Sabe-se que o modelo da república romana serviu de base para o que conhecemos hoje como administração pública. Ou seja, o sistema político-jurídico dessa antiga civilização fomentou a concepção atual inserido no Direito Administrativo. Administrar os bens da sociedade de forma que satisfaça as suas necessidades. As catilinárias de Cícero representam o discurso da insatisfação de um membro do Senado romano, tendo em vista, o desvio moral do senador Catalina que almejava satisfazer os seus desejos pessoais utilizando do bem público. Sua ambição se agregou de tal forma, a ponto da cogitação de levantes e revoltas comprometedoras ao desenvolvimento social e institucional de Roma. Como bem destacou as pesquisadoras Michelly Cordão e Marinalva Lima:
”O Catilina de Cícero' representa a corrupção dos costumes tradicionais, visto ser desprovido de uma moral privada e pública. Os interesses particulares teriam norteado seus planos em promover uma conjuração contra Roma, já que, após ser derrotado por seguidas vezes nas eleições consulares, o romano teria se disposto a construir planos desconectados com as leis e os costumes romanos, a fim de tornar concretas suas idealizações pessoais no campo da política.”
Todavia, os planos de Catalina foram frustrados pois suas intenções foram reveladas dentro do próprio Senado. Cícero, não obstante pela revolta que cercava o seu interior, resolve discursar com exímio habilidade e firmeza realizando acusações ao senador Catalina. A frase mais famosa das catilinárias é: Qvsque tandem abvtere, Catilina, patientia nostra? (Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência?). Até os dias de hoje, notamos muitos políticos se apartarem da finalidade de sua profissão, a saber, representar os anseios do povo. Assim como nas antigas civilizações, hoje não é diferente. Observamos nossos representantes usando a máquina pública como fonte de prosperidade econômica pessoal. A insatisfação de Cícero nos remete ao que o jurista Rui Barbosa abordou, a respeito da falta do cumprimento do dever moral que atinge os parlamentares nos dias de hoje:
“De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.”
Sendo assim, o que deveria ser um trabalho honroso, representar o cidadão, acaba por torna-se disputas políticas onde o interesse maior se resume na da hegemonia do mandato. Assim, ações são realizadas com a intenção de se perpetuarem no poder. Fazendo o que for necessário mesmo não havendo moralidade, quando não legalidade. No entanto, o discurso de Cícero descreve o fim no qual se destina aquele que conspira contra a República:
“Sendo assim, prossegue, Catilina, o caminho encetado; sai da cidade de uma vez para sempre; as portas estão abertas; põe-te a caminho. Há muito que te reclamam como general supremo esses teus acampamentos manlianos. Leva também contigo todos os teus; se não todos, pelo menos o maior número possível. Limpa a cidade. Libertar-me-ás de um grande receio quando entre ti e mim um muro se levantar. Já não podes conviver por mais tempo conosco; não o suporto, não o tolero, não o consinto.
Então, não se admite no convívio social a presença de alguém, que deseja se beneficiar a custa de outrem. No discurso supracitado a consequência é a expulsão dos conspiradores. Tal raciocínio se enquadra no sistema político brasileiro, como bem pontuou na filosofia da origem do estado em Rousseau, o povo é o que dá sustentação ao Estado, sendo assim, aqueles que não sabem servi-lo não é digno de administrá-lo.