O AUTOGOLPE

01/11/2019 às 09:24
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O ARTIGO DISCUTE SOBRE O MOMENTO ATUAL DO PAÍS.

O AUTOGOLPE

Rogério Tadeu Romano

Um autogolpe é uma forma de golpe de Estado que ocorre quando o líder de um país, que chegou ao poder através de meios legais, dissolve ou torna impotente o poder legislativo nacional e assume poderes extraordinários não concedidos em circunstâncias normais. Outras medidas tomadas podem incluir a anulação da constituição da nação e a suspensão de tribunais civis. Na maioria dos casos ao chefe de Estado é concedido poderes ditatoriais.

A história no Brasil demonstra várias hipóteses de autogolpe.

Vejamos alguns:

Don Pedro I fecha a Assembleia Constituinte, e outorga a Constituição de 1824. Esse episódio ficou conhecido como Noite da agonia. (12 de novembro de 1823)

  D. Pedro II é declarado Imperador através do Golpe da Maioridade. (23 de Julho de 1840)

O Presidente Deodoro da Fonseca resolveu  fechar  o Congresso e decretou o  estado de sítio em 3 de novembro de 1891, ficando proibidas as reuniões públicas, manifestações e críticas às autoridades governamentais. Líderes da oposição foram presos, mas conseguiram escapar da prisão, como Prudente de Morais, Campos Sales e Bernardino de Campos.

Deodoro da Fonseca anunciou ainda uma reforma constitucional que ampliaria os poderes do presidente, caracterizando toda essa situação como um golpe de Estado.

Getúlio Vargas, com o apoio das Forças Armadas, declara o Estado Novo, em 1937, outorgando uma Constituição ditatorial, conhecida por Polaca

Em 1961, quando Jânio Quadros renunciou, assumiu a presidência o então vice-presidente João Goulart, e houve suposições de um autogolpe fracassado.

Na Itália, o Primeiro-ministro Benito Mussolini (3 de janeiro de 1925) o praticou para firmar o fascismo como modelo ideológico e político.

As falas autoritárias são frequentes na família do presidente do Brasil  porque Jair Bolsonaro passou a vida inteira defendendo ditaduras militares, a daqui ou as de outros países da região. Ele não mudou de ideia até hoje. O livro de cabeceira dele foi escrito por um torturador, Carlos Alberto Brilhante Ustra, que tem 46 mortes no currículo dentro do Doi-Codi paulista, e é o herói inclusive do vice-presidente. Hamilton Mourão também já comentou o autogolpe como uma possibilidade de governo.

O vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), escreveu em rede social que, por vias democráticas, não haverá as mudanças rápidas desejadas no país.

"Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos... e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!", disse Carlos. 

Tal declaração é típica de um autogolpe.

Quais são os interesses por trás disso?

Utilizo-me de comentário exposto no jornal O Globo, em sua edição de 30 de outubro do corrente ano:

“BOLSONARO LOGO pediu desculpas pelo indesculpável vídeo que circulou nas suas redes sociais em que ele, um leão, é cercado por hienas, que simbolizavam instituições, entre elas, o Supremo. “O atrevimento presidencial parece não ter limites”, respondeu à altura o ministro Celso de Mello, decano da Corte.

HÁ POUCOS dias, Carlos, filho do presidente, usou a senha do pai para defender a manutenção da prisão em segunda instância, e ele mesmo teve de se desculpar, um estridente sinal de que Bolsonaro recuara no seu apoio ao combate à corrupção.

DESTA VEZ, o presidente isentou Carlos, mas confirmou que há uma equipe que usa seu nome nas redes. É grave um presidente terceirizar a este ponto o seu poder.”

Ainda publicou-se:

“Nos últimos dias, Bolsonaro levantou ao menos três vezes a hipótese de convocar as Forças Armadas para reprimir protestos até agora inexistentes no Brasil. Ele tem falado repetidamente em acionar o artigo 142 da Constituição, que permite convocar as tropas para a garantia “da lei e da ordem”. Nas redes sociais, militantes bolsonaristas evocam o mesmo artigo em defesa de uma “intervenção militar” no país.

Ontem o deputado Eduardo Bolsonaro escancarou o tom de ameaça. Na Câmara, ele disse que os oposicionistas“vão querer repetir no Brasil o que tá acontecendo no Chile”.  “Não vamos isso aí vir pra cá. Se vier pra cá, vai ter que se ver coma polícia. E se eles começarem a radicalizar do lado de lá, a gente vai ver a História se repetir. Aí é  que eu quero ver como é que a banda vai tocar ”, desafiou. Deixou a tribuna sob vaias e gritos de“golpista ”.

