Separatismo e federalismo: uma realidade de disputa

Direito Constitucional, Separatismo e Federalismo

11/03/2020 às 10:51
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O presente artigo tem objetivo de discutir questões relacionadas à construção histórico-jurídica que acompanha o fenômeno do Federalismo desde seu surgimento: sua estreita ligação com separatismo, sendo este um contraponto para próprio Federalismo.

Separatismo e federalismo: uma realidade de disputa

Resumo: O presente artigo tem objetivo de discutir questões relacionadas à construção histórico-jurídica que acompanha o fenômeno do Federalismo desde seu surgimento: sua estreita ligação com separatismo, sendo este um contraponto para próprio Federalismo, na medida em que a própria estrutura básica de sua existência exige condição indissolúvel do Estado. Ou seja, como fenômeno político, o Federalismo, padece de uma mal que a acompanha em sua origem jacente, o separatismo. Nesse sentido, dado atual cenário complexo de nossa contemporaneidade, o Federalismo como uma entidade político-jurídico encontra-se questionado. A união essa baseada em valores democráticos e plurais, e, portanto, em contexto de dúvidas e questionamentos, terreno fértil para surgimento de vários outros movimentos separatistas, em um prisma jurídico, aparente sem um fim em si mesmo. O trabalho apresenta um resgate histórico, geopolítico e jurídico desses pontos tão presentes e que desafiam ordenamento jurídico de vários Estados Federais pelo mundo atual.

Palavras-chave: Direito Constitucional, Separatismo, Federalismo.

Resumen: El presente artículo tiene el objetivo de discutir cuestiones relacionadas con la construcción histórico-jurídica que acompaña el fenómeno del Federalismo desde su surgimiento: su estrecha conexión con separatismo, siendo éste un contrapunto para propio Federalismo, en la medida en que la propia estructura básica de su existencia exige condición indisoluble del Estado. Es decir, como fenómeno político, el Federalismo, padece de una mal que la acompaña en su origen jacente, el separatismo. En ese sentido, dado el actual escenario complejo de nuestra contemporaneidad, el Federalismo como una entidad político-jurídico se encuentra cuestionado. La unión esta basada en valores democráticos y plurales, y por lo tanto, en el contexto de dudas y cuestionamientos, terreno fértil para surgir de varios otros movimientos separatistas, en un prisma jurídico, aparente sin un fin en sí mismo. El trabajo presenta un rescate histórico, geopolítico y jurídico de esos puntos tan presentes y que desafían ordenamiento jurídico de varios Estados Federales por el mundo actual.

Palavras-Clave: Derecho Constitucional, Separatismo, Federalismo.

Sumário: Introdução, 1. Contexto histórico, 1.1 A primazia norte-americana e o surgimento do federalismo, 1.2 Crises que levam ao separatismo, 2.1 Federalismo como elemento de aglutinação de forças, 2.2 A importância do vínculo indissolúvel, 3. Realidade brasileira, Conclusão, Referência bibliográfica.

Introdução

Tendo como referência a clássica definição de Estado como um ente sociopolítico composto de três elementos essenciais: povo, território e soberania, aqueles entes que apresentação o Federalismo como forma de estado enfrentam em nossa realidade um desafio comum o separatismo.

As demandas separatistas fazem parte da pauta da política contemporânea. Em diversas regiões do mundo diferentes grupos sociais desenvolvem discursos que lançam bases para questionamentos sobre estabelecimento das soberanias nacionais. Nesse horizonte, surgem elementos desestabilizadores ligados a uma pauta de inconformismo, ancorados, outras às vezes por razões históricas de tempos imemoriáveis.

Assim, subsistem elementos separatistas no mundo contemporâneo, através de tendências políticas isolacionista, e por vezes são retroalimentados num ambiente cercado de resentimentos, promessas não cumpridas e reordenamentos geopolíticos que conspiraram para interesses difusos.

A divisão espacial é ao mesmo tempo uma relação de poder político-jurídico como também de força político-territorial. Ou seja, as fronteiras não são apenas marcos geográfico, mas sim uma construção histórica, jurídica e política de membros que reuniram seus interesses, ora em objetivos aglutinadores, ora em percepções dissonantes que acabaram por destruir os laços que outrora eram relevantes para mantinha-nos unidos.

