INTRODUÇÃO
Bragança Paulista é um município do interior paulista com 168.668 habitantes (senso IBGE 2019), assim como as demais cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes, Bragança sofre com transtornos decorrentes da mobilidade urbana, desigualdade social e burocracia estatal.
Um projeto adotado para facilitar a mobilidade urbana, tornar os serviços acessíveis à população carente e desburocratizar as atividades estatais foi a instalação de uma unidade Poupatempo. Inaugurado em 14 de junho de 2014 situada na Avenida Doutor Plínio Salgado, no bairro Parque dos Esta dos (zona norte bragantina).
Embora seja de coordenação estadual, a empreitada logrou êxito em grande parte por intervenção da prefeitura junto ao governo do estado e por parte dessa, o aluguel de um edifício para o funcionamento do Poupatempo.
Pode-se inferir que a finalidade substancial dessa iniciativa é o cumprimento do princípio constitucional da eficiência.
O renomado teórico de Direito Administrativo, Hely Lopes Meirelles, assim definiu o princípio da eficiência:
O que se impõe a todo o agente público de realizar suas atribuições com presteza, perfeição e rendimento profissional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros”, e acrescenta que “o dever da eficiência corresponde ao dever da boa administração. (MEIRELLES, 2002, p. 94).
Verifica-se, portanto, a importância do mencionado princípio, inerente contextualização do Brasil ao século XXI e persecução de uma sociedade pautada na probidade e zelo de seus agentes públicos, haja vista que devem ser exemplos de boa-conduta para o restante da sociedade.
Outrossim, os brasileiros encontram-se fustigados com a expressiva carga tributária a que são submetidos, merecem e exigem boa destinação desses recursos, portanto, é razoável que o serviço público seja no mínimo, aceitável e os utensílios adquiridos com rendas públicas, racionalizados na medida do possível, visando uma gestão econômica e concretizadora de metas.
Como exemplo de modernas técnicas de Gestão Pública, será utilizado o Departamento Estadual de Trânsito do Estado de São Paulo – DETRAN/SP, que desde 2013 tornou-se uma autarquia, desvinculada da Polícia Civil, como ocorre nos demais estados. O novo modelo de gestão inovou em grande parte na arquitetura, prezando o conforto do cidadão e a transparência, pois a atuação da entidade pode ser constantemente avaliada pelos particulares, mediante painéis avaliativos, formulários de opiniões e arquitetura horizontal e com divisórias baixas, permitindo que os cidadãos visualizem em tempo real a rotina dos agentes públicos.
No ano de 1998 mediante a Emenda Constitucional número 19, o Princípio da Eficiência foi incluído no regime jurídico de Direito Público brasileiro, sendo consagrado no rol de princípios explícitos do art. 37 da Constituição Federal de 1988, ao lado da Legalidade, Impessoalidade, Moralidade e Publicidade.
Agora, 20 anos após a inserção do princípio supracitado, quais foram os resultados alcançados nos órgãos e nas entidades da Administração Pública? Quais medidas foram implementadas para a operacionalização da Eficiência? Quais são os parâmetros avaliativos? O desempenho dos agentes públicos tem sido satisfatório? A População está satisfeita com a qualidade dos serviços públicos?
Inerente à formação do Estado moderno, o Direito Administrativo surgiu com a finalidade precípua de regulamentar e fiscalizar a atuação do Estado perante os seus entes, órgão, serviços e agentes públicos, bem como a sua relação com pessoas físicas e jurídicas particulares.
Tal objetivo possui como escopo o ideal de paz social, para tanto fazendo prevalecer o interesse público sobre o particular, ou seja, nas hipóteses de conflito entre um direito individual e o bem-estar social e/ou a incolumidade pública, a última deverá ser preservada na medida estritamente necessária à preservação dos direitos difusos. Tem-se, portanto, a materialização do Poder de Polícia, intrínseco à Administração Pública.
Referente à estrutura da Administração Pública, esta é dividida em diversos entes: da Administração Direta – os denominados entes políticos, sendo eles a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios – e os entes da Administração Indireta, quais sejam: as autarquias, as fundações, as empresas públicas e as sociedades de economia mista, estas últimas com personalidade jurídica de direito privado, com o advento da Lei nº 11.107/05 ingressaram na Administração indireta os consórcios públicos, também conhecidos por associações públicas, com personalidade jurídica de direito público e natureza autárquica.
Inicialmente, a Administração Pública era na maioria dos Estados, centralizada, nos primeiros Estados resumia-se ao governante soberano e seus assessores, esse é um conceito rudimentar de Administração Direta.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 define por Administração Pública Direta a União, os Estados-Membros, o Distrito-Federal e os Municípios.
