APONTAMENTOS ACERCA DO DIREITO DE ARREPENDIMENTO DO CONSUMIDOR NA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA
Luciano Eustáquioda SIlva
RESUMO
Diante dos a importância dos novos direitos dos consumidores: o direito à informação, o direito à reflexão e ao eventual arrependimento como forma de proteção. O presente artigo pesquisou o direito do consumidor de se arrepender, trata-se de um direito potestativo colocado à disposição do consumidor, contrapondo-se a um estado de sujeição existente contra o fornecedor ou prestador de serviços. Comumente muitas práticas comerciais estabelecidas passam a ideia que o consumidor possui o direito de rescisão contratual quando se arrepende logo depois da aquisição de um produto, contudo existem limites e condições para o exercício de tal direito, por vezes a confusão do consumidor. Dessa forma, é importante a pesquisa da jurisprudência correlata e da doutrina acerca do tema. A presente pesquisa utilizou as obras de TARTUCE e NEVES (2014), ALMEIDA (2007), GRINOVER, et al., (2007), além de outros, a fim de compreender os limites e características do exercício do direito de arrepender-se.
Palavra-chave: tutela; arrependimento; desistência.
Introdução
A tutela de proteção ao consumidor está plenamente regulada pela lei 8.078 de 11 de setembro de 1990, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor. Vale ressaltar, que em razão da evolução tecnológica e o surgimento de novas práticas de contratação eletrônica foi necessário também estabelecer novas regras de proteção.
A razão que justifica a tutela de proteção ao consumidor pode ser entendida pelos comentários de João Batista de Almeida, in verbis:
A primeira justificativa para o surgimento da tutela do consumidor, segundo entendemos, está assentada no reconhecimento de sua vulnerabilidade nas relações de consumo. Como citado em linhas anteriores, trata-se de espinha dorsal do movimento, sua inspiração central, base de toda a sua filosofia, pois, se, a contrario sensu, admite-se que o consumidor está cônscio de seus direitos e deveres, informado e educado para o consumo, atuando de igual para igual em relação ao fornecedor, então a tutela não se justificaria. É facilmente reconhecível que o consumidor é a parte mais fraca na relação de consumo. A começar pela própria definição de que consumidores são os que não dispõem de controle sobre bens de produção e, por conseguinte, devem se submeter ao poder dos titulares destes. Para satisfazer suas necessidades de consumo, é inevitável que ele compareça ao mercado e, nessas condições, submeta-se às condições que lhe são impostas pela outra parte, o fornecedor. (2006, p.24)
De fato, a proteção ao consumidor é imprescindível em razão da desigualdade existente na relação entre consumidor e o fornecedor, afinal o consumidor é considerado vulnerável e processualmente é classificado como hipossuficiente na relação jurídica.
O presente artigo científico tem como objetivo pesquisar o direito do consumidor de arrepender-se da contratação de um serviço ou bem seja na comumente relação contratual, bem como na forma eletrônica de comércio. Cumpre salientar, as inovações tecnológicas criaram variadas maneiras de aquisição de bens e serviços de forma virtual e também foi objeto de regulação legislativa pelo Decreto nº 7.962/2013
A metodologia empregada foi a consulta específica sobre o tema do direito do consumidor se arrepender, foi realizado uma pesquisa bibliográfica de obras doutrinarias específicas do Direito do Consumidor.
Desenvolvimento
O direito do consumidor de arrepender-se de uma eventual contratação de serviço ou aquisição de bens está regulado no CODECON, nos termos art. 49 da Lei 8.078/1990.
Necessário destacar que a tutela do consumidor não se restringe apenas no CODECON, pois existe todo um arcabouço jurídico insculpido no ordenamento pátrio.
Nesse sentido, os direitos existentes no CODECON e eventuais regulamentos ordinários não se restringem apenas nele.
A respeito anote a lição Rizzato Nunes a seguir:
Ao estipular como princípios a livre concorrência e a defesa do consumidor, o legislador constituinte está dizendo que nenhuma exploração poderá atingir os consumidores nos direitos a eles outorgados (que estão regrados na Constituição e também nas normas infraconstitucionais). Está também designando que o empreendedor tem de oferecer o melhor de sua exploração, independentemente de atingir ou não os direitos do consumidor. Ou, em outras palavras, mesmo respeitando os direitos do consumidor, o explorador tem de oferecer mais. A garantia dos direitos do consumidor é o mínimo. A regra constitucional exige mais. Essa ilação decorre do sentido da livre concorrência [...] (2005, p. 59-63).
