Ausência do contraditório e ampla defesa no inquérito policial

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O presente trabalho tem por objetivo apresentar uma breve análise acerca da aplicabilidade do contraditório e ampla defesa no inquérito policial, analisando-o em seus aspectos e modalidades, bem como sua competência e requisitos.

 

A palavra investigação em seu sentido amplo nos traz a ideia de busca do desconhecido, seria uma pesquisa no intuído de adquirir conhecimento acerca de algo que ainda não está claro, um esforço humano que visa esclarecer certos aspectos obscuros, sejam eles de um fato, objeto ou pessoa.

Por sua vez, a investigação criminal realizada pela autoridade policial competente é um importante instrumento da persecução penal, a qual visa elucidar e apurar os supostos fatos tidos como criminosos, é um levantamento detalhado do ocorrido sob vários aspectos formais e materiais.

O inquérito policial é a materialização da investigação criminal, o qual possui dentre várias definições a do Decreto de lei nº 4.824, de 22 de novembro de 1.871, no seu artigo 11 §3º:

 

“O objetivo do Inquérito Policial é a verificação da existência da infração penal, o descobrimento de todas as suas circunstâncias e da respectiva autoria.”


 

Na doutrina Brasileiro encontramos várias definições dentre grandes autores para o que seria inquérito policial, um deles define Fernando Capez, em seu livro, Curso de Processo Penal, 16º Ed,; (2009, p.67);


 

“É o conjunto de diligências realizadas pela polícia judiciária para a apuração de uma infração penal e de sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo (CPP, art.4º). Trata-se de procedimento persecutório de caráter administrativo instaurado pela autoridade policial.”


 

Dessa forma, fica nítido que o inquérito policial trata-se de um procedimento administrativo voltado para apuração de fatos criminosos.

A Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5°, inciso LV, nos traz dois importantes princípios:


 

LV- aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;


 

Sabemos que os princípios constitucionais são norteadores de todo nosso ordenamento jurídico, constituído uma base sólida para toda a estrutura de um estado de direito, criando assim parâmetros para as relações entre estado e sociedade.

Como princípio do contraditório podemos entender como sendo aquele que garante uma igualdade de defesa entre as partes, em todos os atos realizados no decorrer do processo, ou seja, é a garantia de que ambas as partes possam ser ouvidas e ambas impugnem as declarações umas das outras.

Nesse sentido ensina Leonardo Greco em seu livro Instituições de Processo Civil. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010, que


 

O princípio do contraditório pode ser definido como aquele segundo o qual ninguém pode ser atingido por uma decisão judicial na sua esfera de interesses, sem ter tido a ampla possibilidade de influir eficazmente na sua formação em igualdade de condições com a parte contrária. (2010, p. 539).


 

Dessa forma, seria este princípio o garantidor de um diálogo entre as partes envolvidas no processo judicial ou administrativo, é a garantia de que além de ser ouvido, refutar aquilo que é pronunciado a seu respeito.

Já tratando-se do princípio da Ampla defesa podemos afirmar que é um dos mais importantes princípios democráticos, é a forma mais completa do réu se defender, garantido a ele o direito de se utilizar de todos os meios legais para se defender, como por exemplo o instituto da autodefesa e da defesa técnica.

André Rovégno, em seu livro, O Inquérito Policial E Os Princípios Constitucionais Do Contraditório E Da Ampla Defesa, 1º Ed, define o princípio em comento da seguinte forma


 

“O Princípio da Ampla Defesa, assim como ocorre, em geral, com todos os princípios, é um aglutinado de ideias, máximas e proposições, que foram sendo erigidas, ao longo dos últimos séculos, e paralelamente ao Estado de Direito, com a finalidade de permitir que o ”ius libertatis” do indivíduo encontrasse completa proteção,em face da persecução penal estatal.”


 

Ambos os Princípios foram instituídos para serem garantidores do devido processo legal, assegurando que o indivíduo possa processar e ser processado de forma justa em igualdade de condições, seja entre processos judiciais entre particulares ou até mesmo em litígios entre o particular e estado por exemplo.

