A utilização da publicação de um influenciador digital sem autorização ou crédito gera danos morais?

16/03/2020 às 21:28
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Este artigo aborda os direitos dos influenciadores digitais defronte a utilização de suas publicações sem o pagamento de uma contrapartida financeira, autorização ou mesmo o devido crédito. No caso dessa exploração do direito de imagem, cabe danos morais?

Com o crescimento exponencial da internet para propagação de produtos, serviços, marcas e atividades em geral, notadamente por meio de parcerias com criadores de conteúdo digital (influenciadores digitais), despontaram controvérsias jurídicas até então inexistentes.

 

Das mais relevantes, e atualmente corriqueiras, está a utilização (in)devida da imagem de terceiro. Tal fato costuma ocorrer quando alguém, aproveitando-se de imagens (fotos ou vídeos) publicadas na internet por um influenciador digital, em qualquer de suas plataformas, utiliza comercialmente sem autorização ou o devido crédito.

 

Como dito, os maiores prejudicados são, evidentemente, os criadores de conteúdo digital, que fazem da criação a sua fonte de renda, sendo a utilização do conteúdo um claro benefício a título gratuito do expropriador, e um prejuízo daquele que produz digitalmente. 

 

Cada produto advindo de um influenciador digital, e publicado, além de pertencer ao seu direito de personalidade, no qual está inserido o direito de imagem, ainda conta com valor de mercado. É neste sentido que se acredita não ser possível a utilização comercial da criação de um influenciador digital sem anuência, ou mais grave, excluindo qualquer identificação do criador daquele conteúdo.

 

A Constituição Federal resguarda impositivamente os direitos de imagem, ao também proteger os direitos de personalidade, ambos perfazendo os Direitos e Garantias Fundamentais. Veja o que prevê o Art. 5º, V e X:

 

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

V - é asseguradoo direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenizaçãopor dano material, moral ou à imagem;

[...]

X - são invioláveisa intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;”

 

Como percebe-se de plano pela Constituição Federal, além da proteção ao direito de imagem, a própria Carta permite a indenização em caso de violação aos incisos V e X do Art. 5º.

 

E foi seguindo a orientação da Lei maior, que o Superior Tribunal de Justiça alinhou seu entendimento, no sentido de que, além de passível de indenização a utilização da imagem de terceiro comercialmente e sem autorização, o prejuízo é presumido (dano in re ipsa). Logo, a pessoa cuja imagem foi utilizada indevidamente, e comercialmente, não necessita nem mesmo comprovar que auferiu qualquer prejuízo a título de dano moral. Este é o teor do enunciado 403 da Súmula do STJ: “Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa.”

 

Pelo exposto é que o Superior Tribunal de Justiça consolidou sua jurisprudência no sentido de que “os danos morais em virtude de violação do direito à imagem decorrem de seu simples uso indevido, sendo prescindível, em casos tais, a comprovação da existência de prejuízo efetivo à honra ou ao bom nome do titular daquele direito, pois o dano é in re ipsa. (Súmula nº 403/STJ)”[1].

 

Mais, se demonstrado prejuízo material, além do moral, a indenização poderá ter maior extensão, englobando as duas esferas, anímica e material.

 

O Art. 20, do Código Civil, corrobora: “Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais.”

 

O normativo acima é ainda mais pontual ao dispor que o detentor do direito de imagem poderá solicitar a imediata exclusão do conteúdo propagado sem sua autorização, notadamente defronte a fins comerciais.

 

Importa reforçar, até para que se afaste argumento costumeiramente utilizado, que a só existência da publicação em meios digitais não permite sua propagação desenfreada, uma vez que o criador buscava inicialmente atingir um determinado grupo ou nível. Logo, se ultrapassado este nicho para além dos limites imaginados, haverá de ser apurado eventual prejuízo. 

 

De outra ponta, o simples compartilhamento na mesma rede social, sem omitir o nome do influenciador digital ou sua marca, parece não ser passível de indenização, haja vista ter esperado que a imagem tivesse maior alcance dentro da mesma plataforma. Mas repisa-se, a exclusão da identificação do criador de conteúdo, seja omitindo seu nome, seja excluindo sua marca d’água, faz emergir a possibilidade de apuração de eventuais prejuízos, seja de ordem moral, seja de ordem material.

 

De igual forma, o statusde ‘pessoa pública’ não permite a exploração desautorizada de sua imagem, nos termos do entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça:

 

“RESPONSABILIDADE CIVIL. USO INDEVIDO DA IMAGEM. REVISTA DE GRANDE CIRCULAÇÃO. FIM COMERCIAL. SÚMULA N.º 403/STJ. PESSOA PÚBLICA. LIMITAÇÃO AO DIREITO DE IMAGEM. VALOR DA INDENIZAÇÃO. RAZOABILIDADE.

1. "Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais" (Súmula 403/STJ).

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2.Mesmo quando se trata de pessoa pública, caracterizado o abuso do uso da imagem, que foi utilizada com fim comercial, subsiste o dever de indenizar. Precedente.

3. Valor da indenização por dano moral e patrimonial proporcional ao dano sofrido e ao valor supostamente auferido com a divulgação da imagem. Desnecessidade de intervenção desta Superior Corte.”[2](destacado)

 

 

É crucial reforçar que todo o exposto diz respeito, principalmente, a exploração desautorizada da imagem de terceiro com fins econômicos e comerciais, nos termos do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, o que não afasta, por outro lado, a possibilidade de ser apurada eventual indenização mesmo fins lucrativos.

 

É nesta senda que não somente é passível de indenização a utilização de publicação de um influenciador digital sem autorização ou crédito, como decorre de jurisprudência pacífica, que inclusive reconhece o prejuízo moral como presumido, e ainda permite a apuração de danos materiais, tudo a exigir de quem explora comercialmente acuidade, atenção e respeito pela criação dos influenciadores digitais.

 


[1]AgInt no Agravo em Recurso Especial n° 1177785 - PR. Rel. Min. Ricardo Villas Bõas Cueva, j. 03/12/18.

[2]AGRG NO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.345.989 - SP. REL. MIN. MARIA ISABEL GALLOTTI.

Sobre o autor
Vinícius Uberti Pellizzaro

Advogado Sócio da banca "Leandro Bernardino Rachadel Advogados", onde é responsável pela Arbitragem. Presidente da CMACIP (Câmara de Mediação e Arbitragem ACIP). Membro da Comissão Estadual de Arbitragem da OAB/SC e do Comitê de Arbitragem do CESA/SC (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados). Conselheiro da OAB, Subseção Palhoça, para a gestão 2019/2021. Ex-Presidente da Comissão OAB Jovem, Subseção Palhoça, na gestão 2016/2018. Membro efetivo do IASC (Instituto dos Advogados de Santa Catarina). Bacharel em Direito pela Universidade do Contestado - UnC. Pós-Graduado em Direito Constitucional. Pós-Graduado em Mediação, Conciliação e Arbitragem. Participou e ocupou cargos de diretoria em diversas instituições, organizações e comissões relacionadas à Advocacia e à sociedade civil. Possui materiais jurídicos publicados e participa como palestrante, debatedor ou membro da comissão organizadora de eventos em geral relacionados a sua atividade profissional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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