BREVES COMENTÁRIOS: A (I)LEGALIDADE DAS PREVISÕES DO ART. 25 – DO CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA DOS MILITARES DE MINAS GERAIS

01/03/2020 às 21:47
Leia nesta página:

O presente artigo visa apontar, de forma analítica, a legalidade das medidas previstas no art. 25 - do Código de Ética e Disciplina dos Militares de Minas Gerais interpretando de maneira distinta os atos sancionador e de transferência do militar.

O presente comentário, e suas complementações, apresenta uma das partes mais polêmicas do CEDM/MG. Principalmente nas chamadas “transferências disciplinares”. Previsão feita no art. 25 – da Lei nº 14.310/2020, que determina:

Art. 25. Poderão ser aplicadas, independentemente das demais sanções ou cumulativamente com elas, as seguintes medidas:

I – cancelamento de matrícula, com desligamento de curso, estágio ou exame;

II – destituição de cargo, função ou comissão;

III – movimentação de unidade ou fração.

§ 1º – Quando se tratar de falta ou abandono ao serviço ou expediente, o militar perderá os vencimentos correspondentes aos dias em que se verificar a transgressão, independentemente da sanção disciplinar.

§ 2° – As sanções disciplinares de militares serão publicadas em boletim reservado, e o transgressor notificado pessoalmente, sendo vedada a sua divulgação ostensiva, salvo quando o conhecimento for imprescindível ao caráter educativo da coletividade, assim definido pelo CEDMU.

Na verdade a medida disciplinar de transferência do militar, após confirmada a transgressão – assim como qualquer uma das outras medidas previstas no presente artigo –, em princípio, não pode ser considerada ilegal; desde que exista a possibilidade da utilização do argumento institucional de que a movimentação mantém a disciplina, um dos pilares da Instituição Militar.

Como explicitado, este signatário entende que a medida tem fundamentação legal, podendo, sim, ser aplicada como medida complementar à sanção disciplinar. Todavia algumas questões devem ser melhor detalhadas sobre o tema. Dentre tais questões, aquela que deixa de apresentar maiores minúcias, sem dúvidas, é a motivação para justificar o ato. Perceba que a motivação que determina pela transferência do militar, e a consequente manutenção da disciplina, não se vincula ao cometimento do ato infracional, este punido pela medida inicial sancionadora. Mas apenas vinculando-se ao seu resultado.

Nesse contexto, o ato de transferência deverá apresentar sua própria motivação. Devendo a Administração motivar, por meio de comprovação fática e determinada, que a permanência do militar em seu local de origem, tem potencial para diminuir os pilares éticos ou institucionais da IME. Sem essa motivação, não há condições para determinar pela necessidade em movimentar o militar.

Veja que, a solução de um Procedimento Disciplinar (ou Processo), inevitavelmente é constituído por um conjunto de ações. Para se constituir e auto afirmar como válido deve debater os argumentos de defesa. Debatendo estes em contraponto com os argumentos que se originam dentro do conceito deontológico militar. Por fim, para se afirmar como transgressão, os fundamentos da essência institucional devem sobrepor às razões destacadas como justificativas defensivas. Sob a referida ótica, se percebe que, apesar do resultado finalístico poder apresentar viés discricionário, como por exemplo, na utilização do art. 10 – do CEDM/MG, o ato punitivo próprio é estritamente vinculado, devendo por obrigação, ter convergência com uma norma pré-existente (artigos 13, 14 e 15 – do CEDM/MG). 

Por outro lado, dentro da discussão aqui proposta, considerando estar confirmada as razões para se impor a sanção disciplinar, e desde que haja uma motivação que justifique, nasce a necessidade de se proceder a transferência. PERCEBA, SÃO FUNDAMENTAÇÕES DISTINTAS. Cabe destacar que, no segundo ato, o contexto formador é discricionário, não havendo vinculação normativa.

Todavia, mesmo o ato discricionário para se afirmar necessita de uma motivação fundamentada em dados concretos. Assim, obrigatoriamente, o ato da transferência disciplinar, previsto no artigo 25, deve demonstrar o porquê da necessidade da movimentação. Esse porquê não se vincula à transgressão em si e nem às suas razões normativas. Se vincula exclusivamente à questões independentes. Isto é, um militar pode cometer a transgressão “x” e não haver necessidade de transferência – visto a inexistência de uma motivação intrínseca e legal. Outro militar, cometendo a mesma transgressão “x” – havendo uma motivação intrínseca para o segundo Ato Administrativo – pode ter a sua transferência como necessária e legal.    

Destarte, sendo dois atos administrativos distintos, obrigatoriamente está se falando em duas motivações distintas. Não bastando a justificativa do ato de transferência se basear na conclusão fundamentativa do ato sancionador, sob o risco de carência motivacional. Na verdade, a medida administrativa de transferência do militar é um evento complementar de outro ato já estabilizado. Nessa interpretação, a motivação que sustenta a sanção disciplinar, surgindo efeitos extrínsecos ao caso, apenas dará início à necessidade de outros fundamentos, estes, que devem justificar a movimentação do militar.

Tem-se no caso, razões que diferem desde a própria natureza formadora dos dois atos. Sendo o primeiro ato autônomo e independente. Por outro lado, o segundo ato, pendente de confirmação do primeiro, mas que não faz parte daquele. Sendo os dois atos distintos entre si, inclusive com motivações também distintas.

Nesse sentido, o Ato Administrativo que indica o fator transgressional (i), têm as razões da própria infração, e por fim, impõe uma Sanção Disciplinar. Em outro norte, (ii) o Ato Administrativo que, após a confirmação da transgressão e da sua imposição sancionadora, indica a necessidade de que, além da própria sanção disciplinar originária, o fato transcende ao mero conceito de sanção, fazendo surgir uma necessidade que ultrapassa o alcance do primeiro ato, criando um fato jurídico distinto, e obrigatoriamente impondo à autoridade a necessária justificativa da questão, com motivação própria, por meio de uma outra fundamentação, que tenha respaldo em substância completamente diversa da medida que determinou a sanção.    

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Nesse sentido surge um apontamento interessante e que, também, vem demandar análise: a medida de transferência do militar prevista no art. 25 – do CEDM/MG é a mesma medida prevista nos artigos 167, 167 e 174, 175 – da Lei nº 5.301/69?

O entendimento do signatário se agrupa ao posicionamento já exposto pelo doutrinador Maurício José de Oliveira, bem como o entendimento do próprio TJM/MG [Processo nº 0011870-35.2011.9.13.0002], no sentido de que são medidas diversas. Aquele oriunda do CEDM/MG encontra-se vinculada à existência de uma Transgressão Disciplinar.

Por outro lado, a transferência disciplinar prevista no EMEMG não tem ligação direta com o cometimento de uma infração disciplinar. Esta se encontra vinculada a uma motivação administrativa geral, conveniente com um posicionamento de Comando. Ou seja, a origem da transferência motivada na Lei nº 5.301/69, se apresenta em um contexto fático, e não meramente determinado pelo cometimento de uma infração disciplinar.

Sobre o autor
Eder Machado Silva

Advogado. Militar da reserva da PMMG. Bacharel em Filosofia. Especialista em Direito Militar, Direito Constitucional e em Direito Processual Civil. Mestre em Direito. Doutorando em Direito Constitucional Comparado, pelo Centro Alemão de Gerenciamento de Projetos Jurídicos (ZRP) – em Leipzig na Alemanha. Membro Efetivo-Curricular da Academia de Letras João Guimarães Rosa – da PMMG. Professor universitário. Autor de livros jurídicos (E-mail: [email protected]).

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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