Entretanto, como já citado, ambos os princípios expostos não encontram lugar dentro do inquérito policial, mesmo este sendo um processo administrativo. Tal fato se dar por alguns fatores que o distingue dos demais processos administrativos comuns.

Antes de tudo temos que evidenciar que o inquérito policial possui natureza jurídica de caráter inquisitório, ou seja, não se trata de um procedimento acusatório, mas sim de investigação, o sujeito passivo aqui nada mais é do que um suspeito do crime, onde em nenhum momento este é apontado como sendo de fato autor do crime, diante disso não cabe ao indiciado se defender, pois nem se quer existe uma acusação contra sua pessoa.

Assim define Fernando Capez em seu livro, Curso de processo penal, 2016. 23° ed, os procedimentos inquisitivos:


 

Caracteriza-se como inquisitivo o procedimento em que as atividades persecutórias concentram-se nas mãos de uma única autoridade, a qual, por isso, prescinde, para a sua atuação, da provocação de quem quer que seja, podendo e devendo agir de ofício, empreendendo, com discricionariedade, as atividades necessárias ao esclarecimento do crime e da sua autoria

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Devido a esse caráter inquisitivo, não há se falar em contraditório e ampla defesa simplesmente pelo fato de que em nenhum momento houve acusação, mas sim levantamento de informações, tendo em vista que os atos realizados dentro do inquérito não são atos judiciais.

Todavia, em dezembro de 2015 o STF aprovou a seguinte súmula vinculante número 14, dando a esta caráter de repercussão geral:


 

“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.


 

Dessa forma, ficou assegurado ao advogado do investigado ter acesso a todos os atos já documentados pela autoridade policial acerca do seu cliente, Desse modo, o advogado tendo acesso amplo a elementos de prova já colhidos e documentados pode antecipadamente elaborar uma defesa.

Embora não garanta que o advogado realize a defesa nos autos do inquérito, a súmula vinculante 14 tornou mais efetivo o direito do investigado de exercer a ampla defesa e o contraditório, visto que antes dela o defensor só teria acesso ao inquérito quando este já estivesse concluído.

Além do mais, em nenhum momento o indiciado seria prejudicado por não se defender na fase investigativa, pois o mesmo terá a possibilidade de se utilizar de todos os meios possíveis de defesa em uma eventual ação penal, momento no qual já há uma acusação formal feita por uma autoridade competente, Ministério público, e apresentada ao Juiz.

Outro motivo pelo qual seria inviável o uso dos princípios citados durante a formulação do inquérito policial é o fato de que prejudicaria em muito o andamento das investigações, tendo em vista que os prazos de duração dos inquéritos são demasiadamente curtos, principalmente se o indiciado estiver preso, dessa forma uma eventual aplicação destes princípios tornaria quase que impossível a conclusão dos procedimentos.

Ora, sabemos que principalmente em se tratando de crimes graves o estado tem a obrigação de apresentar uma resposta de forma mais célere possível à sociedade, devendo a autoridade policial promover todos as diligências necessárias e em menor tempo possível, a fim de fornecer todos os elementos para que o Ministério Público possa, se assim entender, propor a competente ação penal.

Por fim, reforço que o inquérito policial é um procedimento administrativo, porém, além disso é um ato inquisitivo e de caráter sigiloso, onde não há acusação, mas sim investigação, um levantamento de informações, provas e indícios que levem a elucidação do fato criminoso, razões estas que fundamentam a não aplicação dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa durante sua formulação.

 

CONCLUSÃO

 

Por fim, tendo por base as motivações apresentadas, chegamos à conclusão de que o tema ainda merece ser bastante debatido e estudado para que se chegue a um termo comum, visualizando as questões relativas à segurança da população, quer seja legalizando o porte e posse de arma, quer seja deixando tal uso proibido.

 

REFERÊNCIAS

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. DF: Senado Federal. 1988.

 

BRASIL, LEI Nº 13.245. Brasília. DF, Altera o art. 7º da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994.

 

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal.  23. ed São Paulo : Saraiva, 2016.

 

LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal: volume único. 4. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.

Sobre os autores
Antônio Dyego de Aguiar Moreno

Estudante de Direito da Faculdade Luciano Feijão.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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