A PROVA PERICIAL É SEMPRE NECESSÁRIA SE O DELITO AMBIENTAL DEIXA VESTÍGIOS

22/10/2019 às 14:56

Resumo:


  • A prova pericial é indispensável quando o delito ambiental deixa vestígios, sendo necessária a realização do exame de corpo de delito direto ou indireto.

  • A ausência de prova pericial técnica ou justificativa para não realizá-la em área com vestígios de degradação ambiental pode levar à absolvição do acusado, conforme decisão do STJ.

  • O exame de corpo de delito é obrigatório quando a infração deixa vestígios, sendo uma prova técnica que certifica a existência de fatos que requerem conhecimentos específicos para sua comprovação.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O ARTIGO DISCUTE SOBRE RECENTE DECISÃO DO STJ, ENVOLVENDO A PROVA PERICIAL E CRIME AMBIENTAL PREVISTO NOS ARTIGOS 38 E 38 - A DA LEI DE CRIMES AMBIENTAIS.

A PROVA PERICIAL É SEMPRE NECESSÁRIA SE O DELITO AMBIENTAL DEIXA VESTÍGIOS

Rogério Tadeu Romano

Informou o site do STJ, que, em razão da falta de perícia técnica ou de justificativa para não a realizar em área com vestígios de degradação ambiental, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu um réu condenado a dois anos de detenção, em regime aberto, pela prática dos crimes ambientais previstos nos artigos 38 e 38-A da Lei 9.605/1998.

"O delito deixou vestígios (imagens do local, laudo de verificação de denúncia, auto de infração do IAP), sendo possível a realização do exame direto. E não foram apresentadas justificativas idôneas para a não realização do exame pericial, impondo-se a absolvição do acusado diante da ausência de prova acerca da materialidade delitiva", afirmou o relator do recurso, ministro Reynaldo Soares da Fonseca.

De acordo com o artigo 38 da Lei 9.605/1998, é crime destruir ou danificar floresta de preservação permanente – mesmo que em formação –, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção. Já o artigo 38-A prevê como delito destruir ou danificar vegetação primária ou secundária – em estágio avançado ou médio de regeneração – do bioma Mata Atlântica.

Trata-se de crimes formais e o elemento do tipo é o dolo. 

A prova pericial é prova técnica na medida em que pretende certificar a existência de fatos cuja certeza somente seria possível através de conhecimentos específicos.

Quando a infração deixar vestígios será indispensável o exame de corpo de delito, seja ele direto ou indireto, não podendo ser suprido pela confissão do acusado.

Corpo delito, se adianta, é o conjunto dos elementos materiais e sensíveis do fato delituoso.

Quanto ao exame de corpo de delito é obrigatório para a autoridade a determinação da perícia quando a infração deixar vestígios, como se lê do artigo 158 do Código de Processo Penal.

O artigo 160 do Código de Processo Penal determina que os peritos descreverão, de forma minuciosa, o que examinarem e responderão aos quesitos formulados.

No laudo haverá explicação minuciosa do fato, destacando-se 4(quatro) partes: preâmbulo, exposição, discussão e conclusões. O preâmbulo contém o nome dos peritos, seus títulos e objeto da perícia. A exposição é a narração de tudo quanto foi observado. A discussão é a análise crítica dos fatos observados, com exposições de argumentos, razões ou motivos que informam o parecer do perito. Na conclusão, ele responde de forma sintética aos quesitos do juiz e das partes.

Os expertos, ao findarem o exame, devem guardar material suficiente do produto analisado para realizarem, se for o caso, uma contraprova, que significa uma nova perícia para confirmar a primeira, quando nela se encontrarem falhas insuperáveis ou para que algumas das partes possa questionar a conclusão obtida pelos peritos através de sua verificação.

O prazo de cinco dias para conclusão da perícia pode ser dilatado.

Se houver divergências entre os peritos serão consignadas nos autos do exame as declarações e respostas de um e de outro e cada  um redigiria separadamente o seu laudo, artigo 180, primeira parte do Código de Processo Penal.

