cláusula de hardship

27/11/2019 às 02:40
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Importante também mencionar algumas decisões da ICSID, a respeito da crise sofrida pela Argentina, em 2001.

A falta de uniformidade nesse sentido chama atenção para o tipo de atitude que se deve tomar em situações como essa: se é necessário atentar àquilo que foi expressamente avençado entre as partes envolvidas (seja por meio de contratos entre Estado e investidor ou por meio dos BIT’s) ou se é preciso considerar que tais acontecimentos constituem casos de exceções à responsabilidade do Estado. Enquanto institutos internacionais como a Unidroit ou a Uncitral não positivam os procedimentos a respeito do “estado de necessidade”, vale atentar à jurisprudência arbitral existente em razão da crise argentina, para que, em casos futuros (como o da crise mundial de 2009 e o da atual crise da zona do Euro) possamos nos valer de decisões que envolvam o estado de necessidade arguidos por um país. Por fim, é abordada a aplicação da cláusula de hardship, consoante os Princípios do Unidroit. Nesse contexto, a hardship está posta de forma genérica, de tal forma que pode ser insuficiente para as especificidades de uma determinada relação obrigacional. Nos Princípios, a cláusula de hardship foi regulamentada no art. 6.2. O primeiro artigo aborda o fato de que, ainda que se esteja diante de um caso de excessiva onerosidade, a parte prejudicada ainda deve se esforçar para fazer cumprir a obrigação, sob os termos da cláusula de hardship. O segundo artigo define o que é esta cláusula e quais as causas de sua incidência. Seus efeitos são abordados pelo terceiro artigo. Os Princípios deixam claro que o objetivo dessa cláusula não é afetar de pronto o contrato, isto é, o brocardo pacta sunt servanda deve ser priorizado dentro daquilo que é possível, malgrado a existência de perdas excessivas. Sendo estas perdas excepcionais e não mais suportáveis pelas partes, causando alterações significativas, os sujeitos envolvidos podem se valer dos artigos 6.2.2 e 6.2.3 dos Princípios. É nesse caso em que se é permitido o uso das cláusulas e hardship. Nadia de Araujo afirma que: Em um contrato de longa duração, pode haver desmesurado incremento nos custos da execução, como, por exemplo, um inesperado aumento no preço de matéria-prima, de forma imprevisível, e que, por sua especificidade,8 é imprescindível para a produção em questão, como o aumento do preço do petróleo devido à guerra o que pode impossibilitar o cumprimento de uma obrigação cujo custo está intimamente associado a este fator. Os princípios também abordam o requisito da imprevisibilidade e da inevitabilidade (quando os acontecimentos estão fora do controle do homem). Percebe-se que os Princípios expõem o tema de forma genérica e ampla. Por isso, não rara é a inserção de cláusulas complexas e detalhadas nos contratos internacionais, principalmente aqueles de áreas específicas, como os da indústria do petróleo. Nota-se, afinal, o retorno à abordagem que foi feita no início desta exposição: acaba-se por ter que fazer uma ponderação entre os dois princípios sólidos em nosso ordenamento: o pacta sunt servanda e a doutrina do rebus sic stantibus. Essa ponderação dependerá da vontade das partes: com todos os mecanismos de escolhas em escala internacional que as partes possuem, hoje, para firmar acordos (a exemplo dos Princípios da Unidroit e das cláusulas-padrão da CCI), é inegável a possibilidade que os sujeitos em uma obrigação contratual possuem de moldar os seus investimentos de acordo com suas comodidades. Ademais, as leis internas de diversos países já permitem a flexibilização dos acordos privados, o que estimula os particulares a estipular o que melhor lhes aprouver.

Adicionalmente, X argumentou que, em razão do negócio jurídico não ter sido cumprido da forma devida, deveria ser respeitada uma cláusula de hardship constante no contrato, que permitia a redução do preço da commodity. Y protestou e a decisão coube à CCI. O tribunal arbitral concluiu que, diante da existência de uma cláusula que condicionava a execução do contrato à concessão dessa autorização governamental e, enquanto não houvesse concordância do Estado ao qual pertence X, nesse sentido, o contrato estaria sujeito a essa condição suspensiva, não tendo, portanto, jamais entrado em vigor.

Conclusão

De fato, a opção pelo exercício direto do monopólio de exploração e produção de petróleo na camada pré-sal vai de encontro ao ambiente concorrencial delineado pela EC no. 9/95. Assim, resta saber se o texto constitucional pós-EC n. 9/95 comporta tais alterações. Vale dizer: há que se perscrutar o espaço de conformação do legislador no tocante à forma de exploração do monopólio do petróleo titularizado pela União.

Referências Bibliográficas

1-DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. 2. ed. São Paulo: RT, 2009.

2-Diniz, Maria Helena (2006) Tratado Teórico e Prático dos Contratos, Vol 1,2,3,4  6ª Ed   São Paulo   Saraiva

3-Engish, Karl. (2005). Introdução ao Pensamento Jurídico. 3ª ed São Paulo  Fundação Calouste Gulbekian

Sobre o autor
Geraldo Santos

Advogado, Doutorando em Direito pela Universidad Nacional de Lomas de Zamora, Mestre em Administração pela PUC Rio, especialista em logistica empresarial pela FGV e bacharel em direito pela Universidade Santa Ursula.

Informações sobre o texto

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