A tipificação do feminicídio sob a ótica do homicídio de mulheres na comarca de Ariquemes (RO)

Exibindo página 5 de 5
16/12/2019 às 11:38
Leia nesta página:

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo buscou explanar primeiramente acerca dos significados de femicídio e feminicídio, destacando o conceito de gênero/ sexo feminino e a violência brutal a que milhares de mulheres são submetidas diariamente ao redor do mundo, principalmente no Brasil que é o 5º lugar do mundo mais perigoso para ela viverem.

Uma violência que busca se legitimar no patriarcalismo arcaico e na cultura do machismo e de subjugação da figura da mulher.

A violência contra mulheres no Brasil, em todas as suas unidades federativas atingiu índices alarmantes levando o Brasil a mais uma vez ser denunciado à Comissão Internacional de Direitos Humanos, obrigando-o a assumir um compromisso de criar metas e meios de enfrentamento a violência de gênero que, ultrapassa qualquer forma de entendimento ou justificativa, surgindo a necessidade de compreensão de todas as formas de violência já tão discutidas e dispostas na Lei nº.11.340/06 que mesmo sendo o resultado de anos de lutas por mulheres não é capaz sozinha de coibir e evitar esse genocídio misógino, essa aniquilação do povo feminino.

Ante o exposto, nasceu a necessidade de tipificar o assassinato de mulheres por questão de gênero – surge a tipificação do feminicídio – que transforma esses assassinatos em crimes hediondos com aplicação de sanções mais gravosas para o agente que cometê-los.

No cenário atual estamos diante de uma guerra civil entre homens e mulheres, o feminicídio emerge como uma medida de punição, uma sanção repressiva, já que o Estado não consegue agir com eficiência e eficácia na aplicação e execução das medidas protetivas da Lei Maria da Penha.

Ademais, nesta pesquisa apurou-se que o estado de Rondônia em suas principais comarcas, principalmente na que serviu de base para este estudo, o número de assassinatos e tentativas por questão de gênero é altíssimo se levarmos em consideração o número de mulheres em idade produtiva por metro quadrado e a cada dia cresce o número de denuncias de feminicídios, a exemplo, já no início de 2019 tivemos 07 (sete) casos de feminicídios consumados e, na Comarca de Ariquemes, foi registrado 01 feminicídio consumado, seguido do suicídio do possível autor e um feminicídio tentado.

De modo geral, na divisão desta pesquisa o primeiro capítulo foi apresentando o conceito de violência de gênero, os tipos de violência trazidos pela Lei Maria da Penha, a questão do patriarcalismo e da cultura do machismo a que nossa sociedade é alicerçada, enquanto que no capítulo segundo, o foco foram os marcos de conquistas das lutas femininas até culminarem na promulgação da Lei nº.13.104/15 – Lei do Feminicídio, sua tipificação, qualificadoras, requisitos necessários e a majoração por crime hediondo. Os capítulos seguintes limitarem-se na aplicação da classificação do feminicídio, os sujeitos ativos e passivos, a aplicação com base no código repressivo, regime inicial de cumprimento, exibindo gráficos, tabelas, fotos de vítimas e denunciados, número de registros de denúncias, no que tange aos três primeiros anos da promulgação da Lei.

Para encerrar este estudo, cinco casos emblemáticos ocorridos e julgados pelo Plenário do Júri da Comarca de Ariquemes, em que quatro deles foram classificados como feminicídios e os réus condenados com base no art. 121, §2º, incisos II, IV e VI, §2º-A, inciso I (feminicídio) e o tratamento que foi dispensado pelo nosso judiciário para cada réu e cada caso concreto. Como dito anteriormente, apenas o primeiro caso foi classificado como homicídio duplamente qualificado (por motivo torpe e sem chance de defesa para a vítima).

Observou-se durante os estudos que mesmo a Lei do Feminicídio prevendo a aplicação de uma pena mais gravosa, por estar o crime no rol de crimes hediondo, não é suficiente para coibir ou evitar que esse tipo de delito seja cometido em nossa comarca ou de modo geral, no país.

