O DIREITO E A JUSTIÇA

Almas gêmeas do nosso calvário

27/09/2019 às 20:34
Leia nesta página:

O Direito é reto, uma linha reta para o correto - ou não é Direito, é antidireito.

Quando se mitiga o direito interposto, impõem-se um dever impostor.
 Quando se viola o princípio da inocência, institui-se a subsunção da Justiça, agora se elevando como injustiça programada.
 Em tempos sombrios, de caça às bruxas, o mínimo direito fundamental (sic) é a querela do aprisionamento ao fatalismo, ao apressamento por resultados que apenas devem “nos servir”, satisfazendo-nos do sangue alheio.
 Em tempos sombrios, o Direito Ocidental queda-se na aventura de quem busca a satisfação pessoal, atado à vontade egóica, à incompreensão sistêmica processual que deve gerir o Direito eivado do espaço público.
Não há continência de sociabilidade sem isto. Na incontinência de qualquer atestado de responsabilidade, mais ainda na forma do crime de responsabilidade ou desídia procedimental, observa-se a responsabilização de quem acusa sem menção factual.
 Onde não existe o Direito, por óbvio, reina o temperamento. Entretanto, onde não prospera o Direito também se frutifica do ódio e da acusação sem libelo acusatório. Como ensinam Kafka, no Processo, e Goethe (n´O Fausto), “de quem meu bom direito, exijo”? Mefistófeles que não irá, obviamente, socorrer o Senhor K.
Onde restam acusações indiciárias, incendiárias, sem base material, não há outra coisa a esperar da calúnia, da suposição, da vontade do “meu-querer” – mesmo não sendo-aí que exista.
 Onde restam delações sem formalização de quem acusa, sem que se nomeie os bois, e muito menos se identifiquem quaisquer vítimas – e, obviamente, sem tipificação penal de qualquer grave delito –, já se enterraram os Princípios Gerais do Direito.
Ensinam os romanos que, somente podem ser-aí, como quem “vive honestamente”, aqueles que contribuem para “que se dê a cada um, o que é seu”.
 Pois bem, que assim se dê, a cada um de acordo com sua culpa ou de acordo com a benevolência dos inocentes.
E quem fará isso?
Principalmente se não nomeie indiciado o acusado, sem que haja sombra do acusador, sem que a vítima apresente os laudos de violação de seus direitos, quem fará a Justiça? Deus, a Ideologia, o meu querer, ou o mal querer?
Afinal, como saber o que é real, sem as sombrias sombras da “pós-verdade”, se não sabemos quem fez o que, contra quem, quando, nem como ou onde?
 Como atestar o erro coletivo, massivo, se não me resigno a apresentar sequer uma “evidência” – para não se bater em provas, porque aí seria esperar demais –, sem que se consiga escapar do “achismo”?
 Como assevera um dos mais antigos provérbios do Direito, “dê-me os fatos, que te darei o direito”. Ou seria um ideal pequeno-burguês da Justiça já impraticável no século XXI? Basta o compartilhamento fractal da vontade e da inclinação acusatória?
Repita-se, em que monumento do sistema racional – que nos engloba na vida conceitual – estão descritos os fatos delituosos que agora se enunciam, quem os praticou, contra quem?
Onde está o registro, no diz que foi assim, no disque-me-disque ou no Disque Denúncia apropriado?
Que se saiba, objetivamente, sem Ouvidoria que aconselhe o caminho regular da denúncia, em havendo Autonomia, sem Auditoria, somos todos vitimados pela Autocracia – seja ela verde e amarela, avermelhada, anarco-capitalista ou capitalizada pela maldade.
Cuidado com os danos morais, peso moral que incorre a quem acusa sem sustentação formal...sem comprovação.
 A perambularmos nessa trilha, inverteremos o óbvio, neste caso o ônus da prova, e em dois lados – um já em colapso total.
Vejamos:
1. O já colapsado direito mínimo diz ao acusado que deve provar sua inocência (e, pior, sem ter acusação formal);
2. Menos augusto, mas não totalmente colapsado, quer impor-se um dever coletivo, em que todos façam “mea culpa” diante de injustiçados, porém, sem que se saiba quem são e que injustiças sofreram.
Meia justiça nos basta, assim mesmo minúscula? Satisfaz-se a sanha, ainda que com a senha mais injusta?
 Afinal, quem são os algozes?
A vaidade, o ciúme, o fato concreto (mas, qual?), o real acusado (quem é o abusador dos direitos?), o crime hediondo (contra quem?), o Processo de Kafka que se prolonga há dois anos, ou a ação de Javert contra qualquer Victor Hugo e seus desafortunados Miseráveis? (Os tais que se alimentam das sobras de um sistema que vitima a condição humana...).
 Senhoras e senhores, em tempos hostis (de hostilização, de hostis), não é possível ceder ao chamado “morolismo”, em que é insustentável a moderação, a ponderação, a juris prudentia (o direito prudente), porque ficaríamos cegos pela mera afirmação.
Em qual democracia não há confirmação do crime praticado, subtraindo-se a acusação formal para que se pratique o Princípio do Contraditório?
 No mais, não há racionalidade sem materialidade alguma; não há ciência que se mantenha digna de seu nome, sobretudo como Ciência do Direito, sem uma consciência dos fatos. Não há ciência sem que se forme o concreto-pensado.
E onde está isso se não se conhece da autoria e da materialidade, ou seja, onde está o registro de quem fez o que, contra não sei quem? Não há Justiça sem que se reconheça o Direito. Também não há Direito sem que se reconheça a Justiça, ou pelo menos a vontade dela. Não há ideal, sem o real.
A Justiça é o reto (“directum”: um direito direto, em linha reta, ou seja, a menor distância para o correto), um desígnio ao qual não se permite um desvio ou a escolha pessoal, muito menos é a conformação da decisão da maioria.
Uma democracia em que se permita ceder à pressão da maioria e, assim, eliminar as minorias não se compatibiliza com a Justiça, e o Direto que garante essa dominação se torna em aparelho de violência.

