Medidas Preventivas ao combate do Feminicídio

09/03/2020 às 09:25
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O desmesurado senso de altivez masculina é a primordial causa da ocorrência do aludido crime. As motivações mais triviais são o desapreço ou o sentimento de perda do controle e do poder sobre as mulheres.

1 Introdução

O presente artigo científico visa abordar os tipos, as causas bem como as medidas protetivas atinentes ao famigerado crime de Feminicídio alvitrado na Lei nº 13.104/2015.

É mister destacar que compete ao Estado precaver políticas públicas de precaução e conscientização, e investir nos meios de inserção e beneficiamento das mulheres reprimidas que almejam deixar ou já deixaram a sua moradia.

Destarte impende focalizar que para abrandar o índice de óbitos entre mulheres nos ulteriores anos, o nosso País carece enfrentar o desenvolvimento de táticas de conscientização do nefando, implementação de políticas públicas de prevenção, combate e assistência às vítimas e ainda a criação de mais juizados de violência doméstica e familiar nas comarcas.

2. O feminicídio e os seus tipos

O feminicídio é um crime que aborda a ocisão de mulheres em cenários marcados pela discrepância de gênero. No Código Penal Brasileiro, tal crime é assente como hediondo e é assinalado nos sequentes termos: “é o assassinato de uma mulher cometido por razões da condição de sexo feminino, quando o crime envolve violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher”.

O supraindicado crime foi convencionado legalmente com a entrada em vigor da Lei nº 13.104/2015 a qual alterou o artigo 121 do Código Penal e agregou o feminicídio como uma circunstância qualificadora do crime de homicídio. Vale frisar que a supramencionada Lei foi elaborada a partir de uma recomendação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre a Violência contra a Mulher.

Trata-se o suprarreferido crime do homicídio doloso perpetrado contra a mulher em razões de sua condição de sexo feminino, isto é, desmerecendo, desqualificando e desvalorizando a dignidade da sofrente por ser feminil.

Antes do encetamento da Lei nº 13.104/2015, não existia condenação excepcional quanto ao fato do homicídio ser cometido contra a mulher por razões de sua faculdade de pertencer ao sexo feminino. Vitimar uma mulher em razão de seu gênero configurava homicídio qualificado por motivo torpe ou fútil, a depender do caso concreto. Vale enfatizar que nem sempre o sujeito ativo necessita ser do sexo masculino, podendo também o crime ser perpetrado por uma mulher.

No que concerne a desafeição à condição de ser mulher, manifesta a ideia do machismo, tal qual faz com que determinados homens incultos sintam-se excelsos às mulheres e que esta condição lhes outorgaria o direito de vitimar tais como seres insignificantes.

É considerável frisar que a qualificadora do feminicídio é de natureza subjetiva, ou seja, está associada com a esfera intríseca do agente. Não podendo ser reputada como objetiva, pois não possui liame com o modo ou meio de execução do passamento da padecente.

O feminicídio não pode ser confundido com o femicídio. O femicídio versa da vitimação de mulheres em sentido dilatado, ou seja, qualquer homicídio que possua como sofrente a mulher, ainda que a motivação seja absolutamente alheia ao gênero. Quanto ao feminicídio, este caracteriza-se pelo homicídio da mulher surtido justamente por questões de gênero e por razões da condição do sexo feminino.

Mister se faz ressaltar que são duas as modalidades do feminicídio: a primeira é a que envolve violência doméstica e familiar contra a mulher e a segunda está associada ao escárnio ou discriminação a condição de mulher. A competência para o processamento e o julgamento do aludido delito é do Tribunal do Júri, uma vez que trata-se de crime doloso contra a vida.

Impende frisar que a transexual pode ser sujeito passivo do crime de feminicídio uma vez que o substantivo mulher engloba as lésbicas, transexuais e travestis que se legitimem como do sexo feminino. 

Quanto aos tipos de feminicídio vale lembrar que existem quatro: íntimo, não íntimo, por conexão e transfeminicídio.

O feminicídio íntimo é aquele perpetrado por homem o qual a padecente tem ou teve vínculo íntimo, familiar ou afins. É o ocasionado por parceiro sexual, cônjuge, namorado ou companheiro.

O feminicídio não íntimo é aquele em que ocorre vínculo amorável ou de familiaridade, mas com o qual havia um vínculo de fidúcia, hierarquia ou compadrio, tal como amigos ou parceiros de ofício.

O feminicídio por conexão é o qual a mulher tenta interpor para estorvar a ocorrência de um crime contra outra mulher e acaba fenecendo.

Por fim, quanto ao transfeminicídio, este também é alcunhado de transfemicídio e travesticídio sendo descrito como uma política propagada, premeditada e também sistemática de extermínio da coletividade trans, mulheres trans e travestis incitada pela fereza e repulsa.