O número de assassinatos não está diminuindo, talvez seja a certeza que independente da crueldade com que a vítima tenha sido executada, não importa os requintes, os meios empregados, nem a majoração da pena, uma vez que a própria lei fornece a esses culpados vários direitos a benefícios que diminuirão o seu tempo de reclusão.

Às vezes a impressão que se tem é que o agente encara o encarceramento como uma colônia de férias, onde ele agiu com a mais genuína legitimidade sobre seu objeto (vítima) que a ele e somente a ele pertencia aquela vida que ele próprio era legitimado a pôr um fim quando e como quisesse, sendo injusto o estado cercear a sua liberdade de locomoção, ora ele era o senhor, o subordinante, superior aquele ser.

A Comarca de Ariquemes, ante a realidade do feminicídio deveria enfrenta-lo de forma mais urgente e enérgica, trabalhando com a prevenção, começando a moldar uma nova sociedade, devendo agir de imediato lá no maternal, lapidando esses sujeitos de ambos os gêneros, fazendo-os compreender e enaltecer que somos todos iguais, homens e mulheres em direitos e deveres, que a pessoa do sexo feminino não pode e não deve sofrer subjugação pelo seu gênero, assim criar-se-á uma sociedade longe do padrões errôneos do patriarcalismo e do machismo, ou veremos outras Sindys, Nairs, Vanessas, Taiaras, Geizianes, Sirléias, entre tantas outras brutalmente assassinadas por alguém que um dia jurou amá-las e protegê-las.


REFERÊNCIAS

______. Lei Maria da Penha. Lei n. 11.340/2006. Coíbe a violência doméstica e familiar contra a mulher. Presidência da República, 2006.

______.Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 03 de jul.2017.

______.Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. Lei de Crimes Hediondos. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8072.htm>. Acesso em 03 de jul.2017>

ALVES, Jones Figueirêdo. Violência psicológica torna mulheres reféns absolutas. Conjur. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2014-jan-15/jones-figueiredo-violencia-psicologica-torna-mulheres-refens-absolutas. Acesso em: 13 jun. 2018.

Amnesty International Publications. 2004. VIOLENCE AGAINST WOMEN: GLOBAL HUMAN RIGHT SCANDAL. Disponível em: <https://pathssk.org/wp-content/uploads/2011/06/AI-Its-in-Our-hands.pdf>. Acesso em 23 de jul. 2018.

AMNISTIA INTERNACIONAL. México _Poner fin al ciclo brutal de violencia contra las mujeres em Ciudad Juárez y la ciudad de Chihuahua. 2004. Disponível em: <https://www.amnesty.org/es/documents/amr41/011/2004/es/> Acesso em 24 de jul. 2018.

BANDEIRA, Lourdes. Feminicídio: a última etapa do ciclo de violência contra mulher. 2013. Disponível em: <https://www.compromissoeatitude.org.br/feminicidio-a-ultima-etapa-do-ciclo-da-violencia-contra-a-mulher-por-lourdes-bandeira/> Acesso em 23 de jul. 2018.

BRASIL, Lei. n. 13.104. de 9 de março de 2015. Lei do Feminicídio. Diário Oficial da

R epública Federativa do Brasil. Disponível em:<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015- 2018/2015/Lei/L13104.htm>. Acesso em 22 de abr. de 2018

BRASIL. Código Penal Brasileiro. Lei N. 2848, de 7 de dezembro de 1940. Vade Mecum. São Paulo: JusPODIVM, 2019.

BUZZI, Ana Carolina de Macedo. Feminicídio e o Projeto de Lei nº292/2013 do Senado Federal. Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/122342> Acesso em 18 de jul. 2018.

CUNHA, Rogério Sanches; PINTO, Ronaldo Batista. Violência Doméstica: Lei Maria da Penha Comentada Artigo por Artigo. 6ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

CUNHA, Tânia Rocha Andrade. O preço do silêncio: violência conjugal contra mulheres de camadas médias e alta. Tese (Doutorado). 2007. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=UXFnRHU5g8IC&pg=PA3&lpg=PA3&dq=tania+rocha+andrade+cunha&source=bl&ots=HgP8RQ16Qs&sig=MWSQseUk1lnDsONd5Hwwfe7Toy8&hl=ptBR&sa=X&ved=0ahUKEwiMh7XE3qzLAhWCQ5AKHU_eAF0Q6AEILTAE#v=onepage&q=tania%20rocha%20andrade%20cunha&f=false>.

