OS DOCUMENTOS IDÔNEOS PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO MONITÓRIA
Rogério Tadeu Romano
A tutela monitória é instrumento processual colocado à disposição do credor de quantia certa, de coisa fungível ou de coisa móvel determinada com crédito comprovado por documento escrito sem eficácia de título executivo, para que possa requerer em juízo a expedição de mandado de pagamento ou de entrega da coisa para satisfação do seu crédito, por questão de política legislativa.
Em estudo sobre o novo processo monitório, J. E. Carreira Alvim afirmou que a prova escrita compreende tanto as provas pré-constituídas quanto as casuais. A primeira é aquela cuja criação a lei ordena com anterioridade à existência de um direito ou de uma obrigação, até o ponto em que a exibição é necessária à sua prova preservação e as provas casuais são aquelas que não são feitas com a intenção direta por parte de seu autor de serem empregadas como prova jurídica.
A doutrina admite, à luz de Carreira Alvim que ficam excluídas do âmbito da monitória: a prova documental latu senso, como a fita gravada, em fita cassete, vídeo-tape e o escrito que emanado da pessoa contra quem se faz o pedido ou de quem a represente, o começo de prova por escrito, onde há necessidade de prova testemunhal que a complementa.
Adotou-se o monitório documental e não o documental puro, onde não há necessidade de documento e a alegação do réu em oposição, é óbice à continuidade do feito.
No monitório documental, exige-se esteja ele aparelhado com documento comprobatório.
Admitem-se, pois, os seguintes documentos:
a) escritura pública;
b) anotações de escrita mercantil;
c) duplicata sem aceite;
d) cheque prescrito (TAMG, RT 739/411; TJDF, 3.ª t., Ap. Civ. 43.965, DJU de 06.08.97, TACIVSP, 10.ª Câm., j. 29.08.2001);
e) compra e venda mercantil;
f) despesas comprovadas de condomínio;
g) contrato de abertura de crédito (Súmula n.° 297 do STJ);
h) contrato de parceria agrícola;
i) declaração de venda de veículo;
j) documento ológrafo assinado pelo devedor;
k) instrumento de contrato de consórcio para aquisição de bem, os recibos de pagamento de prestação, e documento de desistência do consórcio.
l) síngrafos assinados pelos contratantes sem testemunhas;
m) assentos de escrituração mercantil do credor;
n) prova emprestada, mesmo que envolvendo depoimento pessoal, pode vir ao processo sob a forma de documento examinável de plano, tendo a doutrina alemã posição contrária.
O Superior Tribunal de Justiça negou eficácia executiva ao contrato de abertura de crédito (REsp 90.114-PR, 3.ª turma, rel. Min. Costa Leite, j. 26.06.1996, v.u., DJU de 25.08.96, p. 296.837; REsp 66.304-0-PR, 3.ª turma, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 06.08.96), na linha do mestre Cândido Rangel Dinamarco. O remate na matéria está em que se o banco dispuser de um contrato escrito (consubstanciado em documento) e em outros documentos indicativos do valor do crédito, o caso é de tutela monitória.
O débito decorrente de uma obrigação, ou seja, a prova escrita apta a respaldar a demanda monitória deve, além de transparecer a probabilidade de existência da dívida, também demonstrar a origem de tal débito consubstanciado na relação jurídica obrigacional subjacente. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DOCUMENTOS HÁBEIS À INSTRUÇÃO DA AÇÃO MONITÓRIA. DEMONSTRATIVO DE VALORES GERADOS NO PERÍODO CONTRATUAL. CONTRATOS DE ABERTURA DE LIMITE DE CRÉDITO ROTATIVO EM CONTA CORRENTE "GIRO FÁCIL" E EXTRATOS BANCÁRIOS. DOCUMENTOS SUFICIENTES. 1. Consoante a dicção do art. 1.102-A do Código de Processo Civil, é prova bastante para a instrução da ação monitória o documento escrito, ainda que emitido pelo próprio credor, hábil a formar o convencimento do juízo acerca da existência da dívida, a qual, por sua vez, pressupõe a comprovação da relação jurídica obrigacional. 2. Enuncia a Súmula 247 do STJ que "o contrato de abertura de crédito em conta corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para o ajuizamento da ação monitória". Em outros dizeres: comprovado o liame jurídico com o contrato de abertura de conta corrente, é admissível a instrução da ação monitória apenas com demonstrativo do débito, o qual, mesmo não provando diretamente o fato constitutivo do direito, possibilita ao juiz presumir a existência do crédito alegado. 3. No caso concreto, os "demonstrativos de valores gerados no período contratual" não seriam, por si só, prova suficiente do crédito pleiteado, por consubstanciarem simples "começo de prova por escrito", uma vez que não demonstram a relação jurídica existente entre o devedor e o credor. Não obstante, em sede de apelação, o recorrente trouxe aos autos também o contrato de abertura de conta corrente (fls. 69-72); os contratos de abertura de limite de crédito rotativo e os extratos bancários (fls. 73-125), suficientes para ensejarem a ação monitória. 4. Recurso especial provido (REsp 1.138.090/MT, 4ª Turma, DJe 01/08/2013) (grifos acrescentados). A título exemplificativo, cita Humberto Theodoro Júnior: A jurisprudência tem aceitado como título injuntivo, entre outros, o documento particular de reconhecimento de dívida não assinado por duas testemunhas, o título de crédito prescrito, a duplicata mercantil sem comprovante da entrega da mercadoria, a compra e venda mercantil da qual não se expandiu a duplicata, o contrato de abertura de crédito em conta corrente, o saldo do contrato de arrendamento mercantil, contribuições condominiais, extratos bancários, honorários advocatícios, contrato de prestação de serviços, “romaneio” agrícola, contrato de seguro, contrato de cartão de crédito, cheque prescrito, contrato de serviços hospitalares, compra e venda representada por notas fiscais, e contrato de serviços educacionais (Curso de Direito Processual Civil – vol. II. 53 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019, pp. 439-440).