Com o transcorrer dos séculos, ocorreu um fenômeno denominado desconcentração, no qual a Administração foi dividida em órgãos, ou seja, criou-se setores especializados dentro do Estado, conforme atribuições inerentes a sua localização geográfica ou função específica. Em âmbito nacional, temos como exemplo os ministérios, explica-se: os ministérios não possuem personalidade jurídica própria, são partes integrantes da União, ou seja, se um indivíduo tiver alguma lide contra ato praticado por Ministro de Estado no exercício da função, deverá demandar judicialmente a União e não o Ministério.
Não obstante, existe também a descentralização, diferente da desconcentração, pois há a criação de ente personalizado, em outras palavras, a União, um Estado, o Distrito Federal ou os Municípios poderão criar uma outra pessoa jurídica de direito público ou privado, para fins específicos de prestação de serviço público ou exploração de atividade econômica (direito privado).
Com o supracitado fenômeno, cria-se a Administração Indireta, na qual a nova pessoa jurídica possui autonomia financeira e administrativa, estando vinculada à pessoa jurídica criadora, mas não subordinada, em outras palavras, haverá uma supervisão se os métodos do ente personalizado estão convergentes com os fins estatais, todavia há um distanciamento e autonomia significativos se comparado com os órgãos da Administração Direta.
Como um bom exemplo de descentralização, temos no Estado de São Paulo o Departamento Estadual de Trânsito – Detran/SP, que até o ano de 2013 era um órgão da Administração Direta Estadual, subordinado à Secretaria de Segurança Pública, com orçamento compartilhado com esta Secretaria. Ao final de 2013, foi promulgada a Lei Complementar Estadual nº 1.195 que criou a Autarquia Detran, desvinculando-o da Secretaria de Segurança Pública, atribuindo-lhe personalidade jurídica e orçamento próprios.
Paralelamente aos órgãos e aos entes, há os particulares em colaboração com o setor público, mediante concessão, permissão ou autorização, além do terceiro setor, com a sociedade civil participando da persecução do bem-comum.
CAPÍTULO I
1. TIPO DE POLÍTICA IMPLEMENTADA
Conforme o eminente cientista político estadunidense Theodor Lowi (1931 – 2017), as políticas públicas podem sem divididas em quatro grupos, conforme o seu objetivo, em razão de disputas em torno de sua decisão passarem por arenas diferenciadas, as políticas podem ser distributivas, regulatórias, redistributivas e constitutivas. (LOWI, 1964, p. 677-715). Citado por Souza, os grupos são assim definidos:
O primeiro é o das políticas distributivas, decisões tomadas pelo governo, que desconsideram a questão dos recursos limitados, gerando impactos mais individuais do que universais, ao privilegiar certos grupos sociais ou regiões, em detrimento do todo. O segundo é o das políticas regulatórias, que são mais visíveis ao público, envolvendo burocracia, políticos e grupos de interesse. O terceiro é o das políticas redistributivas, que atinge maior número de pessoas e impõe perdas concretas e no curto prazo para certos grupos sociais, e ganhos incertos e futuro para outros; são, em geral, as políticas sociais universais, o sistema tributário, o sistema previdenciário e são as de mais difícil encaminhamento. O quarto é o das políticas constitutivas, que lidam com procedimentos. Cada uma dessas políticas públicas vai gerar pontos ou grupos de vetos e de apoios diferentes, processando-se, portanto, dentro do sistema político de forma também diferente. (SOUZA, 2006, p. 9)
O programa Poupatempo é oriundo de uma política pública distributiva, haja vista alocar infraestrutura e serviços para o atendimento da população, em outras palavras, possui o objetivo de fornecimento de serviços do estado, financiados pelo orçamento público. Tais serviços já eram fornecidos antes de sua implementação, todavia, agora estão mais acessíveis.
Embora tenha trazido benesses, o aparelho estatal é onerado com contratos com empresas terceirizadas e incentivos remuneratórios para determinadas carreiras do funcionalismo público, a citar os policiais civis que prestam serviço no setor de identificação, exercendo a função de supervisores na emissão de documentos de identidade, conforme a lei complementar estadual nº 1.046/2008 em seus artigos 11 e 12, que dispõem sobre o acréscimo remuneratório para os servidores públicos com exercício no Poupatempo, essa gratificação é denominada GDAP (Gratificação por desempenho nas atividades do Poupatempo).
Artigo 11 - Fica instituída a Gratificação pelo Desempenho de Atividades no POUPATEMPO - GDAP, a ser atribuída aos servidores designados na forma do artigo 5º e do inciso I do artigo 6º desta lei complementar.
“Parágrafo único - A concessão da gratificação de que trata este artigo far-se-á mediante ato dos Secretários de Estado, do Procurador Geral do Estado ou dos Superintendentes". (NR)
Artigo 12 - A GDAP será atribuída aos servidores de que tratam o artigo 5º e o inciso I do artigo 6º desta lei complementar, em razão do desempenho de suas atividades, sendo calculada mediante a aplicação de coeficientes adiante mencionados:
- CONTEXTO DO LOCAL ANTES DA IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA
Embora o programa Poupatempo tenha sido instituído em âmbito estadual no ano de 1998 pela Lei Complementar Estadual nº 847, só foi implementado no município de Bragança Paulista em 14 de junho de 2014, ou seja, dezesseis anos depois. Nesse período, como já mencionado no capítulo anterior, os serviços públicos inerentes ao programa obviamente eram prestados, visto que se tratam predominantemente de atividades de arrecadação tributária e segurança pública, portanto, eram prestados nos endereços das respectivas repartições públicas da Administração Direta.
