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A caracterização de parte do imóvel como área de preservação permanente (APP) não implica obstáculo legal, podendo sim ser objeto de usucapião, até mesmo, para possibilitar a ação de desapropriação indireta.
Isso porque, a qualificação de determinada área como sendo de preservação permanente não a insere, por si só, no domínio público.
É que a APP pode se encontrar em terrenos públicos ou privados, e enquadra-se no conceito de espaço territorialmente protegido (ETP), nos termos do art. 225, § 1º, III, da Constituição da República, possuindo a natureza de limitação administrativa.
Em outras palavras, existe compatibilidade legal entre o domínio privado e a delimitação da área de preservação permanente, configurando-se apenas uma limitação administrativa à propriedade, estabelecida em prol do interesse coletivo de preservação ecológica e ambiental.
Neste aspecto, o proprietário tem contido o exercício do domínio, com a supressão do seu livre gozo, que deverá atender às regras de preservação do sistema natural compreendido na sua propriedade, o que não enseja, contudo, a impossibilidade de prescrição aquisitiva da propriedade.
De igual modo, imóvel proveniente de loteamento irregular, devidamente individualizado, e inserido em área de preservação ambiental, também pode ser objeto de ação de usucapião.
Isso acontece porque a usucapião é uma forma de aquisição originária de propriedade, e eventual restrição administrativa sobre o uso da propriedade, decorrente de proteção ambiental, não interfere na declaração da usucapião e, consequentemente, na regularização da propriedade do imóvel em favor do posseiro.
A este respeito, importante colacionar a lição de FLÁVIO TARTUCE:
Como ocorre na posse e também nos demais direitos, a propriedade admite formas de aquisição originárias e derivadas. (…)
Do ponto de vista prático, a distinção entre as formas originárias e derivadas é importante. Isso porque nas formas originárias a pessoa que adquire a propriedade o faz sem que esta tenha as características anteriores, de outro proprietário.
Didaticamente, pode-se afirmar que a propriedade começa do zero, ou seja, é “resetada”. É o que ocorre na usucapião, por exemplo. (…)
Se a propriedade é adquirida de forma originária, caso da usucapião, o novo proprietário não é responsável pelos tributos que recaiam sobre o imóvel. (…)
Outro exemplo prático envolve a hipoteca. Se um imóvel gravado por este direito real de garantia for adquirido por usucapião, ela estará extinta, pois a aquisição é originária.[1]
Portanto, o fato do imóvel estar localizado em loteamento irregular e em área de preservação permanente não impede o reconhecimento da propriedade em favor dos posseiros por meio da usucapião, que é forma originária de aquisição da propriedade por aquele que tem o bem, como se proprietário fosse, por determinado lapso temporal, de forma contínua e pacífica, preenchidos os demais requisitos legais específicos para cada uma de suas modalidades.
Ressalte-se, entretanto, que haverá uma mera limitação administrativa do imóvel em área de preservação permanente.
[1] FLÁVIO TARTUCE. Direito Civil, vol. 4, Direito das Coisas, 10ª edição, págs. 178/179, Editora Forense
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