A DIMINUIÇÃO DE SALÁRIOS DIANTE DOS EFEITOS DA CRISE DO CORONAVÍRUS

19/03/2020 às 14:05
Leia nesta página:

O ARTIGO DISCUTE SOBRE RECENTE PROPOSTA DE DIMINUIÇÃO DOS SALÁRIOS DIANTE DOS EFEITOS ECONÔMICOS GERADOS PELO CORONAVÍRUS.

A DIMINUIÇÃO DE SALÁRIOS DIANTE DOS EFEITOS DA CRISE DO CORONAVÍRUS

Rogério Tadeu Romano

 

A CLT permitia a redução geral dos salários dos empregados em até 25%, respeitado o salário mínimo regional, em caso de força maior ou prejuízos comprovados da empresa. Mas com o advento da atual Constituição Federal, essa possibilidade deixou de existir, sendo indispensável que a redução no salário seja negociada com o sindicato profissional.

No caso de redução da jornada ser acompanhada de diminuição do salário, existem duas possibilidades. A primeira, da mesma forma anteriormente exposta, é que norma coletiva determine essa redução, tanto da jornada, quanto do salário.

A segunda é que a redução seja acordada de forma individual com o trabalhador, mas desde que isso, de fato, se caracterize como uma vantagem para ele. Por exemplo, o empregado que cumpra oito horas diárias, mas que em virtude do ingresso em um curso superior prefira diminuir sua jornada para poder conciliar os estudos com o trabalho. Nesse caso, demonstrado seu real interesse, ele poderia, em comum acordo, ter sua jornada diminuída com a correspondente redução do salário.

O artigo 7º, VI, da Constituição Federal garante a irredutibilidade salarial.

Mozart Victor Russomano, ao observar que a natureza alimentar do salário reclama regulamentação cuidadora, por parte do legislador, expôs que no Brasil essa proteção assume três aspectos fundamentais:

  1. Irredutibilidade;
  2. Integridade;
  3. Intangibilidade.

Recordo que, no direito anterior, já era reconhecida a irredutibilidade do salário, por força do preceituado no artigo 468 da Consolidação das Leis do Trabalho, que estabelecia a impossibilidade de alterações unilaterais do contrato individual de trabalho. Não obstante, a concordância do empregado, ainda assim, ela é nula de pleno direito, pois presume-se sempre que seja prejudicial ao trabalhador(CLT, artigo 468, parte final).

Mas não serão consideradas reduções salariais aquelas diminuições resultantes da menor quantidade de trabalho realizado, quando o salário é reajustado por tarefa, peça, comissões, percentagem etc.

Há ainda, como já realçado, as hipóteses de força maior ou prejuízos devidamente comprovados à empresa.

Mozart Victor Russomano fixou como condição para a redução com fundamento nessas hipóteses: a) seja geral; b) não prejudique o salário mínimo; c) não ultrapasse na proporção de 25% a remuneração habitual.

Mas, observe-se, a Constituição de 1988 fixou a regra da irredutibilidade do salário, abrindo tão-somente duas exceções, para o disposto em convenções ou acordos coletivo.

Pelo texto original do artigo 7º, VI, da Constituição onde se traça uma verdadeira garantia institucional, ficam absolutamente excluídas as reduções de salários, ainda que feitas com a concordância do empregado, assim como as diminuições advindas, da força maior, ou de prejuízos devidamente comprovados para a empresa.

A reforma trabalhista, por sua vez, não alterou essas regras.

No caso de redução da jornada ser acompanhada de diminuição do salário, existem duas possibilidades. A primeira, da mesma forma anteriormente exposta, é que norma coletiva determine essa redução, tanto da jornada, quanto do salário.

A segunda é que a redução seja acordada de forma individual com o trabalhador, mas desde que isso, de fato, se caracterize como uma vantagem para ele. Por exemplo, o empregado que cumpra oito horas diárias, mas que em virtude do ingresso em um curso superior prefira diminuir sua jornada para poder conciliar os estudos com o trabalho. Nesse caso, demonstrado seu real interesse, ele poderia, em comum acordo, ter sua jornada diminuída com a correspondente redução do salário.