1. Contexto histórico

           

1.1 A primazia norte-america e o surgimento do Federalismo

A literatura aponta que o Federalismo surge em contexto específico, inserido no bojo das Revoluções do século XVIII. Num cenário de disputas entre nações, os Estados Unidos, então uma jovem entidade nacional, após uma breve experiência das Confederações das Treze Colônias, lança as bases para as origens do que conhecemos como Federalismo. Nesse sentido, pontua Branco (2015, p. 813):

                                

“O federalismo tem as suas primeiras origens nos Estados Unidos. Surgiu como resposta à necessidade de um governo eficiente, em vasto território, que ao mesmo tempo, assegurasse os ideais republicanos que vingaram com a resolução de 1776”.

Nesse mesmo caminho, Bulos (2015, p. 922), apresenta a data de 1787 como sendo o marco temporal para surgimento da Federação, ou seja, do próprio federalismo em si, através da constituinte norte-america.

1.2 Crises que levam ao separatismo

A Europa e o Oriente Médio são bons exemplos dos efeitos desse ambiente histórico confuso que retroalimentam movimentos separatistas. Hobsbawn (1995, p. 39), observa que:

 

“(...) os muitos pretendentes à sucessão, pelo menos na Europa, em vários movimentos nacionalistas que os vitoriosos tendiam a estimular, contanto que fossem antibolcheviques como convinha. Na verdade, na Europa o princípio básico de reordenação do mapa essa criar Estados-nação étnico-linguisticos, segundo a crença de que as nações tinha o “direito d autodeterminação”. O nobre autor ainda destaca que: “(...) A tentativa foi um desastre, como ainda se pode ver na Europa da década de 1990”. Os conflitos nacionais que despedaçam o continente na década de 1990 são as galinhas velhas do Tratado de Versalhes voltando mais uma vez para o Choco. O remapeamento do Oriente Médio se deu ao longo da linha imperialistas (...)”.

 

            A essa que não ao longo do tempo. Pelo contrário, tem se tornado cada vez mais comum e presente em nossa realidade. Seria então o contexto de separatismo, terreno necessário e fecundo para surgimento do federalismo, ou ainda, seria o federalismo elo entre inquietação social e separatismo.

 

2. Federalismo como elemento de aglutinação de forças

            Diferente concepção em torno da conceituação sobre Federalismo nos leva aprofundar o tema. Para Bulos (2015, p. 922), o tema merece uma digressão etnológica, levando o termo Federalismo ao estudo sobre origem, ou seja, a ideia de unidade de Estados, ou ainda, uma estrutura política-administrativa e jurídica que espelha os anseios de interações de povos na formação de um ente maior e mais forte que seja, assim, um elemento de coesão, sem suas palavras:

“Federação, do latim foedus, foederis, significa pacto, interação, aliança, elo entre Estados-membros. Trata-se de uma unidade dentro da diversidade. A unidade é ela, a federação, enquanto a diversidade é inerente às partes que a compõem, isto é, os Estados, com seus caracteres próprios. A federação, portanto, é um pluribus in unum, ou seja, uma pluralidade de Estado dentro da unidade que é o Estado Federal”.

 

            Portanto, o movimento de interação ansioso dos povos para unidade de seus Estados-membros leva ao surgimento de um novo ente, um Estado Federal. Com isso, as diversidades apresentadas por cada um dos componentes da Federação subsistem para formação de uma unidade, ou seja, um fim maior na condução da finalidade daquele novo ente.

            O estado federado é um componente que surge num contexto de descentralização de poder, um deslocamento no eixo das forças que redirecionam para outra trajetória. Assim, convém destacar, conforme pensamento de Masson (2015, p. 494), que o Estado Federado:

“É a forma de Estado na qual existe descentralização no exercício do poder político, estando este pulverizado em mais de uma entidade política, todas funcionando como centros emanadores de comandos normativos e decisórios. Segundo Georg Jellink, federalismo é a “unidade na pluralidade”, pois embora tenhamos mais de um ente dotado de capacidade política, não se pode perder de vista a unidade necessária para a manutenção do Estado Federal”.

 

            É a unidade o traço que permite a sobrevivência do Estado Federal e do próprio federalismo. A necessidade de coesão permite que aqueles que aderem a pacto federativo sintam-se mais fortes através de sua própria condição de “unidade na pluralidade”, ou seja, uma lógica de agregação de forças e ideais que se somam em busca de objetivo, repousando sob a sombra de uma bandeira, formando um Estado, uma País, uma Nação.