As cédulas de identidade – RG – eram emitidas no endereço da delegacia de polícia, em prazo de três a seis meses. As fotografias para o documento eram trazidas pelo próprio interessado.
Os serviços inerentes ao Departamento Estadual de Trânsito do Estado de São Paulo (DETRAN/SP) local eram prestados na respectiva delegacia de trânsito, em prazos variáveis, com pouca padronização de procedimentos e exigências documentais. O atendimento ao público era precário, bem como as condições físicas do local. As revistorias para regularização de documentos apreendidos por infração de trânsito eram todas realizadas por empresas credenciadas localizadas em outros endereços. O exame teórico para obtenção da primeira habilitação também era realizado em outro local, em avaliação escrita e com demora de quinze dias para a divulgação do resultado, pois tratava-se de processo manual. Diante das dificuldades, os cidadãos recorriam a despachantes documentalistas, tendo maior gasto financeiro para a regularização de seus documentos ou desistiam e ficavam inadimplentes com o Estado e sujeitos aos ônus decorrentes.
Nesse diapasão, o atendimento em ambas as repartições era das 09:00hs às 17:00hs, de segunda à sexta-feira, o que causava transtornos para as pessoas que trabalham durante a semana, dificultando a ida ao local.
Outro empecilho era a distância dos bairros periféricos populosos de Bragança Paulista das repartições públicas eram demasiado afastadas dos bairros periféricos populosos de Bragança Paulista.
- CONTEXTO LOCAL APÓS A IMPLANTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA
Desde sua implementação, a emissão de documentos de identidade, atestado de antecedentes criminais e serviços do Detran são prestados juntos no mesmo local. O cidadão tem o seu RG em até cinco dias úteis, bem diferente do prazo anterior de até três meses. A fotografia para os documentos também é feita no local, por funcionários terceirizados, sem custo adicional.
Quanto ao Detran, os exames teórico, médico e revistorias são realizados no Poupatempo, com resultado obtido logo após o atendimento, os procedimentos e documentos estão padronizados, em razão de haver maior transparência, a estrutura organizacional é horizontal e exposta, possibilitando o cidadão fiscalizar o desempenho dos agentes públicos.
Diversos empregos foram gerados mediante contratos com empresas privadas para fornecimento de mão-de-obra terceirizada, os funcionários, em sua maioria jovens bragantinos sem experiência anterior, têm a oportunidade de conseguir o seu primeiro emprego em uma instituição pública a adquirir sólidos conhecimentos sobre atendimento ao público e administração pública. Esses funcionários são responsáveis por auxiliar os cidadãos a regularizarem seus documentos junto aos órgãos e entidades públicas presentes no Poupatempo, evitando assim informações e procedimentos equivocados.
Quanto à localização, o endereço favoreceu os moradores da zona norte bragantina, região bastante populosa e com grande quantidade de pessoas com baixa renda, o que viabilizou o acesso aos serviços públicos. O horário de atendimento também foi estendido, funcionando aos sábados.
2. PRINCIPAIS PONTOS POSITIVOS
Os serviços prestados pelos órgãos e entidades públicas agora estão mais acessíveis e ágeis, pois estão concentrados em um único local, com prazos e procedimentos padronizados, amplo acesso à informação, transparência e massiva utilização de funcionários terceirizados para auxiliar os cidadãos.
A localização beneficiou a zona norte bragantina, favorecendo o comércio local, com a instalação de novas lojas e lanchonetes para atender os cidadãos que utilizam o Poupatempo.
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS / CONCLUSÃO
Desde o desenvolvimento e implantação dos Direitos Humanos de segunda geração, o Estado passou além de ter o papel de mantenedor da ordem pública, a função assistencialista de seu povo. Nas modernas sociedades o Estado não deve ser omisso às mazelas de seu povo, caso contrário, criar-se-ia um exército de miseráveis, pedintes e marginalizados de toda sorte, ainda maior do que os já existentes.
No Brasil, com o implemento da função social, a Administração Pública acumulou funções consideradas excessivas por seus dirigentes, embora a alta carga tributária suportada pelo contribuinte, o serviço público tornou-se em grande parte obsoleto e sucateado, sob a administração estatal.
Ora, um mero ajuste na legislação pátria concernente ao tema auxiliaria, mas não resolveria completamente a celeuma, é necessário imiscuir na mente dos agentes públicos o princípio da moralidade, impessoalidade e eficiência, consagrados no artigo 37 da Carta Magna, a Constituição de 1988.
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