Por que temos Estados, costumes, casas e famílias?
O que faremos sobre isso? O que é feito de ti, voluntariamente, e o que se fará contigo? Conosco não te queremos, pelas razões que explicaremos abaixo.
Basta-nos pensar que temerários e incrédulos estamos nós, por ver-te irrefletido em tudo que presta, e crédulo exatamente em tudo que não presta.
Vamos nos entregar ou somente te entregar ao tirano, aos traidores e aos mercadores da pátria?
Quem sois vós, afinal? Amigo do rei? Mas como, se vós só conheceis a miséria? Não abrireis mão dos costumes? De qual, mais precisamente, da opulência de quem vos oprime? E essa, por acaso, é tua?
Por que vos entregais ao tirano, sorridente, amável, arqueado pelo jugo? Sois tirano também, em miniatura? Sois tirano subjugado, gado amestrado no varonil pasto verde-amarelo? Que diabos de tirano vós sois? Um minúsculo de quem todos abdicam? Não reclamais se és cego por teu Pai. Alguém o chamaste de Pai Fascista? Te irritas ver falar do Pai e pouco te incomodas com o Fascista?
Esse é o vosso fogo já queimado? Caís-te no fogo para se lavrar em metal forte ou asco retorcido? Das cinzas às cinzas? Não sabeis que o fogo pode queimar a massa até às cinzas – e que pode fazer a massa virar pão que alimenta a miséria? Parais e pensais se só há um pão e um circo? De que massa sois feito? Da massa que se amassa e não se realiza? Vedes que tens mais perguntas, que recusas, do que uma simples resposta?
Ouviste demais os presunçosos dentro de ti? Está preso. E por quem os sinos dobram na ausência da tua liberdade? Ouves e recitas as memórias do teu cárcere? Ninguém escreve ao coronel que habitas em ti? Ensaiastes uma cegueira, foste acometido de uma peste? Teu Estado viraste um sítio, sem que precises de um Estado de Sítio? Não és capaz de ver que em tua Numancia ganhaste um belo prêmio de Troia.
És acumulador, mas não guardaste nada de ti? Apanhastes ou foste apanhado, quando não obedeceste? A acumulação o tornaste primitivo – ou a negação de tê-la? Sentes o aquartelamento de tuas forças e vossa rendição às milícias assaltantes do Estado, dos costumes, das casas e das famílias? Sentes que tu não vigoras mais, que te sugaram todo o vigor?
Percebes que não foste o Estado, a casa, os costumes, a família, o emprego que tu perdeste? Percebes que perdeste, há muito, o imemoriável lapso de tempo onde dormitava tua dignidade? Percebes o quanto já és incapaz de perceber algo relevante? Sentes o quanto nos cansa escreverdes sobre o mesmo? Sentes a tua passiva mesmice deste nada que a ti tornaste? Sentes o tempo perdido por todos nós, ao te lembrardes do que não deverias terdes esquecido? Sentes que és um caso perdido se já não sentes nada do que te dissemos?
Desculpe-nos por lembrar-vos disso. Isto é apenas um acorde do que poderia ter-te tornado. Mas, se assim quereis, voltas a dormir – até que ninguém a ti acorde. Ficais como o animal que se abateu e, abatido, declinou da coroa do reino da política, pois, abdicarás do “jus esperniandi”.