 

2.1 A importância do vínculo indissolúvel

Temos no federalismo a celebração de vínculo, porém, para que esse vínculo permaneça a ameaça da secessão deve ser banida, permanentemente, surge assim à ideia do vínculo indissolúvel. É o que registra Masson (2015, p. 495):

“(...)pode-se conceituar a federação como a reunião, feita por uma Constituição, de entidades políticas autônomas unidas por um vínculo indissolúvel. Nesta reunião inexiste direito de secessão, havendo completa intolerância com movimentos separatistas, que serão firmemente coibidos”.

 

            Nessa mesma linha de raciocínio destacamos Puccineli Júnior (2012, p. 611):

“Por Federação compreende-se a união indissolúvel de vários Estados diferentes, que abrem mão de sua própria soberania para criar um Estado Federal, este sim soberano e dotado de personalidade política internacional, a quem incumbe a administração dos interesses nacionais.  A decisão de ingressar numa Federação configura, segundo Dallari, “ um ato de soberania que os Estados podem praticar, mas, quando isto ocorre, pode-se dizer que essa é a última decisão soberana do Estado. Pretende-se com isso enfatizar que os Estados-membros da Federação não gozam de soberania, traduzida como o poder de autodeterminação plena, não subordinado a nenhum outro poder externo ou interno”.

 

            Nesse sentido, podemos admitir, portanto, que o federalismo represente a produção política necessária para sobrevivência do poder dos Estados através de um alinhamento entre eles para formação, específica, de um só. Para que isso ocorra, a Federação é o mecanismo fundamental de aglutinação de Estados-membros, que leva ao clímax da própria ideia ensejadora do Federalismo em si. Segundo Pinho (2005, p. 62), a Federação:

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“(...) é a aliança de Estado para a formação de um Estado único, em que as unidades federadas preservam sua autonomia política, enquanto a soberania é transferida para o Estado Federal. O federalismo possibilita a coexistência de diferentes coletividades políticas dentro de um Estado único, havendo diversas esferas de atribuições fixadas na própria Constituição entre a União e os Estados Federados”.

 

            Logo, é através do vínculo que Estados ganham dimensão necessária para solidificação do pensamento do Federalismo com fenômeno político. Sem essa aliança, sem essa ideia, não existe Federalismo.                                   

 

3. Realidade brasileira

            No contexto brasileiro não registramos atividades com força suficiente para desmembramento de partes do território nacional. Em geral, o que temos em solo pátrio são movimentos não violentos que se manifestam, comumente, através da identificação de elementos éticos, embora, alguns grupos tenham apresentado ao longo dos últimos anos, representações argumentativas mais afirmativas. Em resumo, não passam de bravatas.

            De sorte que em termos legais a República Federativa do Brasil trata dessa questão da separação como sendo absolutamente vedada. Conforme ensinamento de Lenza (2016, p. 504), estamos tratando de uma das características de composição do federalismo brasileiro, temos então:

“(...) preceitua o artigo 1º, caput, da Constituição Federal de 1988 que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituindo-se em Estado Democrático de Direito, sendo que o caput do seu artigo 18 complementa, estabelecendo que “a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição”.

O citado autor também observa que temos na Constituição Federal a inexistência do direito de secessão, sendo a forma federativa de Estado não pode ser objeto de deliberação de proposta de emenda tendente a aboli-la.

Conclusão

            Presente artigo procurou discutir elementos que julgamentos importantes para discussão do federalismo no atual contexto contemporâneo, através de pequenos recortes teóricos, oportunidade apresentado, trazendo para discussão eminentemente acadêmica esse tema que julgamos ser relevante para Ciência Jurídica.

 Por fim, salientamos que em nosso entendimento a construção teórica e material do federalismo exige uma conjunção de elementos complexos que possam traduzir os esforços dos povos de se unirem e abrandarem suas diferenças, algo que ultrapassa a lógica comum de poder. Perfazendo assim uma pauta permanente de estudo sobre o tema.

Referência bibliográfica:

BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. MENDES, Gilmar Ferreira. Organização do Estado, in: Curso de direito constitucional. 10 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2015.

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 9 ed. rev. atual. de acordo com a EC n. 83/2014, e os últimos julgados do STF. São Paulo: Saraiva, 2015.

HOBSBAWN, Eric. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 20 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2016.

MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. 3ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2015.

PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria geral da constituição e direitos fundamentais, volume 17. 5 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005.

PUCCINELI JÚNIOR, André. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2012.

           

Sobre o autor
Rubens Melo da Silva

Acadêmico de Direito Centro Universitário Estácio de Sá. Graduado em História pela Universidade Federal do Ceará, Pós-Graduado em Administração, Finanças e Negócios Escola Superior Abertura do Brasil. Email: [email protected]

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