3. As causas do feminicídio

O desmesurado senso de altivez masculina é a primordial causa da ocorrência do feminicídio. As motivações mais triviais são o desapreço ou o sentimento de perda do controle e do poder sobre as mulheres.

Infindos são os exemplos que podem conduzir uma mulher inerme ao seu passamento. Por consequência disto, as causas do feminicídio devem ser conferenciadas de modo genuíno e sistematizado para que os possíveis assassinatos sejam devidamente atalhados.

4. A Lei do Feminicídio

A Lei de Feminicídio foi engendrada a partir de uma recomendação da CPMI que esquadrinhou a violência contra as mulheres no País, de março do ano de 2012 a julho de 2013.

Dois fatos históricos impulsionaram a importância do estudo deste assunto, quais seriam: O assassinato de quatorze mulheres, tendo outras nove mulheres e quatro homens ficados feridos na Escola Politécnica da Universidade de Montreal. O assassino deste massacre suicidou-se, no entanto deixou uma carta narrando que as mulheres estariam ocupando lugares que seriam dos homens.[1]

O segundo momento histórico que marca a preocupação com o estudo deste assunto foram os assassinatos de mulheres ocorridos no México, momento em que havia um descaso na cidade de Juáres no México, quanto ao fato dos desaparecimentos e assassinatos de mulheres. Com o auge das maquiladoras, o crescimento demográfico assim como a criminalidade na cidade de Juáres cresceu.[2]

A susodita Lei introduz um qualificador na esfera de crimes contra a vida e altera a categoria dos intitulados crimes hediondos, adicionando nesta categoria o feminicídio.

Aduz a supradita Lei:

Feminicídio (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015)

VI – contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:

VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

§ 2º-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:

I - violência doméstica e familiar;

II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

Aumento de pena

§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:

I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto;

II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;

III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima.” (NR)

Art. 2º O art. 1º da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, passa a vigorar com a seguinte alteração:

Art. 1º

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV, V e VI);

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

Brasília, 9 de março de 2015; 194º da Independência e 127º da República.

Houve também modificação na seção dos crimes hediondos preceituados na Lei número 8.072/1990 por meio da Lei número 13.104/2015 que inseriu o feminicídio na mesma categoria destes crimes, o que resultou na necessidade de se formar um Tribunal do Júri, ou o célebre júri popular, para o devido veredito dos réus de feminicídio.

Tendo em vista que alude de uma forma qualificada de homicídio, a penalidade para o feminicídio é eminente à pena predita ao homicídio simples. Enquanto um sentenciado por homicídio simples pode ser encadeado com uma pena de 6 a 20 anos de reclusão, um condenado por feminicídio pode ser encadeado por uma pena de 12 a 30 anos. Isto assemelha a previsão das penas para os sentenciados por homicídio qualificado e feminicídio. Destarte, cabe memorar que a pena prevista para os crimes de feminicídio pode abeirar a 30 anos de prisão.

5. O feminicídio no Brasil

O crime trazido à baila tem sido de forte expansão em nosso País. É considerável notabilizar que em três anos cerca de 3.200 mulheres foram vitimadas. Tal apuração é repulsiva e aviva a notoriedade e a premência de políticas públicas de combate à violência de gênero e ao machismo.

Corrobora a benemérita Delegada de Polícia e Presidente do Sindicato dos Delegados do Estado de São Paulo Raquel Kobashi Gallinati:

"As políticas de segurança pública adotadas pelas autoridades brasileiras não são suficientes para que se combata o feminicídio pela natureza multifatorial e multidisciplinar deste tipo de crime. Não bastam o aumento significativo de delegacias especializadas em violência contra a mulher ou policiais preparados para atender esse tipo de vítima. Há a necessidade de mudanças institucionais [na sociedade]. É uma causa social, de todos" [3].

6. Medidas preventivas

As medidas podem estabelecer o distanciamento do ofensor do lar; a interdição de contato ou o achegamento com a vítima, familiares ou testemunhas; contribuição de alimentos e anteparo dos filhos. Em situação de inobservância das medidas, poderá a vítima deslocar-se novamente a delegacia, ao Parquet ou até mesmo a vara judicial para averbar nova queixa.

Discorridas medidas tratam-se dos encaminhamentos inculcados na Lei número 11.340: requerimento de medida protetiva, exame de corpo de delito entre outras perícias. Poderá também ser efetuada a condução para abrigadouro nas ocorrências de situação de periculosidade e o cortejo de policiais até a residência para a retirada de pertenças. Caso a vítima esteja lesionada, a polícia fará também o translado desta até o hospital. E também será propiciado o devido atendimento psicológico em centro de referência com o intento de conservar a autoestima da sofrente por meio dos programas oferecidos pelo Governo. 

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Haja vista que tratam-se de medidas de caráter de urgência a sofrente pode pleitear a medida por intermédio da autoridade policial, ou do Parquet, que norteará o pedido ao juiz. A lei antevê que a autoridade judicial deverá deliberar o pedido no prazo de 48 horas após o peditório da vítima ou do Parquet.