DIAS, Maria Berenice. Lei Maria da Penha: A efetividade da Lei 11.340/2006 de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. 4ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

FERNANDES, Valéria Diez Scarance. Feminicídio: Uma Lei Necessária? Jornal Carta Forense, 2015. Disponível em: <https://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/feminicidio-uma-lei-necessaria/15183>. Acesso em 28 fev. 2018.

G1. Monitor da violência – Feminicídios no Brasil. Disponível em: <https://especiais.g1.globo.com/monitor-da-violencia/2018/feminicidios-no-brasil/>. Acesso em 03 de abr. 2019.

GALVÃO, Instituto Patrícia. Feminicídio: Invisibilidade Mata. 2017. Disponível em:<https://agenciapatriciagalvao.org.br/wp-content/uploads/2017/03/LivroFeminicidio_InvisibilidadeMata.pdf>. Acesso em 23 de jul. 2018.

GOMES, Luiz Flávio. Feminicídio: Entenda as Questões Controvertidas da Lei 13.104/2015. JusBrasil, 2015. Disponível em:<https://professorlfg.jusbrasil.com.br/artigos/173139525/feminicidio-entenda-as- questoes-controvertidas-da-lei-13104-2015>. Acesso em 25 fev. 2016.

JESUS, Damásio Evangelista de. A Violência Contra a Mulher: Aspectos Criminais da Lei nº 11.340/2006. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

LIMA, Larissa Alves de Araújo et al. Marcos e dispositivos legais no combate à violência contra a mulher no Brasil. 2016. Disponível em: <https:// dx.doi.org/10.12707/RIV16034 >. Acesso em 26 de ago. 2018.

LINS, Regina Navarro. Cama na Varanda: arejando nossas ideias a respeito de amor e sexo: novas tendências/ Regina Navarro Lins. – Ed.rev. e ampliada. – Rio de Janeiro: BestSeller, 2007.

MANZINI, Luana. VELTER, Stela Cunha. Violência psicológica contra mulheres: uma abordagem com instrumentos previstos na Lei Maria da Penha. 2016. Disponível em:<https://jus.com.br/artigos/64779/violencia-psicologica-contra-mulheres-uma-abordagem-com-os-instrumentos-previstos-na-lei-maria-da-penha>. Acesso em 26 de ago. 2018.

MENEZES, Adhara Catharinie Reis. A tipificação do feminicídio sob a ótica do homicídio de mulheres no estado de Roraima. Disponível em:<ufrr.br/direito/index.php?option=com...mulheres>. Acesso em 23 de jul. 2018

MUCHEMBLED, Robert. Uma história da violência. Do final da Idade Média aos dias atuais. Madrid: Paidós, 2010.

NOBRE, Patrícia Moraes. Tentativa de feminicídio contra Elaine Caparróz é um crime de ódio. Disponível em: <https://blog.jovempan.uol.com.br/eva/tentativa-de-feminicidio-contra-elaine-caparroz-e-um-crime-de-odio/>. Acesso em 03 de abr. 2019.

OEA. Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – “Convenção de Belém do Pará”. 1994. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/m.Belem.do.Para.htm>. Acesso em: 8 jan. 2016.

OLIVEIRA, Ana Carolina Gondim de A., COSTA, Mônica Josy Sousa., SOUSA, Eduardo Sérgio Soares. Feminicídio e violência de gênero: aspectos sóciojurídicos. Disponível em:<https://revistatema.facisa.edu.br/index.php/revistatema/article/view/236> Acesso em 23 de jul. 2018.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

OMS, Organização Mundial da Saúde. Relatório Mundial sobre Violência e Saúde. Genebra, 2002. Disponível em: <https://portalms.saude.gov.br/dicas-de-saude/portal/> Acesso em 22 de jul. 2018.

ONU. Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW). 1979. Disponível em: <https://www.un.org/womenwatch/daw/cedaw/cedaw.htm>. Acesso em: 8 jan. 2016.