Vigora o sistema liberatório onde o juiz tem inteira liberdade para aceitar o rejeitar o laudo produzido pelos peritos. Isso porque vigendo o sistema da livre apreciação da prova, não está o juiz obrigado e adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo no todo ou em parte(artigo 182 do Código de Processo Penal).

Percebe-se, de outro modo, que o Código de Processo Penal estabelece, em alguns casos, provas tarifadas, como é o caso do exame de corpo delito para os crimes que deixem vestígios. Se há, nos autos, a juntada de  um laudo toxicológico, comprovando que o material apreendido não é substância tóxica, certamente não irá o juiz rejeitá-lo, condenando o réu.

Por outro lado, o juiz, sem qualquer fundamentação lógica, não pode dizer que alguém, em incidente de insanidade, é saudável, se o laudo determinou que possuía uma patologia que o levava a inimputabilidade.

O juiz, na análise da pericia, não pode enveredar no terreno perigoso e tortuoso do capricho, da arbitrariedade, e, sem melhor fundamentação, justificar razões para não seguir um laudo pericial. Se não concorda que tal ou qual substância era entorpecente, por razão motivada, deve determinar nova perícia, mas, não, sem maior justificação, substituir-se à pericia. A não ser que os resultados da perícia fujam à lógica do razoável quando então a descartará.

O juiz deve ouvir ainda os assistentes técnicos indicados pelas partes , que poderão lhe dar maiores dados para decisão como explicita a Lei 11.690/2008.

Vestígio é o rastro, pista ou o indício deixado por algo ou alguém.

O exame de corpo de delito é um ato em que se descrevem as observações dos peritos e o corpo de delito é o crime em sua tipicidade. É espécie de prova pericial que constata a materialidade do crime investigado realizadas, em regra, por peritos oficiais, sendo que atualmente basta um perito oficial, ou técnicos auxiliares de peritos estatais.

O exame do corpo de delito deve ser realizado logo que o fato torna-se conhecido da autoridade policial.

Por certo o corpo de delito se comprova através da perícia. O laudo deve registrar a existência do próprio delito.

Já se disse que quando a infração deixar vestígios, será indispensável a realização do exame de corpo de delito, direto ou indireto. Tal se dá nos homicídios(exame necroscópico), lesão corporal(exame de ofensas físicas, fisiológicas ou mentais), estupro(exame de conjunção carnal).

Quando o crime deixa vestígios é indispensável o exame do corpo de delito, direto ou indireto, consoante o artigo 158 do Código de Processo Penal.

No caso do julgamento acima citado do STJ, no AREsp 1.571.857, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que, nos casos em que a infração deixa vestígio, o artigo 158 do Código de Processo Penal estabelece a necessidade do exame de corpo de delito direto. Por outro lado, nos termos do artigo 167 do CPP, não sendo possível o exame de corpo de delito quando desaparecem os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir o atestado pericial.

O relator também trouxe precedentes da Terceira Seção do STJ no sentido de que, havendo vestígios do crime, a elaboração de perícia é imprescindível.

"Somente será possível a substituição de exame pericial por outros meios probatórios, na forma indireta, para fins de comprovação da materialidade dos crimes ambientais de natureza material – no caso, o artigo 38 da Lei 9.605/1998 –, quando a infração não deixar vestígios ou quando o lugar dos fatos tenha se tornado impróprio à análise pelos experts, circunstâncias excepcionais que não se enquadram na hipótese sub judice", concluiu o ministro ao decidir pela absolvição.

Entendeu-se que para o caso era imprescindível a realização de perícia.

No caso, o acusado foi condenado por infração aos arts. 38 e 38-A da Lei n. 9.605/98 assim transcritos: Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção. Pena – detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. [...] Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção. Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Necessário que a conduta tenha sido praticada contra vegetação de floresta de preservação permanente (art. 38) e vegetação primária ou secundária, situada no Bioma Mata Atlântica (art. 38-A). Tratam-se de delitos materiais, que se consumam com a destruição ou perpetração de danos em floresta em formação.

A conduta em discussão consiste em destruir ou danificar floresta de preservação permanente, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção, que podem estar contidas na regulamentação ambiental competente.

