PLANOS DE SAÚDE SÃO OBRIGADOS A CONCEDER TRATAMENTO A CRIANÇAS COM AUTISMO

01/09/2019 às 12:30
Leia nesta página:

O entendimento do Poder Judiciário sobre as constantes negativas dos planos de saúde em conceder tratamento aos pacientes

 

No decorrer dos anos na advocacia, várias vezes nos deparamos com negativas de acesso a tratamentos, terapias e medicamentos pelas operadoras de saúde aos pacientes.

Na maioria dos casos, a negativa ocorre porque o tratamento não consta no rol da ANS ou porque possui natureza experimental.

Nessa situação, a liberação do tratamento ou entrega do medicamento somente ocorre com ordem judicial, ou seja, o interessado precisa iniciar uma ação judicial obter seu direito.

As crianças diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), dependendo do grau que possuírem (leve, moderado e grave), podem apresentar “dificuldades acentuadas no comportamento, interação social, comunicação e sensibilidades sensoriais (...) Interesses intensos ou híper foco; Movimentos corporais estereotipados e repetitivos, tais como agitar as mãos; Manipulação repetitiva de objetos, tais como ligar e desligar ou alinhar brinquedos; Insistência em aderir a rotinas, tais passar sempre pelo mesmo lugar e fazer as coisas exatamente na mesma ordem a cada vez; Interesses sensoriais incomuns, como cheirar objetos ou olhar atentamente para objetos em movimento; Sensibilidades sensoriais, incluindo a evitação de sons do cotidiano e texturas, como secadores de cabelo, aspiradores de pó e areia; Deficiência intelectual ou dificuldades de aprendizagem”[1]

A lei n. 12.764/12, que instituiu a POLÍTICA NACIONAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS DA PESSOA COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA, prevê em seus artigos 2°, III e 3°, III, “b” a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com autismo.

Em geral, o tratamento multidisciplinar (Terapia ABA) é a recomendação mais frequente para crianças autistas e, embora costumeiramente negada pelas operadoras de saúde, sob o argumento de que a terapia não consta do rol de procedimentos da ANS, os juízes têm comumente afastado o argumento e garantido o tratamento aos pacientes, como se observa dos julgados abaixo:

PLANO DE SAÚDE –  AUTOR PORTADOR DE AUTISMO –  NECESSIDADE DE TRATAMENTO COM TERAPIA DENOMINADA "ABA" –  NEGATIVA SOB A ALEGAÇÃO DE QUE O TRATAMENTO NÃO POSSUI COBERTURA CONTRATUAL –  ABUSIVIDADE –  CABE AO MÉDICO ESPECIALISTA ELEGER O TRATAMENTO MAIS CONVENIENTE AO PACIENTE E NÃO AO PLANO DE SAÚDE –  SESSÕES DE TERAPIAS ILIMITADAS, ATÉ DISPENSA MÉDICA –  REEMBOLSO INTEGRAL, ANTE A IMPOSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO DO TRATAMENTO PRESCRITO DENTRO DA REDE REFERENCIADA –  SENTENÇA MANTIDA –  RECURSO NÃO PROVIDO. (TJSP - ACÓRDÃO APELAÇÃO  1022340-19.2017.8.26.0100, RELATOR(A): DES. LUIS MARIO GALBETTI, DATA DE JULGAMENTO: 14/08/2018, DATA DE PUBLICAÇÃO: 14/08/2018, 7ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE SAÚDE. DIREITO DO CONSUMIDOR. TUTELA ANTECIPADA INDEFERIDA. RECUSA EM AUTORIZAR O TRATAMENTO MÉDICO. PACIENTE COM 11 ANOS DE IDADE E DIAGNÓSTICO DE MÁ-FORMAÇÃO CONGÊNITA QUE CAUSA ATRASO GLOBAL NO DESENVOLVIMENTO NEUROPSICOMOTOR. INDICAÇÃO DE FISIOTERAPIA COM O MÉTODO BOBATH, TERAPIA OCUPACIONAL, PSICOMOTRICIDADE, HIDROTERAPIA, MUSICOTERAPIA, EQUOTERAPIA, TERAPIA ABA E PSICOLOGIA COMPORTAMENTAL ABA. RECUSA FUNDADA NA AUSÊNCIA DE COBERTURA ILIMITADA PARA TODAS AS TERAPIAS E AUSÊNCIA DE COBERTURA DOS MÉTODOS INDICADOS QUE NÃO CONSTAM NO ROL DE PROCEDIMENTOS DA ANS. LAUDO MÉDICO QUE ATESTA A NECESSIDADE DA TERAPIA MULTIDISCIPLINAR. PREVALÊNCIA DA INDICAÇÃO MÉDICA ESPECÍFICA. INTELIGÊNCIA DOS ENUNCIADOS SUMULARES Nº 211 E 340 DO TJRJ. PRESENTES OS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA. PROVIMENTO DO RECURSO. (TJRJ - ACÓRDÃO AGRAVO DE INSTRUMENTO 0011169-52.2018.8.19.0000, RELATOR(A): DES. CLÁUDIA TELLES DE MENEZES, DATA DE JULGAMENTO: 11/09/2018, DATA DE PUBLICAÇÃO: 11/09/2018, 5ª CÂMARA CÍVEL)

As súmulas expedidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo podem servir como fundamento para cobertura de procedimentos a pacientes de todo o país:

Súmula 96: “Havendo expressa indicação médica de exames associados a enfermidade coberta pelo contrato, não prevalece a negativa de cobertura do procedimento.”

Súmula 102: “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.”

Ao contrário do que se pensa, a determinação do Juiz, obrigando a operadora a conceder o tratamento, pode vir em poucos dias, desde que o advogado escolhido pelo paciente (preferencialmente um especialista) elabore um pedido liminar na ação.

 


[1] FONTES, Maria Alice. Disponível em http://plenamente.com.br/artigo.php?FhIdArtigo=207 .

Sobre o autor
Gustavo Tuller

Membro dos escritórios Tuller Freitas Advocacia, em Curitiba/PR, e Takahashi Advogados, em Cornélio Procópio/PR. Graduado pela PUC/PR em 2009, especialista em Direito Público pela UniBrasil. Atuante em processos disciplinares da OAB desde o ano de 2011, em via administrativa e judicial. Contato: [email protected]

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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