Devo anuir com os acordos de parcelamento de impostos da Municipalidade?

Solução ou problema?

02/12/2019 às 21:35
Leia nesta página:

É preciso analisar o que está sendo acordado para não acabar recolhendo tributos indevidamente cobrados.

"Dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus".... assim diz a passagem inscrita na Bíblia em Mateus 22:21 – razão pela qual devemos saber há muito que, presente o fato gerador, a regra é o recolhimento dos impostos devidos a quem de direito...

Ensina o Mestre RICARDO ALEXANDRE (Direito Tributário Esquematizado. Método, 2015) que, “segundo o art. 32 do CTN, o IPTU tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município”.

Portanto, é do proprietário de imóvel, por exemplo, a responsabilidade pelo pagamento (anual) do IPTU.

É óbvio e muito importante que, na ocorrência das campanhas (praticamente anuais) das Prefeituras o contribuinte inadimplente fique atento à oportunidade que lhe é conferida de quitar seus débitos em atraso e assim colaborar para o desenvolvido da municipalidade, além de é claro, prestigiar sua cidadania, cumprindo com seus deveres (e normas bíblicas, inclusive!). Afinal de contas, não se desconhece que o Município só se desenvolve se houver, além de vontade política, recursos e receitas para tanto.

Não bastassem os importantes argumentos, será que de fato o cidadão deve acolher as propostas oferecidas pelo Município para a quitação?

Por certo que não deve anuir a qualquer oferta de parcelamento sem examinar cuidadosamente os débitos que estão sendo negociados. É que a Lei prevê fatos que podem extinguir o crédito tributário, como por exemplo a PRESCRIÇÃO (art. 156, inc. V do CTN). Nestes casos a municipalidade realmente já não tem o que cobrar, simplesmente porque deixou que o manto da prescrição cobrisse o seu direito.

Para o já citado mestre Ricardo Alexandre “opera-se a prescrição quando a Fazenda Pública não propõe, no prazo legalmente estipulado, a ação de execução fiscal para obter a satisfação coativa do crédito tributário”.

E se o contribuinte já pagou os débitos prescritos?

O contribuinte que pagou débitos prescritos tem direito a restituição do valor, acrescido inclusive de correção monetária (Súmula 162 do STJ) e juros (art. 167, par. único do CTN).

Neste caso os Tribunais reconhecem a possibilidade da restituição, como se vê abaixo no REsp 646.328/RS j. em 23/06/2009 pelo STJ:

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IPTU. ARTIGOS 156, INCISO V, E 165, INCISO I, DO CTN. INTERPRETAÇÃO CONJUNTA. PAGAMENTO DE DÉBITO PRESCRITO. RESTITUIÇÃO DEVIDA. 1. A partir de uma interpretação conjunta dos artigos 156, inciso V, (que considera a prescrição como uma das formas de extinção do crédito tributário) e 165, inciso I, (que trata a respeito da restituição de tributo) do CTN, há o direito do contribuinte à repetição do indébito, uma vez que o montante pago foi em razão de um crédito tributário prescrito, ou seja, inexistente. Precedentes: (REsp 1004747/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 18/06/2008; REsp 636.495/RS, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 02/08/2007) 2. Recurso especial provido”. (GRIFAMOS).

É importante assinalar que esse é também o entendimento no âmbito do TJRJ, senão vejamos:

“TJRJ. 0023827-48.2008.8.19.0004 – APELAÇÃO. Des(a). SEBASTIAO RUGIER BOLELLI – Julgamento: 28/06/2011 - DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL. Restituição de valor pago espontaneamente referente a IPTU prescrito. (...). A prescrição no direito tributário, diferentemente do direito privado, atinge o direito, ou seja, o crédito tributário, na forma do artigo 156, V do CTN. Consequentemente extingue a obrigação tributária, nos termos do artigo 113, §1º do mesmo diploma legal. A lei tributária prevê a restituição no caso de pagamento indevido. Reforma da sentença para condenar o apelado ao pagamento dos valores pagos referentes ao IPTU dos exercícios de 1994 a 1996, que já estavam prescritos há época do parcelamento do tributo em novembro de 2001. Invertendo-se os ônus sucumbenciais. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO”. (GRIFAMOS).

“TJRJ. 0005112-46.2014.8.19.0036 – APELAÇÃO. Des(a). TERESA DE ANDRADE – Julgamento: 18/10/2017 – SEXTA CÂMARA CÍVEL. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. (...). PAGAMENTO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO PRESCRITO. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO EM AÇÃO AUTÔNOMA. POSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO. 1. (...). 2. A prescrição no direito tributário extingue o próprio crédito tributário e não apenas a pretensão para a busca da tutela jurisdicional. 3. O reconhecimento do débito tributário, não importa o renascimento do crédito já extinto nos moldes do art. 156 do CTN. 4. Ocorrendo a prescrição inexiste causa para o pagamento, o que o torna indevido, surgindo o dever de restituição, nos termos do inciso I do art. 165 do CTN. 5. A correção monetária deve incidir a partir do pagamento indevido e o termo a quo dos juros moratórios fluirão do trânsito em julgado da decisão. Súmulas 162 e 188 do STJ. 6. Recurso provido”. (GRIFAMOS).

A restituição pode ser pedida a qualquer momento?

O pedido de restituição está sujeito ao prazo decadencial de 05 (cinco) anos, nos termos do art. 168 do CTN. No caso do IPTU, conta-se a partir do dia seguinte ao pagamento efetivo, como já assentou o STJ (AgRg no REsp 601.111/CE). É importante salientar que, quanto aos débitos prescritos, ainda assim a Fazenda Municipal os cobre incluindo em parcelamentos, caso o contribuinte desavisadamente pague, poderá postular a restituição, não havendo se falar em eventual “renúncia ao direito da prescrição dos créditos tributários” já que na hipótese os mesmos não “renascem” – diferentemente do caso onde a prescrição ainda não tenha atingido o crédito tributário: é que nessa hipótese a anuência do contribuinte ao acordo de parcelamento implicará em confissão espontânea da dívida com interrupção da prescrição tributária.

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Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

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