papéis mais intensos, numa construção de equivalência entre as fontes. Nesse ínterim, ganha mais força a jurisprudência. No tocante às obrigações, entretanto, não se pode confundir decisões judiciais do que se denomina jurisprudência.

 

3. DECISÕES JUDICIAIS E A JURISPRUDÊNCIA:

A diferença está essencialmente no fato de que as decisões judiciais constitutivas oferecem solução a uma lide específica e determinada. Um conjunto de decisões judiciais, por seu turno, constitui a jurisprudência, que por vezes pode se tornar pacificada e gerar uma expectativa de decisão semelhante quando da busca por solução favorável no Judiciário. Sem embargo, esta expectativa não é vinculante, não cria por si só a obrigação que só será gerada no momento em que entrar em ação a decisão judicial.

 

4. CONCLUSÃO - A JURISPRUDÊNCIA NÃO É FONTE DO DIREITO OBRIGACIONAL

A jurisprudência, portanto, não cria nem inova no Direito das Obrigações, ainda que aponte rumos, fundamentos para a decisão judicial – nesse mesmo raciocínio, também não se coloca a doutrina como fonte de obrigações, pois esta tem caráter meramente fundador de balizas para a atividade legislativa e jurisprudencial.

Nada obstante, há uma espécie específica na jurisprudência denominada súmula vinculante4 , que está prevista no art. 103-A da Constituição Federal de 1988 e, por força de seu § 3º, contra qualquer ato administrativo ou decisão judicial que o contrarie caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Em decorrência do texto constitucional, uma decisão judicial constitutiva de obrigação que contrarie súmula vinculante será passível de contestação mediante reclamação ao STF. Ainda assim, apenas o fato de existir essa possibilidade de reclamação não faz com que se crie, direta e imediatamente, uma obrigação, mesmo que se observe na natureza jurídica de uma súmula vinculante a força de lei.

 

1. BOCCHI, Olsen Henrique. Fontes do Direito Obrigacional: um paralelo com as fontes       do        Direito.        Publicado       em        11/2011.       Disponível                  em:

<https://jus.com.br/artigos/2411/fontes-do-direito-obrigacional>. Acesso em: 24 de abril de 2019.

2. Op. cit.

3. Op. cit.

4. MARQUES, Gabriel. O que é uma súmula vinculante? Publicado em 2015. Disponível em: <https://gabrielmarques.jusbrasil.com.br/artigos/221414850/o-que-e- uma-sumula-vinculante>. Acesso em: 24 de abril de 2019.

 

Demais referências bibliográficas:

AGUIAR, Igor Nóbrega. Fontes do Direito Obrigacional. Publicado em 01 de novembro de 2004. Disponível em: <https://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/artigo/398/fontes- direito-obrigacional>. Acesso em: 24 de abril de 2019.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Teoria Geral das Obrigações. Editora Saraiva. 17ª edição. São Paulo, 2017.

Sobre o autor
Gabriel Teles Pontes

Bacharel em Direito e Técnico-Administrativo em Educação na Universidade de Brasília (UnB).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Ensaio acadêmico elaborado como requisito parcial para aprovação na disciplina Direito das Obrigações, da Universidade de Brasília (UnB), no primeiro semestre de 2019, ministrada pelo prof. Fellipe Borges Dias.

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