É possível realizar a aplicação combinada da Lei no 11.343/2006 e da Lei no 6.368/1976?

Análise dos acórdãos do STF em dois Recursos Extraordinários, RE 596.152 e RE 600.817

25/02/2020 às 11:00
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Análise dos acórdãos do STF em dois Recursos Extraordinários, RE 596.152 e RE 600.817

Inicialmente, cabe destacar a extrema complexidade de tomada de decisão frente a esse tema. A doutrina dentro do campo do Direito sempre esteve dividida, o dissenso tornou-se dessa forma, recorrente no que tange a complementaridade das leis.

Cabe citar a importância da separação dos poderes e necessidade de manutenção desse sistema, tendo em vista que, caso um dos poderes falhe, ou deixe de atuar da forma como estava previsto, causaria diversos efeitos, também, nos outros dois poderes.

No que tange ao Recurso Extraordinário n°596.152, julgo que o caso é de provimento de recurso. Tenho para mim que a conjugação de duas leis, uma posterior e uma anterior, tendo por objetivo destacar partes exclusivas de cada uma que beneficiem o réu seria totalmente inadequada. Na prática, esse ato tomado pelo poder judiciário estaria marcado por uma ultrapassagem dos méritos desse poder.

A formulação de uma terceira possibilidade, uma terceira lei, com base em recortes de outras duas leis distintas significaria que o poder judiciário passara a legislar, uma direta infração aos princípios de legalidade e de separação dos poderes.

Cabe destacar, também, que o tribunal brasileiro já possui uma jurisprudência rigidamente estabelecida após uma série de casos recorrentes e temas semelhantes ao caso concreto então analisado. A jurisprudência firmada, com o passar do tempo, por essa corte, define claramente que não é possível a combinação de leis no tempo, mesmo que essas estejam direcionadas ao benefício do réu.

Desta forma, essa síntese faria com que o juiz acabasse por gerar uma terceira lei, não vigente, e totalmente exclusa de uma relação legal. A referente ação por parte dos juízes seria considerada uma verdadeira transgressão do seu papel interpretativo, fazendo recortes de partes, frases, palavras em busca do benefício do réu.

De acordo com a Constituição Federal e o princípio de irretroatividade, novatio legis in mellius de uma lei, é evidente que isso só seria passível caso uma lei completa fosse aplicada sobre o caso concreto, portanto, a escolha de partes, frases ou palavras que favoreceriam o réu, va de encontro com o próprio ordenamento jurídico, fragmentando às próprias leis e os princípios que a regem

Cabe destacar a importância de manutenção e respeito das intenções do legislador ao criar essa lei, a dosimetria de duas outras leis significaria uma criação de uma nova sansão totalmente distinta daquela pretendida pelo legislador.

                                    “contém uma reserva absoluta de lei formal, que exclui apossibilidade de o legislador transferir a outrem a função de definir o crime e de estabelecer penas”. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Co nstitucional Positivo. 22. ed. São Paulo: Malheiros,2003. p. 428.

A pena, mais grave, surgida com a nova Lei de Drogas, impôs uma repressão ainda maior para crimes relacionados ao tráfico de drogas e entorpecentes não permitidos.

Torna-se importante comentar que o § 4º do art. 33 da nova Lei de Drogas estabelece a possibilidade de atenuação para crimes de acordo com o histórico e relacionamento do detido com questões sociais e criminosas. Entretanto, a escolha e síntese de duas leis não pode ser considerada a escolha mais justa, uma vez que essa atenuação foi determinada e pensada pelo legislador com base em uma nova pena base, mais severa que a anterior.

Concordo com a tese de que caso fosse permitida a combinação da lei N°11.343/2006 e da Lei N° 6.368/1976, em busca da obtenção de uma síntese ou mescla entre as duas, os juízes estariam ultrapassando os méritos e funções de seus cargos e passando a atuar como verdadeiros legisladores. Isso estaria relacionado á uma completa violação do princípio de separação dos poderes e do princípio de legalidade dessa nova sansão.

Desta forma, defendo a tese de que o Juiz deve verificar qual das duas referentes leis favorece mais o réu, e assim, aplica-la em sua integridade, não sendo cabíveis recortes, alterações ou sínteses com outras sansões.

Por fim, gostaria de destacar um trecho do voto do Ministro Carlos Britto, em uma análise da Ext. 925 - República do Paraguai, uma síntesa daquilo que foi exposto por mim, em meu posicionamento:

55. Ora, ninguém discute a possibilidade da ultra-atividade e da retroatividade da lei penal mais favorável ao acusado; postulado, esse, insculpido tanto na Constituição da República do Paraguai (art. 14) quanto na Carta Política brasileira (art. 5º, XL). Todavia, coisa diversa de pinçar o conjunto mais favorável de normas de Direito Positivo é arbitrariamente combiná-las para compor um novo modelo legal. Uma lei imaginária. E a partir desse improvisado mosaico fazer às vezes de legislador. Fazer às vezes de legislador, acrescente-se, com o deliberado intuito de obstaculizar a persecução penal.

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