(In)Segurança Pública ou Em Defesa de uma Maior Autonomia Administrativa para os Policiais

03/02/2020 às 17:57
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Este artigo pretende apontar alguns dos obstáculos encontrados pelas Forças Policiais brasileiras para a melhoria da Segurança Pública no país e refletir sobre a possibilidade de conferir relativa autonomia administrativa às Polícias.

A Polícia Militar apreendeu 505 fuzis em 2019 e bate recorde no Rio de Janeiro. Segundo estimativa da Polícia Civil, o Rio é a cidade com mais fuzis do Brasil, e cerca de 3 a 3,5 mil armas estariam nas mãos de criminosos. Menores de idade trabalhando no tráfico de drogas portando fuzis é comum na cidade, sendo certo que “nas favelas cariocas, há décadas, crianças e adolescentes são cooptados pelo tráfico de drogas, considerado uma das piores formas de trabalho infantil pela Organização Internacional do Trabalho”, o que nos permite afirmar que o Brasil efetivamente engrossa as fileiras de uma espécie de “Exército” Infanto-Juvenil mundial destinado ao narcotráfico.

No ano passado, também aumentou a apreensão de fuzis em São Paulo. E não há como deixar de reconhecer que o problema da segurança pública no Brasil está entre os mais graves do mundo (senão, possivelmente, o mais), em função dos números oficiais que se encontram distantes de retratar a realidade, o que é muito bem percebido pela chamada “inteligência do mercado”.

Conforme rotineiramente noticiado, o sistema de segurança pública do País beira ao colapso, seja pela carência que abrange desde os equipamentos mais básicos – armas de fogo, munições, coletes balísticos, fardamentos, viaturas, materiais periciais etc – ao efetivo existente nas instituições policiais.

Apenas para exemplificar uma das imperfeições do sistema, sabe-se que as Polícias Militares do Brasil, por diversas razões, inclusive de ordens cultural e financeira, não preservam satisfatoriamente o local de infração penal, ao passo que as Polícias Civis, também por vários motivos, não conseguem investir em rotinas e protocolos investigativos, o que faz com que o seu produto institucional (notadamente o inquérito policial) seja, de modo geral, pouco consistente. Isso contribui para os baixos índices de elucidação delitiva com os quais convivemos no País.

No Brasil, bem como em muitos países, mata-se por qualquer motivo. Ceifa-se a vida humana, por exemplo, por um simples par de tênis. Nesta seara, e em tantas outras demandas, o Estado Brasileiro (bastante presente onde “atrapalha”; e muito ausente onde poderia “ajudar”) continua “adormecido” diante do atual cenário de tragédia e de violência com o qual infelizmente nos acostumamos a conviver.

Como se não bastasse a ousadia da criminalidade contemporânea, que cada vez mais insiste em aterrorizar a sociedade, a ausência de integração e de sintonia entre os Entes (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) que fazem parte do Sistema denominado Constitucional da Segurança Pública (art. 144 da Lei Maior) é flagrante, sendo apontada como uma das muitas causas para o quadro atual.

Tudo isso aliado a um recrutamento juvenil (e sem parâmetros comparativos no mundo) de novos juízes vem contribuindo para um crescente desgaste institucional. O fenômeno gradualmente retira a credibilidade dessa importantíssima (e vital) instituição nacional, não somente diante da população, mas igualmente perante o próprio Poder Executivo. Este é representado, em tal contexto, pelos Organismos Policiais, que com muito custo conseguem “prender” o marginal de hoje, para novamente “prendê-lo” amanhã, numa espécie de “vai-e-vem”, fenômeno desestimulante para os integrantes incorporados a tais Instituições.

Com efeito, um orçamento condizente com a relevância da área é fundamental para melhorar o serviço público prestado pelas Polícias do Brasil, capacitando-as  para a preservação da ordem do Estado Democrático. Precisamos evoluir quanto a tal quesito, inclusive refletir sobre a possibilidade de conferir relativa autonomia administrativa às Polícias (Federal, Civil, Militar etc), como acontece com outras instituições que compõem o Sistema de Justiça Criminal, tais como o Ministério Público e o Poder Judiciário, ambos igualmente comprometidos com a ordem do Estado Democrático.

Sobre o autor
Reis Friede

Desembargador Federal, Presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (biênio 2019/21), Mestre e Doutor em Direito e Professor Adjunto da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO). Graduação em Engenharia pela Universidade Santa Úrsula (1991), graduação em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1985), graduação em Administração - Faculdades Integradas Cândido Mendes - Ipanema (1991), graduação em Direito pela Faculdade de Direito Cândido Mendes - Ipanema (1982), graduação em Arquitetura pela Universidade Santa Úrsula (1982), mestrado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1988), mestrado em Direito pela Universidade Gama Filho (1989) e doutorado em Direito Político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1991). Atualmente é professor permanente do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Local - MDL do Centro Universitário Augusto Motta - UNISUAM, professor conferencista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército. Diretor do Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF). Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região -, atuando principalmente nos seguintes temas: estado, soberania, defesa, CT&I, processo e meio ambiente.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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