Calúnia e Denunciação Caluniosa

11/03/2020 às 16:31
Leia nesta página:

A diferença entre o crime de calúnia e denunciação caluniosa

VOCÊ SABE A DIFERENÇA ENTRE CALÚNIA E DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA?

É muito comum, mesmo entre os operadores do direito, confundir os delitos de calúnia e denunciação caluniosa. Embora esses dois crimes tenham uma relação muito próxima, comportam muitas diferenças, inclusive na pena cominada, que é muito mais gravosa no caso da denunciação caluniosa.

O crime de calúnia atinge o bem jurídico “honra” e é descrito no art. 138 do Código Penal, in verbis:

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: (grifado)

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Cuida-se do mais grave entre os crimes contra a honra, com penas mais alta que a difamação e a injúria.

Para que se configure o crime de calúnia é preciso que a imputação seja de um fato definido como crime. Exemplo: Tício caluniou Mévio, dizendo que este roubou seu telefone celular.

O ato de roubar constitui crime, previsto no art. 157 do Código Penal (subtrair, para si ou para outrem, coisa móvel alheia, mediante violência ou grave ameaça), portanto, o crime de calúnia restou configurado. Se Tício tivesse imputado a Mévio algum fato desabonador, mas que não fosse definido como crime, restaria configurado o crime de difamação e não de calúnia.

A calúnia também resta configurada se alguém, sabendo ser falsa a imputação, a propaga. Por exemplo, Tício ouviu Mévio dizer que Agripina ameaçou causar mal injusto e grave a Caio, mesmo sabendo que Agripina nunca chegou a fazer isso. Assim, Tício também comete crime de calúnia contra Agripina, na forma equiparada.

Cumpre destacar que o crime de calúnia é doloso, não admitindo a forma culposa. Ou seja, só se pune a calúnia se o autor do fato sabia que a vítima era inocente, que não cometeu crime nenhum. Além disso, admite-se a exceção da verdade, que é quando a suposta vítima de fato praticou o crime que lhe foi imputado.

Só não se admite a exceção da verdade em três situações:

I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;

II - se o fato é imputado ao Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro;

III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

Discute-se se é possível a configuração do crime de calúnia na forma tentada, pois este crime se consuma a partir do momento em que terceiros ficam sabendo da falsa imputação, mesmo que não chegue a de fato abalar a honra do ofendido. A doutrina admite a tentativa na hipótese de o crime ser cometido mediante carta que não chegue ao destinatário, por exemplo.

Por fim, insta salientar que o crime de calúnia é de ação penal privada, de modo que só se procede mediante queixa.

Por sua vez, o crime de denunciação caluniosa é de ação penal pública incondicionada à representação, pois trata-se de um crime contra a administração da justiça e a pena cominada é mais alta que a da calúnia. Embora também afete a honra da vítima, esse bem jurídico é atingido de maneira mediata.

Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

O crime de denunciação caluniosa é mais grave que o de calúnia, pois não se resume a apenas imputar falsamente fato descrito como crime, nesse caso o infrator movimenta a máquina estatal para iniciar um procedimento investigativo contra alguém que sabidamente não fez nada. Por isso é punido mais severamente.

Assim como a calúnia, o crime de denunciação caluniosa é doloso, não admitindo a forma culposa. E a denúncia caluniosa deve dizer respeito a fato definido como crime, contravenção ou infração análoga, punida civil ou administrativamente.

O crime se consuma a partir do momento em que têm início as investigações ou os demais procedimentos dispostos no caput do art. 339 do Código Penal.

Há controvérsia quanto à necessidade de a vítima ser inocentada, por meio de uma sentença ou arquivamento do inquérito, por exemplo, para que o Ministério Público possa processar o denunciante. Contudo, o entendimento predominante é de isso não é necessário. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, confira-se:

A alegação de que seria indispensável o arquivamento formal do inquérito policial indevidamente instaurado, para só depois se processar o crime de denunciação caluniosa, não merece prosperar, quando evidenciado que foi no próprio inquérito policial instaurado para apurar o crime de abuso de autoridade, indevidamente imputado à vítima, que se verificou tratar-se de atribuição falsa de crime a pessoa sabidamente inocente.” ((RHC 50.672/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 18/09/2014, DJe 07/10/2014) (Grifado)

Também se discute se há a possibilidade de tentativa no crime de denunciação caluniosa. O entendimento que prevalece é de que é possível a tentativa quando a investigação não é instaurada, mesmo depois de ter sido feita a denúncia caluniosa.

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Sobre a autora
Creuza Almeida

Advogada Criminalista, vice-presidente da Abracrim PE, Diretora Nacional da ABCCRIM - Academia Brasileira de Ciências Criminais, palestrante, especialista em Habeas Corpus, Uma das autoras do Livro Mulheres da Advocacia Criminal, professora, Mulher Evidência 2019, Prêmio Destaque Nordeste. Membra da União Brasileira dos Escritores

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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