É certo, ainda, que este STJ já decidiu no sentido de reconhecer a possibilidade de utilização da ação monitória para a cobrança de taxas condominiais (REsp 1.172.448/RJ, 4ª Turma, DJe 01/07/2013; REsp 613.112/PR, 3ª Turma, DJ 20/02/2006; e REsp 405.011/RS, 4ª Turma, DJ 02/06/2003).
É pacífica é a orientação de que, para o ajuizamento da ação monitória, não é necessário que o documento seja emanado do devedor, sendo suficiente para a sua admissibilidade, a prova escrita que revele razoavelmente a existência da obrigação.
Recentemente o STJ enfrentou essa matéria.
Segundo o site do STJ, em 30 de outubro do corrente ano, A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou a possibilidade de que uma cooperativa habitacional utilizasse extrato de penhora on-line efetuada em suas contas bancárias, nos autos de cobrança ajuizada anteriormente por um condomínio contra ela própria, como forma de fundamentar ação monitória contra a proprietária de um apartamento. Segundo a cooperativa, como ela não era proprietária do imóvel, os débitos condominiais, na realidade, seriam da verdadeira dona.
Para a Terceira Turma, porém, não é possível afirmar, com base apenas no extrato de penhora, que existe uma obrigação de pagamento por parte da proprietária, inclusive porque a própria cooperativa não alegou sua ilegitimidade passiva na ação original de cobrança.
Na ação de execução inicialmente ajuizada, a cooperativa habitacional alegava ser credora de mais de R$ 80 mil, valor proveniente de penhora on-line determinada nos autos de cobrança ajuizada contra ela pelo condomínio, relativamente a imóvel de propriedade da executada.
Após intimação para regularizar a petição inicial – uma vez que não se tratava de execução de título executivo judicial ou extrajudicial –, a cooperativa requereu a conversão do processo executivo em ação monitória.
Relatora do recurso especial da proprietária, a ministra Nancy Andrighi explicou que a ação monitória é instrumento processual colocado à disposição do credor de quantia certa, cujo crédito pode ser comprovado por prova escrita sem eficácia de título executivo, nos termos do artigo 700 do Código de Processo Civil de 2015.
Com base em precedentes do STJ, a ministra também afirmou que a prova hábil a instruir a ação monitória precisa demonstrar a existência da obrigação, devendo o documento ser escrito e suficiente para influir na convicção do juiz sobre o direito alegado.
"Com efeito, exige-se a presença de elementos indiciários caracterizadores da materialização de um débito decorrente de uma obrigação, ou seja, a prova escrita apta a respaldar a demanda monitória deve, além de transparecer a probabilidade de existência da dívida, demonstrar a origem de tal débito consubstanciado na relação jurídica obrigacional subjacente", disse a ministra.
No caso dos autos, contudo, Nancy Andrighi apontou não ser possível concluir que o extrato de penhora on-line ocorrida em contas bancárias de titularidade da cooperativa, utilizado para embasar a ação monitória, confira certo juízo de probabilidade a respeito da responsabilidade da suposta possuidora e proprietária do imóvel.
"Isso porque o próprio condomínio ajuizou ações diversas para a cobrança de débitos condominiais em atraso: uma ação de cobrança em desfavor da recorrente, pelo qual pretendeu a cobrança das parcelas vencidas e não pagas a partir de outubro de 2005; e uma ação de execução contra a cooperativa recorrida, cobrando os débitos anteriores a este período", apontou a relatora.
Ao restabelecer a sentença que extinguiu a ação monitória, a ministra ressaltou que, além de não ser possível entender que do recibo de protocolo de valores decorra uma obrigação da proprietária quanto ao pagamento dos débitos, os documentos juntados aos autos tampouco permitem ter certeza de que o valor bloqueado represente o valor do débito condominial de responsabilidade total da dona do imóvel.
O caso foi objeto de discussão no REsp 1.713. 774.