Exclusivamente para desenvolver o “Breves Comentários” deste mês, segue um exemplo prático: Pense na existência de que numa certa Unidade Militar, um Tenente, que após desentender-se com um Sargento, injustamente faz a Comunicação Disciplinar daquele seu subordinado. Por outro lado, o citado Sargento, diante do acontecimento, sentindo-se pessoalmente prejudicado com a postura do seu superior hierárquico, apresenta Queixa Disciplinar contra aquele. Diante dos 2 (dois) procedimentos apresentados, a Queixa Disciplinar apresentada pelo Sargento, consta como testemunhas do desenrolar dos fatos, dois cabos. Estes graduados, que presenciaram os fatos – e que, em tese, confirmariam a versão apresentada pelo Sargento –, encontram-se diretamente subordinados, inclusive, na mesma Unidade Militar, ao Tenente parte dos fatos. Têm esses militares autonomia de consciência para testemunhar contra o seu superior hierárquico?
O questionamento elaborado, dentro dessa questão cotidiana, também faz surgir outras questões que vão levantar uma interessante discussão: em se tratando de militares, o subordinado tem a liberdade necessária para determinar os limites entre sua concepção dos fatos e o próprio interesse que envolve as circunstâncias dilatadas pelo seu superior hierárquico direto, sob os aspectos relacionados aos fatos?
Não é raro encontrar procedimentos administrativos disciplinares, no âmbito das administrações militares, que expõem na conexão dos fatos em análise o depoimento de testemunhas vinculadas hierarquicamente de forma direta ao acusado, ou mesmo, em plano igual, ao acusador. Em muitos destes casos, o encarregado, ou a própria testemunha destacada é subordinada direta da autoridade delegante, ou ainda dos próprios comunicante ou comunicado.
Nesse compasso, cabe destacar a possibilidade da suspeição. Suspeição que em termos jurídicos, se fundamenta naquilo, ou naquele, que tem receio fundamentado, estando suscetível de se opor à imparcialidade, em razão de certas circunstâncias ou interesses intercorrentes que possam impedir ou privar o exercício de suas funções ou da sua própria cidadania, consciente ou inconscientemente.
O Código Civil, em seu art. 145, ao descrever os motivos da suspeição do julgador, anota no inciso II, que fica suspeito aquele que aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa. Primeiramente de bom grado descrever que, a suspeição anotada como existente a um julgador, é “norte” específico para apontar e descrever todas as possíveis espécies de suspeições, porventura existentes no Processo Constitucional, seja judicial ou administrativo.
A situação prevista no Código Civil é reproduzida no MAPPA, norma interna que regulamenta o CEDM/MG, nesse quesito, aquele Manual detalha que a suspeição, por ser “situação que compromete a imparcialidade da apuração” não pode sobressair à própria realização do processo. Devendo ser considerada como suspeita, aquela pessoa que “tenha particular interesse na decisão da causa”. Ora, filosoficamente está comprovado que o interesse particular de um indivíduo tem contorno simétrico com a influência que o meio lhe proporciona.
Nesse sentido, perceba que por aconselhar, deve-se traduzir como inspirar. Contextualizando ao âmbito militar, o conceito de inspiração está diretamente ligado entre os vários degraus hierárquicos existentes – o meio. Visto que, um dos princípios castrenses é a lealdade, o espelhamento objetivado entre superior hierárquico e subordinado – a influência. Devendo o subordinado se espelhar na conduta do seu Comandante.
Observe, o aconselhamento não se apresenta apenas como substância concreta, mas sim, também como resultado, inspiração abstrata. Manifestação de lealdade (§ 2º, do art. 3º), que se traduz como “um corpo”, com o interesse comum. Devendo o subordinado se inspirar na atuação do seu superior. Assim, o aconselhamento previsto como indicativo de suspeição, no Código de Processo Civil, na seara estritamente militar, ganha um contorno distinto, determinando que, os atos de um comandante, além de exemplos, são inspirações, verdadeiros aconselhamentos aos seus subordinados diretos.
Conceitualmente, ainda no meio militar, deve-se pensar o aconselhamento como princípio indicativo de lealdade, visto que, o subordinado deve ser leal ao seu comando (e vice-versa), traduzindo-se a ação testemunhal do subordinado em automático imperativo de consciência, em que, este está institucionalmente, pelos princípios regulamentares do militarismo, ligada a um dever de se inspirar na versão apresentada pelo seu superior, mesmo que aquela não seja a versão que melhor contorna os fatos. Sob este aspecto, como já exposto, do ponto de vista castrense, o aconselhamento que ultrapassa a substância concreta, chega a ser inspiração abstrata; devendo ser lugar de partida para se determinação à efetiva suspeição da espécie testemunhal.
Nesse espaço interpretativo, se percebe a necessária observação do ‘Resguardo de Consciência’, este que tem por base a premissa da pretensão em garantir àquele que se dispõe a opinar que o mesmo possa relatar sua real maneira de pensar – ou julgamento pessoal – sem máculas de qualquer espécie em sua vontade, inclusive, sem “medo” ou temor de represarias de um poder maior.
A objeção de consciência – ou imperativo de consciência –, que representa o sinônimo de ‘resguardo de consciência’, também podendo ser definida como o ato de oposição individual e consciente ao cumprimento de uma obrigação legal, tendo como justificativa motivos baseados em convicção íntima, que pode ser religiosa, filosófica ou política. O imperativo se posta em resguardar a consciência e o próprio objeto destacado.
CONCLUSÃO
Sob o aspecto jurídico, tendo por base uma lógica filosófica comprovada, ao militar, ouvido como testemunha em processos administrativos ou judiciais, sendo subordinado direto a uma das partes envolvidas nos acontecimentos a serem apurados, faz presumir o interesse no desfecho da causa, estando sob o manto da suspeição, devendo prestar depoimento como informante, sem prestar compromisso.
O referido conceito tem por base lógica constitucional, baseado no devido processo legal, não o princípio da transparência processual, mas sim o princípio do Resguardo de Consciência – que também deve ser preservado no devido processo legal, como instrumento de legalidade e moralidade na busca da verdade real dos fatos –, evitando retaliações administrativas.