Consuma-se o artigo 38 com a efetiva destruição ou danificação da floresta, ou utilização com infringência das normas de proteção descritas em lei de outro diploma. A tentativa é admissível.

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É hipótese de crime formal exigindo um elemento do tipo que é o dolo. 

A Lei nº 9605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, determinou, em sua seção II, dos crimes contra a flora, e previu, em seu artigo 38, crime apenado com detenção de um a três anos, “destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção”

Um dos conceitos técnicos de floresta utilizados pela doutrina e Tribunais é aquele extraído do I Encontro de Pesquisadores para a Padronização da Terminologia Florestal, ocorrido em Curitiba no ano de 1976, que considerou floresta como “a área de terra mais ou menos extensa, coberta predominantemente de vegetação lenhosa de alto porte, formando uma biocenose”. No significado etimológico, floresta, segundo o dicionário Houaiss, é “o denso conjunto de árvores que cobrem vasta extensão de terra; mata”. No mesmo sentido, o Anexo I da Portaria 486-P, de 28.10.1986, do IBDF (órgão antecessor do atual IBAMA), conceitua a floresta, no seu item 18, como a “formação arbórea densa, de alto porte, que recobre área de terra mais ou menos extensa”, sendo que grande parte de nossos Tribunais.

A floresta é formação florística de porte arbóreo, mesmo em formação. 

A Mata Atlântica representa formações florestais e ecossistemas associados inseridos no domínio Mata Atlântica, com as respectivas delimitações pelo mata de vegetação do Brasil. Representa um conjunto de tipologias florestais, formadas por árvores altas(de 25 a 35 m), que revestem as encostas e as planícies fortemente influenciadas pela regulação térmica e pelo regime de chuvas abundantes da proximidade do Oceano Atlântico. Estende-se em estreita faixa costeira do Rio Grande do Norte até o Rio Grande do Sul. 

Tem-se presente o  paradigma da maior proteção possível das áreas de preservação permanente, sempre com o intuito de propiciar a manutenção ou desenvolvimento da flora que a reveste.

A Terceira Seção desta Corte  consolidou entendimento já firmado no Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, "se houver vestígios, a perícia é imprescindível, na forma do art. 158 do Código de Processo Penal".

Tem-se então:

 AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO. CHAVE FALSA. APREENSÃO. VESTÍGIO. EXAME PERICIAL. INDISPENSABILIDADE. SÚMULA N. 168/STJ. INCIDÊNCIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. O atual posicionamento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a necessidade de realização do exame pericial à constatação da qualificadora de uso de chave falsa (art. 155, § 4º, inciso III, do Código Penal) dependerá das circunstâncias fáticas de cada caso. Se houver vestígios, a perícia é imprescindível, na forma do art. 158 do Código de Processo Penal. Naqueles em que não forem eles verificados ou se já desaparecidos, a prova oral poderá suprir a técnica, conforme disposto no art. 167 do Código de Processo Penal. 2. A apreensão do objeto utilizado como chave falsa constitui vestígio do delito, o que torna imprescindível a realização da perícia para a caracterização da qualificadora do crime de furto. 3. No caso, apesar da apreensão, não houve a confecção da prova técnica, o que obsta o reconhecimento da qualificadora. 4. Os Embargos de Divergência apresentados contra acórdão que adotou entendimento consolidado neste Superior Tribunal de Justiça podem ser indeferidos por decisão monocrática, eis que incabíveis, nos termos da Súmula n. 168 do STJ. 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EAREsp 886.475/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/02/2019, DJe 12/03/2019).

 Dessa forma, somente será possível a substituição de exame pericial por outros meios probatórios, na forma indireta, para fins de comprovação da materialidade dos crimes ambientais de natureza material – no caso, o art. art. 38 da Lei n. 9.605/1998 – quando a infração não deixar vestígios ou quando o lugar dos fatos tenha se tornado impróprio à análise pelos experts, circunstâncias excepcionais que não se enquadram na hipótese sub judice que foi objeto de apreciação no recurso supracitado

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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