As manifestações no Chile mexeram com os instintos primitivos do bolsonarismo. O presidente tem ameaçado convocar os militares para reprimir protestos inexistentes no Brasil.”

Nos últimos dias, mais declarações trazem preocupações.

O vereador Carlos Bolsonaro (PSL-RJ) disse na noite desta terça-feira, 29 de outubro deste ano, que foi seu pai, Jair Bolsonaro, quem postou nas redes sociais o vídeo no qual o presidente é comparado a um leão atacado por hienas – sendo uma delas o Supremo Tribunal Federal (STF).

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro , afirmou que caso haja uma radicalização da esquerda a resposta pode ser via "um novo AI-5 ", que afronta a Constituição de 1988. A declaração foi dada em entrevista à jornalista Leda Nagle , publicada em um canal do Youtube na manhã desta quinta-feira.
— Vai chegar um momento em que a situação vai ser igual a do final dos anos 60 no Brasil, quando sequestravam aeronaves, quando executavam-se e sequestravam-se grandes autoridades, consules, embaixadores, execução de policiais, de militares. Se a esquerda radicalizar a esse ponto, a gente via precisar ter uma resposta. E a resposta, ela pode ser via um novo AI-5, via uma legislação aprovada através de um plebiscito, como aconteceu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada — afirmou Eduardo.
Ele descreveu a esquerda como um "inimigo interno" e disse esperar não chegar ao ponto de um novo AI-5.
- É uma guerra assimétrica, não é uma guerra onde você está vendo o seu oponente do seu lado e você tem que aniquilá-lo, como acontece nas guerras militares. É um inimigo interno de difícil identificação aqui dentro do país. Espero que não chegue a esse ponto, mas a gente tem que estar atento.”
Trata-se de uma verdadeira apologia à ditadura em afronta ao Estado Democrático de Direito.
Mas as ameaças proferidas à democracia não param aí.
Em vídeo gravado em julho de 2018, disponível na internet, mas que veio à tona a uma semana do segundo turno, Eduardo responde a pergunta sobre uma hipotética possibilidade de ação do Exército em caso de o STF impedir que Bolsonaro assuma a Presidência.
"Aí já está caminhando para um estado de exceção. O STF vai ter que pagar para ver e aí vai ser ele contra nós. Se o STF quiser arguir qualquer coisa, sei lá, recebeu uma doação ilegal de R$ 100 do José da Silva, pô, impugna a candidatura dele. Não acho improvável, não, mas aí vai ter que pagar para ver. Será que vão ter essa força mesmo?", responde o filho do candidato.
"Cara, se quiser fechar o STF, sabe o que você faz? Você não manda nem um jipe. Manda um soldado e um cabo. Não é querer desmerecer o soldado e o cabo, não", diz.
"O que é o STF? Tira o poder da caneta de um ministro do STF. Se prender um ministro do STF, você acha que vai ter uma manifestação popular a favor do ministro do STF, milhões na rua?", afirma.
Na verdade, Eduardo Bolsonaro é porta-voz de um sinistro plano para levar seu pai, Jair Bolsonaro a governar como um ditador, com o fechamento do Congresso Nacional e a fragilização do Poder Judiciário.
Ele governaria por decretos e de forma plebiscitária.
Tudo viria por um autogolpe.
Lembrem-se que Hitler assumiu o poder, em 1933, de forma democrática, pelo voto popular e depois se transformou num ditador na Alemanha que tinha um passado cultural invejável.

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Disse bem Carlos Andreazza(O fetiche reacionário de Carlos Bolsonaro) que “o bolsonarismo investe no estabelecimento de uma cultura plebiscitária entre nós; um fetiche por meio do qual o líder populista governaria (reinaria) – prescindindo de instituições intermediárias – em conexão direta, verdadeira, sem filtros deturpadores, com o povo. É assim na Venezuela, onde as hienas, imprensa incluída, foram estranguladas uma a uma.

“Uma legislação aprovada através de plebiscito” nada mais será do que o estabelecimento de um poder paralelo exclusivamente destinado a sufocar o Parlamento, a democracia representativa e, pois, a própria atividade política.”

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

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