A extinção do arquivamento judicial de investigações pela Lei Anticrime

Resumo:


  • A Lei 13.964/2019 alterou o art. 28 do Código de Processo Penal, afastando a atividade judicial no arquivamento de investigações criminais.

  • Antes da alteração, o Ministério Público solicitava o arquivamento ao Judiciário, que poderia concordar ou remeter ao Procurador-Geral.

  • A nova redação busca concretizar o princípio acusatório, retirando a homologação judicial nos arquivamentos, permitindo o desarquivamento com base em novas provas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A Lei 13.964/2019, que entrará em vigor dia 23/01/2020, conferiu nova redação ao art. 28 do Código de Processo Penal , refinando o sistema acusatório ao afastar a atividade judicial no procedimento de arquivamento das investigações.

    A Lei 13.964/2019, que entrará em vigor dia 23/01/2020, conferiu nova redação ao art. 28 do Código de Processo Penal afastando a atividade judicial do procedimento de arquivamento das investigações criminais. A redação original apontava que o Ministério Público deveria requerer o arquivamento das investigações ao Poder Judiciário que, numa função anômala de fiscalização do princípio da obrigatoriedade da ação penal, poderia concordar e arquivar ou, em caso de dissenso, remeteria o feito ao Procurador-Geral, que insistiria no arquivamento ou designaria outro órgão ministerial para o prosseguimento da persecução penal.

    O juiz fiscalizava a atividade de arquivamento da investigação criminal, quando, então, incursionava as razões de fato e de direito elencadas pelo Ministério Público. Ressalte-se que a investigação criminal é atividade essencialmente administrativa pré-processual que se destina ao Ministério Público para formação de seu opinio delicti. Com efeito, em especial a partir da Constituição Federal de 1988 que consagrou o sistema acusatório, com nítida separação entre as função de acusar e de julgar, extirpando processos judicialiformes e atribuindo ao Ministério Público a titularidade privativa da ação penal, a manutenção da previsão de supervisão judicial no arquivamento de investigação criminal ganhou críticas de vários setores da doutrina nacional1.

    O juiz não exercia, em regra, atividade jurisdicional, mas, meramente,  de controle, uma vez que, discordando das razões invocadas, deveria remeter os autos ao Procurador-Geral quem decidiria de forma definitiva pelo arquivamento. Observe-se, que, no âmbito do Ministério Público Federal, o preceito em questão foi derrogado pelo art. 62, IV da Lei Complementar 75/93, uma vez que a função revisora pertence às Câmaras de Coordenação e Revisão (Atualmente, a depender do tipo penal, a atribuição pode ser da 2ª, 4ª,  6ª ou7ª CCR). Deste modo, a prerrogativa de promover o arquivamento da investigação criminal sempre foi do Ministério Público.

    Com o objetivo de concretizar o princípio acusatório, o Ministério Público Federal já tinha exarada a orientação conjunta 01/2015 no sentido de que os membros a submetessem as promoções de arquivamento de inquéritos policiais, de procedimentos investigatórios criminais e de notícias de fato ou peças de informação diretamente à Câmara competente, para fins de revisão. Deste modo, há quase cinco anos no âmbito federal, o arquivamento das investigações criminais poderia ocorrer diretamente no âmbito interno, sem necessidade de apreciação judicial.

    A Resolução CNMP 181/2017 previa que os procedimentos investigatórios criminais poderiam ser arquivados em juízo ou diretamente perante ao órgão de revisão do Ministério Público, dispensando-se apreciação judicial.

    A nova redação do art. 28 do CPP veio dar um novo passo de forma a afastar a atuação judicial nos arquivamentos da investigação criminal, em consonância com o sistema acusatório. Embora o procedimento não seja novidade, conforme já visto, necessário abordar algumas questões práticas e teóricas.

    Em regra, o arquivamento da investigação em juízo não fazia coisa julgada material, podendo ser desarquivada no caso de notícia de nova prova. No entanto, a jurisprudência, excepcionalmente, defendia a formação de coisa julgada material quanto à decisão judicial de arquivamento com base na atipicidade ou em razão da extinção da punibilidade.

    Haja vista que, pela nova regra, as decisões de arquivamento não serão homologadas pelo Poder Judiciário, não haverá formação de coisa julgada, seja formal ou material, mas apenas preclusão, nada impedindo que ocorra o desarquivamento com base em notícias de novas provas, ainda que o Ministério Público tenha alegado atipicidade ou extinção de punibilidade, por exemplo.

    Ressalte-se que haverá discussão se a nova sistemática se estenderá aos crimes militares porque os artigos que determinam a submissão do pedido de arquivamento à Justiça Militar não foram alterados (art. 25, § 2º; art. 397 todos do CPPM). 

    Embora a alteração tenha ficado restrita ao Código de Processo Penal, o sistema acusatório, de extração constitucional, vigora em todas as fases da persecução penal, irradiando seus efeitos e normais para todos os procedimentos criminais, independentemente do ramo, instância e espécie de crime sob apuração. O Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus 127.900, em 03/03/2016, decidiu que a alteração promovida pela Lei 11.179/2008, no Código de Processo penal, deslocando o interrogatório para o último ato de instrução processual, deveria ser aplicada aos processos penais militares, aos processos penais eleitorais e a todos os procedimentos penais regidos por legislação especial. Igual raciocínio deve ser aplicado quanto ao art. 28 do CPP, que deve incidir, também, ao Inquérito Policial Militar.

    Neste ponto, o legislador andou bem, refinando o sistema acusatório, separando as funções de julgar e acusar/arquivar com a exclusão da participação do Poder Judiciário em matéria que não está sob reserva de jurisdição.

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1 Marcellus Polastri Lima, Curso de processo Penal, vol 1, p 149 Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2002    

Sobre os autores
Douglas Balbi Araujo

Procurador da República; Mestre em Direito Penal; Ex-Procurador do Ministério Público junto ao TCE/RJ; Aprovado nos concursos para os cargos de Defensor Público do Estado do Rio de Janeiro, Procurador Federal/AGU e advogado da Casa da Moeda.

Laura Balbi Araujo

Advogada. Especialista em Investigação Criminal e Segurança Pública

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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