O filme o guia pervertido da ideologia, da diretora Sophie Fiennes, protagonizado pelo filósofo e sociólogo esloveno Slavoj Zizek. A principal proposta do Slavoj é elucidar as propagandas ideológicas dominantes, imperceptíveis, na grande maioria dos filmes dos mais variados gêneros e as explicações dessas táticas de propagandas subliminares são explicadas se invocando pensadores tais como Freud e Lacan.
No filme, Slavoj aborda alguns filmes, demonstrando que o conteúdo dos mesmos nos ensina como um guia para o que fazer quando se quer escapar da “ideologia”, o que incluiria a indução e a lavagem cerebral que se realiza por instituições religiosas, instituições laicas, ideologias políticas, econômicas ou sociais, etc… Dizendo que a verdade é difícil de ser encarada e não pode ser encontrada pela vontade única do indivíduo, mas por um catalisador externo; há um elemento crucial em todas as ideologias que é o “Grande Outro”, a encarnação de todas as ideias contrárias à ideologia central, mas esse “Grande Outro” não existe de verdade, concluindo que nem tudo na vida têm sentido; e ainda há uma brilhante defesa da ideia que os indivíduos devem estar dentro da ideologia, é muito difícil escapar delas, mas devemos manter uma distância cínica saudável, fazermos piadas delas e não nos deixar infectar com elas.
No filme "A Noviça Rebelde" do diretor Robert Wise foi abordado parte de uma musica cuja a letra fora censurada em seu pais de origem, ao que fazendo uso da psicanálise fala do gozo, ao distinguir o gozo dos prazeres corriqueiros. Ao tratar do sublime ao excremento, o Zizek bebe uma coca-cola, a qual de gelada à quente demonstra que a mesma matéria e o mesmo conteúdo em situações diversas pode causar situações antagônicas. A dialética elementar da mercadoria é o excedente ilusório. Já o Kinder Ovo é usado para demonstrar o objeto do desejo, o brinquedo que está dentro do ovo que preenche o espaço vazio do ovo. A surpresa é o excedente.
Ao tratar da musica o "Hino à alegria" de Beethoven - Nona Sinfonia, o autor demonstra como a musica pode ser usada para fins adversos, por ideologias opostas, a exemplo do nazismo e do comunismo. Destacando ainda que este é o hino não oficial da União Europeia. Cena perversa de fraternidade universal. Assim a ideologia funciona como invólucro vazio. No filme "Laranja Mecânica" do diretor Stanley Kubrick nos remete ao discurso liberal ao justificar a delinquência pela pobreza, miséria, exclusão.
Assim o homem não é apenas um produto de circunstâncias objetivas, tem uma margem de decisão. Com o filme "Taxi Driver" do diretor Martin Scorsese e "Rastros de ódio" de John Ford sobre a vítima que de um modo perverso goza ou participa de sua vitimização. Não quer ser redimida, resiste. O filme "Tubarão" do diretor Steven Spielberg, Zizek demonstra como este filme unifica todos os medos. Fala do racismo, que o outro tem um gozo, perverso, ele tenta roubar de nós o nosso gozo. Perturba o nosso estilo de vida.
Além destes filmes também FOrão citados Titanic para o sagrado e o obsceno, A Queda de Berlim, Mash, Nascido para matar, Batman o Cavaleiro das trevas, A última tentação de Cristo, O segundo rosto entre outros. Zizek falará ainda sobre o capitalismo ter uma estrutura religiosa, a inércia do Real, dos ritos obscenos que regulam as escolas na Inglaterra. Sobre o grande Outro - o stalinismo. Sobre a histeria e por sermos responsáveis por nossos sonhos que encenam nossos desejos.
O filme se divide em três partes, sendo que na primeira parte trata-se de um assunto central no cinema, qual seja, a dicotomia entre realidade e ficção, a qual se esta contida não tao apenas na relação das histórias dos filmes, como de igual forma nessa experiência cinematográfica de sentarmos diante de uma tela para assistir a um filme, onde somos jogados para dentro de uma outra realidade diversa à nossa. Tudo se mistura. A segunda parte fala sobre a libido, tema bem Freudiano.
E a terceira parte é sobre o jogo das aparências, onde são discutidos valores simbólicos apresentados nos filmes. Confesso que as três partes se intercalam nos temas, uma penetra na outra, o que torna tudo menos didático. O que vem a ser considerado pervertido é justamente essa leitura mais profunda dos filmes como, por exemplo, o Triunfo da Vontade (1935) e Titanic (1997), elucidando o que vem a ser considerado como um lado nefasto do cinema: a ideologia.
O Zizek tenta mostrar que através da psicanálise, que é uma conversa inconsciente, como os filmes falam conosco ainda que nós não percebamos, mas que isso não impede de que as mesmas sejam devidamente entregues, ou seja, cumpram sua missão. É uma ideia brilhante colocar o ator, Zizek, dentro das cenas dos filmes que estão sendo analisados, ele literalmente participa dessas cenas e as explica, pois, segundo a ideia do filme, mesmo quando vamos ao cinema estejamos inseridos em realidades completamente diferentes da nossa, nós nos envolvemos com as histórias que nos são mostradas gerando um tipo de mistura/complementação entre o que se assiste e aquilo que se vive na vida de cada um dos telespectadores.
É através desses diálogos, não necessariamente em filmes críticos ou documentários, pois pode-se enxergar uma ideologia dominante até mesmo no filme do Batman, que se mostra qual ideologia se aborda, qual seja, uma ideologia social que impele ao consumismo, a um padrão pré-estabelecido. Os filmes, ainda que proponham uma liberdade que aparenta ser algo comum na época do filme (2012) e na atualidade, na realidade pregam que somos livres para consumir o que quisermos desde que efetivamente consumamos, ou seja, nós somos convidados a perceber que somos, na verdade, verdadeiros escravos de um capitalismo que independentemente do gênero do filme sempre propaga o ideal do consumismo que é uma ideologia completamente disfarçada de uma ideia de um tipo de livre arbítrio, entretanto, nesse caso, não existe afinal a própria psicanálise nos aduz como ocorre essa manipulação, essa conversa silenciosa com o íntimo, a fim de que nos tornemos aquilo que é mais valioso para o capital: seu escravo gerador de lucro.
A solução encontrada/dada pelo ator principal do filme é justamente se rebelar contra o sistema, capitalismo, dominando nossos sonhos para que não sejamos consumistas escravizados que não creem que são escravos, contudo, tal como pode se imaginar, esse processo é demasiadamente torturador uma vez que requer mudanças significativas no intimo do ser.
O Zizek lembra um pouco o martelo do Nietzsche, pois vai andando pelos filmes e demonstrando/destruindo suas fraquezas/propagandas/malicias silenciosas num filme estilo palestra. O primeiro filme que ele aborda é "Eles Vivem" de 1988 do diretor John Carpenter sobre os óculos que o protagonista encontra e ao usá-los ele vê o que os outros não conseguem ver. Zizek então nos fala que a ideologia é nossa relação espontânea com o mundo social, é como percebemos seu significado.
Gostamos da ideologia e sair dela machuca. Eis o porque da recusa das pessoas de usarem o óculos, pois têm consciência de que ao colocá-los irá ver a verdade que pode ser dolorosa e não querem passar pela violência extrema da libertação, a liberdade dói.
REFERENCIAS:
http://vimeo.com/34768645 http://vimeo.com/35104283 http://vimeo.com/35100202