PORTARIA NÃO CRIA REGRAS GERAIS

12/03/2020 às 11:57
Leia nesta página:

O ARTIGO DISCUTE SOBRE RECENTE PORTARIA 356 QUE TRATA DE COMBATE AO NOVO CORONAVÍRUS.

PORTARIA NÃO CRIA REGRAS GERAIS

Rogério Tadeu Romano

 

I – O FATO

Segundo o Estadão, o Ministério da Saúde regulamentou medidas como isolamento e quarentena para evitar a propagação do novo coronavírus (Covid-19). A portaria com as ações a serem adotadas está publicada no Diário Oficial da União desta quinta-feira, 12.

Segundo o texto, a medida de isolamento tem como objetivo "a separação de pessoas sintomáticas ou assintomáticas, em investigação clínica e laboratorial, de maneira a evitar a propagação da infecção e transmissão local".

"A medida de isolamento somente poderá ser determinada por prescrição médica ou por recomendação do agente de vigilância epidemiológica, por um prazo máximo de 14 (quatorze) dias, podendo se estender por até igual período, conforme resultado laboratorial que comprove o risco de transmissão", diz o texto da Portaria.

O isolamento prescrito deverá ser efetuado, preferencialmente, em domicílio, podendo ser feito em hospitais públicos ou privados, de acordo com a recomendação médica, dependendo do estado clínico do paciente. A determinação deverá ser acompanhada de termo de consentimento livre e esclarecido do paciente.

"A medida de isolamento por recomendação do agente de vigilância epidemiológica ocorrerá no curso da investigação epidemiológica e abrangerá somente os casos de contactantes próximos a pessoas sintomáticas ou portadoras assintomáticas, e deverá ocorrer em domicílio", diz o texto. Nos locais onde não houver agente de vigilância epidemiológica, caberá ao Secretário de Saúde determinar a medida.

A Portaria trata ainda dos casos em houver necessidade da quarentena, que tem como objetivo garantir a manutenção dos serviços de saúde em local certo e determinado. Segundo o texto, a quarentena "será determinada mediante ato administrativo formal e devidamente motivado, editado pelo secretário de Saúde do Estado, do município, do Distrito Federal ou ministro da Saúde ou superiores em cada nível de gestão, publicada no Diário Oficial e amplamente divulgada pelos meios de comunicação". A quarentena será adotada pelo prazo de até 40 dias, podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde.

O descumprimento das medidas acarretará a responsabilização nos termos previstos em lei. Caberá ao médico ou agente de vigilância epidemiológica informar à autoridade policial e Ministério Público sobre o descumprimento das regras.

Para aplicar medidas de isolamento e quarentena deverão ser observados os protocolos clínicos do coronavírus e as diretrizes estabelecidas no Plano Nacional de Contingência Nacional para Infecção Humana novo Coronavírus (Covid-19), com a finalidade de garantir a execução das medidas profiláticas e o tratamento necessário.

É o que diz aquela noticia aqui trazida à colação.

Os coronavírus (CoV) são uma grande família viral, conhecidos desde meados dos anos 1960, que causam infecções respiratórias em seres humanos e em animais. Geralmente, infecções por coronavírus causam doenças respiratórias leves a moderada, semelhantes a um resfriado comum. A maioria das pessoas se infecta com os coronavírus comuns ao longo da vida, sendo as crianças pequenas mais propensas a se infectarem. Os coronavírus comuns que infectam humanos são alpha coronavírus 229E e NL63 e beta coronavírus OC43, HKU1.

Alguns coronavírus podem causar síndromes respiratórias graves, como a síndrome respiratória aguda grave que ficou conhecida pela sigla SARS da síndrome em inglês “Severe Acute Respiratory Syndrome”. SARS é causada pelo coronavírus associado à SARS (SARS-CoV), sendo os primeiros relatos na China em 2002. O SARS-CoV se disseminou rapidamente para mais de doze países na América do Norte, América do Sul, Europa e Asia, infectando mais de 8.000 pessoas e causando entorno de 800 mortes, antes da epidemia global de SARS ser controlada em 2003. Desde 2004, nenhum caso de SARS tem sido relatado mundialmente.

