A DELEGAÇÃO LEGISLATIVA COMO INSTRUMENTO DA ECONOMIA

17/10/2019 às 09:50
Leia nesta página:

O ARTIGO ESTUDA A QUESTÃO DA DELEGAÇÃO LEGISLATIVA DIANTE DE PROPOSTAS ECONÔMICAS.

A DELEGAÇÃO LEGISLATIVA COMO INSTRUMENTO DA ECONOMIA

 

Rogério Tadeu Romano

 

No Brasil, lei delegada (vide artigos 59, IV e 68 da Constituição brasileira de 1988) é um ato normativo elaborado pelo chefe do Poder Executivo no âmbito federal, com a solicitação ao Congresso Nacional (art. 68, caput, Constituição Federal 1988), relatando o assunto que se irá legislar. O chefe do executivo solicita a autorização, e o poder legislativo fixa o conteúdo e os termos de seu exercício, tudo por meio de resolução legislativa. Depois de criada a lei pelo chefe do executivo, ela é remetida ao legislativo para avaliação e aprovação. Considerando que os limites foram respeitados e que a lei é conveniente, o legislativo a aprova, contudo, essa norma entra no sistema jurídico na qualidade de lei ordinária. As leis delegadas não admitem emendas.

Atualmente temos apenas 13 leis delegadas. A última foi editada em 1992.

Falando sobre um projeto desenvolvimentista para o Brasil, Delfin Neto(Folha de São Paulo, edição de 16 de outubro de 2019) aludiu que o  Brasil precisa aprovar no Congresso uma boa Lei Delegada (Art. 68 da Constituição de 1988), que torne expeditas as medidas necessárias para realizar esses objetivos.

Disse ele então:

“Nosso grave problema é como criar mecanismos para acelerar os leilões de algumas dúzias de projetos de infraestrutura, as parcerias público-privadas e as privatizações. Não há nem interna, nem externamente, restrições para financiá-los, porque têm altas taxas de retorno num mundo complicado e com taxas de juros reais negativas.”

Sabe-se que a delegação legislativa opera-se por meio de Resolução do Congresso Nacional. Durante a vigência do regime parlamentarista, sob a Constituição de 1946, as delegações legislativas operavam-se por meio de decretos legislativos. As Constituições de 1967 e 1969, assim como a atual, exigiram a resolução que, no sistema constitucional brasileiro, são verdadeiras leis, posto que constituem atos legislativos formais.

Na Alemanha, alguns autores pretenderam que a lei de autonomia(em nosso caso a resolução) não constitui lei material, mas apenas lei formal. É lei em face de forma emprestada. Mas não é lei no sentido material, já que não veicula verdadeiras normas jurídicas(genéricas e abstratas); a lei de autorização produziria efeitos meramente internos, não incidindo na esfera jurídica dos cidadãos. Se não incide de modo direto acaba por incidir de modo indireto após a edição da lei delegada.

A resolução deve especificar o conteúdo da delegação e os termos do seu exercício. Para Pontes de Miranda(Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda n. 1 de 1969, tomo III, 1970, pág. 139), o prazo pode ser um só, como podem ser dois ou mais os prazos, com especial referência a cada conteúdo.

O ato de delegação, então, ensinou Pontes de Miranda, autoriza o presidente da República a exercer temporária e limitadamente a função legiferante. Não pode o Legislativo conceder plenos poderes ao presidente da República. O sistema constitucional brasileiro não se compadece com a outorga de plenos poderes ao Executivo. Daí porque a questão da limitação da autoridade delegada está com base da moderna doutrina acerca da delegabilidade dos poderes constituídos, que exige a fixação de standards precisos, sem o que a delegação importa em abdicação da função. Dir-se-ia que, além do mais, se a atribuição de poder legislativo for de tal sorte abrangente e indeterminada, a ponto de o próprio Congresso ou o Poder Judiciário carecerem de parâmetros para apreciarem a legalidade da resolução padecerão de vício irremediável de inconstitucionalidade.

A lei delegada é elencada entre as hipóteses normativas primárias, do que se lê do artigo 59, IV, da Constituição.

Compete ao presidente da República solicitar a delegação. Veja-se a leitura do artigo 68 da Constituição Federal:

Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.

    § 1º Não serão objeto de delegação os atos de competência exclusiva do Congresso Nacional, os de competência privativa da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, a matéria reservada à lei complementar, nem a legislação sobre:

        I -  organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;

        II -  nacionalidade, cidadania, direitos individuais, políticos e eleitorais;

        III -  planos plurianuais, diretrizes orçamentárias e orçamentos.

    § 2º A delegação ao Presidente da República terá a forma de resolução do Congresso Nacional, que especificará seu conteúdo e os termos de seu exercício.