Cumpre ressaltar que compete ao Estado precaver políticas públicas de precaução e conscientização, e investir nos meios de inserção e beneficiamento das mulheres reprimidas que almejam deixar ou já deixaram a sua moradia. Para abrandar o índice de óbitos entre mulheres nos ulteriores anos, o nosso País carece enfrentar o desenvolvimento de táticas de conscientização do nefando, implementação de políticas públicas de prevenção, combate e assistência às vítimas e ainda a criação de mais juizados de violência doméstica e familiar nas comarcas.

Urge salientar que a partir da compreensão que os feminicídios são, via de regra, ‘mortes exteriorizadas’, o Estado pode ser culpabilizado pelas vidas ceifadas. Fatores como a não efetivação dos direitos preconizados nos marcos legais, não implementação de serviços de atendimento especializados, a aceitação e naturalização de hierarquias de gênero e raça e a banalização de uma série de violências anteriores pelas próprias instituições do Estado concorrem para a continuidade de violências que estão nas raízes do feminicídio, como a doméstica e sexual, até o desenredo fatal.

7. Conclusão

O feminicídio é o crime o qual a mulher tem a sua vida dizimada pela condição de sua progênie. As motivações mais corriqueiras são o desamor, o ódio ou até mesmo o sentimento de perda do controle sobre as mulheres, consuetos em sociedades marcadas pela associação de papéis discriminatórios em relação às mulheres.

Concerne a uma categoria de crime doloso onde há o intento de vitimar a mulher em fundamento de sua condição de pertencer ao sexo feminino. O autor do crime, comumente, é propínquo à vítima, não impreterivelmente tem um vínculo afetuoso, mas anela denotar uma preeminência em relação à esta.

Mister se faz ressaltar que são duas as modalidades do feminicídio: a primeira é a que envolve violência doméstica e familiar contra a mulher e a segunda está associada ao escárnio ou discriminação a condição de mulher. A competência para o processamento e o julgamento do aludido delito é do Tribunal do Júri, uma vez que trata-se de crime doloso contra a vida.

Impende frisar que a transexual pode ser sujeito passivo do crime de feminicídio uma vez que o substantivo mulher engloba as lésbicas, transexuais e travestis que se legitimem como do sexo feminino. 

Pressuponho que o crime apurado é previnível para o qual compete a sociedade e aos Poderes laborarem unidamente para formularem medidas de proteção, prevenção, reparação e responsabilização.

Destarte, é verossímil concluir que as mortes decorrentes da violência nos vínculos conubiais é a mais fácil e clara visualização do crime de feminicídio. Memorando que tais mortes não decorrem de ciúmes, paixão ou até mesmo hostilidade entre casais, mas sim, de uma procedência estrutural concatenada à dissimetria de gênero, que vem radicada na sociedade desde o período colonial.

8. Referências

CAMPOS, Lorraine Vilela. Os casos recentes de feminicídios no Brasil. 2018. https://vestibular.brasilescola.uol.com.br/atualidades/os-casos-recentes-feminicidios-no-brasil.htm - acesso em 06/01/2020

GODOY, Edvania Fátima Fontes. Como reduzir os casos de feminicídio no Brasil? 2018.https://www.jornaldocomercio.com/_conteudo/cadernos/jornal_da_lei/2018/11/655593-como-reduzir-os-casos-de-feminicidio-no-brasil.html - acesso em 05/01/2020.

Instituto Patrícia Galvão. Algumas propostas e práticas promissoras no Brasil. https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/feminicidio/capitulos/quais-sao-os-servicos-existentes-e-seus-limites/#direitos-garantidos-as-mulheres-que-podem-evitar-o-feminicidio - acesso em 06/01/2020.

[1]  PASINATO, Wânia. Femicídios e as mortes de mulheres no Brasil. Cadernos Pagu nº 37, UNICAMP, julhodezembro 2011, p. 224

PORFÍRIO, Francisco. "Feminicídio"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/feminicidio.htm. Acesso em 07 de janeiro de 2020.

Portal R7 São Paulo. 2020. Feminicídio é o crime que mais cresce em SP, diz delegada. https://noticias.r7.com/sao-paulo/feminicidio-e-o-crime-que-mais-cresce-em-sp-diz-delegada-07012020 - acesso em 08/01/2020.

[2]  RIO, Tabita López. Mujeres en la Ciudad Juárez: narco, maquilas y feminicídios. Ser mujer en la frontera. Universidade de Salamanca: Trabajo fin de máster 2010-2011, p. 13.

Sobre a autora
Rebecca Mara Oliveira da Hora

Rebecca da Hora é Bacharel em Direito. Especialista em Direito e Processo Penal. Especialista em Direito Penal. Especialista em Segurança Pública e Investigação Criminal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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