Por último, a empresa não pode dispensar o empregado e, em seguida, admiti-lo somente para recontratá-lo com um salário menor. Essa prática é uma espécie de fraude e, caso isso aconteça, será considerado como se não houvesse ocorrido a dispensa.

Esse o quadro constitucional.

Surgiram as chamadas medidas contra os efeitos da propagação do coronavírus.

O governo anunciou no dia 19 de março do corrente ano a edição de mudanças legislativas para facilitar às empresas tomarem medidas para reduzir o custo com empregados, durante o período de crise causada pelo novo coronavírus. Entre as medidas, está a permissão para que as empresas cortem pela metade os salários e a jornada de trabalho. As medidas vão valer até durar o Estado de Calamidade Pública, ou seja, até 31 de dezembro de 2020.

As mudanças podem ser encaminhadas ao Congresso Nacional por medida provisóra ou projeto de lei, o que ainda não foi decidido. Tudo precisará do aval de deputados e senadores.

Com o devido respeito as medidas propostas são inconstitucionais.

Isso porque agridem ao disposto no artigo 7º, VI, da Constituição Federal.

Estamos diante de garantias institucionais.

A garantia institucional não pode deixar de ser a proteção que a Constituição confere a algumas instituições, cuja importância reconhece fundamental para a sociedade, bem como a certos direitos fundamentais, providos de um componente institucional que os caracteriza. Temos uma garantia contra o Estado e não através do Estado. Estamos diante de uma garantia especial a determinadas instituições, como dizia Karl Schmitt. A vitaliciedade é uma garantia constitucional que protege o Judiciário e o Ministério Público e sua perda enfoca a instituição. Ora, se assim é a garantia institucional na medida em que assegura a permanência da instituição, embaraçando a eventual supressão ou mutilação, preservando um mínimo de essencialidade, um cerne que não deve ser atingido ou violado, não se pode conceber o perecimento desse ente protegido.

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J.H. Meirelles Teixeira prefere chamar de direitos subjetivos, uma vez que eles configuram verdadeiros direitos subjetivos. Tais direitos se configuram quando a Constituição garante a existência de instituições, de institutos, de princípios jurídicos, a permanência de certas situações de fato. São características desses princípios, consoante apontados por Karl Schmitt: a) são, por sua essência, limitados, somente existem dentro do Estado, afetando uma instituição juridicamente reconhecida; b) a proteção jurídico‐constitucional visa justamente esse círculo de relações, ou de fins; c) existem dentro do Estado, não antes ou acima dele; d) o seu conteúdo lhe é dado pela Constituição;   Penso que a Constituição não deixa margem de mudança dos direitos institucionais, garantias institucionais, por emenda constitucional, e muito mais ainda por lei ordinária. A vitaliciedade é, pois, instituto que o Constituinte originário cristalizou , impondo o seu acatamento in totum. As garantias institucionais, direitos institucionais, constituem direitos fundamentais.

Não cabe ao governo, por norma típica primária, desconstituir algo que ficou determinado, por functor deôntico, mas por meras ilações descritivas, na norma paratipica que é a Constituição.

Será o caso de extrair a solução das Convenções ou de Dissídios Coletivos não de uma imposição inconstitucional.

Mostra mais uma vez o Executivo, pela política econômica adotada, desprezo pelo trabalhador.

Trata-se de mais uma estratagema arquitetado para sepultar o direito do trabalho, que já se encontra na UTI desde a Lei 13467/2017, para asfixiar a Constituição Federal e destruir Normas Internacionais do Trabalho das quais o Brasil é signatário.

Como sugestão acentuou que os sindicatos de empregados, que foram alijados nessa intenção do governo, própria de algo que segue o caminho unicamente neoliberal, do patrimônio acima de tudo, poderiam ter com os patrões o caminho-limite de 25% que já era estabelecido pela CLT na sua redação original, na diminuição momentânea dos salários, enquanto durar essa circunstância extraordinária.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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