Observo o que dita a citada Portaria que regulamenta o disposto na Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que estabelece as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional em decorrência da Infecção Humana pelo coronavírus (COVID-19).

Observo o que diz a citada Portaria 356, de 11 de março de 2020:

Art. 3º A medida de isolamento objetiva a separação de pessoas sintomáticas ou assintomáticas, em investigação clínica e laboratorial, de maneira a evitar a propagação da infecção e transmissão local.

§ 1º A medida de isolamento somente poderá ser determinada por prescrição médica ou por recomendação do agente de vigilância epidemiológica, por um prazo máximo de 14 (quatorze) dias, podendo se estender por até igual período, conforme resultado laboratorial que comprove o risco de transmissão.

§ 2º A medida de isolamento prescrita por ato médico deverá ser efetuada, preferencialmente, em domicílio, podendo ser feito em hospitais públicos ou privados, conforme recomendação médica, a depender do estado clínico do paciente.

§ 3º Não será indicada medida de isolamento quando o diagnóstico laboratorial for negativo para o SARSCOV-2.

§ 4º A determinação da medida de isolamento por prescrição médica deverá ser acompanhada do termo de consentimento livre e esclarecido do paciente, conforme modelo estabelecido no Anexo I.

§ 5º A medida de isolamento por recomendação do agente de vigilância epidemiológica ocorrerá no curso da investigação epidemiológica e abrangerá somente os casos de contactantes próximos a pessoas sintomáticas ou portadoras assintomáticas, e deverá ocorrer em domícilio.

§ 6º Nas unidades da federação em que não houver agente de vigilância epidemiológica, a medida de que trata o § 5º será adotada pelo Secretário de Saúde da respectiva unidade.

§ 7º A medida de isolamento por recomendação será feita por meio de notificação expressa à pessoa contactante, devidamente fundamentada, observado o modelo previsto no Anexo II.

Art. 4º A medida de quarentena tem como objetivo garantir a manutenção dos serviços de saúde em local certo e determinado.

§ 1º A medida de quarentena será determinada mediante ato administrativo formal e devidamente motivado e deverá ser editada por Secretário de Saúde do Estado, do Município, do Distrito Federal ou Ministro de Estado da Saúde ou superiores em cada nível de gestão, publicada no Diário Oficial e amplamente divulgada pelos meios de comunicação.

§ 2º A medida de quarentena será adotada pelo prazo de até 40 (quarenta) dias, podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território.

§ 3º A extensão do prazo da quarentena de que trata o § 2º dependerá de prévia avaliação do Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE-nCoV) previsto na Portaria nº 188/GM/MS, de 3 de fevereiro de 2020.

§ 4º A medida de quarentena não poderá ser determinada ou mantida após o encerramento da Declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional.

Mas o artigo 5º da citada Portaria prescreve:

Art. 5º O descumprimento das medidas de isolamento e quarentena previstas nesta Portaria acarretará a responsabilização, nos termos previstos em lei.

Parágrafo único. Caberá médico ou agente de vigilância epidemiológica informar à autoridade policial e Ministério Público sobre o descumprimento de que trata o caput.

O  artigo 5º é mais veemente a um ato normativo secundário que tem força apenas dentro dos limites da Administração e não pode extrapolá-la;

Art. 5º O descumprimento das medidas de isolamento e quarentena previstas nesta Portaria acarretará a responsabilização, nos termos previstos em lei.

Parágrafo único. Caberá médico ou agente de vigilância epidemiológica informar à autoridade policial e Ministério Público sobre o descumprimento de que trata o caput.

II – O EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA

Pois bem.

Quanto ao isolamento considero que se trata de medida própria da Administração no exercício do poder de polícia.

A matéria, sabe-se que compete, de forma concorrente, à União, aos Estados e aos Municípios, a teor do artigo 24, XII,  da Constituição Federal, legislar sobre a defesa da saúde.

Atende-se aos casos de relevância e urgência na aplicação do modelo legislativo no que concerne ao exercício da autoexecutoriedade do ato administrativo para que se possa ter o poder de policia.

Trata-se de executoriedade dos atos administrativos unilaterais. Através dele a Administração pode modificar, por sua única vontade, situações jurídicas, sem o consentimento dos atingidos pelo ato.

