Prisão domiciliar para mães com filhos menores de 12 anos

05/11/2019 às 21:03
Leia nesta página:

A legislação é clara, mas os Tribunais estão decidindo contráriamente

O HC 143641 do STF de janeiro de 2018 determinou a substituição da prisão preventiva por domiciliar de mulheres presas, em todo o território nacional, que sejam gestantes ou mães de crianças de até 12 anos ou de pessoas com deficiência, sem prejuízo da aplicação das medidas alternativas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal (CPP).

No Código de Processo Penal ficou clara a intenção do legislador e, relação a prisão domiciliar para mães que possuem filhos menores de 12 anos, veja:

CPP - Art. 318.  Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: V - mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; Parágrafo único.  Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.

Aqui a prova idônea é a documentação de mãe e filha, nada mais, pois o critério aqui é objetivo.

Para não deixar dúvidas, posteriormente legislaram demonstrando quais são os casos onde não se deve aplicar a prisão domiciliar, veja:

CPP - Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que: I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente. Art. 318-B.  A substituição de que tratam os arts. 318 e 318-A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 deste Código.

Assim, subentende-se que em todos os casos é para se aplicar a prisão domiciliar, com exceção se o crime possuir a caraterísticas do inciso I ou II do artigo 318 A.

Mas o que se vê nos Tribunais são decisões contrárias às normas, veja:

TJMG -  1.0000.19.123863-3/000  

Relator(a): Des.(a) Marcílio Eustáquio Santos

Data da publicação da súmula: 16/10/2019Data de Julgamento: 16/10/2019

Ementa: EMENTA: "HABEAS CORPUS". TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. PRESENÇA DOS REQUISITOS FÁTICOS (ARTIGO 312 DO CPP) E INSTRUMENTAIS (ARTIGO 313, I, DO CPP) DA MEDIDA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA DOS FATOS APURADOS. CONSIDERÁVEL QUANTIDADE DE DROGAS APREENDIDAS. SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR. NÃO CABIMENTO. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA IMPRESCINDIBILIDADE DA PRESENÇA DA PACIENTE NOS CUIDADOS DO FILHO MENOR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. 1. Tendo sido a paciente presa preventivamente pela suposta prática do delito de tráfico de drogas, presentes a prova da materialidade delitiva e os indícios suficientes de autoria, inexiste constrangimento ilegal na decisão que, fundamentadamente, decretou a sua segregação cautelar, visando a garantir a ordem pública. 2. O princípio do estado de inocência, estatuído no artigo 5º, LVII, da Constituição da República, não impede a manutenção da prisão provisória, quando presentes os requisitos dos artigos 312 e 313 do Código de Processo Penal. 3. A Lei 12.403/2011 alterou todo o sistema de medidas cautelares do Código de Processo Penal, preconizando de forma expressa o princípio da proporcionalidade, composto por dois outros, quais sejam: adequação e necessidade. 4. A prisão preventiva, espécie de medida cautelar, passou a ser exceção na sistemática processual, dando, o quanto possível, promoção efetiva ao princípio constitucional da não-culpabilidade. Todavia, embora medida extrema, a manutenção da segregação cautelar da paciente pode ser determinada sempre que presentes os requisitos exigidos pelo Código de Processo Penal, em seus artigos 312 e 313. 5. Sendo o crime de tráfico de drogas apenado com reprimenda máxima, privativa de liberdade, superior a quatro anos, é admissível a manutenção da segregação provisória da paciente como forma de garantia da ordem pública, mormente diante da elevada gravidade concreta dos fatos apurados, eis ter sido apreendida considerável quantidade de drogas. 6. A configuração de qualquer das hipóteses arroladas pelo artigo 318 do CPP não impõe, inexoravelmente, a substituição da prisão preventiva pela domiciliar, sendo perfeitamente possível que, não obstante se encaixe o caso em alguma das previsões, se admita a subsistência da medida cautelar extrema que atenda aos requisitos do artigo 312 do mesmo diploma 7. Tendo em vista a gravidade concreta dos fatos apurados, bem como a inexistência de provas da imprescindibilidade da presença da paciente nos cuidados do filho menor, é inviável a concessão da prisão domiciliar. 8. Ordem denegada.

TJMG - 1.0024.19.039153-2/001 

Relator(a): Des.(a) Kárin EmmerichData de Julgamento: 15/10/2019

Data da publicação da súmula: 23/10/2019

Ementa: EMENTA: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - TRÁFICO DE DROGAS - DECISÃO QUE CONCEDE LIBERDADE PROVISÓRIA - IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL - PRISÃO CAUTELAR - NECESSIDADE - PRESENTES OS REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. Demonstrada a presença dos requisitos do art. 312 do Código de Processo penal, a custódia cautelar é medida que se impõe, eis que a concessão da prisão domiciliar para mulher, mãe de filhos menores de doze anos, não é automática, de forma que, ainda que presente alguma das hipóteses previstas no art. 318 do diploma legal, faz se necessária a análise das circunstâncias do caso concreto e, bem assim, a adequação e suficiência da medida.

Mas ainda há esperança, eis que no mesmo Tribunal de Justiça há decisões que estão de acordo com a legislação, legislação esta que foi clara em prever que somente nos casos dos incisos I ou II é que não se deve aplicar a prisão domiciliar.

TJMG - Processo: Habeas Corpus Criminal - 1.0000.19.112065-8/000 

Relator(a): Des.(a) Maria Luíza de Marilac

Data da publicação da súmula: 17/10/2019Data de Julgamento: 15/10/2019

Ementa: EMENTA: "HABEAS CORPUS" - TRÁFICO DE DROGAS - PRISÃO PREVENTIVA - SUBSTITUIÇÃO POR PRISÃO DOMICILIAR - PACIENTE QUE POSSUI FILHO MENOR DE 12 ANOS - POSSIBILIDADE. Considerando-se que a paciente possui uma criança de um (01) ano de idade e o delito supostamente cometido por ela se enquadra no disposto no art. 318-A do Código de Processo Penal, acrescentado pela Lei 13.769/18, a substituição da prisão cautelar por "prisão domiciliar" é medida que se impõe.

Sobre o autor
Santos Fiorini Netto

Advogado Criminalista, especialista em ciências penais e processo penal, professor de direito penal (Unifenas - Campo Belo - MG), escritor das obras "Prescrição penal simplificada", "Direito penal parte geral V. I" e "Direito penal parte geral V. II", "Manual de Provas - Processo Penal", "Homicídio culposo no trânsito", "Tráfico de drogas - Aspectos relevantes", "Noções Básicas de Criminologia" e "Tribunal do Júri, de suas origens ao veredicto". Atua na área criminal, defesa criminal em geral - Tóxicos - crimes fiscais - Tribunal do Júri (homicídio doloso), revisão criminal, homicídios no trânsito, etc.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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