A respeito do direito de arrepender-se, anote-se a lição de TARTUCE e NEVES:
Como se trata do exercício de um direito legítimo, não há a necessidade de qualquer justificativa, não surgindo da sua atuação regular qualquer direito de indenização por perdas e danos a favor da outra parte. (2014, p.286)
O direito de arrependimento do consumidor está previsto no CODECON como um direito sem necessidade de justificar a rescisão unilateral da contratação, ou seja, não é preciso qualquer justificativa do porquê do consumidor.
Lado outro, o consumidor que adquire um produto na loja física e se arrepende da compra e deseja desfazer a contratação, não é direito exercer o arrependimento, contudo de a contração ocorreu por telefone ou por contratação eletrônica poderá exercer tal direito.
Portanto, apenas o requisito de que o contrato de consumo tenha sido concluído fora do estabelecimento comercial para que incida, plenamente, o direito de o consumidor arrepender-se. (GRINOVER, et al., 2007. p. 560)
Importante destacar que no caso do fornecer vedar o direito do consumidor de desfazer a contratação, ou ainda impor multa ou retenção do que foi devidamente pago, estará incorrendo além de violação do direito do consumidor, a prática abusiva.
São tidas como práticas abusivas os atos que dizem respeito a toda atitude contrária ao senso comum que afronta quaisquer benefícios ou direitos do consumidor, despreza o costume comercial ou se utiliza do abuso de direito.
A respeito das práticas comerciais é comumente utilizado no comércio de varejo que ao adquirir um bem o consumidor terá um prazo de realizar a troca da mercadoria se assim o desejar desde que a devolva nas exatas condições, quando o fornecedor estabelece tal condição no momento contratação gera outros direitos ao consumidor nas condições e prazo firmados no momento da contratação.
Por sua vez, diante essa prática comum, muitas vezes o consumidor considera que a possibilidade de troca de produto caso não o atenda seja um direito. Contudo, caso o fornecedor não cumpra o acordado o consumidor terá direito a troca nas condições estabelecidas caso tenha cumprido os requisitos estabelecidos.
O objetivo principal do CODECON conforme o art.311 é reunir todas as informações necessárias ao consumidor, da maneira mais clara e objetiva possível, evitando qualquer tipo de dubiedade ou 'enganosidade' nas orientações disponibilizadas nos sites.
A respeito das práticas comerciais coleciona-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça a seguir:
DIREITO DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO DE MULTA A FORNECEDOR EM RAZÃO DO REPASSE AOS CONSUMIDORES DOS VALORES DECORRENTES DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE ARREPENDIMENTO.
O Procon pode aplicar multa a fornecedor em razão do repasse aos consumidores, efetivado com base em cláusula contratual, do ônus de arcar com as despesas postais decorrentes do exercício do direito de arrependimento previsto no art. 49 do CDC. De acordo com o caput do referido dispositivo legal, o consumidor pode desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio. O parágrafo único do art. 49 do CDC, por sua vez, especifica que o consumidor, ao exercer o referido direito de arrependimento, terá de volta, imediatamente e monetariamente atualizados, todos os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão - período de sete dias contido no caput do art. 49 do CDC -, entendendo-se incluídos nestes valores todas as despesas decorrentes da utilização do serviço postal para a devolução do produto, quantia esta que não pode ser repassada ao consumidor. Aceitar o contrário significaria criar limitação ao direito de arrependimento legalmente não prevista, de modo a desestimular o comércio fora do estabelecimento, tão comum nos dias atuais. Deve-se considerar, ademais, o fato de que eventuais prejuízos enfrentados pelo fornecedor nesse tipo de contratação são inerentes à modalidade de venda agressiva fora do estabelecimento comercial (pela internet, por telefone ou a domicílio). REsp 1.340.604-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/8/2013 [ grifo nosso]
Não há dúvidas que o direito arrependimento possui amparo no ordenamento pátrio, enfim no disposto do art. 49 do CDC, vale ressaltar que se dispensa qualquer motivação para o exercício do arrependimento dentro do prazo de reflexão.
Nas contratações virtuais também se aplica o CODECON. Está disposto no Decreto nº 7.962/2013, o direito de arrepender-se.
Art. 5º O fornecedor deve informar, de forma clara e ostensiva, os meios adequados e eficazes para o exercício do direito de arrependimento pelo consumidor.