 Ou nos dirijamos à aplicação do Direito (como instrumento cego da Justiça), a saber, “o que não está nos autos, não está no mundo”, ou, sem nenhuma base empírica sustentável (sem que se comprove o afirmado categoricamente), apenas informalmente formaremos uma tão-somente convicção como opinião.
E é fato “uLulante” que assim não se faz Justiça, posto que só se institui uma opinião pública partidarizada. O Direito não brota das chicanas, da voz rouca das ruas, e sim do bom senso, da Política pactuada pelo sentido do Bom e do Justo. O Direito, por fim, cabe dizer, não é uma peça publicitária.
Finalmente, indaga-se, qual Justiça deverá ser ensinada aos graduandos de Direito, aquela pautada na moralidade, na ética, nos ditames constitucionais, ou aquela Justiça esculpida pela conveniência, pelo precário moralismo, pela falsa política empregada nos dias atuais; enfim, seremos expulsos como impolutos seres da Polis pelo simples prazer em se fazer justiciamento pelas próprias mãos?
O Direito não é servido na bandeja da Mandrágora, ainda que astuciosamente bem travestida.
Autoria de Representação

Vinício Carrilho Martinez (OAB/108390)
Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito
Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar
Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH
Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar

Alan Victor Pimenta de Almeira Pales Costa
Ex-Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar
Professor Adjunto IV da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
Departamento de Educação- Ded/CECH
Programa de Pós-Graduação em Educação/PPGE/UFSCar


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Doutor em Ciência Política (UFRGS). Atua na área de Ciência Política.
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Doutorando no PPGCTS, da UFSCar. Advogado
Especialista em direito processual civil pela Rede Anhanguera/UNIDERP

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Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da UFSCar (PPGCAm/UFSCar)

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Bacharel em Direito
Doutorando em Engenharia Urbana da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar
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Jornalista e advogada com Pós-Graduação em Direito Público.
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Bacharel em Administração de Empresas
Licenciatura em Língua Portuguesa, inglês e Literatura
Pós-Graduação em Língua Portuguesa
Professora na Rede Pública de Ensino/MG

Sobre o autor
Vinício Carrilho Martinez

Pós-Doutor em Ciência Política e em Direito. Coordenador do Curso de Licenciatura em Pedagogia, da UFSCar. Professor Associado II da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Departamento de Educação- Ded/CECH. Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade/PPGCTS/UFSCar Head of BRaS Research Group – Constitucional Studies and BRaS Academic Committee Member. Advogado (OAB/108390).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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