É a chamada execução forçada na via administrativa, que consiste em uma via jurídica especial, própria do ato administrativo, fazendo a Administração prescindir da declaratio iuris do Poder Judiciário.

A executoriedade, pois, por sua importância, é a manifestação do poder de autotutela da Administração Pública, pelo qual esta tem a possibilidade de realizar, de forma coativa, o provimento no caso de oposição do sujeito passivo.

Pois a executoriedade dos atos administrativos tem fundamental importância no exercício do poder de polícia administrativo, na faculdade que tem a Administração Pública de disciplinar e limitar, em  prol de interesse público adequado, os direitos e liberdades individuais, como já ensinou Caio Tácito (O poder de polícia e seus limites. in Rev. De Dir. Adm., volume 27, páginas 1 e seguintes).

O artigo 78, da lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 cita que:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.               (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 1966)

Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

III – OS LIMITES DA PORTARIA

Todavia, a portaria não traz novidade, própria da edição de uma regra jurídica, pois é regra secundária que está limitada por normas primárias.

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A portaria é norma secundária. Ela não é editada pelo Parlamento, criando-se nos gabinetes da Administração.

Necessário estudar a natureza jurídica da portaria diante da lei.

Como bem ensinou Celso Antônio Bandeira de Mello(Curso de Direito Administrativo, 17ª edição, pág. 337):

“Se o regulamento não pode criar direitos ou restrições à liberdade, propriedade e atividades dos indivíduos que á não estejam estabelecidos e restringidos na lei, menos ainda poderão fazê-lo instruções, portarias ou resoluções. Se o regulamento não pode ser instrumento para regular matéria que, por ser legislativa, é insuscetível de delegação, menos ainda poderão fazê-lo atos de estirpe inferior, quais instruções, portarias ou resoluções. Se o chefe do Poder Executivo não pode assenhorear-se de funções legislativas nem recebê-las para isso por complacência irregular do Poder Legislativo, menos ainda poderão outros órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta”.

Na lição de Paulino Jacques(Curso de Introdução à Ciência do Direito, 2ª edição, pág. 81), as instruções, normas típicas secundárias, dispõem, em geral, sobre a execução dos serviços públicos ou de normas legais ou regulamentares. Daí tem-se a lição de Carré de Malberg de que as instruções só produzem efeito “no interior do serviço, porque se originam do serviço e se editam em virtude das relações que o serviço engendra entre chefes e subalternos”(Teoria general del Estado, tradução de J. L. Degrete, México, 1948, pág. 605, n. 224), não obrigando assim os particulares.

Em verdade, com relação a portarias, há regras dadas às autoridades públicas, prescrevendo-lhes o modo por que devem organizar e pôr em andamento certos serviços.

Portaria ministerial não integra o processo legislativo disciplinado pela Constituição. Trata-se de ato normativo interno destinado a ordenar os serviços executados por servidores de determinado estabelecimento ou repartição. Não atribui direitos, nem impõe obrigações e penalidades a terceiros. Desde o regime militar, todavia, o extinto Ministério do Trabalho – reduzido à condição de secretaria do Ministério da Economia pelo presidente Jair Bolsonaro – baixa portarias para aprovar normas regulamentadoras sobre higiene e segurança do trabalho, com regras impositivas que beiram o absurdo ou de impossível execução.

A portaria não é lei.

IV – O QUE É LEI?

 Lei, no sentido material, é o ato jurídico emanado do Estado com o caráter de norma geral, abstrata e obrigatória, tendo como finalidade o ordenamento da vida coletiva, como já dizia Duguit. Esses caracteres e o de modificação da ordem jurídica preexistente, que decorre da sua qualidade de ato jurídico, como dizia Miguel Seabra Fagundes(“O controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário”, segunda edição, José Konfino, pág. 30), se somam para caracterizar a lei entre os demais atos do Estado. Mas entre eles só é específico o da generalidade.

Entre os italianos, Ranelletti, além de outros, entende que o caráter especifico da lei, no sentido material, está na novidade ou modificação(“novità), e não na generalidade, se bem que seja esta uma característica habitual trazida à norma jurídica.