§ 1º O consumidor poderá exercer seu direito de arrependimento pela mesma ferramenta utilizada para a contratação, sem prejuízo de outros meios disponibilizados.
§ 2º O exercício do direito de arrependimento implica a rescisão dos contratos acessórios, sem qualquer ônus para o consumidor.
§ 3º O exercício do direito de arrependimento será comunicado imediatamente pelo fornecedor à instituição financeira ou à administradora do cartão de crédito ou similar, para que:
I - a transação não seja lançada na fatura do consumidor; ou
II - seja efetivado o estorno do valor, caso o lançamento na fatura já tenha sido realizado.
§ 4º O fornecedor deve enviar ao consumidor confirmação imediata do recebimento da manifestação de arrependimento. (BRASIL, 2013, art.5)
Verifica-se na forma de contratação virtual o direito de arrependimento pelo consumidor foi mais explicitado e imputou a responsabilidade ao fornecedor de bens ou serviços, e, ainda, estabeleceu a forma que se dará o estorno do valor pago por meio dos cartões eletrônicos de créditos. Ao contrário da contratação na forma física não esta especificado o prazo de 7 dias, tal como no art. 49 do CDC. No entanto, deve estabelecer um prazo ao consumidor, assim cabe ao fornecedor informar todos os meios adequados e eficazes para o exercício do direito de arrependimento.
Caso o fornecedor não especifica um prazo de desistência deve ficar consignado o prazo de 7 dias, pois a contratação caso não tenha ocorrida no estabelecimento físico, pode ter sido realizada na forma virtual, o que é condição de aplicação do artigo 49. Nesse sentido, as normas legais (CODECON e Decreto nº 7.962/2013) se complementem para o exercício do direito do arrependimento.
Cumpre ressaltar que o consumidor que adquirir um produto dentro de uma loja, não possui o direito de desistir da compra, pois compreende-se que o consumidor dentro do estabelecimento comercial teve condições de examinar o produto antes da compra. Assim, o contrato de compra e venda é plenamente válido e eficaz. O Decreto nº 7.962/2013 prevê a aplicação de sanções previstas no artigo 56 do CODECON.
Conclusão
É cada vez mais comum as compras fora dos estabelecimentos comerciais em razão do comércio eletrônico, a medida que surgem como uma atraente alternativa para os consumidores adquirirem produtos ou serviços com maior comodidade, segurança e sem desgaste.
Dessa maneira, diante da possibilidade de uma frustração de expectativa do consumidor, que à distância, baseia sua decisão unicamente nas informações que são prestadas pelo fornecedor, o CODECON protegeu o consumidor ao estabelecer o direito ao arrependimento, ou seja, desistir da contração.
Imperioso consignar que o disposto no artigo 49 do CODECON prevê de forma clara que o consumidor ao adquirir produto ou serviço por um desses meios e se arrepender no período de reflexão de 7 (sete) dias, pode desistir do negócio sem qualquer ônus, e com direito à restituição dos valores eventualmente despendidos, atualizados monetariamente. O direito de arrependimento só pode ser invocado quando a aquisição de bens e serviços for concretizada fora do estabelecimento comercial.
Isto posto, o consumidor possui o chamado direito de reflexão a respeito da aquisição de bens ou serviços fora do estabelecimento comercial, no caso de compras por telefone, por exemplo como nas compras virtuais. Assim, as novas concepções de contração na forma eletrônica foram reguladas de forma mais específica pelo Decreto nº 7.962/2013, determinou que o fornecedor especifique as condições para o consumidor exercer seu direito de arrependimento. Enfim, toda a sistemática de proteção aos consumidores a respeito do direito ao arrependimento conforme estabelecido no CODECON e o Decreto nº 7.962/2013.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2006.
BRASIL, Vade Mecum Saraiva. Constituição Federal de 1988. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
_______, Vade Mecum Saraiva. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
_______, Decreto nº 7.962, de 15 de março de 2013. Regulamenta a Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, para dispor sobre a contratação no comércio eletrônico. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/decreto/d7962.htm>. Mar. 2017.
_______, Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.340.604-RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 15/8/2013.
TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor : direito material e processual, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: MÉTODO, 2014.
MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcellos; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
GRINOVER, Ada Pellegrini et al. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos autores do Anteprojeto. 9. ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.
NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
NUNEZ, Luiz Antônio Rizzato. Comentário ao código de defesa do consumidor. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.