Capa da publicação Caracterização do ato de improbidade administrativa

Caracterização do ato de improbidade administrativa

Ato ímprobo

Exibindo página 2 de 2
02/12/2019 às 14:46
Leia nesta página:

Acordos em ações de improbidade administrativa

Há uma discussão hoje em dia sobre se o Ministério Público (ou a procuradoria do ente público, caso ela tenha ingressado em juízo) pode ou não firmar acordos com os acusados de improbidade administrativa.

A Lei de Improbidade Administrativa proibia qualquer tipo de acordo:

Art. 17. (…)

§ 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.

(…)

O que qualquer pessoa pode concluir da leitura desse dispositivo é que, na ação de improbidade, são vedados transação, acordo ou conciliação (art. 17, § 1º, Lei nº 8.429/1992).

Se o Ministério Público movesse ação de improbidade contra um servidor público identificado como membro de uma quadrilha desarticulada pela Polícia Federal, a colaboração do servidor com as investigações não justificaria nenhum acordo na ação de improbidade administrativa.

Mas, em dezembro de 2015, este dispositivo foi revogado pela Medida Provisória nº 703/2015, o que, na época, franqueou acordos.

O argumento era que o Ministério Público reforçaria o combate à corrupção se pudesse barganhar acordos em troca de provas.

Mas o argumento não decolou. A medida provisória não foi convertida em lei, tendo a vigência encerrada em maio de 2016.

Mesmo com o encerramento da vigência da medida provisória, há quem defenda a legalidade dos acordos em ação de improbidade administrativa.

Dizem, os defensores, que a Lei nº 8.429/1992 integra-se a um microssistema de combate à corrupção, com a Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) e a Lei nº 7.347/1985 (Lei de Ação Civil Pública).

Dizem também que o § 1º do art. 17. da Lei nº 8.249/1992 foi revogado tacitamente por esse microssistema e pelo Código de Processo Civil de 2015. Os arts. 3º e 16 da Lei nº 12.846/2013 admitem acordos em processos penais; e os §§ 2º e 3º do art. 2º do Código de Processo Civil de 2015 (Lei 13.105/2015) exortam a conciliação judicial como meio de solução de conflitos.

Estaria, então, revogado o § 1º do art. 17. da Lei nº 8.249/1992, e admitido o acordo, através dos citados dispositivos da Lei Anticorrupção e do Código de Processo Civil de 2015.


O Ministério Público nas ações de improbidade administrativa

O Ministério Público pode requisitar a instauração de um inquérito policial ou de um procedimento administrativo para apuração dos ilícitos previstos na Lei nº 8.429/1992.

Para tanto, o Ministério Público pode agir de ofício, por requerimento de autoridade administrativa ou por representação de qualquer pessoa.

Se a ação de improbidade for proposta pela procuradoria de um ente público, o Ministério Público atuará como fiscal da lei, ou haverá nulidade da ação (art. 17, 4º, Lei nº 8.429/1992).


Responsabilidade administrativa, civil e penal

Algo a ter em mente é que a improbidade administrativa é ilícito civil apurado e punido em via judicial civil.

O regime disciplinar da Lei nº 8.112/1990, com a sindicância e o processo administrativo disciplinar (PAD), não pode punir improbidade administrativa.

Pode, apenas, apurar indícios, e levá-los ao Ministério Público ou à procuradoria do ente público, para que um deles ingresse com a ação judicial de improbidade administrativa.

Às vezes a natureza civil da improbidade administrativa fica obscurecida porque os casos de improbidade costumam gerar processos e condenações na esfera administrativa, criminal e civil.

Isso acontece porque, na prática, a pessoa que comete improbidade administrativa geralmente pratica diversas ilicitudes simultaneamente.

O delinquente de uma só vez descumpre o regime disciplinar (direito administrativo), comete crime (direito penal) e pratica improbidade (direito civil). Em consequência, termina processado nas três esferas, gerando um emaranhado de processos administrativos, cíveis e criminais atinentes a um mesmo evento, porém cada qual preocupado com uma atitude ou personagem desse evento.

Esse emaranhado de processos desperta indagações sobre a acumulação de responsabilidades em todas as esferas em que o sujeito esteja sofrendo processos.