Ranelletti, com razão, nega o caráter de lei às regras que o Estado regula a sua própria atividade, por lhe parecer que não produzam efeito jurídico em relação a terceiros.

Ao lado da generalidade é, sem dúvida, elemento intrínseco, inapartável da lei, a modificação do direito preexistente alterando situações juridicas anteriores. A novidade de que falou Ranellleti.

Ora, no Brasil, não ocorre no ato administrativo normativo (decreto), mas somente na lei, generalidade e novidade.

Aliás, dita o artigo 5º, inciso II, da Constituição, quanto ao princípio da legalidade e da reserva de lei, que ninguém poderá ser obrigado a fazer ou não fazer senão em virtude de lei.

A lei que se fala é formal e material de modo que é ato normativo oriundo de reserva do Parlamento.

Há, para o caso, uma supremacia e preeminência de lei formal.

O princípio da legalidade eleva a lei à condição de veículo supremo da vontade do Estado.

A lei é uma garantia, o que não exclui, como bem se avisa, a necessidade de que ela mesma seja protegida contra possíveis atentados à sua inteireza e contra possíveis máculas que a desencaminhem de sua verdadeira trilha.

Necessário expor, ainda que em poucas palavras, o princípio da legalidade no direito penal, no direito administrativo e no direito tributário.

Diante do princípio da legalidade do crime e da pena, pelo qual não se pode impor sanção penal a fato não previsto em lei, é inadmissível o emprego da analogia (forma de autointegração da lei) para criar ilícitos penais ou estabelecer sanções criminais.

A única fonte direta do direito penal é a lei, diante do princípio da reserva legal.

O princípio da legalidade está inscrito no artigo 1º do Código Penal, reserva legal, no sentido de que “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”.

Assim também é na Constituição Federal, no artigo 5º, XXXIX, quando se dispôs que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

Na esfera administrativa discutem-se as características do princípio da legalidade.

O princípio da legalidade da função executiva, de que a legalidade da Administração é simples aspecto, desdobra-se nos princípios da preeminência da lei e o princípio da reserva de lei.

O princípio da preeminência da lei, princípio da legalidade em sentido amplo, fórmula negativa ou regra da conformidade, traduz-se na proposição de que cada ato concreto da Administração é inválido, se e na medida em que contraria uma lei material.

Por sua vez, o princípio da reserva de lei, princípio da legalidade em sentido restrito, surgiu originalmente com o sentido de que cada ato concreto da administração que intervém na liberdade ou propriedade do cidadão, carece de autorização de uma lei material; mas veio mais tarde a evoluir no sentido de exigir a mesma autorização para todo e qualquer ato administrativo, ainda que, de forma direta, não contendesse na aludida esfera privada dos particulares.

Entende-se pela experiência doutrinária que, se o princípio da preeminência da lei representa muito mais a defesa da própria ideia de generalidade numa fase de evolução do poder administrativo concebido essencialmente como uma ampla esfera de autonomia ou mero âmbito da licitude, o princípio da reserva legal desempenha uma função de garantia dos particulares contra as intervenções do poder.

Na doutrina alemã, do que se lê das observações de Peters, Huber, Wolff e Forsthoff, o princípio da legalidade reveste no direito administrativo o seu conteúdo mínimo de uma simples regra de preeminência da lei. Assim, no direito administrativo brasileiro, há o entendimento de que apenas se deve exigir uma reserva de lei no que se diz respeito à criação de deveres, de conteúdo positivo ou negativo. A Constituição dita: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”(artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal).

Fala-se em reserva de lei material e reserva de lei formal. No primeiro caso, basta que a conduta da Administração seja autorizada por uma norma geral e abstrata, seja ela a lei constitucional (norma paratípica), a lei ordinária (norma típica primária) ou mesmo o regulamento (norma típica secundária). No segundo caso, torna-se necessário que o fundamento legal do comportamento do órgão executivo seja um ato normativo dotado com força de lei, de ato provindo de órgão com competência legislativa normal e revestido da forma externa legalmente prescrita.

A atividade administrativa que não se traduz na criação de limites à liberdade pessoal ou patrimonial dos cidadãos, apenas se encontra submetida à regra da preeminência da lei.