    § 3º Se a resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará em votação única, vedada qualquer emenda.

Descabe a delegação sem prévio requerimento presidencial.

Qualquer delegação não solicitada pode configurar interferência indevida do Legislativo na esfera de atribuição do Executivo, ofendendo ao princípio da separação dos poderes.

Porém o  Legislativo não pode obrigar o presidente da República a legislar.

Cabe somente ao presidente da República, chefe do Executivo, elaborar a lei delegada.

Logo, não há lei delegada elaborada por ministro de Estado. Cabe ao presidente da República a competência privativa na matéria.

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Inclusive porque a delegação legislativa não comporta subdelegação, ou seja, a transmissão a terceiro da atribuição de elaborar a lei delegada.

Aprovada a resolução autorizadora, cuja promulgação será determinada pelo presidente do Senado Federal(na condição de presidente do Congresso Nacional – artigo 57, § 5º da CF), cabe a edição da lei delegada, na medida em que obedecidos os princípios e o prazo no ato de delegação fixados.

A resolução autorizadora pode ou não determinar a apreciação do projeto de lei delegada pelo Congresso Nacional, que, neste caso, o fará em votação única, vedada qualquer emenda(artigo 68, § 3º, da CF).

Mas se a resolução não determinar a apreciação pelo Congresso compete ao presidente unicamente editar a lei delegada. Como não haveria necessidade de sanção, o presidente da República promulga o ato legislativo, providenciando a sua publicação.

Exigida, porém, pela resolução, a apreciação do Congresso Nacional, cabe ao presidente elaborar projeto de lei delegada, e submetê-lo à análise do Congresso Nacional. Este aprova ou não o projeto, em votação única, sem a possibilidade de emenda-lo.

Ensinou, a propósito, Michel Temer(Elementos de direito constitucional, 5ª edição, pág. 163) que ‘não se veta o projeto de lei delegada. É ilógico pensar-se que o presidente vetaria aquilo que ele próprio elaborou”. Compete, neste caso, ao presidente da República, não mais do que promulgar a lei delegada, providenciando, também, a publicação.

Para o ministro Celso de Mello Filho(Constituição anotada, 1986, pág. 210), o projeto de lei delegada, depois de aprovado pelo Congresso, submete-se à sanção presidencial, “cujo efeito jurídico consiste, precisamente em transformar um projeto aprovado pelo legislativo em lei. Em lei delegada no caso”.

Por isso que o presidente da República não apenas sanciona, mas igualmente promulga a lei delegada. Se pode sancioná-la, pode ainda vetá-la.

No período fixado pela resolução delegante, não fica impedido o Legislativo de revogar a delegação ou de legislar livremente, embora sobre a medida objeto de autorização.

Quanto ao presidente da República, no prazo da delegação, encontra-se autorizado a produzir um ou mais diplomas legislativos. Mas o presidente da República não poderá exceder os limites da delegação.

Mas, uma vez utilizada a delegação e esgotados os seus limites materiais(utilização integral da delegação), fica impedido o presidente da República, por meio de nova lei delegada, revogar, alterar ou substituir a anterior, ainda que não esgotado o prazo estabelecido na resolução de autorização. Mas, na lição de Canotilho(Direito Constitucional, 1989, pág. 637), essa vedação, entretanto, não se opera quando e lei delegada anterior não tenha produzido efeitos. Na lição de Clèverson Merlin Clève(Atividade Legislativa do Poder Executivo no Estado Contemporâneo e na Constituição de 1988, pág. 203), nesse caso não fica o presidente impedido de apresentar novo projeto de lei delegada.

O pais precisa de novos investimentos na infraestrutura, na construção de vias alternativas a terrestre, na impactante intervenção no saneamento básico que somente progredirá se houver privatização dessa atividade somada a parcerias público-privadas, pois o modelo atual está sujeito ao fracasso e não trará maiores benefícios à população.

Não espantam as estatísticas sobre o tema: Eram 18,6% da população em 2008, 35 milhões de pessoas; uma década depois, são 16,5%, ou quase os mesmos 35 milhões.

Ao fim da segunda década do século 21, espanta constatar que a coleta de esgotos, num país de renda média como o nosso, sirva só pouco mais da metade dos habitantes.

Legiões de cidadãos tem de sair à rua para alcançar uma fonte ou uma latrina.

A lei delegada, pois, observados os parâmetros acima acentuados, poderá ser um importante instrumento para essas demandas importantes para a população brasileira. 

Para a construção desse modelo econômico, que retire a parasitária dependência do privado para o público, serão importantes as edições de leis delegadas, que, por sua natureza, poderão tornar mais célere essa mudança.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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