Se um mesmo ato for ilícito administrativo (infração ao regime disciplinar), ilícito civil (improbidade administrativa) e ilícito penal (crime tipificado na legislação penal), qual delas prevalece?

A regra é que nenhuma prevalece — todas atuam ao mesmo tempo. Elas são instâncias independentes entre si e o sujeito pode ser punido separadamente por cada uma delas.

Porém, a exceção é que a instância penal pode prevalecer sobre as instâncias administrativa e civil:

  1. a condenação penal acarreta a condenação nas instâncias civil e administrativa;

  2. a absolvição penal, se devida à inexistência do fato ou à ausência de autoria, acarreta a absolvição nas demais instâncias. Se devida a outros motivos, não interfere nas demais.

Você pode ver uma explicação detalhada da relação entre a responsabilidade nas esferas civil, criminal e administrativa quando explico o regime disciplinar da Lei nº 8.112/1990.


Prescrição das ações de improbidade

Os prazos de prescrição das ações de improbidade estão no art. 23. da Lei nº 8.429/1992:

  • até cinco anos após o término do exercício de mandato;

  • até cinco anos após a desocupação do cargo em comissão ou da função de confiança;

  • o mesmo prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.

    Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
    Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Caso o agente público exerça cargo efetivo e função de confiança cumulativamente, prevalecerá o prazo prescricional do ocupante de cargo efetivo.

Todavia, há uma particularidade importante: são imprescritíveis as ações civis de ressarcimento de dano (art. 37, § 5º, CF88).

Para a jurisprudência do STJ, os prazos prescricionais valem igualmente aos particulares que agem em conluio com agente público na prática de ato de improbidade, uma vez que os particulares nunca são processados isoladamente, mas em conjunto com os agentes públicos.


Referências bibliográficas

ALMEIDA TOURINHO, Rita Andréa Rehem, A eficácia social da atuação do Ministério Público no combate à improbidade administrativa, in Revista de Direito Administrativo, n° 227/253, 2002.

BLASI, Paulo Henrique. A ação civil pública como instrumento de combate à corrupção no Estado democrático de direito, in Revista de Direito Administrativo, n° 221/127, 2000.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. ed. São Paulo. Saraiva, 2003.

BRASIL. Lei nº 8.429/92, de 02 de junho de 1992.

CAETANO, Marcello. Manual de direito administrativo. 1. ed. Brasileira, t. II/684. Rio de Janeiro: Forense, 1970.

CÂMARA LEAL, Antônio Luís da. Da Prescrição e da Decadência. Rio de Janeiro, 1959.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 5. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999.

COSTA, José Armando da, Contorno jurídico da improbidade administrativa. 2. ed. Revista, atualizada e ampliada. Brasília: Jurídica, 2002.

CRETELLA JUNIOR, José. Administração indireta brasileira. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002

FERRACINI, Luiz Alberto. Improbidade Administrativa. 3. ed. São Paulo: Agá Júris Editora, 2001.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 29. ed. atualizada por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixio e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 2004.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Ato administrativo e direito dos administrados. 1981.

______. Curso de Direito Administrativo. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

______. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2. ed., 3ª tiragem, São Paulo: Malheiros, 1998.

TOURINHO, Rita Andréa Rehem Almeida, Dicricionariedade administrativa: ação de improbidade e controle principiológico. 1. ed. Curitiba: Jaruá, 2004.

Sobre o autor
Benigno Núñez Novo

Pós-doutor em direitos humanos, sociais e difusos pela Universidad de Salamanca, Espanha, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción, com o título de doutorado reconhecido pela Universidade de Marília (SP), mestre em ciências da educação pela Universidad Autónoma de Asunción, especialista em educação: área de concentração: ensino pela Faculdade Piauiense, especialista em direitos humanos pelo EDUCAMUNDO, especialista em tutoria em educação à distância pelo EDUCAMUNDO, especialista em auditoria governamental pelo EDUCAMUNDO, especialista em controle da administração pública pelo EDUCAMUNDO, especialista em gestão e auditoria em saúde pelo Instituto de Pesquisa e Determinação Social da Saúde e bacharel em direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Assessor de gabinete de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos