Os determinantes do planejamento estratégico, no âmbito governamental

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Este trabalho tem por objetivo incitar uma discussão teórica acerca dos determinantes do planejamento estratégico, no âmbito governamental. Pretende-se explorar as constantes da apropriação estratégicos no setor público, bem como seus alcances e desafios.

O presente trabalho tem como tema o planejamento estratégico enquanto ferramenta de gerenciamento da atuação das instituições do setor público. O objetivo primordial deste estudo é incitar uma discussão teórica acerca da administração estratégica e explorar determinadas constantes de sua utilização no setor público. Para atender a finalidade proposta, utilizou-se como recurso metodológico, a pesquisa bibliográfica e documental sobre a conceituação e delimitação do planejamento estratégico, no âmbito governamental.

O planejamento pode ser entendido como uma “contínua avaliação de alternativas e a tomada de decisões interrelacionadas, antes que a ação se faça, de modo que a probabilidade de um resultado favorável ou mais favorável aumente”. (Ferreira, 1998, p.14). Outra definição colocada por Maximiliano (2000), trata o planejamento como ferramenta capaz de ser empregada por cidadãos e por instituições com o objetivo de administrar suas relações com as situações futuras. Barreto e Estrada (2006) apontam para a diversidade de modelos de planejamento encontrados durante o processo de desenvolvimento da sua definição. Até 1960, por exemplo, os autores destacam que os modelos implementados traziam planejamentos, para o longo prazo, que não levavam em conta as transitoriedades do ambiente ou que estavam em descompasso com as soluções de problemas inéditos que se apresentavam. A partir desse contexto, os estudos organizacionais são impulsionados, dando origem ao pensamento estratégico-empresarial, uma das bases do Planejamento-Estratégico.

O planejamento das instituições está essencialmente relacionado com sua estratégia. De acordo com Quinn (apud SOUZA, 2013), a estratégia deve reunir as principais políticas, metas e iniciativas de determinada organização, sendo capaz de assessorar o processo de distribuição de recursos para o alcance de uma situação futura desejada, sem deixar de considerar suas competências, fraquezas internas ou possíveis mudanças no ambiente.

Complementarmente, a estratégia da instituição deve ser recorrentemente revisitada para que sejam incorporadas mudanças do ambiente inexistentes, por exemplo, ao longo do processo de construção da estratégia. Trata-se então, de processo contínuo e dinâmico para que a organização evolua e se aproxime, cada vez mais, da postura planejada. (REZENDE, 2011).

A intensidade das reivindicações da sociedade por serviços públicos mais eficientes e capazes de atender a públicos diversos vem crescendo gradativamente, exigindo que as instituições sejam flexíveis e capazes de incorporarem mudanças que se apresentam e as demandas inéditas. Apresentado esse contexto, faz-se necessária a implementação da Administração Estratégica no setor público. (BARRETO; ESTRADA, 2006).

A Administração Estratégica, quando priorizada nas organizações públicas é capaz de: (i) incrementar o processo de identificação de oportunidades para o desenvolvimento; (ii) controlar e minimizar fraquezas; (iii) melhor enfrentar as ameaças; bem como (iv) legitimar e disseminar as competências da instituição. (BARRETO; ESTRADA, 2006). Entretanto, diferente do setor privado, as instituições públicas precisam lidar rotineiramente com uma série de influências internas e externas específicas à lógica governamental.    

Pfeiffer (2000) apresenta algumas constantes encontradas no processo de construção do planejamento estratégico no ambiente público. Diversos planos estratégicos governamentais são robustos, trazendo em sua estrutura uma extensão de áreas, programas, iniciativas e situações-problema. Ou seja, sem a devida priorização de ações ou com raros indícios de aplicação dos princípios fundamentais do planejamento estratégico. Além disso, muitos planos não apresentam propostas tecnicamente viáveis, em nível de execução, em função das descrições pouco claras e vagas, sendo então, mais um dos produtos ou documentos formais elaborados pela instituição.

Outra destaque está na influência da política nos desenhos estratégicos, no âmbito do setor público. Muitos gestores públicos, centralizadores do processo decisório, priorizam a seleção de intervenções que geram visibilidade e repercussão, não necessariamente intervenções estratégicas capazes de atingir a estrutura dos problemas. Os ciclos de renovação política intensificam a escolha de iniciativas de curto e médio prazo, capazes de produzir impacto midiático para que se garanta visibilidade na concorrência pela reeleição ou eleição de função pública. As propostas de longo prazo, estruturantes e, em certa medida, com alta capacidade de atendimento aos cidadãos ou provenientes de demandas sociais historicamente reprimidas são mantidas em segundo plano. (PFEIFFER, 2000).

Existem certas condições, dentro do contexto de planejamento estratégico, capazes de dificultar, em maior grau, a efetivação da construção estratégica no ambiente governamental, em relação à iniciativa privada, e que merecem atenção e acompanhamento. Pfeiffer (2000) destaca 

 

[...] além da óbvia condição da vontade política para iniciar um processo de transformação nas organizações, é importante que o processo disponha de uma liderança competente, de preferência composta por representantes de organizações públicas e privadas. Também são necessários recursos mínimos, sensibilidade social e um forte sentido comum. (PFEIFFER, 2000, p.10).

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Nesse sentido, a implementação do planejamento estratégico envolve movimentos de mudança organizacional sujeitos, por exemplo, à ausência de liderança ao longo do processo ou seu pouco protagonismo, bem como desmotivação dos patrocinadores da iniciativa para alteração de estruturas, procedimentos padrões, costumes e princípios arraigados. Um dos caminhos possíveis para se contornar tais impedimentos no setor público é o envolvimento participativo de todos os atores para que a construção dos valores da instituição ocorra de maneira gradativa e sua assimilação seja natural e espontânea.  (CHIAVENATO; SAPIRO, 2003).

Existe uma série de etapas recomendáveis para que a assimilação dos planos estratégicos seja efetiva nas instituições governamentais, conforme enumerado por Sanches (1993, p.7): “o diagnóstico da realidade presente, o delineamento de cenários de futuro desejados, a articulação de estratégias para sua realização e das respectivas políticas de apoio, a definição de prioridades e a formulação de programas de intervenção”.  A partir do diagnóstico e seleção das ações essenciais para o alcance da situação futura desejada, elas precisam ser transformadas em metas e objetivos claros. Um importante instrumento garantidor da implementação do plano estratégico é o orçamento público, uma vez que distribui a alocação de recursos em iniciativas estratégicas e mantém suas execuções.  Souza (2013) coloca que:

 

[...] o PEO [Planejamento Estratégico Organizacional] por conter os objetivos da organização deve condicionar o orçamento, para que esses possam ser alcançados. Por outro lado, caso o orçamento não disponibilize recursos para determinadas ações estratégicas, o alcance dos objetivos relacionados a essas poderá ser comprometido. Portanto, deve-se assegurar que o planejamento influencie o processo de alocação orçamentária. (SOUZA, 2013, p.27).

Portanto, o planejamento estratégico, enquanto ferramenta de gerenciamento, no setor público é de extrema relevância e precisa ser levada em consideração, ao longo do processo de tomada decisão. Apesar das especificidades enfrentadas pela sistemática pública dispostas neste estudo, o conceito merece ser priorizado na organização e, consequentemente, integrado com o ambiente governamental envolvido, independente dos fluxos de troca de gestão dos órgãos. Ou seja, é preciso garantir insumos para o alcance da visão de futuro definida no longo prazo, com o mínimo de desvios possíveis.

Apesar de existirem avanços na implementação de iniciativas estratégicas, dentro da lógica pública, muito ainda precisa ser explorado para que tais planos sejam a força motriz e central das instituições. Por fim, muitas definições estratégicas precisam ainda superar o status de registro formal para cumprir exigências superiores, deslocadas das intenções sociais ou afastadas dos técnicos que compõe aquela organização pública.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BARRETO, Paulo Ricardo Ceni; ESTRADA, Rolando Juan Soliz. Do planejamento estratégico à administração estratégica: que estágio encontram-se os municípios do noroeste do Rio Grande do Sul? In: Revista Contemporânea de Contabilidade, Santa Maria, v.1, n.6, p. 61-80, jul/dez. 2006. Disponível em: < https://periodicos.ufsc.br/index.php/ contabilidade/article/view/783/622>. Acesso em: 13 dez. 2019.

 

CHIAVENATO, Idalberto; SAPIRO, Arão. Planejamento Estratégico – Fundamentos e aplicações. Da intenção aos Resultados. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. – 7 Reimpressão.

 

FERREIRA, Maria do Carmo Ribeiro Schwandner. Orçamento: um instrumento de planejamento e controle. São Paulo, FGV/EAESP, 1988. (Dissertação de Mestrado apresentada ao curso de Pós Graduação da FGV/EAESP, Área de conhecimento: Contabilidade, Finanças e Controle). Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/5106/1198900372.pdf?sequene=1&isAllowed=y >. Acesso em: 13 dez. 2019.

 

MAXIMIANO, Antonio Cesar Amaru. Introdução à Administração. 5 ed. São Paulo: Atlas, 2000.

 

PFEIFFER, Peter. Planejamento estratégico municipal no Brasil: uma nova abordagem. Brasília: ENAP, Texto para Discussão nº 37, 2000. Disponível em: <http://www.enap.gov.br/documents/586010/601535/37texto.pdf/620429ef-b89f-4a61-b563-3e9a1e8d0b5c>. Acesso em: 10 dez. 2019.

 

REZENDE, Fernando. Planejamento no Brasil: auge, declínio e caminhos para a reconstrução. In: CARDOSO JUNIOR, José Celso. A reinvenção do planejamento governamental no Brasil. Brasília: Ipea, 2011. V.4 (517 p.). Cap.2. p. 177-214.

 

SANCHES, Osvaldo Maldonado. O ciclo orçamentário: uma reavaliação à luz da Constituição de 1988. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro: v. 27, n.4, p. 54-76, out/dez, 1993.

 

SOUZA, Flávio Sérgio Rezende Nunes de. A Integração entre o Planejamento Estratégico e o Processo de Elaboração Orçamentária no setor público: o caso das organizações da Marinha. Rio de Janeiro, EBAPE/FGV, 2013. (Dissertação de Mestrado apresentada à Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas, Área de concentração: Gestão Pública). Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/11370/dissertacao_flaviosouza.pdf?sequence=3&isAllowed=y>. Acesso em: 11 dez. 2019.

 

 

 

 

 

 

 

Sobre os autores
Gabriela dos Santos Ribeiro

Bacharel em Administração Pública pela Fundação João Pinheiro.

Fernando Silvestre de Brito

EPPGG em Governo do Estado de Minas Gerais Bacharel em Administração Pública (Fundação João Pinheiro/MG, 2011)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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