Organização dos Estados Americanos, Convenção Interamericana para a Prevenção, Punição e Erradicação da Violência contra a Mulher ("Convenção de Belém do Pará"), 1994.

Organização dos Estados Americanos, Convenção Interamericana para a Prevenção, Punição e Erradicação da Violência contra a Mulher ("Convenção de Belém do Pará"), 1994.

RAGAZZI, Felipe. Feminicídio: o crime movido pelo ódio e desprezo. Disponível em:<https://jus.com.br/artigos/62451/feminicidio-o-crime-movido-pelo-odio-e-desprezo>. Acesso em 01 de abr. 2019

RIOS, Dermival Ribeiro. Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Rideel, 2010

SCOTT, Joan Wallach. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade. Porto Alegre, vol. 20, n. 2, jul./dez. 1995, p. 71-99. Disponível em: <https://archive.org/details/scott_gender>. Acesso em: 7 jan. 2018.

SENADO FEDERAL. Relatório Final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Violência contra a Mulher. Brasília, 2013. Disponível em <https://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=130748&tp=1>. Acesso em: 11 dez. 2015.

SILVA, Juliana Andrade da. A qualificadora do feminicídio: considerações acerca da possibilidade da sua aplicação em casos de homicídios de mulheres transgêneras. 2017. Disponível em: <https://conteudo.pucrs.br/wpcontent/uploads/sites/11/2017/09/juliana_silva_20171.pdf>. acesso em 23 de ago. 2018.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE RONDÔNIA. Disponível em:<https://www.tjro.jus.br/>.

VÁSQUEZ, Pastilí Toledo. Feminicidio. Publicado para a Oficina en México del Alto Comisionado de las Naciones Unidas para los Derechos Humanos. 1. ed. México: OACNUDH, 2008. Disponível em: <https://hchr.org.mx/files/doctos/Libros/feminicidio.pdf>. Acesso em 11 jan. 2018.

VELASCO, Clara. CAESAR, Gabriela. REIS, Thiago. Cai o nº de mulheres vítimas de homicídio, mas registros de feminicídio crescem no Brasil. Disponível em:<https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2019/03/08/cai-o-no-de-mulheres-vitimas-de-homicidio-mas-registros-de-feminicidio-crescem-no-brasil.ghtml>. Acesso em 21 de jul. 2018.

ZIBECHI, Raúl. Los feminicidios, parte de la cuarta guerra mundial. Disponível em:<https://www.jornada.com.mx/2016/08/19/opinion/021a1pol>. Acesso em 13 de jan. 2018.


Notas

1 A violência contra as mulheres não se limita a nenhum sistema político ou econômico específico, mas é predominante em todas as sociedades do mundo. Ele atravessa fronteiras de riqueza, raça e cultura. As estruturas de poder dentro da sociedade que perpetuam a violência contra as mulheres são profundamente enraizadas e intransigentes. A experiência ou ameaça de violência inibe as mulheres em todos os lugares de exercer plenamente e desfrutar de seu direito humano.

2 "A violência contra as mulheres é a maior atrocidade cometida contra os direitos humanos em nossos tempos. Desde o momento em que nascem até a morte, tanto em tempos de paz como de guerra, as mulheres enfrentam discriminação e violência do Estado, da comunidade e da família ".

3 Força física.

4 Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã escrito em 1791 por Marie Gouze conhecida pelo pseudônimo de Olympe de Gouges e endereçado à Rainha.

5 Uma reivindicação pelos direitos da mulher, escrito por Mary Wollstonegraft em 1792.

6 CEDAW – Convenção sobre a Eliminação de Todas as formas de Discriminação contra Mulher (1979).

7 Marcela Lagarde é uma antropóloga e pesquisadora mexicana, especializada em etnologia, representante do feminismo latino-americano.

8 Diana Russell é uma escritora e ativista feminista.

9 Diz respeito ao órgão sexual que possuímos em nosso corpo.

10 O inciso IV do §7º do art. 121. do CP foi acrescentado pela Lei n. 13.771, de 19 de dezembro de 2018.

Sobre a autora
Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos