Transparência para inglês ver

21/12/2019 às 03:26
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Um pouco de história e a "Transparência Criativa" da Câmara Municipal de São Paulo.

Os britânicos, por um longo período dominaram o mercado de escravos. Foram mais de duzentos anos, sobretudo monopolizaram o tráfico de negros africanos. Também lideraram os movimentos antiescravistas abolindo tal prática em 1807. A nível geopolítico, tentaram fazer jus à sua moral, exercendo pressão noutros estados fomentando as aspirações abolicionistas. Eram tempos de iluminismo.

Assim, a partir de 1833, o Reino Unido proibiu o tráfico de escravos em suas colônias, abolindo definitivamente a escravidão em seus territórios. Começava uma agressiva campanha pelo fim do escravismo nos demais países. Em 1826 a Coroa Britânica obrigou o Brasil, que havia recentemente adquirido sua independência, a firmar um tratado de abolição do tráfico em três anos, o que não foi efetivamente cumprido. Mas o Brasil, já independente, era economicamente dependente dos britânicos, porque eles lideravam a aquisição da produção do café e também forneciam a maior parte dos produtos manufaturados aos brasileiros. A pressão britânica era intensa, o príncipe Dom Pedro II ainda não atingira a maioridade e Dom Pedro I do Brasil, havia abdicado do trono. Então o Governo Regencial promulgou em 1831 a Lei Feijó, que declarava livres os africanos desembarcados em portos brasileiros desde aquele ano, mas o sentimento geral era de que a lei não seria cumprida, fazendo circular pela Corte e na Câmara dos Deputados, o comentário de que o Regente Feijó fizera uma lei só "para inglês ver".

Desde então, a expressão passou a designar tanto leis que só existem no papel como também qualquer outra coisa feita apenas para preservar as aparências, sem que efetivamente ocorra, tanto em “Terrae Brasilis” como em Terras Lusitanas.

A Câmara Municipal de São Paulo e a Lei de Acesso a Informacao

Dentre outros artigos que fazem alusão ao direito à informação, o artigo  da Constituição Cidadã em seu inciso XXXIII estabelece que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.”

Segundo a Lei de Acesso a Informacao - Lei Nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, a publicidade é a regra, o sigilo é a exceção e não o contrárioO espírito da Lei é a divulgação máxima das informações, direito fundamental do cidadão garantido em sua Lei Maior. Estão obrigados a esta Lei os órgãos públicos integrantes da administração direta dos Poderes Executivo, Legislativo, incluindo as Cortes de Contas e Judiciário e o Ministério Público, dentre outros. Com isso, fica estabelecido que os três poderes têm a obrigação de divulgar integralmente informações de interesse público através da Internet.

Há dois anos publiquei nas redes sociais um vídeo abordando este tema, ocasião em que notei que a Câmara Municipal de São Paulo passara há pouco, a omitir do seu portal da transparência o nome dos servidores divulgando apenas cargos e salários.

Momentos em que voltam a nos assombrar notícias de funcionários fantasmas, laranjas, (não as frutas) e “rachadinhas”, tive a curiosidade de compulsar o sítio da Câmara Municipal de São Paulo na internet em 20 de dezembro de 2019, seção Transparência e qual não foi a minha surpresa? Inexiste a informação. Desta feita, nem cargos nem salários, senão vejamos em:

https://www.saopaulo.sp.leg.br/transparencia/salarios-abertos/salarios-abertos/remuneracao-dos-servidoresecomissionados/

Seria leviandade dizer que tais procedimentos visam dificultar a fiscalização do cidadão ou estorvar eventuais investigações acerca de funcionários fantasmas e “rachadinhas” tão populares nos gabinetes do Poder Legislativo em tempos hodiernos, mas o fato é que da Lei do Regente Feijó até hoje já se passaram 188 anos e parece que no Brasil, subsiste a ideia de fazer leis “para inglês ver”.

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Sobre o autor
Wander Simoes

Um humilde administrador, pensador, acadêmico de direito e piloto de rallye.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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