V – A RESERVA DE LEI NA ADMINISTRAÇÃO E OS REGULAMENTOS

No direito administrativo, há uma reserva relativa de lei formal.

Assim, o direito administrativo se contenta com uma simples reserva de lei material, baseado no item generalidade, novidade, próprios de um perfil normativo.

No Brasil, admitem-se os chamados regulamentos de execução ou executivos.

O regulamento de execução se presta a:

a) precisar o conteúdo dos conceitos de modo sintético referidos pela lei;

b) determinar o modo de agir da Administração nas relações que, necessariamente, travará com os particulares na oportunidade da execução da lei;

c) surgem na chamada discricionariedade técnica, quando, na lição de Oswaldo Bandeira de Mello(Princípios Gerais de Direito Administrativo, volume I, 1980, pág. 310), se tem: “o Legislativo delega ao Executivo as operações de acertar a existência de fatos e condições para a aplicação da Lei, os pormenores necessários para que as suas normas possam efetivar-se. Ela encontra corpo nas atividades estatais de controle. A lei da habilitação fixa os princípios gerais da ingerência governamental e entrega ao Executivo o encargo de determinar e verificar os fatos e as condições em que os princípios legais devem ter aplicação”. Trata-se da Administração explicar técnico-cientificamente os pressupostos de fato previstos em lei.

Se a lei conferiu tal ou qual indexador para a solução das obrigações entre os Estados Membros e Municípios para com a União, não pode um decreto regulamentador modificá-lo.

Dita o artigo sexto da Lei 1079/50 que é crime de responsabilidade intervir em negócios peculiares aos Estados e Municípios em desobediência às normas constitucionais. É um crime contra o livre exercício dos poderes constitucionais.

A eficácia da lei, sua execução, poderá ficar condicionada à edição do regulamento, desde que seja fixado prazo para a ação normativa do executivo. Não atribuído prazo, então a lei será eficaz desde sua vigência em tudo aquilo que não depender do ato complementar e inicial da execução. Fixado o prazo de regulamentação, e desrespeitado respectivo lapso temporal, a lei será eficaz em tudo o que não depender do regulamento.

No Brasil, alguns juristas, quando vigente a última Constituição, defenderam a tese de que o país admitia os regulamentos autônomos, sob o fundamento de que o artigo 81, V, atribuía ao Presidente da República a competência para “dispor sobre a estruturação, atribuições e funcionamento dos órgãos da administração federal”. Ora, os regulamentos de organização devem ser editados na forma da lei, de modo que não podem ser editados independentemente da lei.

Não há no Brasil regulamentos independentes, há regulamentos de execução, que servem para aplicação da lei. Não podem operar contra legem, ultra legem, nem praeter legem. Operam secundum legem.

Observe-se que a Constituição Portuguesa, com a revisão de 1982, previa, de forma expressa, os regulamentos independentes, no artigo 115. Eles não se confundem com os regulamentos autônomos porque não se satisfazem com o fundamento constitucional. Devem, como os de execução, indicar o ato legislativo que atribui competência regulamentar. Os regulamentos independentes, ao contrário dos executivos, já não recebem das leis determinados conteúdos-disciplinas para regulamentar, antes são eles que estabelecem, originalmente e com amplos poderes de conformação material, o regime, a disciplina de certas relações jurídicas, como ensinou Jorge Manuel Coutinho de Abreu(Sobre os Regulamentos Administrativos e o Princípio da Legalidade, 1987, pág. 40). O direito português, posto isto, admite os regulamentos independentes, “aquele em que a lei se limita a indicar a autoridade que poderá ou deverá emanar o regulamento e a matéria sobre o que versa”. Mas, na lição de J. J. Gomes Canotilho(Direito Constitucional, pág. 675), não se admite, porém, os “regulamentos autônomos , isto é, regulamentos não derivados, sem referência a lei anterior”.

No caso em discussão, a regulamentação desse poder de polícia dar-se-á diante de decretos de regulamentação editados pelo presidente da República.

Há, pois, evidente, vício de formalidade, na edição da portaria noticiada. A fonte normativa não deve ser, por certo, uma portaria.

Ora, se há a Lei nº 13.979, que precisa ser regulamentada, será caso de decreto que a regulamente.

 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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